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Psicologia, Saúde & Doenças

Print version ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.19 no.2 Lisboa Aug. 2018

https://doi.org/10.15309/18psd190206 

Eficácia do neurofeedback no tratamento da ansiedade patológica e transtornos ansiosos: revisão sistemática da literatura

Neurofeedback efficacy in the anxiety disorder and pathological anxiety treatment: systematic literature review

Claudson Cerqueira Santana1, Menilde Araújo Silva Bião1

1 Faculdade Anísio Teixeira, Departamento de Psicologia


 

RESUMO

O neurofeedback, Técnica não-invasiva de tratamento de transtornos neurológicos e psiquiátricos vem sendo utilizado como uma alternativa ao tratamento medicamentoso. Este estudo tem como objetivo analisar a literatura nacional e internacional acerca da eficácia desta técnica no tratamento da ansiedade e transtornos ansiosos. Foi feito um levantamento bibliográfico dos artigos publicados entre 2003 e 2014 das principais bases de dados nacionais e internacionais. Foram encontrados 14 artigos sistematizados em três categorias: instrumentos utilizados, áreas cerebrais correlatas e média de sessões de neurofeedback. Ficou evidenciado a avaliação positiva do uso do neurofeedback e sua eficácia. Ressalta-se a necessidade de mais estudos que possam reafirmar a eficácia do treinamento neurológico no tratamento da ansiedade patológica e transtornos ansiosos, tendo em vista a escassa publicação voltada para essa temática, principalmente no contexto nacional.

Palavras-Chave: ansiedade, transtornos ansiosos, neurofeedback, treinamento neurológico


 

ABSTRACT

Neurofeedback, non-invasive treatment technique for neurological and psychiatric disorders, has been used as an alternative to drug treatment. This study has as an objective to analyze national and international literature on this technique efficacy in the anxiety and anxiety disorder treatment. A literature review of articles published between 2003 and 2014 of the main national and international databases was done. Fourteen articles systematized into three categories were found: used instruments, correlated brain areas and neurofeedback session average. Neurofeedback use positive evaluation and its efficacy were evidenced. It highlights the need for further studies that can reassure neurological training efficacy in the anxiety disorder and pathological anxiety treatment, bearing in mind the scarce publication aimed at this theme, mainly in the national context.

Keywords: anxiety, anxiety disorders, neurofeedback, neurological training


 

A ansiedade é um mecanismo biológico utilizado pelo organismo como proteção diante de uma ameaça. De modo geral é um sentimento desencadeado pela expectativa de algum evento, real ou não, que pode pôr em risco a sobrevivência do organismo. Esse sentimento pode desencadear alterações no Sistema Nervoso Autônomo, que possui a função de preparar o organismo para tomar as medidas necessárias afim de que os possíveis prejuízos não sejam concretizados (Vasconcelos, Costa & Barbosa, 2008).

Segundo Lent (2001) “as manifestações de ansiedade e estresse são consideradas reações normais até o ponto - mal definido - em que começam a provocar sofrimento no indivíduo” (p. 664). Esse sofrimento pode levar ao desenvolvimento de um estado de ansiedade patológica e, como consequência, ao desenvolvimento dos chamados Transtornos Ansiosos. (Vasconcelos, Costa & Barbosa, 2008).

Nos Estados Unidos, um em cada quatro indivíduos relata ter tido algum tipo de transtorno de ansiedade ao longo da vida, concentrando-se na população jovem (25 e 44 anos), sendo mais comum em mulheres (Munaretti e Terra, 2007). Segundo Kessler, Ruscio, Shear e Wittchen (2009), as fobias específicas apresentam alta prevalência (6-12%), seguida pela fobia social (10%) e pelo TEPT (cerca de 7%).

No Brasil, um estudo realizado na cidade de São Paulo, mostrou que, dos 1.464 entrevistados, 4,2% foram diagnosticados com TAG, 1,6% com transtorno do pânico, 2,1 % com agorafobia, 4,8% com fobia simples, 3,5% com fobia social e 0,3% com TOC (Andrade, Walters, Gentil e Laurenti, 2002).

Investigações de bases neurobiológicas vêm sendo feitas ao longo das últimas décadas com o objetivo de compreender as alterações ocorridas no sistema nervoso, tanto estrutural como a molecular. Os sintomas comuns dos transtornos de ansiedade são: sudorese, taquicardia, dilatação da pupila, aumento da pressão arterial e da ventilação pulmonar. Rodrigues (2011) afirma que há participação direta da amígdala, que avalia a natureza e o nível de intensidade da situação em que o indivíduo está exposto, dando uma conotação afetiva.

As técnicas psicoterápicas têm contribuído para tratamento dos transtornos ansiosos (Araújo, Melo & Leite, 2007). A partir da segunda metade do século XX, o treinamento neurológico por neurofeedback foi se desenvolvendo como alternativa não-medicamentosa (Neves, 2010).

O treinamento do neurofeedback é obtido a partir da atividade elétrica, observada pelo registro do eletroencefalograma (EEG). As alterações elétricas encefálicas da ansiedade evidenciam aceleração na faixa High Beta (uma das ondas elétricas) da região motora e do córtex dorsolateral no hemisfério direito (Mascaro, 2012).

As pesquisas na área das neurociências contribuem para o tratamento de doenças psiquiátricas e neurológicas, com alternativas não-farmacológicas complementares. O presente estudo tem como objetivo analisar a literatura científica nacional e internacional acerca do uso do treinamento neurológico por neurofeedback no tratamento de indivíduos com ansiedade patológica ou transtornos ansiosos, entre os anos 2003 e 2014.

 MÉTODO

A revisão foi feita a partir do levantamento bibliográfico das seguintes bases de dados científicas: The Cochrane Library, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), PubMed, Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE), Scientific Eletronic Library Online (Scielo Brasil e Espanha), Periódicos Eletrônicos de Psicologia (PePSIC), Red de Revistas Científicas de América Latina y el Caribe, España y Portugal (Redalyc) e PsycINFO. Foi realizado um levantamento de artigos empíricos publicados em espanhol, inglês e português. As palavras-chave utilizadas, nos três idiomas foram: “Neurofeedback”; “biofeedback EEG”; “neuroterapia” e “ansiedade”; “transtornos ansiosos”; “transtorno obsessivo-compulsivo”; “transtornos de ansiedade generalizada”; “transtorno de estresse pós-traumático”; “transtorno de pânico”. Como critério de inclusão, todos os artigos deveriam ser empíricos, constituir de resumos que apresentem método, resultados e discussão, serem publicados em língua inglesa, portuguesa ou espanhola, independentemente do país de publicação, e serem publicados entre os anos 2003 e 2014.

Os artigos encontrados deveriam apresentar resultados que possuíssem a relação do treinamento neurológico por neurofeedback com a ansiedade patológica ou transtornos ansiosos (Transtorno Obsessivo-Compulsivo, Transtorno de Ansiedade Generalizada, Transtorno do Pânico, Transtorno do Estresse Pós-traumático), avaliando a sua eficácia. Como critério de exclusão, não foram considerados aqueles artigos que não possuíam resultados associando a ansiedade ou transtornos ansiosos com o neurofeedback. Não foram considerados, também, artigos que apresentaram intervenções com crianças e adolescentes, ou em pacientes que tenham algum tipo de ansiedade ou transtorno ansioso como etiologia secundária ou comorbidade. Artigos contendo pesquisas feitas com animais não-humanos não foram considerados.

RESULTADOS

 Foram encontrados, ao total, 49 artigos, um em língua espanhola, e 48 em língua inglesa. Nas bases de dados em português não foram encontrados nenhum estudo empírico ou ensaio clínico que fizesse associação do neurofeedback com a ansiedade patológica e os transtornos de ansiedade. Após a filtragem, feita através dos critérios de inclusão e exclusão, 14 artigos (28,57%) foram selecionados para esta revisão sistemática.

Os artigos foram traduzidos e as informações foram apresentadas em um banco de dados, divididos nos seguintes tópicos: título, autores, revista, país de publicação, ano, objetivos, participantes, instrumentos, resultados, discussão e considerações finais. Alimentado o banco de dados, os dados dos resultados obtidos foram agrupados em categorias. Essas categorias foram obtidas através das informações encontradas, analisando os instrumentos utilizados para avaliar a aplicação do neurofeedback e, também, a utilização do EEG, a participação ou não de grupo controle, o tipo de transtorno de ansiedade encontrado, a quantidade de sessões de neurofeedback utilizadas, a área cerebral analisada com o EEG. Outras informações foram categorizadas para possíveis hipóteses, como a quantidade de participantes, país de realização do estudo, o aumento ou diminuição dos sintomas dos transtornos por quantidade de participantes das pesquisas.

Dos 14 artigos encontrados, 5 (35,71 %) apresentam estudos acerca do uso do neurofeedback no tratamento da ansiedade patológica, ou seja, aquela que causa sofrimento psíquico, mas que não entra dentro dos critérios diagnósticos apresentados pelo DSM-V como transtorno; 2 (14,28 %) apresentam sobre o neurofeedback com o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG); 5 (35,71%) com o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) e 2 (14,28%) com o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). Não foi encontrado, em nenhuma base de dados e em nenhum dos três idiomas pesquisados, artigos onde houvesse associação do neurofeedback com o Transtorno do Pânico.

Em relação à região de publicação, 6 artigos (42,85 %) foram publicados na América, com a maior prevalência nos Estados Unidos da América (EUA) e um no Canadá, 2 (14,28%) publicados na Europa (Escandinávia e República Tcheca), e 6 (42,85%) artigos da Ásia (China, Turquia, Índia e Paquistão). Dentre os mesmos artigos, 3 (21,42%) deles foram publicados antes do ano de 2010 (entre 2003 e 2009), e 11 (78,57%) artigos publicados entre os anos de 2010 e 2014.

Todos os artigos encontrados encaixaram-se dentro dos critérios de inclusão, sendo todos empíricos, associando o neurofeedback com a ansiedade ou transtorno ansioso, onde os participantes da amostra foram submetidos a sessões de neurofeedback e, logo após, submetidos a instrumentos de avaliação ou ao Eletroencefalograma (EEG), para analisar se houve ou não melhora dos sintomas e, em alguns artigos, em comparação com o grupo controle. O quadro 1 apresenta, de forma detalhada, as informações contidas no método de cada um dos artigos e que são pertinentes para este estudo.

 

 

O valor da amostra apresenta variações na quantidade de indivíduos submetidos ao treinamento, variando entre 2 participantes (Hammond, D. C., 2003) e 100 (Bhat, P., 2010). A quantidade de sessões de neurofeedback também são bem variáveis, dependendo de cada método aplicado pelo (s) autor (es). Em relação aos tipos de instrumentos utilizados para avaliação do indivíduo, pré e pós sessões de neurofeedback, há uma variação de testes aplicados, porém todos dentro do contexto de avaliação emocional e dos sintomas da ansiedade. Alguns estudos utilizaram o mesmo tipo de instrumento, para avaliar os sintomas de transtornos diferentes, e um artigo (Kluetsch, R., et. al., 2014) não utiliza nenhum tipo de instrumento para avaliação. O instrumento mais aplicado, observado nos estudos foi o Yale-Brown Obsessive- Compulsive Scale (YBOCS), presente em 5 dos 14 artigos encontrados.

Alguns estudos, além de escalas de avaliação, utilizaram o Eletroencefalograma (EEG) como forma de avaliação da eficácia do neurofeedback. Dos 14 artigos analisados, 4 (28,57%) fizeram uso do EEG, antes e após as sessões do treinamento. O uso dessa técnica de análise da atividade elétrica cerebral, além das de imageamento encefálico, tanto como avaliação, como para mapear as regiões onde seriam o alvo do treinamento por neurofeedback, foi importante para analisar as áreas cerebrais envolvidas na ansiedade patológica e seus transtornos, e comparar com a literatura existente.

Em relação à participação do grupo controle, dos 14 artigos deste estudo, 7 (50%) fizeram parte da pesquisa, para serem avaliados com o grupo experimental e, posteriormente, comparados os resultados dos testes e/ou o EEG, para confirmar ou não a eficácia do neurofeedback.

 DISCUSSÃO

 Os artigos filtrados para este estudo apresentam alguns pontos que evidenciam a eficácia ou não do treinamento neurológico por neurofeedback no tratamento da ansiedade patológica e os transtornos ansiosos, onde foram feitas comparações entre os métodos, resultados e discussão dos mesmos e, posteriormente, análise, com o intuito de responder as possíveis hipóteses que foram levantadas neste estudo.

I - Utilização de Instrumentos para Avaliação do Neurofeedback

Dos 14 artigos deste estudo, 13 utilizaram testes e/ou escalas de avaliação psicológica para avaliar a eficácia do Neurofeedback, pré e pós sessões de treinamento. O instrumento mais utilizado foi o Yale-Brown Obsessive- Compulsive Scale (YBOCS). Em todos os artigos onde foi apresentada essa escala, houve melhora nas pontuações que foram apresentadas, ou seja, os sintomas foram minimizados, quando comparados os resultados antes e após as sessões de neurofeedback. Vale chamar atenção para um dos estudos sobre a avaliação da eficácia do Neurofeedback em indivíduos com TOC (Surmeli T., Ertem A., 2011), em que foi utilizado o YBOCS, juntamente com o Minnesota Multi-Phasic Personality Inventory (MMPI), onde os 36 participantes foram contactados, dois anos após o estudo, para uma entrevista acerca do seu estado de saúde. Destes, 19 melhoraram ou permaneceram sem os sintomas do TOC, 9 tinham desenvolvido sintomas leves, mas que não trazem sofrimento psíquico ou atrapalhem nas atividades cotidianas e, apenas 5 reincidentes. Pode-se perceber neste estudo que o uso do treinamento possui efeitos positivos a longo prazo, o que reforça a sua eficácia.

Dos instrumentos, 5 foram utilizados em mais de uma patologia. Dentre eles, o Beck's Depresseion Inventory (BDI) foi utilizado como avaliação nos estudos sobre TOC (Kopřivová J. et. al. 2013; Joseph, G. A., et. al., 2009) e TAG (Hou, Y. et. al., 2013); o State and Trait Anxiety Inventory (STAI) nos estudos de TAG (Hou, Y. et. al., 2013) e ansiedade patológica (Gilham, S. et. al., 2012); Minnesota Multiphasic Inventory (MMPI) nos estudos de TOC (Surmeli T., Ertem A., 2011) e ansiedade patológica (Hardt, J. V., 2012); Inventory Padua nos estudos de TOC (Hammond, D. C., 2003) e ansiedade patológica (Scheinost, D., et. al., 2013); e PTSD Sympton Scale (PSS) nos estudos de TEPT (Nelson, D. V., Esty, M. L. 2012) e ansiedade patológica (Gilham, S. et. al., 2012). Pode-se perceber, nessa comparação que, 4 dos instrumentos que foram utilizados em mais de um transtorno, tem envolvimento com a ansiedade patológica, o que pode indicar que, como esta pode levar, posteriormente, ao desenvolvimento de um transtorno de ansiedade, a utilização destes instrumentos para avaliá-lo sinaliza a melhora ou não dos sintomas.

Dentre os artigos, um chamou atenção por utilizar apenas dois participantes em seu método de pesquisa (Hammond, D. C., 2003). Esse estudo apresenta, tanto o YBOCS como o Padua Inventory, como instrumentos de investigação da eficácia do neurofeedback. O autor traz que, em ambos os indivíduos, os resultados do Padua Inventory, após as sessões de treinamento, apresentaram melhoras significativas e a manutenção destes a longo prazo, em comparação ao tratamento farmacológico, que apresentou melhoras modestas; e à terapia comportamental, com exposição de resposta, que demonstrou ser desagradável e levou ao abandono do tratamento.

Em contraponto à pesquisa acima, o estudo indiano (Joseph, G. A., et. al., 2009) apresenta dados que não confirmam a eficácia do neurofeedback no tratamento do TOC. 5 indivíduos foram submetidos a 15 sessões de treinamento neurológico, porém o YBOCS e o Hamilton Rating Escale for Anxiety (HAM-A), demonstraram que os sintomas de obsessão e compulsão não sofreram alterações se comparado com o grupo controle, mas melhora a respeito da ansiedade não específica. O autor, comparando o estudo com o de Hammond (2003), apresenta que a diferença na quantidade de participantes e a não utilização de um grupo controle pode ter influência na avaliação da eficácia do neurofeedback.

II - Áreas Cerebrais Envolvidas no Neurofeedback

Outro ponto de discussão diz respeito às áreas corticais e subcorticais que sofreram alterações após as sessões de neurofeedback, observadas tanto pelo Eletroencefalograma (EEG) como por outras técnicas de mapeamento e imageamento cerebral. Dos 14 estudos desta revisão, 10 descrevem as áreas encefálicas onde foram percebidas modificações em sua atividade elétrica.

Ênfase maior é dada na região do córtex frontal, onde há maior incidência de alterações pós sessão de neurofeedback, mais especificamente o córtex pré-frontal (TOC e TEPT), córtex orbitofrontal (Ansiedade patológica e TOC), giro frontal médio (TEPT) e córtex frontal medial (TOC). Nas outras regiões corticais, pode-se perceber alterações no córtex temporal (TEPT, TOC e Ansiedade patológica), córtex parietal (TEPT, TOC e TAG) e córtex occipital (TEPT, TOC e Ansiedade patológica). Além das regiões corticais, 7 estudos apresentaram áreas onde as alterações ocorreram em regiões internas dos hemisférios cerebrais e às regiões subcorticais, podendo perceber alterações no córtex cingulado (TOC, TEPT e Ansiedade patológica), região insular (TEPT e TOC) e estruturas que compõe o sistema límbico (TOC e Ansiedade Patológica).

Pode-se perceber, também, nesta revisão, que há predominância, nas regiões onde alterações foram presentes, do TEPT. Por conta da peculiaridade na sintomatologia deste transtorno, as alterações cerebrais podem ocorrer em diversas regiões. Um dos estudos sobre o TEPT (Nelson, D. V., Esty, M. L. 2012), feito com indivíduos que estavam no campo de batalha da guerra do Vietnã, apresenta o treinamento por neurofeedback em toda a região cortical, havendo estimulação da mesma. Em comparação com o estudo de Kristensen, Parente e Kaszniak (2006), que não faz parte dos artigos desta revisão, apresenta que as principais áreas que são prejudicadas após um evento estressor inclui o córtex pré-frontal, o córtex visual de associação, hipocampo, giro cingulado, amígdala e núcleo accumbens. O que confirma o que foi apresentado pelo estudo acima.

Mascaro (2012) ressalta, em seus estudos, as principais áreas encefálicas onde ocorrem a hiper ou hipoatividade elétrica, sendo alvo do treinamento neurológico, com destaque para o córtex pré-frontal dorsolateral, a área motora, e todo o lobo frontal bilateral. Os estudos apresentados corroboram com essa afirmação, comprovando que há alterações da atividade elétrica nessas regiões, o que, consequentemente, associando-se as funções de cada região com os sintomas de cada tipo de transtorno, evidencia que a normalização do registro cerebral contribui para a minimização dos sintomas e, por fim, levando à melhora do quadro patológico do indivíduo. Com isso, supõe-se que, a convergência dos estudos apresentados, acerca da neurobiologia da ansiedade e seus transtornos, contribui para que o neurofeedback, ao trabalhar com as regiões sinalizadas pelo EEG e/ou outras técnicas, apresente eficácia na melhora dos sintomas da ansiedade patológica e transtornos de ansiedade.

 III - Quantidade de Sessões de Neurofeedback como fator de Avaliação de Eficácia

Todos os artigos presentes nesta revisão apresentam, em seus métodos, a quantidade de sessões de neurofeedback em que cada participante do estudo foi submetido. Nesta revisão, pode-se perceber que os estudos de TOC apresentam maior quantidade de sessões, seguida dos de ansiedade patológica, TEPT e TAG. Os dois últimos obtiveram menor valor por ambos terem dois estudos acerca da temática. Vale ressaltar dois estudos desta revisão, onde pode-se inferir se a quantidade de sessões de treinamento é um fator ou não de avaliação de sua eficácia.

O primeiro deles é o estudo de Kluetsch, R., et. al., (2014), que tem como objetivo investigar se uma única sessão de neurofeedback está relacionada com as diferentes oscilações da rede de EEG. Nesse estudo, 21 indivíduos, que sofreram algum tipo de abuso de infância, foram submetidos a apenas uma sessão de neurofeedback, sendo precedida pela leitura da ressonância magnética funcional (fMRI). O estudo traz que o mesmo representou um primeiro passo na elucidação dos possíveis mecanismos neurocomportamentais após as sessões do treinamento, além de apresentar alterações no EEG, apontando a tendência do organismo a manter a homeostase e a compensação cerebral.

O segundo é um estudo longitudinal de Surmeli T., Ertem A., (2011), cujo objetivo foi analisar a evolução clínica dos sintomas de TOC e avaliar a eficácia do neurofeedback. 36 indivíduos resistentes ao uso de medicação foram submetidos a 84 sessões do treinamento neurológico, com duas sessões diárias de 60 minutos e intervalo de 30 minutos entre uma e outra. Os resultados apontam que houve melhora nos valores das escalas de avaliação, onde os indivíduos, considerados severos no início do estudo, foram classificados como limítrofes. Outro ponto observado foi que, por usarem a medicação por mais de um ano, não eram observadas melhoras clínicas significativas e, após as sessões de neurofeedback, já era percebida pelos instrumentos a mudança clínica, sendo mantido esse resultado em boa parte dos participantes, dois anos depois da pesquisa, quando feito contato.

Em contraponto ao estudo anterior, onde foi percebido que o treinamento neurológico possui eficácia maior que o tratamento farmacológico, o estudo desenvolvido por Bhat, P., (2010), feito com 100 pacientes com diagnóstico psiquiátrico e que foram submetidos a 40 sessões de neurofeedback, demonstrou que, a curto prazo, tanto o tratamento medicamentoso como o treinamento são eficazes no tratamento dos sintomas da ansiedade, e supõe que, a longo prazo, o neurofeedback pode apresentar uma melhor eficácia.

Pode-se perceber que, tanto no estudo com apenas 1 sessão de neurofeedback, e outro com 84 sessões, houve melhoras, mesmo sendo mínimas, a nível cerebral, como salientado no primeiro estudo, chegando a melhora no quadro clínico e de diagnóstico, sendo mantido dois anos após o estudo. Já o terceiro artigo apresenta um resultado adverso, o que denota que não há um padrão na quantidade de sessões para verificar se o neurofeedback é eficaz ou não, podendo variar pela metodologia aplicada na pesquisa e o objetivo proposto no estudo.

Os pontos destacados evidenciam a eficácia do neurofeedback no tratamento da ansiedade patológica e os transtornos ansiosos. Pode-se perceber que a maioria dos instrumentos utilizados nos estudos apresentaram índices positivos em seus escores, o que demonstra uma diminuição dos sintomas e, consequentemente, uma boa avaliação do treinamento. Analisando as áreas cerebrais envolvidas, a apresentação de áreas similares nos diferentes estudos demonstra a uniformidade das regiões onde ocorrem alterações da atividade elétrica, o que também evidencia, através dos equipamentos de imageamento cerebral, que há uma normalização dessa atividade, confirmando a eficácia do neurofeedback. Pela média de sessões do treinamento das patologias estudadas, apesar de não haver evidências de que há uma quantidade de sessões onde se pode perceber a diminuição de sintomas, a melhora dos mesmos, ainda que mínimas, demonstra que o neurofeedback produz efeitos positivos.

Sendo assim, o treinamento neurológico por neurofeedback tem o potencial para ser uma opção não-medicamentosa para o tratamento de transtornos psiquiátricos e neurológicos - no caso dessa revisão, voltada para os transtornos de ansiedade. O que pode ser outra opção utilizada por profissionais de saúde, principalmente para indivíduos resistentes à medicação ou aqueles que não podem utilizar o tratamento farmacológico. Porém, vale ressaltar que os estudos na área do neurofeedback, apesar de ser uma tendência, ainda são poucos, principalmente nos países da américa latina, em especial no Brasil, onde não foi achado nenhum estudo. Uma das possíveis dificuldades para que isso ocorra é pelo acesso ao equipamento do neurofeedback, que é oneroso e não é produzido no país, o que torna menos provável a popularização dessa opção de tratamento e, consequentemente, a possibilidade de pesquisas voltadas para a temática.

Outro ponto a ser observado é que, através dos métodos dos estudos dessa revisão, notou-se que há uma variabilidade no uso das técnicas de imageamento cerebral, pré e pós neurofeedback, para avaliar os seus resultados, o que carece de novos estudos para avaliar se essa variação pode trazer alguma modificação nos resultados obtidos pelo neurofeedback e no quadro clínico do indivíduo.

Nos estudos apresentados, alguns fizeram uso de grupo controle como um mecanismo de afirmação da eficácia do treinamento. Porém, por não haver a participação do grupo em todos os estudos, a visualização de uma avaliação geral pode-se tornar mais difícil, além de apresentar possível viés no resultado, o que faz necessário que haja estudos futuros feitos com o intuito de comparar pesquisas apresentadas na literatura que utilizam o grupo controle para avaliar o uso do neurofeedback e confirmar a avaliação apresentada nesta revisão.

 

 REFERÊNCIAS

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Recebido em 16 de Outubro de 2016/ Aceite em 04 de Junho de 2018

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