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A Estratégia Saúde da Família (ESF) é caracterizada como modelo de assistência reorganizado, a qual funciona como ordenadora do serviço, de modo a sistematizar a assistência prestada na Atenção Primária à Saúde (APS). Para isso, tal seguimento é composto por uma equipe multiprofissional, que atua na produção do cuidado e saúde da população (Malta et al., 2016). Assim, diversas práticas assistenciais de proteção e promoção de saúde são implementadas, tendo em vista a pluralidade das necessidades individuais e coletivas dos usuários. Desse modo, profissionais e comunidade criam laços de aproximação/afeto, sendo esta uma ferramenta imprescindível para a qualificação do cuidado e para o estímulo de hábitos saudáveis de vida (Milanez et al., 2018).
Essa produção ocorre por meio do contato entre seres, não somente humanos, mas de vivências, saberes e falas; e dessas interações surge o afeto, compreendido como dispositivo hábil na produção do cuidado em saúde, indo muito além da perspectiva assistencial, formal e/ou institucional, sendo esta elaboração subjetiva que se desenvolve por meio do território afetivo, cujo o local pode ser a ESF (Silva et al., 2015). Segundo Figueira et al. (2020), estes mecanismos são conhecidos como tecnologias leves, as quais são caracterizadas e desenvolvidas no processo de trabalho propriamente dito, onde se apresentam as relações de interações estabelecidas, permitindo, assim, a produção de acolhimento, vínculo, corresponsabilização e autonomia. Estas ferramentas são essenciais para aprimorar a assistência à saúde nesse nível de atenção e para a efetivação das ações de cuidado.
Quando relacionada a assistência pré-natal, tais tecnologias são aplicadas como instrumentos do processo de promoção da saúde. Desse modo, elementos com menor grau de complexidade são evidenciados como ferramentas facilitadoras no desenvolvimento e efetivação da atenção pré-natal, trazendo repercussões positivas para o trinômio mãe-filho-família (Fogaça et al., 2017).
O presente estudo parte do pressuposto da importância do uso de dispositivos de produção de afeto/tecnologias leves na assistência pré-natal exercidas entre equipe e usuários na produção de cuidado, apresentando-se de forma relevante no intuito de resgatar experiências exitosas, de modo a auxiliar os profissionais da ESF a aprimorar os processos de cuidado.
Desse modo, o objetivo deste estudo é mapear a produção científica sobre tecnologias utilizadas na assistência pré-natal que favorecem a autonomia, corresponsabilização, vínculo e a produção de afeto entre profissionais e usuários da ESF.
Método
Tipo de estudo
Trata-se de um estudo bibliográfico de abordagem qualitativa do tipo revisão integrativa da literatura. Segundo Souza et al. (2010), tal método proporciona maior abordagem metodológica relacionada às revisões, o que permite o entendimento dos fenômenos pesquisados, bem como a incorporação da aplicabilidade de resultados de estudos importantes na prática.
Para a elaboração desta pesquisa foram obedecidas as seguintes etapas: estabelecimento dos objetivos da revisão; elaboração da pergunta norteadora, critérios de inclusão e exclusão dos artigos; busca dos estudos na literatura; definição das informações extraídas dos estudos selecionados; avaliação crítica dos achados; discussão dos resultados e apresentação da revisão integrativa (Mendes et al., 2008).
Questão norteadora
Inicialmente, a questão norteadora foi efetivada através da utilização da estratégia PVO (acrônimo de population/população, variables/variáveis, outcomes/desfecho), no qual o primeiro elemento (P) consiste nos profissionais e usuários da ESF; o segundo elemento (V) representa as tecnologias utilizadas na assistência pré-natal que favorecem a autonomia, corresponsabilização, vínculo e produção de afeto; e para o encerramento e terceiro elemento (O) destina-se a pesquisar de que forma as tecnologias utilizadas na assistência pré-natal que favorecem a autonomia, corresponsabilização, vínculo e a produção de afeto entre profissionais e usuários da ESF. A sintaxe de aplicação desta estratégia está descrita no Quadro 1.
Quadro 1 Aplicação da estratégia PVO.
| Etapa | Definição | Descrição | Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) | Medical Subject Headings (MeSH) |
| P | População | Profissionais e usuários da ESF | (Estratégia Saúde da Família) OR (Atenção Primária à Saúde) | (Family Health) OR (Primary Health Care) |
| V | Variáveis | Tecnologias utilizadas na assistência pré-natal que favorecem a autonomia, corresponsabilização, vínculo e produção de afeto | (Tecnologias Leves) OR (Acolhimento) OR (Vínculo) OR (Participação da Comunidade) OR (Autonomia) | (Soft Technologies) OR (Comprehensive Healthcare) OR (Emotional Bond) OR (Community Participation) OR (Personal Autonomy) |
| O | Desfecho | De que forma as tecnologias utilizadas na assistência pré-natal que favorecem a autonomia, corresponsabilização, vínculo e a produção de afeto entre profissionais e usuários da ESF. | (Assistência Pré-Natal) | (Prenatal Care) |
Portanto, partindo dessa perspectiva, a questão determinada para a pesquisa foi: Quais as tecnologias utilizadas na assistência pré-natal que favorecem a autonomia, corresponsabilização, vínculo e produção de afeto entre profissionais e usuários da ESF?
Coleta de dados
A busca dos artigos foi realizada entre os meses de Janeiro e Fevereiro de 2021 nas seguintes bases de dados: Scientific Eletronic Library Online (SCIELO), Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), U.S. National Library of Medicine and the National Institutes Health (PubMed), ScienceDirect e Cochrane.
Utilizaram-se os seguintes descritores, obtidos nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e suas respectivas combinações na língua inglesa, extraídos na Medical Subject Headings (MeSH): Estratégia Saúde da Família (Family Health), Atenção Primária à Saúde (Primary Health Care), Tecnologias Leves (Soft Technologies), Acolhimento (Comprehensive Healthcare), Vínculo (Emotional Bond), Participação da Comunidade (Community Participation), Autonomia (Personal Autonomy), Assistência Pré-Natal (Prenatal Care). Na busca avançada, foram aplicados os operadores booleanos AND e OR, sendo esta uma ferramenta utilizada para ampliar e operacionalizar a busca. A chave de busca de cada base está descrita no Quadro 2.
Quadro 2 Aplicação das estratégias de busca nas bases de dados.
| Bases de Dados | SCIELO | LILACS | PubMed | ScienceDirect | Cochrane |
| Estratégia de busca 1 | (Estratégia Saúde da Família) OR (Atenção Primária à Saúde) AND (Tecnologias Leves) AND (Assistência Pré-Natal) | (Estratégia Saúde da Família) OR (Atenção Primária à Saúde) AND (Tecnologias Leves) AND (Assistência Pré-Natal) | ((Family Health) OR (Primary Health Care)) AND (Soft Technologies)) AND (Prenatal Care) | ((Family Health) OR (Primary Health Care)) AND (Soft Technologies)) AND (Prenatal Care) | “family health” OR “primary health care” AND “soft technologies” AND “prenatal care” |
| P1 | 2 | 1 | 6 | 2.104 | 897 |
| Estratégia de busca 2 | (Estratégia Saúde da Família) OR (Atenção Primária à Saúde) AND (Tecnologias Leves) OR (Acolhimento) OR (Vínculo) OR (Participação da Comunidade) OR (Autonomia) AND (Assistência Pré-Natal) | (Estratégia Saúde da Família) OR (Atenção Primária à Saúde) AND (Tecnologias Leves) OR (Acolhimento) OR (Vínculo) OR (Participação da Comunidade) OR (Autonomia) AND (Assistência Pré-Natal) | ((Family Health) OR (Primary Health Care)) AND (Soft Technologies)) OR (Comprehensive Healthcare)) OR (Emotional Bond)) OR (Community Participation)) OR (Personal Autonomy)) AND (Prenatal Care) | ((Family Health) OR (Primary Health Care)) AND (Soft Technologies)) OR (Comprehensive Healthcare)) OR (Emotional Bond)) OR (Community Participation)) OR (Personal Autonomy)) AND (Prenatal Care) | “family health” OR “primary health care” AND “soft technologies” OR “comprehensive healthcare” OR “emotional bond” OR “community participation” OR “personal autonomy” AND “prenatal care” |
| P2 | 0 | 7 | 4.251 | 15.551 | 0 |
| Total de Artigos | 2 | 8 | 4.257 | 17.655 | 897 |
Nota. P1 - Quantidade parcial de artigos encontrados após a aplicação da Estratégia de busca 1; P2 - Quantidade parcial de artigos encontrados após a aplicação da Estratégia de busca 2.
Com o objetivo de reduzir prováveis erros ou vieses de fiscalização dos estudos, a seleção foi desenvolvida por dois revisores independentes em duas etapas. Na primeira, realizou -se a leitura de título e resumo e, na segunda, fez-se a leitura completa dos artigos. Nos casos onde houve discordân cia, ocorreu a discussão entre os dois revisores para se chegar a um consenso.
Seleção e Análise dos Artigos
Os critérios de inclusão foram: texto completos disponíveis, idiomas português, inglês e espanhol. Em contrapartida, excluiu-se aqueles não pertinentes à temática objetivada, estudos repetidos, bem como dissertações, teses, livros e capítulos de livros. Tais parâmetros foram estabelecidos como forma de encontrar estudos com maior nível evidência e, consequentemente, trazer qualidade ao artigo desenvolvido.
Em relação à definição do nível de evidência dos estudos, utilizou-se a seguinte classificação: nível I (trabalhos oriundos de revisões sistemáticas ou meta-análise de ensaios clínicos); nível II (estudos derivados de no mínimo um ensaio clínico randomizado controlado bem delineado); nível III (ensaios clínicos sem randomização); nível IV (estudos de coorte e de caso-controle); nível V (revisão sistemática de estudos descritivos e qualitativos); nível VI (referências derivadas de um único estudo descritivo ou qualitativo); e nível VII (opinião de autoridades ou relatório de comitês de especialistas). Segundo tal classificação os níveis I e II são consideradas as evidências mais fortes; níveis III e V como moderadas e os níveis VI e VII são tidas como evidências fracas.
Resultados
A partir das estratégias de busca realizadas para a pesquisa, foram encontradas um total de dois artigos na SCIELO, oito artigos na LILACS, 4.257 na PubMed, 17.655 na ScienceDirect e 897 na Cochrane. Do total de 22.819, realizou-se leitura criteriosa dos títulos e resumos de todas as publicações localizadas pelas estratégias de busca e seleção, após confrontadas com os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos, onde foram selecionados 24 artigos; em seguida foi realizada a leitura completa de cada material, e foram excluídos 13 artigos, dez por não abordarem as tecnologias utilizadas na assistência pré-natal que favorecem a autonomia, corresponsabilização, vínculo e produção de afeto propostas por este artigo e três por corresponderem a materiais advindo de livros/capítulos de livro, restando 11 produções científicas que serviram como fonte de dados para esta pesquisa.
Para sistematizar a busca e seleção dos artigos (Figura 1) utilizou-se a recomendação do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and MetaAnalyses (PRISMA) (Moher et al., 2009). Os artigos incluídos foram 11, sendo apresentadas as principais informações dos estudos selecionados, no Quadro 3.
Figura 1 Fluxograma de seleção dos estudos segundo o Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA).
Quadro 3 Síntese dos estudos incluídos.
| Autores, Ano | Objetivo | Desenho de pesquisa | Principais resultados | NE |
|---|---|---|---|---|
| García et al., 2008 | Investigar se a oferta de teste de triagem pré-natal impede as mulheres de fazerem escolhas autônomas | Estudo exploratório de abordagem qualitativa sobre um ensaio de controle randomizado | A oferta da triagem pré-natal foi vista como positiva e as participantes mencionaram estar satisfeitas com suas decisões a partir dessa ação, entretanto, relataram influências de apoio durante a tomada de decisão, seja por parte do parceiro, parteira, obstetra, sociedade e/ou outras pessoas próximas, e ainda assim conseguiram seguir suas escolhas de forma livre. Assim, sugere-se que essa oferta seja feita em tempo hábil para dar às mulheres a oportunidade de refletir de maneira autônoma sobre seus reais desejos. | VI |
| Massey et al., 2006 | Apresentar o CenteringPregnancy e mostrar evidências para evidencia-lo como um modelo de cuidado pré-natal centrado no relacionamento | Estudo descritivo, bibliográfico | O modelo apresentado foi exitoso ao fornecer atendimento pré-natal em grupo, o qual se mostra mais eficaz e eficiente do que o método tradicional de assistência individualizada dos consultórios, haja visto que promove uma atmosfera que diminui as barreiras entre profissionais e usuárias, estimula a autonomia e empoderamento da mulher, valorizando seus conhecimentos e experiências prévias, o que aumenta sua confiança para tomada de decisões e melhora os resultados perinatais. | VI |
| Albuja et al., 2019 | Testar a criação de um ambiente de cuidado amigo do pai e os efeitos dessas ações no envolvimento paterno no pré-natal | Método de intervenção por meio de três ensaios clínicos randomizados | As ações realizadas no intuito de inserir os pais durante o período de pré-natal, resultaram no maior envolvimento da figura paterna no cuidado pré-natal gerando benefícios para a saúde tanto das mães quanto dos filhos. | II |
| Amorim e Backes, 2020 | Compreender o significado da gestão do cuidado de enfermagem a puérperas e recém-nascidos na Atenção Primária à Saúde | Estudo exploratório qualitativo | A gestão do cuidado na Atenção Primária à Saúde, aponta a liderança de enfermeiros frente aos desafios no cenário de cuidados, induzindo ações e interações para garantir a autonomia e a qualidade dos cuidados, além do empoderamento ma terno/paterno a partir do pré-natal. | VI |
| Raznievski et al., 2020 | Identificar as percepções de enfermeiras da Atenção Básica sobre as boas práticas de assistência ao parto e nascimento na perspectiva das Práticas Baseadas em Evidências | Estudo descritivo, exploratório, qualitativo | O pré-natal é percebido como momento ideal para orientar as gestantes, gerando a autonomia e empoderamento das mesmas, exercidas por meio da construção e aplicação de protocolos assistenciais que visam à melhoria da qualidade de atendimento ao pré-natal, evidenciado, por exemplo, nas atividades educativas coletiva realizadas com grupos de gestantes. | VI |
| Johnsen et al., 2017 | Avaliar o conhecimento de mulheres sobre os cuidados de suporte à autonomia durante as consultas de cuidados pré-natais entre mulheres grávidas de baixo risco que utilizaram a base eHealth | Estudo de intervenção multicêntrico com um grupo de controle | O uso da ferramenta eHealth evidencia a importância das tecnologias digitais de informações sobre saúde como positivo, uma vez que foi associado a autopercepção significativamente superior nos cuidados de suporte e autonomia das gestantes durante o cuidado pré-natal. | II |
| Venkateswa et al., 2019 | Avaliar a cobertura das triagens e intervenções no cuidado pré-natal em clínicas de saúde pública primária na Cisjordânia, Palestina. | Estudo derivado de dados de prontuários clínicos | A cobertura efetiva das intervenções de cuidado pré-natal foi maior nas clínicas de atenção primária à saúde com disponibilidade de laboratório e ultrassom, sendo estas associadas a maiores chances de realizar a triagem e assistência pré-natal eficaz, oferecendo um maior suporte tanto tecnológico quanto profissional para a produção do cuidado de acordo com as diretrizes nacionais recomendadas. | VI |
| Silva et al., 2014 | Analisar o acesso e o acolhimento no cuidado pré-natal à luz das experiências de 13 gestantes | Estudo qualitativo | A facilidade no acesso e no acolhimento do processo de cuidar pré-natal favorece a relação entre profissional e usuários, evidenciando-se assim a importância do uso das tecnologias leves nas relações intersubjetivas do cuidado. | VI |
| Vedam et al., 2019 | Explorar as preferências das mulheres e experiências de assistência à maternidade, incluindo o papel da mulher na tomada de decisões | Estudo transversal qualitativo | A autonomia das mulheres é significativamente alterada pelo modelo de assistência à maternidade oferecido, a natureza do interações com prestadores de cuidados e capacidade de autodeterminação das mulheres, as quais estas apresentam-se mais satisfeitas a medida com que se tornam a principal tomadora de decisões durante o atendimento. | VI |
| Chen e Cheng, 2020 | Compreender as experiências de decisão das mulheres taiwanesas em relação ao pré-natal, procedimentos de triagem e diagnósticos | Pesquisa qualitativa com desenho fenomenológico hermenêutico | As experiências positivas das mulheres foram derivadas da sua liberdade no processo de tomada de decisão, fruto das ações cuidado realizadas durante o diagnóstico e triagem na consulta pré-natal, permitindo a autonomia e corresponsabilização do cuidado em saúde. | VI |
| Varga et al., 2020 | Incentivar a pesquisa com foco no envolvimento do pai ao longo do cuidado pré-natal | Estudo descritivo, Revisão de literatura | Evidencia-se a importância da inserção e envolvimento dos futuros pais durante a gravidez como elemento-chave da assistência pré-natal de qualidade, maximizando-se desse modo os benefícios para sua própria saúde em além de aumentar os resultados positivos para a saúde da mãe e do bebê. | VI |
Nota. NE - Nível de Evidência
Discussão
Os dispositivos utilizados na produção do cuidado para o desenvolvimento de relações afetivas entre profissionais e usuários da ESF têm implicações positivas na assistência pré-natal. Dentre esses dispositivos, pesquisa realizada no Brasil evidencia que o acolhimento e as ligações intersubjetivas estabelecidas entre profissionais de saúde e usuárias são percebidas como ferramentas que favorecem a presença e a satisfação das gestantes diante da assistência prestada (Silva et al., 2014). Essa a interação e comunicação efetiva entre cuidadores e gestantes assim como a facilidade do acesso aos serviços de saúde têm se mostrado eficazes para o estabelecimento de vínculo e de um relacionamento de confiança entre as gestantes e o serviço que as assistem, visto que estimulam as mulheres a fazerem escolhas autônomas (García et al., 2008).
Desse modo, ressalta-se a importância da autonomia e da corresponsabilização na assistência pré-natal através da necessidade de a mulher ser considerada agente ativa nesse processo, sendo percebido nível de experiências mais exitosas em mulheres que participaram ativamente do processo de tomada de decisão no pré-natal, fazendo escolhas informadas sobre vários procedimentos realizados na triagem pré-natal, com base em seus valores e características individuais, evidenciando-se benefícios no rastreio de problemas genéticos por meio da troca de informações entre profissionais e usuários (Chen & Cheng, 2020). Esses dados corroboram com o estudo realizado por Vedam et al. (2019), o qual constatou que 95,2% das mulheres da sua amostra preferiram ser a figura principal na tomada de decisões durante o atendimento pré-natal. Vale salientar que o processo de tomada de decisões no pré-natal é associado ao perfil social, econômico e demográfico das gestantes e a forma de comunicação estabelecida entre profissionais e usuários.
Nos estudos de Vedam et al. (2019), Chen e Cheng (2020) e García et al. (2008) ressalta-se ainda que para uma maternidade segura é necessário um cuidado centrado no paciente em que o profissional estimula o empoderamento da mulher e apoia suas decisões para a mesma seguir suas perspectivas individuais de maneira livre no cuidado pré-natal. No entanto, elas preferem dividir a responsabilidade de tomar decisões e suas consequências com outras pessoas, sejam eles membros da família, parceiro e pessoas próximas, realizando assim o processo de corresponsabilização do cuidar. Sobre isso, Chaves et al. (2020), relataram em seu estudo acerca da satisfação das gestantes nas consultas pré-natal, das quais houve destaque para propriedades como atenção, carinho, diálogo e confiança em todas as falas registradas.
Esta revisão permitiu identificar ainda algumas tecnologias, utilizadas com êxito no âmbito nacional e internacional, para estimular a autonomia das gestantes durante o ciclo gravídico-puerperal. Dentre elas, a gestão do cuidado é enfatizada por Amorim e Backes (2020) como resultado do olhar ampliado no cuidar, no qual enfatiza-se a liderança dos profissionais diante dos desafios no cenário da assistência ao realizar o acolhi mento focado na singularidade da mulher, de modo a proporcionar o protagonismo e vinculação da mesma com o serviço de saúde, bem como empoderamento da mulher/casal, através do estímulo a participação do genitor.
O envolvimento da figura paterna na assistência pré-natal, é outra ferramenta útil para a produção de cuidado e afeto no campo da ESF, sendo associada a maior capacitação do parceiro para auxiliar a mulher, ficando associado a benefícios para a saúde da mãe e o bebê, entretanto, ainda percebesse que as barreiras culturais, econômicas, afetivas e sociais pré-existentes dificultam esse envolvimento. Dois estudos, apresentados no Quadro 3, indicaram a promoção do vínculo por meio do incentivo a participação do parceiro no cuidado pré-natal. No estudo desenvolvido por Albuja, Sanchez, Lee, Lee e Yadava (2019) diante do incentivo a figura paterna no cuidado pré-natal foi evidenciado maior confiança dos pais, conforto e intenções comportamentais mais saudáveis para aprender sobre a gravidez e se envolver no processo de gestação. Esses dados corroboram com as evidências de Varga et al. (2020) que evidenciam benefícios do apoio do parceiro em contextos de saúde do binómio mãe-filho.
Outra ferramenta utilizada nos estudos que favorecem o vínculo é demonstrada por Raznievski et al. (2020) através do uso de protocolos de boas práticas de assistência ao parto e ao nascimento, sendo associados à melhoria da qualidade de atendimento ao pré-natal, de modo a sistematizar o cuidado com base nas evidências científicas, de modo a atender os princípios legais e éticos da assistência pré-natal, resultando em desfechos maternos e neonatais positivos e causando impacto direto na assistência à saúde. Assim, destaca-se o papel do profissional de atender e estimular uma relação de acolhimento e cuidado completo às gestantes e suas famílias. Esse suporte deve surgir por meio de ações que tenham o objetivo de incluir e ampliar o nível de conhecimento das gestantes sobre os direitos, riscos e possíveis complicações da gravidez (Gomes et al., 2019).
Umas dessas formas de apoio são demonstradas nas atividades educativas coletivas realizadas com grupos de gestantes, apresentada em dois estudos do Quadro 3. No estudo desenvolvido por Massey et al. (2006), foi aplicado o modelo de atendimento pré-natal em grupo chamado de CenteringPregnancy o qual se mostrou mais eficiente quando comparado a assistência individualizada, uma vez que promove uma ambiente livre para a troca de conhecimento, estimulando a autonomia da mulher e valorizando seus saberes prévios, o que melhora o vínculo entre profissional e usuária, como também aumenta sua confiança para tomada de decisões e melhora os resultados perinatais. Sobre isso, Raznievski et al. (2020) relataram a realização dessa prática pela maioria dos profissionais entrevistados e associação da mesma a maior qualificação no pré-natal.
O uso de tecnologias de informação à saúde também se apresentou como positivo ao favorecer os cuidados de suporte e autonomia das gestantes, de acordo com Johnsen et al. (2017), o uso do eHealth foi associado a maior pontuação na percepção geral das consultas e visitas pré-natais por grande parte da população analisada, uma vez que as informações fornecidas na ferramenta possibilitaram a autopercepção significativamente superior nos cuidados de suporte e autonomia das gestantes durante o cuidado pré-natal. Concomitantemente, no estudo de Venkateswaran et al. (2019) a cobertura eficaz das intervenções de cuidado pré-natal são maiores nas clínicas de atenção primária à saúde com suporte tanto tecnológico quanto profissional, sendo estas associadas a maiores chances de realizar a triagem e assistência pré-natal eficaz.
Com isso, é possível inferir que este artigo apresenta contribuições científicas importantes para a área da saúde nos cenários nacionais e internacionais da assistência pré-natal, pois o uso da tecnologia afetiva através das suas diferentes vertentes é umas das principais medidas para a promoção da qualidade do cuidado prestado a mulher no processo de gravidez.
Os resultados deste estudo fornecem ainda subsídios para o fortalecimento e estímulo a corresponsabilização, isto é, o envolvimento das mulheres no cuidado pré-natal refletindo diretamente na melhor adesão a assistência, vínculo, autonomia, confiança, envolvimento e produção do afeto entre profissionais e usuários da ESF, haja visto por meio da leitura exaustiva dos estudos o desconhecimento dos profissionais dos protocolos de gestão do cuidado e das boas práticas de assistência ao parto e nascimento.
As principais limitações desta revisão estão relacionadas principalmente ao nível de evidência dos estudos encontrados, havendo necessidade de mais pesquisas de campo a cerca da temática, com ênfase no desenvolvimento de estudos randomizados, sendo encontrado somente um através da estratégia de busca aplicada nesta revisão.
