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Psicologia, Saúde & Doenças

Print version ISSN 1645-0086

Psic., Saúde & Doenças vol.22 no.3 Lisboa Dec. 2021  Epub Dec 31, 2021

https://doi.org/10.15309/21psd220322 

Artigos

Comportamento de risco à saúde do estudante adolescente

Adolescents student health risk behaviors

1Rede Estadual de Ensino do Ceará (SEDUC), Fortaleza, Ceará, Brasil, diogoallenpalacio@gmail.com

2Universidade Regional do Cariri (URCA), Crato, Ceará, Brasil, germanepinto@gmail.com

3Universidade Estadual do Ceará (UECE), Fortaleza, Ceará, Brasil, heraldo.simoes@uece.br

4Prefeitura Municipal de Fortaleza (PMF), Fortaleza, Ceará, Brasil, gabriellima_08@hotmail.com

5Universidade de Trás-Os-Montes e Alto Douro (UTAD), Vila Real, Portugal, aaranha@utad.pt


Resumo

Objetivou-se verificar a prevalência de comportamentos de riscos e proteção à saúde do estudante adolescente. Trata-se de um estudo epidemiológico de corte transversal, com abordagem quantitativa. A pesquisa foi realizada em seis escolas da rede pública estadual de ensino situadas no nordeste brasileiro. A amostra foi de 1.130 alunos (idade média 16,6 anos ± 1,1). O instrumento de coleta de dados utilizado foi um questionário. O estudo teve característica analítica e interpretação quantitativa.As variáveis quantitativas foram expressas em média e desvio padrão. Para as análises da associação foi utilizado o teste qui-quadrado ou teste t de student. Considerou-se significantes p< 0,05. Como resultados, 66,2% dos estudantes já experimentaram algum tipo de bebida alcoólica, o sexo feminino apresentou uma exposição a este comportamento de risco significativamente maior (p<0,05); 21% dos estudantes relataramter utilizado drogas pelo menos uma vez e 21,9% para o uso de maconha; 59,2% dos estudantes relataram ser sexualmente ativos, os estudantes do sexo masculino relataram um início de atividade sexual mais cedo (p<0,001), enquanto o sexo feminino relatou uma quantidade maior de parceiros (p<0,05). Conclui-se, que os valores de prevalência encontrados para o consumo de bebidas alcóolicas e drogas são considerados elevados e comum para os dois sexos. A prevalência encontrada para a atividade sexual desprotegida é preocupante em ambos os sexos.

Palavras-Chave: Saúde; Adolescente; Instituições Acadêmicas

Abstract

The objective was to verify the prevalence of risk behaviors and health protection for adolescent students. This is an epidemiological cross-sectional study, with a quantitative approach. The research was carried out in six state public schools located in northeastern Brazil. The sample consisted of 1,130 students (mean age 16.6 years ± 1.1). The data collection instrument used was an objective questionnaire. The study had analytical characteristics and quantitative interpretation. Quantitative variables were expressed as mean and standard deviation. For the analysis of the association, the chi-square test or the student's t test was used. P<0.05 was considered significant. As a result, 66.2% of the students have already tried some type of alcoholic beverage, the female gender was significantly more exposed to this risky behavior (p<0.05); 21% of students reported having used drugs at least once and 21.9% for using marijuana; 59.2% of students reported being sexually active, male students reported an earlier onset of sexual activity (p<0.001), while females reported a greater number of partners (p<0.05). In conclusion, the prevalence values found for the consumption of alcoholic beverages and drugs are considered high and common for both sexes. The prevalence found for unprotected sexual activity is worrying in both sexes.

Keywords: Health; Adolescent; Schools

O debate sobre qualidade de vida e seus múltiplos influenciadores, constitui uma temática relevante para o trabalho interdisciplinar na escola. A adolescência é uma fase marcada pela passagem da infância para a vida adulta, quando comumente ocorrem transformações psicossociais, que facilitam a exposição a comportamentos de riscos à saúde, demonstrando a o papel fundamental da escola na orientação para a prevenção destes comportamentos (Zappe et al., 2018).

Entre as características dos adolescentes, destaca-se o desejo intrínseco de se expor a novas experiências, testando seus limites ou transgredi-los, construindo um espaço de afirmação e conquista. Neste contexto, é importante compreender a prática comportamental durante a transição do início ao fim da adolescência. Como comportamentos saudáveis são um fator determinante para a saúde, mudanças positivas podem impactar sobre os desfechos gerais da saúde (Moura et al., 2018).

A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) foi realizada em escolas públicas e privadas de diversas cidades do país (Brasil), com finalidade de obter informações sobre os alunos que estavam cursando do sétimo ano do Ensino Fundamental ao terceiro ano do Ensino Médio. De acordo com a pesquisa 86% dos jovens não trabalham, 27,5% são ativos sexualmente, 18,4% e 55,5% dos estudantes já experimentaram cigarros e álcool respectivamente. A pesquisa mostrou um cenário alarmante e necessidade de atenção e assistência à saúde do escolar (Brasil, 2015).

Para melhor análise das condições que oferecem riscos à saúde do adolescente, torna-se necessário um diagnóstico para a devida compreensão do quadro atual em relação a este público específico. Para tanto, uma das alternativas para a consecução desse diagnóstico, está na constante observação das intervenções e na supervisão atenciosa para os estados de saúde do aluno adolescente (Souza & Pereira, 2018).

Compreende-se que todas as mudanças de origem econômica, social e política impactam, necessariamente, nas formas de cuidado com a saúde de uma sociedade. Considerando as particularidades culturais e a profunda heterogeneidade dos povos, observamos que os níveis de saúde também dependem dessas circunstâncias geográficas, políticas e culturais. Toda essa análise aponta para o contexto escolar demandando uma preocupação mais acurada para as questões de saúde (Maia et al., 2017).

Pesquisas centradas neste objeto de estudo, vigilância em saúde na escola, contribuem para oentendimento sobre a situação de saúde dos adolescentes no Brasil. O conhecimento sobre esta questão potencializa as práticas de cuidado com desdobramentos que impactam diretamente na qualidade de vida do escolar. O presente estudo teve como objetivo verificar a prevalência de comportamentos de riscos e proteção à saúde de estudantes adolescentes do nordeste brasileiro, mais especificamente em Fortaleza, capital do Ceará.

Método

Realizou-se um estudo epidemiológico de corte transversal, com abordagem metodológica quantitativa. A pesquisa foi desenvolvida em escolas da rede pública estadual de ensino situadas no município de Fortaleza, Ceará, Brasil. Com base nas regionais em que se divide o município de realização da pesquisa e nos indicadores apresentados pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), foram selecionadas seis escolas como cenário para a coleta de dados. A população da pesquisa, compreende o somatório dos estudantes matriculados nas escolas selecionadas como cenário do estudo resultando em um total de 3.721 estudantes.

Participantes

Ao tratar-se aqui de um estudo com delineamento transversal foi realizado o cálculo amostral utilizando-se a equação: n= P x Q / (E/1,96)2, em que n é o tamanho mínimo da amostra necessária; Pé a prevalência; Q= 100 - P; e E é a margem de erro amostral tolerado. Sendo assim, com um erro padrão de 5%, intervalo de confiança de 95% e P de 50%, chegou-se ao valor de 349, que equivale ao mínimo de estudantes necessários para a composição da amostra. No presente estudo obteve-se uma amostra final expressiva de 1.130 alunos. Considerando a população e a amostra do presente estudo, para um grau de confiança de 95% temos uma margem de erro de 2%.

A amostra foi selecionada de forma aleatória, com um conglomerado (escola) estratificado por sexo e faixa etária de idade de 14 a 18 anos (idade média 16,6 anos ± 1,1). Os critérios de inclusão adotados foram: estar regularmente matriculado, frequentando a escola e não apresentar dificuldade motora, física ou mental, que impossibilite a leitura e preenchimento do instrumento do estudo.

O Quadro 1 a seguir detalha o perfil da amostra em relação aos seguintes aspectos: idade, sexo, nível de escolaridade, atividade profissional e renda familiar.

Quadro 1 Perfil e características sociodemográficas dos participantes. 

Nota: Valores expressos em n(%). *Teste qui-quadrado. **Teste t de student. ***Valores expressos em média e desvio padrão. Em negrito, considerou-se significante p<0,05 e altamente significativo para p<0,001.

Os valores mostram uma distribuição semelhante entre os sexos masculino e feminino sobre o nível de escolaridade. Os alunos do sexo masculino possuem um perfil trabalhador significativamente maior (p<0,05). Estes também possuem mais conhecimento sobre a renda de sua família (p<0,001). A renda familiar dos estudantes do sexo masculino é significativamente maior (p<0,001) em relação ao sexo feminino.

Procedimentos

Optou-se no presente estudo pela utilização de um questionário auto-administrado de caráter objetivo, perguntas de múltipla escolha e de sim/não. O instrumento foi desenvolvido a partir da adaptação do questionário “Global school-based student health survey (GSHS)” traduzido para a língua portuguesa (World Health Organization et al., 2013). Sobre a expectativa de alcançar o maior quantitativo de amostra e potencializar a heterogeneidade dela, o pesquisador realizou uma visita em cada turno de funcionamento das seis escolas selecionadas, totalizando 18 visitas ao final do processo de coleta de dados.

Os estudantes foram abordados em sala de aula, onde em consonância com o professor responsável na instância de aplicação do instrumento, tiveram um tempo hábil de 50 minutos/1 hora-aula para responder as questões. Antes de entregar o questionário, o pesquisador esclareceu aos alunos qual a finalidade do estudo e como deve-se desenvolver o preenchimento do questionário.

Para a análise utilizou-se o pacote estatístico Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 23. As variáveis quantitativas foram expressas em média e desvio padrão. Para as análises de associação foi utilizado o teste qui-quadrado ou teste t de student. Considerou-se significantes p<0,05 e altamente significativas p<0,001. O sexo dos participantes foi organizado como variável independente e os aspectos: Iniciação ao consumo de bebidas alcoólicas, drogas e atividade sexual; Quantidade e frequência de consumo de bebidas alcoólicas, drogas e atividade sexual; Acessibilidade e problemas associados ao consumo de bebidas alcóolicas e drogas; Proteção sobre a atividade sexual, foi organizado como variáveis dependentes.

Este estudocumpriu todos os preceitos éticos da pesquisa envolvendo seres humanos. Os estudantes foram convidados a participar voluntariamente. A pesquisa envolve riscos de natureza não física, podendo ter causado constrangimento e/ou desconforto gerado pela observação, que foram minimizados com o anonimato e a possibilidade de desistência a qualquer momento da aplicação. Os riscos se justificam com os benefícios que esta pesquisa pode trazer para melhorias na qualidade de vida do estudante adolescente. O estudo teve aprovação do Comité de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Inta - UNINTA, parecer Nº 3.706.537.

Resultados

Os resultados a seguir descrevem comportamentos de riscos à saúde do escolar. Entre as condutas analisadas destacamos: consumo de bebidas alcoólicas, drogas, tabaco e atividade sexual.

Como mostra o Quadro 2, 33,8% dos estudantes relatam nunca ter consumido bebidas alcoólicas, enquanto 66,2% já experimentaram, com uma forte relação (p< 0,05) entre os gêneros. O sexo feminino apresentou um padrão de iniciação ao consumo de álcool significativamente maior (p< 0,05) quando comparadas aos jovens do sexo masculino. O pico na iniciação ao consumo de bebidas alcoólicas foi identificado na faixa etária de 14 a 15 anos para ambos os sexos.

Ao se observar o consumo de álcool nos últimos 30 dias, histórico de intoxicação e problemas relacionados ao álcool, não se identificou diferenças significativas entre os sexos (p > 0,05). Utilizando a soma ou percentual acumulativo, temos que 31,2% dos jovens relataram ter consumido algum tipo de bebida alcoólica no último mês.

Como é apresentado no Quadro 3, 21% dos estudantes relataram já ter utilizado drogas. Percebe-se que o pico no padrão de inicialização ao consumo de drogas entre os escolares ocorre na faixa etária de 14 a 15 anos, corroborando com a descrição sobre os relatos de consumo de bebidas alcoólicas. Os relatos de consumo de maconha (21,9%) são semelhantes ao de drogas. A prevalência dos relatos de utilização da maconha é menor (11,5%) quando se considera apenas os últimos 30 dias. Houve poucos relatos de utilização das anfetaminas e metanfetaminas. Não se identificou diferenças significativas (p> 0,05) entre os sexos para as questões relacionadas a utilização de drogas.

Quadro 2 Comparações dos fatores individuais sobre o consumo de álcool entre os adolescentes com o sexo. 

Notas: Valores expressos em n(%). *Teste qui-quadrado. Em negrito, considerou-se significante p<0,05.

Quadro 3 Comparações dos fatores individuais sobre o uso de drogas entre os adolescentes com o sexo. 

Notas: Valores expressos em n(%). *Teste qui-quadrado. Considerou-se significante p<0,05.

Como apresentado no quadro 4, a maior parcela dos estudantes (59,2%) relata já ter relações sexuais, enquanto 40,8% relatam que nunca tiveram. Os jovens do sexo masculino relataram iniciar a atividade sexual mais cedo,13 anos ou menos, em relação ao sexo feminino (p<0,001). Enquanto na faixa etária 14 anos ou mais, o sexo feminino relatou iniciação a prática sexual significativamente maior (p<0,001). O sexo masculino relatou ter atividade sexual (quantitativo de pessoas), significativamente maior em relação ao sexo feminino (p<0,05). 26,9% dos estudantes relatam não utilizar camisinha e 33,3 % não utiliza ou não sabe (parceiro) se usa algum outro método de controle de natalidade, sendo este aspecto de risco mais comum ao sexo feminino (p<0,001).

Discussão

O uso de bebidas alcoólicas tem sido considerado o principal fator de risco para a carga atribuível a doenças entre os adolescentes. Leung et al. (2019) estimou em sua pesquisa as diferenças entre os sexos na prevalência do consumo de álcool por adolescentes em países de baixa e média renda. Com 271.156 estudantes de 13 a 17 anos, os alunos do sexo masculino apresentaram maiores chances de uso de álcool (OR = 2,38 [1,91-2,96]), histórico de intoxicação (OR = 2,64 [2,11-3,31]) e problemas relacionados ao consumo de álcool (OR = 1,72 [1,41-2,10]) quando comparados ao sexo feminino. O estudo acrescenta que o aumento no poder econômico e as melhorias na igualdade entre os sexos nas sociedades devem aumentar a prevalência futura sobre o consumo de álcool pelo sexo feminino.

Quadro 4 Comparações dos fatores individuais sobre atividade sexual entre os adolescentes com o sexo. 

Notas: Valores expressos em n(%). *Teste qui-quadrado. Em negrito, considerou-se significativo p<0,05 e altamente significativo p<0,001.

Para Pengpid & Peltzer (2019) as normas socioculturais em relação a população masculina e feminina podem ter mudado no sentido de se dedicarem de forma semelhante ao uso e absentismo de álcool. Em sua pesquisa com 2.540 estudantes das ilhas Seychelles na África com idade média de 14 anos, os dados indicam que 47,6% estavam bebendo álcool no mês passado, 42,6% relataram embriaguez ao longo da vida, 23,1% relataram beber em excesso e 15,7% relataram problemas pelo consumo de álcool. Os correlatos de consumo aplicam-se para ambos os sexos.

Em consonância, os estudos tratama ingestão de bebidas alcóolicas como uma realidade nos hábitos de vida do jovem escolar. Nesta fase de desenvolvimento, o adolescente pode ser particularmente susceptível a influências sociais, principalmente pelo sentimento de autonomia inerente a este período de maturação social e biológica, reforçando-se a importância da família, da escola e dos grupos de pares, onde, dependendo do contexto social, pode-se favorecer a adesão sobre condutas de proteção ou agravos a saúde (Riva et al., 2018).

O estudo de Vieira et al. (2019) aplicado com 753 estudantes de escolas públicas estaduais de Sergipe, Brasil, indica que a experimentação do álcool está associada de forma significativa aos alunos que já haviam tido reprovação escolar (43,3%, IC 95=1,37-1,67, p=0,049).

O ambiente escolar possui um fator de impacto sobre o contexto que tangencia o consumo de álcool entre os adolescentes. Existem variáveis que circundam e disparam a motivação do estudante para o consumo de bebidas alcoólicas, como a busca por experiências e sensações, pertencendo a comunidade escolar a responsabilidade social de desempenhar ações protetoras para o uso arriscado/excessivo de álcool. Essa prerrogativa se fundamenta na necessidade de melhorias no rendimento acadêmico e qualidade de vida dos discentes em formação (Lau et al., 2019).

Obradors-Rial et al., (2020) realizou um estudo de desenho transversal com 1.268 adolescentes (idade 15 a 17 anos) em Catalunha - Espanha, sobre os principais fatores de riscos a nível contextual associados ao consumo de álcool. Entre os aspectos analisados (empregabilidade, centros esportivos, boates e bares), a taxa de utilização dos centros esportivos é descrita como o principal fator indireto de proteção, sendo a única variável estatisticamente significativa (p< 0,005) relacionada com o consumo de bebidas alcoólicas pelos adolescentes. As taxas de desemprego e o número de bares e boates perderam seu significado após o ajuste pelas variáveis ​​individuais e mediadoras. Sugere-se ainda no estudo, que os centros esportivos conferem uma opção de lazer organizada, onde se oferece a prática esportiva considerada um fator de proteção direto na saúde do escolar.

O setor educacional, destaca-se por sua capilaridade e abrangência como um aliado importante nas ações de promoção de saúde. Sobre esta ótica, é fundamental que os docentes tenham princípios congruentes com as políticas escolares e departamentais, para a construção e consolidação por meio das práticas de educação em saúde, de uma nova cultura comportamental no âmbito escolar, onde se valoriza comportamentos favoráveis a condição de saúde (Araújo et al., 2020).

De acordo com os critérios médico-psicológico, educacional, social e cultural, o consumo de drogas ilícitas entre os adolescentes foi definido como uma das exibições mais típicas de comportamento desviante, assim como o de bebidas alcoólicas. As estatísticas por idade, tem confirmado que a delinquência juvenil assume formas de crimes contra a propriedade e a vida humana. Os desdobramentos sociais do contato do jovem escolar com as drogas não podem ser quantificados, implicando em prejuízos individuais e coletivos (Bartosh et al., 2020). Assim, entende-se a condição apresentada no Quadro 3 como alarmante, um problema social, que na ausência de intervenções expressivas abre-se margem de piora subsequente.

Freitas & Souza (2020), realizaram um estudo epidemiológico de corte transversal, com estudantes de idade média entre 10 e 19 anos no município de Cuiabá, Mato Grosso, Brasil, e encontrou uma prevalência de uso de drogas ilícitas de 23,5% (IC95% 20,8; 26,4) entre os escolares. Na pesquisa de Mehanović et al. (2020), de característica epidemiológica transversal com 4.078 adolescentes (idade média 14,7 anos) de 32 escolas de seis zonas geopolíticas da Nigéria, encontrou-se uma prevalência no uso de drogas de 12%. Salienta-se ainda no estudo que a percepção de baixo risco esteve associada ao uso de drogas por adolescentes. Os resultados recém apresentados se assemelham ao do presente estudo, reiterando a vigência e a carga do problema sobre a saúde da comunidade aqui referida.

O ambiente escolar, familiar e de pares, formam a base das principais áreas de funcionamento das atividades (tempo de ocupação) do adolescente (Jedynak & Motyka, 2020). É sobre este contexto que os jovens moldam suas atitudes e assimilam padrões de comportamento observados dentro destes ambientes de socialização, os adotando ou rejeitando. Assim, a escola assume um papel importante no processo de amadurecimento do jovem escolar, ao fornecer o conhecimento e ensinar sobre interações sociais.

Os estudantes vivenciam na escola experiências bivalentes, tanto sentimentos agradáveis como tensões desagradáveis. Estes, partem principalmente das relações interpessoais ali estabelecidas juntamente com as avaliações realizadas ao longo do processo educacional que também podem ser estressantes (Pascoe et al., 2020). Os primeiros contatos do adolescente com as drogas ilícitas parece ser um fenômeno observado frequentemente em ambientes de pares e famílias. Contudo, ao se considerar a quantidade substancial de tempo dedicado as atividades educacionais no âmbito escolar, pode ser percebido quais os possíveis determinantes motivacionais, ou seja, instâncias de conforto e desconforto emocionais, associados ao uso de drogas (Soares et al., 2019).

Jedynak & Motyka (2020) realizaram um estudo em Podkarpackie, na Polônia, com 2.500 alunos de 27 escolas. A análise dos dados mostrou existência de relações interessantes entre as atividades escolares dos adolescentes e o envolvimento em comportamentos de riscos: o risco sobre o consumo de drogas aumenta com o avançar da idade; os alunos com melhor rendimento acadêmico possuem menor incidência sobre o uso de drogas; e os estudantes que relatam intenção de permanecer e conferem maior assiduidade escolar possuem menor probabilidade de utilizar drogas.

Essas constatações sobre o padrão de contato e utilização de drogas pelos estudantes podem sustentar iniciativas de prevenção que impliquem na redução dos indicadores de riscos à saúde apresentados no presente estudo.

Como último aspecto analisado, destacamos a atividade sexual dos estudantes, que no início da adolescência podem representar um comportamento de risco, por serem indivíduos imaturos psicologicamente para lidar com relacionamentos. Smith et al. (2020) realizou uma investigação sobre a atividade sexual de adolescentes em 38 países em quatro regiões da OMS, encontrando uma prevalência de relações sexuais de 13,2%. No estudo, se descreve que o comportamento sexual no início da adolescência esteve associado a transtornos mentais e tentativas de suicídio. Além disso, ter tido múltiplos parceiros sexuais também foi considerado um fator de risco para ao aumento nas tentativas de suicídio.

O estudo de Ansari-Thomas et al. (2020), investigou sobre a prevalência de comportamentos e experiências sexuais dos estudantes do ensino médio nos EUA. Participaram do estudo 42.854 estudantes onde, 3,4% dos estudantes se identificaram como asiáticos, 13,8% como negros, 22,1% como hispânicos/latinos, 54,5% como brancos e 6,2% como outras raças. A prevalência geral de jovens que já fizeram sexo ficou na zona de 40,6% - 51,7% e 15,9% - 43,8% para ativos sexualmente.

A pesquisa de Smith et al. (2019), realizada com 84.867 adolescentes de 21 países de baixa e média renda, apresentou que 12,7% da amostra relatou ter tido relações sexuais, e desses adolescentes, 53,1% tiveram múltiplos parceiros sexuais. Entre aqueles que já tiveram relações sexuais, as respectivas razões de chances (IC95%) para ter múltiplos parceiros sexuais foram 1,56 (0,93-2,62), 1,70 (0,92-3,14) e 5,66 (2,97-10,82). Não houve interações significativas por sexo para essas associações.

O comportamento sexual dos jovens escolares provavelmente varia consideravelmente entre as regiões, principalmente devido a diferentes fatores sociais e culturas. No presente estudo, a atividade sexual dos adolescentes teve uma prevalência maior quando comparada as pesquisas recém descritas.

No período da adolescência, em meio a intensas modificações corporais, a sexualidade torna-se um componente central na vida do jovem, envolvendo fatores como orientação sexual, erotismo, prazer, afetividade, prática sexual e reprodução (Lopes et al., 2020). Estes fatores vêm se construindo desde a infância, com influência do ambiente, podendo ter seu significado alterado de acordo com a religião, crenças costumes, normas éticas e morais em que o indivíduo se encontra inserido (Furlanetto et al., 2019).

O adolescente precisa ter conhecimento sobre seu próprio corpo e da sua parceira, além de utilizar métodos contraceptivos, para uma prática sexual saudável e segura. A gravidez indesejada e a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis (DST’s) representam as principais consequências para o risco na atividade sexual prematura (Fuchs et al., 2019). Dessa forma, a prevalência da não utilização de preservativo e demais métodos contraceptivos descritos no presente estudo, torna-se um fator de risco preocupante.

Diante do exposto, fica evidente a necessidade de informação e educação sexual para o adolescente, sendo o espaço escolar uma fonte segura para este serviço a saúde do escolar. A escola deve representar para o estudante um local para sanar suas dúvidas, com informações de qualidade, assim, quando uma pessoa detém conhecimento sobre sua sexualidade, considera-se esta conscientizada sobre os cuidados a sua própria saúde.

Haja vista a relevância das informações descritas, salientamos o período escolar como essencial para se trabalhar as práticas de promoção da saúde. Estratégias voltadas a prevenção de doenças e ao fortalecimento de fatores de proteção, contribui para que o adolescente se incorpore ao âmbito pessoal e coletivo, conscientizando este sobre os riscos relacionados a fatores comportamentais (dos Santos et al., 2019).

Conclui-se, que os participantes apresentam comportamentos que os tornam vulneráveis a danos a sua própria saúde. Os valores de prevalência encontrados para o consumo de bebidas alcóolicas e drogas são considerados elevados e comum para os dois sexos. A maior parcela (59,2%) dos estudantes são considerados ativos sexualmente, com o sexo masculino iniciando sua atividade sexual mais cedo (13 anos ou menos) e com maior número de parceiros. A prevalência encontrada para a atividade sexual desprotegida é preocupante em ambos os sexos.

Os achados aqui descritos fundamentam as demandas sociais, que devem ter constância nos processos de ensino e aprendizagem no âmbito escolar. Salienta-se ainda, que estes temas devem ser incluídos no currículo escolar, de forma sistêmica, organizada, compatível com a fase social da vida (idade) do escolar.As associações entre os padrões de comportamentos de riscos com a idade e sexo dos estudantes podem favorecer esta adequação, potencializando as práticas educativas.

Referências

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Recebido: 09 de Maio de 2021; Aceito: 11 de Outubro de 2021

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