SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.8 número1Turbulencias en la década de 1990: el «turnaround» de BungeAspectos políticos y administrativos en la formación y consolidación del Estado nacional Brasileño (1808-1889) índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Indicadores

Links relacionados

  • No hay articulos similaresSimilares en SciELO

Compartir


Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa

versión impresa ISSN 1645-4464

Rev. Portuguesa e Brasileira de Gestão v.8 n.1 Lisboa mar. 2009

 

A crise de 1807/1808: algumas reflexões de estratégia

José Manuel Freire Nogueira*

 

Resumo: A palavra Estratégia tem hoje demasiados significados. Neste artigo, estratégia é empregue no sentido que teve desde os fins do Séc. XIX a meados do Séc. XX – o uso da coacção para obter finalidades políticas – e sublinhada no duplo contexto da sua relação com a Geopolítica – a Geoestratégia – e da transferência da corte portuguesa para o Brasil, numa resposta assimétrica à invasão napoleónica de 1807. As opções políticas e geoestratégicas tomadas por Portugal nos anos precedentes, bem como as condições geoestratégicas que então prevaleciam, tornaram esta resposta simultaneamente inevitável e hábil. Inevitável era também a independência do Brasil, uma consequência que estava, certamente, muito longe das previsões quando a família real portuguesa e todo seu governo iniciaram a travessia do Atlântico em 1807.

Palavras-chave: Estratégia, Geopolítica, Geoestratégia, Assimetria, Poder Continental e Poder Marítimo

 

Title: The 1807/1808 Crisis – A short essay on strategy

Abstract: Strategy is today a word with many meanings. In this text, its original meaning – the employment of coercion to achieve political goals – is highlighted in the double context of its relations with Geopolitics – Geostrategy – and the transfer of Portuguese government to Brazil, as an asymmetric response to the Napoleonic invasion of Portugal in 1807. Political and geopolitical options taken by Portugal during the preceding years as well as prevailing geostrategic conditions made that response simultaneously inevitable, and very effective. Inevitable, was also the independence of Brazil, a consequence far from being forecasted when the Portuguese royal family initiated the crossing of the Atlantic in 1807.

Key words: Strategy, Geopolitics, Geostrategy, Asymmetric, Continental and Maritime Power

 

Título: La crisis de 1807/1808: algunas reflexiones de estrategia

Resumen: La palabra estrategia tiene muchos significados en el día de hoy. En este Artículo, la estrategia se utiliza en el sentido que tenia desde el final del siglo XIX a mediados del siglo XX – el uso de la coacción para lograr objetivos políticos – y subrayó en el doble contexto de su relación con la Geopolítica – la geoestratégica – y el traslado de la corte portuguesa para Brasil, en una respuesta asimétrica a la invasión napoleónica de 1807. Las opciones políticas y geoestratégicas realizadas por Portugal en los años anteriores, así como la geoestratégica y condiciones que prevalecían, hicieran que esta respuesta fuera simultáneamente inevitable y hábil. Fue también inevitable la independencia de Brasil, un resultado que estaba sin duda muy lejos de las predicciones, cuando la familia real Portuguesa y todo su gobierno iniciaran la travesía del Atlántico en 1807.

Palabras clave: Estrategia, Geopolítica, Geoestratégica, Asimetría, Poder Continental y Poder Marítimo

 

 

A palavra estratégia tem vindo a banalizar-se. Se durante séculos esteve associada à «arte» do general(1), alargou-se com o fenómeno da Guerra Total a todos os domínios do conflito e, dessa forma, a todas as actividades do Estado. Daí a generalizar-se a toda a actividade humana foi apenas um pequeno passo. Do conceito original de estratégia, a sua versão jornalística apenas retém a necessidade de planeamento das acções a desenvolver num prazo de tempo muito dilatado. Apesar de tudo, na área empresarial ou política, da pureza original do conceito, além da visão de longo prazo, reteve-se o conceito de duelo de vontades e de ciência do conflito. Uma aproximação razoável.

Mas não é dessa estratégia que trataremos aqui. Clarificando conceitos, a estratégia de que aqui se falará é aquela que pode ser definida como «a forma de desenvolver e utilizar o poder de uma unidade política, a fim de se atingirem objectivos que suscitam, ainda que potencialmente, a hostilidade de uma outra vontade política»(2).

Não é o momento nem o lugar para ministrar um curso elementar de estratégia. Assim, através do texto e de notas de pé de página, tentar-se-á ir clarificando conceitos e expondo o «travejamento» intelectual do linguarejar estratégico. Para isso, que melhor cenário que o Portugal dos fins do Séc. XVIII e princípios do XIX e, em particular, os acontecimentos de 1808, cujo bicentenário comemorámos recentemente?

Para Portugal, o Séc. XIX começou com ventos de guerra. A invasão espanhola de 1801 – um evidente prelúdio do que estava para vir – demonstrou, mais uma vez, a pequeníssima liberdade de acção do Governo de Lisboa no quadro europeu de então.

Espartilhado entre o fantasma da reabsorção por Espanha e os ditames da aliança com a Inglaterra, que lhe permitiam a livre utilização do mar, e, portanto, o acesso às riquezas do Brasil – das quais vivia –, o Reino não escapara, durante o Séc. XVIII, a dois conflitos que eram corolários dessa lógica. De facto, em 1704 e 1762, Portugal fora apanhado na tenaz da antiga luta entre o poder marítimo e o poder continental, claramente representados, nessa época, pelo duelo entre a França e a Inglaterra. Geoestrategicamente, a «placa tectónica» entre os dois poderes passou, então, pela fronteira terrestre portuguesa, sugando Portugal e Espanha para esses conflitos, em lados opostos.

Geopoliticamente, a Revolução Francesa nada alterara, apenas dera mais força e élan ao poder continental, força essa que se começara a multiplicar à medida que o poder em França se ia concentrando nas mãos de Bonaparte – um verdadeiro génio da guerra terrestre.

A Espanha – que dois séculos antes tentara também a hegemonia continental –, perdidos os sonhos hegemónicos, acabara por, numa lógica inversa à de Portugal, se converter numa espécie de «procurador» do poder continental, como se este tipo de poder fosse a sua vocação geopolítica profunda(3). Efectivamente, em todos os conflitos do Séc. XVIII, fora esse o lado escolhido pela Espanha. Com uma única excepção que, no entanto, não durara: em 1793, depois da execução de Luís XVI, a Espanha aderira à primeira coligação que a Europa formara contra a França revolucionária, acabando, no entanto, por assinar a paz dos Pirenéus no ano seguinte. O pequeno corpo expedicionário português – 5600 homens, arregimentados dum Exército onde o número de desertores ascendia a 13 000, numa infantaria que, no papel, contava com 20 000 praças (Latino Coelho, 1885) –, que cooperava com as tropas espanholas, foi, assim, apanhado de surpresa e, de um momento para o outro, ficara em território hostil, já que a Espanha, católica, monárquica e absolutista, não participara, obviamente, a sua decisão de se unir à causa francesa, algo que poderia parecer contra natura.

Além do retorno à normalidade geopolítica na Península, esse acontecimento revelara a profunda debilidade do aparelho militar terrestre de Portugal. Com efeito, a lógica do Brasil, e talvez alguma desconfiança do poder político pela força terrestre, comandada, regra geral, pelos «Grandes do Reino», relegara o Exército para um plano secundário. Ficou célebre a instrução do Ministro da Guerra da «Viradeira»(4) – Ayres de Sá e Melo –, aos governadores das armas «para que as suas tropas consagrassem mais tempo a rezar o terço!».

A Marinha fora, pelo contrário, objecto do maior desvelo. Como salienta Carlos Selvagem (1991), os estaleiros do Arsenal de Lisboa, impulsionados pelo Ministro Martinho de Mello, nunca deixaram de produzir magníficas unidades de combate, e, em 1796, dispúnhamos de 12 naus de guerra, 2 corvetas, 12 bergantins e 6 charruas, num total de 45 navios de alto bordo e de 26 pequenas embarcações.

Foram claramente aquilo que podemos classificar como opções estratégicas: a estratégia total(5), que deu prioridade estrutural aos meios navais na estratégia genética, limitou, à partida, a estratégia operacional possível(6). Ao fazê-lo, talvez inconscientemente, impôs estreitos limites à sua própria acção. O leque de opções do Estado – para o bem ou para o mal – fora fortemente limitado pelas acções ou omissões do último quartel do Séc. XVIII. Tal não tardaria a tornar-se claro.

A Segunda Coligação contra a França, que se iniciara em 1799 enquanto Bonaparte estava no Egipto, correu de início muito mal para a França, mas, com Bonaparte cônsul, a maré não tardou a virar e a paz foi assinada em Amiens em 1802. Esta paz, declarada como um «definitivo Tratado de Paz», acabou por durar pouco, tendo a guerra entre a França e a Inglaterra recomeçado logo em 1803. Em 1805, a Inglaterra conseguiu ampliar a luta e erguer contra a França a Terceira Coligação.

A Napoleão, imperador dos franceses desde 1804, que, dotado da autoridade suprema, concentrara recursos da estratégia genética no levantamento de uma esquadra, pareceu que, finalmente, estariam estabelecidas as condições para vencer militarmente a Grã-Bretanha. A Grande Armée foi concentrada no campo de Boulogne, à semelhança do que acontecera em 1798 quando, Bonaparte, investido pelo Directório no comando do Exército, verificara a inexequibilidade da tentativa de invasão de Inglaterra por falta de poder naval. Sem dúvidas sobre o principal inimigo e a estratégia necessária para o abater, já em 1797 Napoleão escrevera ao Directório: «Concentremos os nossos esforços na reconstrução da armada e na destruição da Inglaterra. Uma vez isso feito, a Europa estará aos nossos pés» (Kennedy, 1990)(7). Napoleão nunca tivera dúvidas sobre o que estava em jogo.

Em 1805, com a autoridade imperial e tantas vezes vitorioso, Napoleão esperava, impaciente, que a esquadra do Almirante Villeneuve lhe trouxesse a liberdade de acção suficiente para transportar para o outro lado do canal o esmagador poder militar terrestre francês. Mas Villeneuve – que tentava executar um plano assaz complicado de Napoleão, que, ao que parece, nunca terá compreendido muito bem que as esquadras não se movem como os regimentos (Jacques Mordal, 1959) – falhou, e Napoleão viu-se obrigado a desistir da invasão. Restava-lhe bater em terra os outros elementos da coligação. Foi o que fez, deslocando o grosso do seu Exército contra os austro-russos. E deu-se Ulm e Austerlitz, confirmando a hegemonia continental francesa. Mas deu-se igualmente Trafalgar: a 21 de Outubro de 1805, o Almirante britânico Nelson morre ao esmagar a esquadra franco-espanhola. Como escreve Jacques Mordal, esta batalha «vai custar ao Imperador, de momento, a sua esquadra, e dentro de 10 anos, o seu trono» (Mordal, 1959)(8).

Talvez Napoleão não tivesse consciência disso, mas, se a derrota não era inevitável, a vitória, essa, já era impossível.

Geostrategicamente(9), igualmente, o destino de Portugal está selado. Se, até aqui, os estados ibéricos eram essenciais à projecção marítima francesa, perdido o poder naval, a França não podia consentir que Portugal fosse uma «cabeça-de-praia» da potência marítima no continente. Longe do poder francês, anfiteatro face ao mar, ponto de entrada de mercadoria inglesa, passagem obrigatória dos bens coloniais a caminho de Inglaterra, Portugal não se poderia manter imune ao conflito de poder.

E o dilema estala. Em 21 de Novembro de 1806, após esmagar a Prússia em Iena, Napoleão recorria à estratégia económica: as ilhas Britânicas são declaradas em «Estado de Bloqueio», implicando que todos os países que abrissem os portos ou comerciassem com a Inglaterra fossem considerados inimigos da França e dos seus aliados. Após a paz de Tilsit, a própria Rússia adere ao Sistema Continental e a Portugal é dado o prazo até 1 de Setembro de 1807 para fechar os portos aos ingleses e declarar-lhes guerra, sob pena do país ser invadido.

Era a resistência possível? A resposta, face às opções dos últimos vinte anos, é um inequívoco não. É mesmo possível que a manutenção de um Exército com o gabarito que fora herança do conde de Lippe(10) não acabasse por ser esmagado como o foram os seus congéneres europeus de então. O leque de opções seria, pelo menos, mais alargado e a humilhação certamente menor.

A reorganização militar, que se estudava desde o fim da Guerra de 1801, consumara-se em Maio de 1806, organizando no papel o Exército à maneira moderna e de evidente inspiração francesa. Criaram-se então três Divisões: a do Norte, no Centro e no Sul, num total de 12 Brigadas de Infantaria (24 regimentos), 12 Regimentos de Cavalaria e 4 de Artilharia. Os Regimentos de Milícias continuavam sendo 43. E mais providências não foram tomadas. No entanto, como ironiza Carlos Selvagem (1991), davam-se novos uniformes às tropas de linha, milícias e ordenanças.

Com raras excepções, havia a sensação de que resistir a Napoleão, que esmagara todos os Exércitos do continente, era loucura.

Que poderia, pois, o Príncipe Regente fazer? Nas palavras exageradas mas expressivas de Oliveira Martins (1888) «fez o que pôde. Fechou os portos, sequestrou as propriedades dos ingleses, dizendo-lhes ao mesmo tempo, em segredo, que não era a valer, que seriam indemnizados, que se tratava apenas de amansar Napoleão». Bonaparte que, apesar de tudo, não abandonara as suas ambições navais, não se deixou iludir.

Com efeito, após Trafalgar, a França reforçara o ritmo da sua construção naval. Em 1807 e 1808, o número de navios lançados à água nos portos franceses e holandeses foi superior à construção britânica. Neste contexto, a, apesar de tudo, importante esquadra portuguesa – com os seus 13 navios de linha, 8 fragatas e 18 navios menores –, poderia desequilibrar perigosamente a balança. Se a sua posse era vital para a França, à Inglaterra bastava-lhe furtá-la às mãos francesas, retirando-a do teatro europeu, ou, se necessário, destruindo-a. Adicionalmente, Lisboa, e também a Madeira, adjacentes às principais rotas comerciais britânicas, perto de Cádis e da entrada do Mediterrâneo, poderiam proporcionar bases navais em posição privilegiada para as esquadras francesas, obrigando a que uma enorme fracção da Royal Navy tivesse de ser empenhada no seu bloqueio.

Por outro lado, a Grã-Bretanha, além dos seus interesses navais, cuidava também dos comerciais. Lisboa e Porto eram o entreposto indispensável para que os bens ingleses (incluindo os de contrabando) fossem encaminhados para a Europa e América do Sul. Como os portos brasileiros estavam então fechados às importações directas, Lisboa era ponto de passagem obrigatório no caminho para o Brasil. Se a Corte portuguesa retirasse para o Brasil, só a Royal Navy estaria em condições de garantir a segurança da travessia e a subsequente protecção do Brasil, proporcionando à Grã-Bretanha uma posição em que a abertura dos portos do Brasil lhe não poderia ser negada.

A habilidade inglesa é notável. Em Londres, a 22 de Outubro de 1807, o Ministro dos Estrangeiros Canning assina com o Embaixador Domingos de Sousa um convénio secreto em que se previa a retirada da Corte para o Brasil em caso de intervenção francesa. Como o convénio teria que ser ratificado em Lisboa, Canning decide enviar uma força naval para «ajudar e de certa maneira compelir o embarque». O comando foi entregue ao Contra-Almirante Sidney Smith, um duro homem do mar que enfrentara Napoleão no Mediterrâneo e que, dotado de um carácter extravagante, Canning pensava ser o homem ideal para «lidar com a arcaica e impressionável Corte portuguesa» (Malyn Newitt e Martin Robson, 2004) .

Esgotada a estratégia indirecta(11) – pressão diplomática, demonstração de força, apoio a partidos internos –, Napoleão decide-se pela estratégia directa(12). Em Agosto de 1807, ordenou a preparação de um corpo de Exército(13) de 28 000 homens sob o comando do General Junot, antigo Embaixador em Lisboa.

A 27 de Outubro de 1807, Napoleão assina com Espanha o Tratado secreto de Fontainebleau, pelo qual Portugal é dividido em três pequenos Estados e a Espanha se compromete a auxiliar os franceses na conquista do vizinho. Já antes da assinatura do Tratado, o Exército francês iniciara a sua marcha. Com ou sem a Espanha, Napoleão tencionava capturar a Família Real portuguesa.

Em Portugal reinava alguma desorientação. Talvez a maneira mais clara de a descrever seja passar a palavra ao Marquês de Fronteira(14) que, nas suas Memórias (1928), escreve:

«O nosso Embaixador em Madrid, meu tio, o Conde de Ega, não soube da direcção do exército francez e se elle queria invadir Portugal pelo Norte ou pelo Sul, senão quando elle estava a vinte leguas da nossa fronteira da Beira Baixa, e partiu então para Lisboa, onde teve diferentes entrevistas com o Príncipe e com o Governo, mas sem nada decidirem.

Meu tio Alorna, que commandava a província do Alemtejo, pedia instruções e respondia-se-lhe que recebesse Junot como um alliado.

Em vista disto, tomou, sob sua responsabilidade, a deliberação de reunir todas as forças do Alemtejo e escreveu directamente ao Príncipe (…) dizendo-lhe ‘[visto o abandono em que os nossos alliados inglezes nos deixavam], annuisse às reclamações da França, fechando-lhes os portos, e que combatesse a invasão armada do exército francez, se, apezar de se annuir às reclamações do seu Governo, ele continuasse a avançar. Que Portugal não tinha exército para invadir um paiz qualquer, mas para defender a sua nacionalidade e a dynastia tinha 40 000 homens armados e promptos a cumprirem o seu dever’.

Annos depois, soube que os Cortesões, em Mafra tinham dito ao Príncipe, quando elle recebeu aquela carta: ‘O Marquez sempre foi doido, mas, depois que perdeu os dois filhos, está tonto. Ninguém pode resistir ao exército de Napoleão’. (...) O Marquez de Alorna não teve resposta à sua carta. (...)

Fez, contudo, um grande serviço ao Príncipe.

Vendo que na Corte nada se sabia da marcha do exército francez, do qual elle também ignorava os movimentos, e parecendo-lhe que elle devia ter entrado em Portugal, ou, pelo menos, estar na fronteira, ordenou aos seus três Ajudantes de campo, os Coronéis Lecor e Boucachar e Major Gaibão, que marchassem em differentes direcções ao encontro d’aquelle exercito e que verificassem onde elle estava, que estrada tomava e quantos dias de marcha lhe seriam precisos para occupar a capital.

O Coronel Lecor, em desempenho daquellas ordens, encontrou a vanguarda do exército de Junot a pouca distância de Abrantes, (…) e, calculando que em seis dias, podia o mesmo exército estar às portas de Lisboa, partiu logo para Mafra, onde chegou em trinta horas (…). Foi só então que o Príncipe soube que o exercito de Napoleão havia já trinta horas que estava a vinte e quatro leguas da capital!

O quartel-general de Junot tinha sahido de Paris em Agosto e estes acontecimentos davam-se em Novembro! É levar a ignorância ao seu extremo!»

O marquês de Fronteira estava, no entanto, enganado. Se a Corte não sabia do paradeiro exacto do Exército de Junot – sabia pelo menos que estava perto da fronteira com a Beira-Baixa –, não lhe restavam grandes dúvidas quanto à acção a tomar. A 16 de Novembro chegava à embocadura do Tejo a força naval de Sidney Smith, contando com oito navios de linha e uma fragata. Com surpresa, o Almirante inglês verificou que, dias antes, uma esquadra russa de onze navios chegara igualmente ao Tejo, o que lhe sugeriu a possibilidade de ser atacado conjuntamente por portugueses e russos. De concerto com o Embaixador Strangford, que, entretanto, pedira o seu passaporte e se juntara à força naval, o afoito almirante, sem se deixar intimidar, iniciou imediatamente o bloqueio do Tejo.

Não julgando possível passar à ofensiva sem maior número de navios e, em especial, sem o concurso de uma força terrestre de alguma importância, Strangford e Sidney Smith, além de insistirem no cumprimento do acordo de 22 de Outubro, não se coibiram de ameaçar as autoridades portuguesas com o tipo de acção que recentemente tinham desencadeado em Copenhaga. Efectivamente, quatro meses antes, em circunstancias semelhantes, Copenhaga tinha sido bombardeada e a esquadra dinamarquesa capturada. Sem meios reais para fazer muito mais, tendo exposto a situação a Londres, restava a Sidney Smith aguardar.

Finalmente, a 27 de Novembro, o Príncipe Regente, a Rainha e toda a Família Real, depois de terem equacionado todas as medidas de salvação nacional – inclusivamente prender súbditos de Inglaterra –, embarcaram nos navios que estavam concentrados no Tejo, de acordo com o convénio de 22 de Outubro. Nesse dia, entrava Junot em Santarém.

Esta situação já tinha sido equacionada várias vezes antes: aconselhada ao Prior do Crato em 1580; durante a restauração pelo P. António Vieira; nas vésperas da invasão da Guerra dos Sete Anos (os navios chegaram a estar preparados no Tejo); e mesmo em 1801, quando Sousa Coutinho, que afirmava que «os domínios da Europa já não eram a capital e o centro do Império português», instava a que fossem armados os vasos de guerra e os outros navios que estavam ancorados no Tejo e neles colocados os filhos e os tesouros reais.

Mas a ideia era bastante mais antiga e pode ser datada dos primeiros tempos da expansão portuguesa, quando aos mais avisados se tornou patente a desproporção entre as enormes extensões e os recursos dos espaços em que imperávamos e a magreza do território europeu.

As enormes riquezas do Brasil tinham dado corpo a essa argumentação durante o Séc. XVII. Algumas dezenas de anos antes, o diplomata Luís da Cunha – que passara quarenta anos fora de Portugal – escrevera um memorando secreto ao Rei João V em que, analisando lucidamente as fraquezas do país, nomeadamente pela preponderância da Igreja, pelo papel nefasto da Inquisição, pelas vastíssimas terras incultas, concluía que o caminho passava por inverter toda a lógica que nos guiava. Isto é, ao mesmo tempo que se abriria Lisboa como um porto franco, se desenvolveriam as colónias pela criação de companhias comerciais (Angola e Moçambique seriam ligadas por rotas terrestres), o centro do poder político se descentraria para fora da Europa, aconselhando o Rei a, no Brasil, tornar-se no Imperador do Ocidente. Para o diplomata, o continente português não passava de uma «nesga de terra» (Patrick Wilcken, 2005).

Pouco depois da saída da Corte, estas ideias foram divulgadas por um panfleto anónimo publicado em Lisboa. Nele, o autor descreve a criação de um Império futurista no Novo Mundo. Uma cidade, chamada «Nova Lisboa» seria construída na selva, algures no centro do Brasil; uma rede viária, por entre a densa folhagem, ligaria as cidades costeiras da colónia à nova capital.

Tudo começaria de novo (…). «E não seriam apenas os nomes dos meses que mudariam», prossegue o anónimo panfletário. «Os nomes das cidades e rios do Reino de Portugal substituiriam os nomes dos rios, cidades e províncias do Grande Império. O rio mais próximo de ‘Nova Lisboa’ será chamado 'Novo Tejo'. Neste Novo Mundo, todos os traços de influência francesa seriam apagados:

«Criaremos uma espécie de Inquisição para exterminar todos os franceses de nascimento ou simpatizantes da sua cultura, quem quer que fale francês e qualquer livro nessa língua. E deste novo trono, o Príncipe Regente lançaria uma terrível vingança ‘castigando a França pelos seus crimes e a Espanha pela sua perfídia, com um ceptro de ferro’. (Patrick Wilcken, 2005, p. 101). Uma extraordinária mistura de Sebastianismo e visão do futuro».(15)

Acompanharam a Família Real muitos nobres, comerciantes ricos, quadros superiores da Administração e toda a criadagem do Reino, num total de cerca de quinze mil pessoas. Quinze navios de guerra – a totalidade da esquadra, com excepção dos navios que se encontravam em reparação – transportaram a Corte e seu pessoal, tendo os restantes sido transportados por vinte navios mercantes. Adicionalmente, cerca de duas mil pessoas dirigiram-se a Inglaterra tendo, a partir daí, alcançado o Brasil (Hermano Saraiva, 1978). Todo o estrato superior da sociedade abandonou o país. Ficaram os militares a isso obrigados e os «afrancesados», que viam os Exércitos napoleónicos como forças de libertação.

Antes de partir, o Príncipe Regente recomendara que o Exército francês fosse recebido em «boa paz», tentando manter até ao fim a ficção da neutralidade. No dia anterior à partida, o Príncipe dirigiu uma proclamação a mostrar os sacrifícios feitos para defender a neutralidade do Reino e que, reconhecendo ser impossível a luta, era a melhor maneira de preservar a Coroa, «razão da sobrevivência nacional» (Veríssimo Serrão, 1978).

Este acto, de esclarecido bom senso político, embora tão criticado, perturbou especialmente a política continental napoleónica. A ocupação militar não era bastante para a posse do Reino, pois a legitimidade nacional levara-a o Príncipe D. João para o Brasil. Esta decisão salvou a realeza em Portugal e permitiu, à distância, abrir as portas da independência do Brasil, quando a paz voltou. Obviamente, esta retirada corresponde também a uma hábil manobra britânica, garantindo, simultaneamente, a abertura dos portos do Brasil ao seu comércio e um controlo mais apertado do que nunca sob o poder político português.

Do ponto de vista estratégico, Portugal – persuadido ou não pelo Governo britânico – aproveitando a sua então imensa profundidade estratégica –, respondia a Napoleão com uma manobra estratégica assimétrica, recusando jogar a partida que o Império francês lhe pretendia impor. Sendo uma manobra corrente ao nível táctico e normalmente associada com uma estratégia de lassidão (visando desgastar o potencial do adversário mais forte através da diminuição da intensidade da acção, mas prolongando-a no tempo), o combate assimétrico é a alternativa frequente – por vezes a única – do contendor mais fraco. Contudo, a sua utilização ao nível estratégico não é muito frequente(16). No caso português, ela frustrou quase totalmente os objectivos de Napoleão.

A própria tese da fuga precipitada, tão vulgarizada entre nós, merece cuidadosa reflexão, que tem vindo, aliás, a ser feita pela moderna historiografia. Como referimos, a retirada da sede do poder político para o Brasil, fora repetidas vezes equacionada no passado, não tendo, contudo, sido nunca materializada uma situação que exigisse tal medida extrema. A invasão de 1807 materializava tal situação. A relativa rapidez do embarque de uma tal multidão pressupõe o mínimo de planeamento e organização.

Os momentos dramáticos descritos pelas testemunhas da época não podem deixar de ser interpretados como a profunda impressão que certamente provocaram as cenas pungentes de separação familiar, a terrível incerteza de uma expatriação forçada – a própria viagem de barco era então uma aventura – e a enorme angústia dos que ficavam. Tal não justifica, necessariamente, a ideia de uma fuga precipitada. Sabe-se, aliás, que desde o princípio de Novembro de 1807, o Tesouro Real e um grande número de objectos preciosos que se encontravam espalhados por diversos templos, estavam a recolher à esquadra (Damião Peres, 1935).

A decisão final não foi fácil. Exigiu mesmo, como já referido, forte pressão britânica. O Embaixador inglês, Lord Strangford, juntamente com o Almirante Sidney Smith, teriam mesmo ameaçado apoderar-se da esquadra portuguesa(17) e, se o Regente se não vergasse às suas exigências, impedi-lo de sair a barra e entregá-lo às mãos dos franceses… (Pereira Marques, 1989).

Na manhã de 29 de Novembro, a chalupa inglesa Confiance destacada à entrada da barra assinalou os preparativos de saída de uma vasta armada. Inseguro quanto ao que iria realmente passar-se, Sidney Smith mandou preparar os navios para combate ou para as salvas de saudação. Perante a segunda hipótese, a esquadra inglesa salvou à passagem da Corte portuguesa. Destacando quatro navios para acompanhar a armada portuguesa, Sidney Smith manteve o bloqueio a Lisboa, onde permanecia a esquadra russa e onde acabavam de entrar as guardas avançadas de Junot (Malyn Newitt e Martin Robson, 2004).

A 28 de Novembro chegava Junot a Sacavém, com não mais do que 1500 soldados esfarrapados e exaustos. A 30 de Novembro de 1807, entrando em Lisboa, Junot apenas avistou as velas no horizonte. O resto do Exército francês foi chegando lentamente, enquanto o Exército espanhol ocupava o Porto, Évora e finalmente a 25 de Dezembro, Setúbal.

A conquista de Portugal estava feita sem a menor resistência. Alguns dias depois da esquadra que transportava a Corte para o Brasil ter passado na Madeira, uma esquadra inglesa transportando uma pequena força de dois regimentos, surgiu nas águas daquela Ilha, exigindo a capitulação desta, o que se materializou a 26 de Dezembro de 1807. Comandava a força o General William Carr Beresford(18), figura que se virá a revelar de primordial importância para o desenrolar dos acontecimentos em Portugal.

Os habitantes da Madeira foram obrigados a reconhecer o Rei de Inglaterra como seu legítimo soberano, sendo a bandeira portuguesa substituída pela Union Jack. Mais tarde, esta situação foi modificada. Parece que, efectivamente, a esquadra inglesa tinha largado da Irlanda antes de se saber em Inglaterra da partida da Família Real portuguesa para o Brasil, não se sentindo o General Beresford em posição de modificar as instruções recebidas. Tal só foi conseguido em Março de 1808, quando a diplomacia portuguesa obteve do Governo inglês a modificação de estatuto de capitulação de 1807. A bandeira foi novamente substituída, o Governo voltou às mãos do Governador português, tendo o Comandante inglês assumido o comando combinado das forças portuguesas e inglesas, agora em nome do Príncipe Regente de Portugal.

A ocupação militar inglesa manteve-se, no entanto, até ao fim do ano de 1814 (Luz Soriano, 1883). Como já anteriormente salientado, perdida Lisboa – que seria agora necessário bloquear –, o controlo da Madeira e a sua negação a um poder português potencialmente aliado à França ou às próprias forças francesas era essencial ao controlo da navegação que constituía um objectivo estratégico vital da Grã-Bretanha. Com maior ou menor elegância formal, a Grã-Bretanha não teve qualquer hesitação. A Moral e o Direito não são habitualmente chamados para estes assuntos.

A 2 de Dezembro, Londres recebia a declaração de guerra da Rússia. Ainda desconhecedor da partida da Corte portuguesa, Canning, admitindo que a presença da esquadra russa resultava de uma prévia concertação com os franceses, decidiu reforçar os meios navais ao largo de Lisboa, de forma a igualar o poder combinado das esquadras portuguesa e russa. O número de navios de linha subiu a 22, uma força naval de enormes dimensões, que bem demonstra a importância da parada para a Grã-Bretanha. Note-se que em Trafalgar, Nelson apenas dispusera de um número de navios de linha ligeiramente superior: 27.

Uma força de tais dimensões levou também à alteração do comando: ao Contra-Almirante Sidney Smith, sucedeu o Vice-Almirante Sir Charles Cotton, uma escolha que mereceu a aprovação do próprio Rei. Cotton foi informado que uma força de 7000 homens sob o comando do Major-General Spencer seria enviada para Lisboa e que uma outra de iguais dimensões, sob o comando do Tenente-General, Sir John Moore, retirada da Sicília, estaria igualmente disponível em breve.

A alteração da situação mudou os planos britânicos. A força de Moore foi desviada para o Norte da Europa, e Cotton – seguindo instruções de Londres –, conseguiu entrar secretamente em contacto com Sinavine, que, aparentemente pouco feliz com a situação, se declarava incapaz de uma rendição com todas as baterias do Tejo na posse dos Franceses. Mais tarde, acabou mesmo por parlamentar com Junot uma proposta de abandono de Portugal em troca do fim do bloqueio, proposta que teria sido transmitida a Napoleão. Sem forças terrestres para uma acção de envergadura, Cotton manteve o bloqueio até Agosto de 1808, na esperança de que esta acção provocasse graves dificuldades de abastecimento não só à população, mas também aos franceses e aos russos. Sentiu-se mesmo obrigado a distribuir em Lisboa uma proclamação em que explicava o bloqueio como uma medida de protecção inglesa cuja responsabilidade só podia ser imputada à França (Malyn Newitt e Martin Robson, 2004).

Por esta altura, a Corte portuguesa estabelecera-se no Rio de Janeiro. Depois de uma atribulada viagem de onze semanas – não faltaram nem as avarias nem os piolhos! –, a esquadra, dispersa pelas tempestades e calmarias, abordara a costa brasileira em vários pontos. O Príncipe Regente apenas desembarcou no Rio de Janeiro a 8 de Março de 1808 e a sua Corte apenas se restabeleceu alguns meses mais tarde dos choques provocados pela mudança de cenário, de hábitos, de alojamentos e de clima.

Mas, já em Salvador, o Regente verificara que alguns dos problemas de que fugira o tinham seguido através do Atlântico. Com efeito, nenhum navio saíra de Salvador desde a tomada de Lisboa. O porto estava atulhado com navios à espera de deixar o Brasil e transportar as suas mercadorias para a Europa. As colheitas tinham começado, os armazéns abarrotavam de produtos vindos do interior, muitos dos quais estavam a estragar-se. Com base no sistema colonial em vigor, os navios mercantes que largavam do Brasil eram ferreamente controlados pela coroa portuguesa. Todo o comércio tinha, em teoria, de ser encaminhado para Portugal, de onde, depois do pagamento de direitos, a maioria dos artigos era reexportada para outros países, muitas vezes para Inglaterra. Com a França a controlar Lisboa, todo o sistema imperial ficou paralisado (Patrick Wilcken, 2005).

Por decreto, o Príncipe abriu os portos do Brasil a toda a navegação. É claro que, acima de tudo, era uma medida inevitável – de outra forma, de que iria viver o novo poder instalado no Brasil? –, mas também o cumprimento de uma convenção secreta com a Grã-Bretanha. Como a única Marinha não controlada pela França era a britânica, tal medida significou a abertura do comércio do Brasil à Grã-Bretanha. Apesar da oposição dos armadores portugueses – que alternativa haveria? –, esta simples medida deu, realmente, a independência ao Brasil.

Quando, treze anos mais tarde, o já Rei João VI, relutantemente regressou a Portugal, a longa permanência da Corte estruturara um sólido poder brasileiro. Nem o país se fragmentou por força da dimensão e da diversidade geográfica e climática, nem tinha, a partir daí, qualquer necessidade de Portugal. Resta apenas especular como se teria desenrolado a História – já que o fim dificilmente seria diferente – se tivesse sido seguido o conselho de Talleyrand de manter a capital do Reino Unido de Portugal e do Brasil no Rio de Janeiro, relegando Lisboa à residência do Príncipe Regente…

Estrategicamente, a derrota de Napoleão foi total. A França não cessou de declinar e o mundo tornou-se anglo-saxão. O objectivo da estratégia total da Grã-Bretanha de evitar o estabelecimento de um poder hegemónico na Europa foi plenamente conseguido. Com inteligência e perseverança soube orquestrar as suas estratégias económicas, diplomáticas e militares. Nesta última, capitalizou o domínio do mar, ao mesmo tempo que, com os seus poucos aliados continentais, sujeitava o Império francês a contínuo desgaste. Finalmente, ganhou porque no estádio da evolução da economia no início do Séc. XIX, a maioria dos países europeus já não podia dispensar os bens que lhe chegavam por via marítima. Como John Evelyn dissera no fim do Séc. XVI, «quem controla o Oceano, controla o comércio do Mundo; quem controla o comércio do Mundo, controla a riqueza do Mundo; quem controla a riqueza do Mundo, controla o próprio Mundo».

Portugal também conseguiu os seus objectivos sobrevivendo ao ciclone que então varreu a Europa e chegou até a ser hábil e inovador no aproveitamento das suas vantagens geopolíticas. O seu objectivo estratégico – a manutenção do Reino como Estado independente – foi plenamente conseguido. Contrariamente a muitos vaticínios, conseguiu sobreviver à perda da sua principal colónia, embora cedo a tenha tentado substituir pelo Império africano. Ainda é cedo para avaliar o impacto da perda de mais essa fonte de proventos exteriores.

Mas aquilo que foi para Portugal um dano colateral da sua grande estratégia, tornou o Brasil grande vencedor deste jogo que se disputou num tabuleiro euro-atlântico e que teve dimensões pouco comuns até à época. Talvez, de novo, um grande poder mundial volte a falar português.

 

Notas

(1) O Estrategos era o comandante das forças militares na Grécia Clássica.

(2) Cf. Cabral Couto (1988), Elementos de Estratégia, Vol. I, IAEM, Lisboa, p. 209

(3) Uma comparação, mesmo superficial, entre a organização do Império português e espanhol é particularmente reveladora. Ver José Manuel Freire Nogueira (2007), «A individualidade de Portugal: reflexões sobre um velho tema», in Geopolítica, n.º 1, Setembro, Aveiro.

(4) Epíteto porque era conhecida a Rainha Maria I (1777-1816), mãe do futuro João VI (1816-1826). A rainha já morreria no Rio de Janeiro para onde se deslocou a corte em finais de 1807. Desde 1791 foi o filho João que exerceu o cargo de regente, em virtude de doença mental da rainha. As invasões espanholas (1801) e francesas (1807, 1809, 1810) ocorrem durante a regência do príncipe. (N.E.)

(5) Entende-se por Estratégia Total ou Integral a orquestração das várias Estratégias Gerais, tais como a diplomática, a económica, a psicológica ou a militar. Compete ao topo da Direcção Política.

(6) É ao nível das Estratégias Gerais que se situa a charneira entra a concepção e a execução. Assim, para que uma determinada Estratégia Operacional seja exequível, é necessário que os meios adequados sejam obtidos em tempo útil (Estratégia Genética) e convenientemente organizados e articulados (Estratégia Estrutural).

(7) Ascensão e Queda das Grandes Potências. Publicações Europa-América, 1990, p.158.

(8) 25 Siécles de Guerre Sur Mer. Vol. I, Marabout Université, Verviers, 1959, p. 263.

(9) Ramo da Geopolítica que se ocupa exclusivamente das relações de conflito e da influência nestas do meio geográfico.

(10) Conde de Schaumburg Lippe (1724-1777) comandou e reorganizou o Exército português entre 1762 e 1764. Deixou uma marca ainda hoje reconhecível.

(11) Estratégia em que os meios de coacção são, predominantemente, não militares.

(12) Estratégia em que os meios de coacção são, predominantemente, militares. Todos os outros meios de coacção são igualmente empregues mas em apoio da estratégia principal, que é, neste caso, militar. Corresponde ao privilegiar do hard power.

(13) Unida de táctica criada por Napoleão que agrupava todos os meios de combate e apoio capazes de assegurar o seu emprego independente.

(14) D. Trazimundo de Mascarenhas Barreto (1802-1881). Militar e político, participou em todos os principais eventos da Guerra Civil, na maioria deles como oficial do Estado-Maior do Duque da Terceira. Par do Reino, ocupou vários cargos parlamentares e foi Governador Civil de Lisboa.

(15) Na juventude do autor – com o início das revoltas em África –, estes sonhos voltaram em força, desta vez com a transferência da capital para Angola.

(16) Um exemplo clássico de resposta estratégica assimétrica é a acção de resistência pacífica oposta por Ghandi e seus partidários à ocupação britânica da Índia.

(17) Não seria de estranhar. Muitos anos mais tarde, durante a II Guerra Mundial, a Marinha britânica não hesitou em afundar a tiro, no Norte de África, a esquadra francesa – sua aliada poucos dias antes – para evitar que esta caísse nas mãos dos alemães.

(18) William Carr Beresford (1768-1854), General do Exército britânico, Visconde de Beresford, foi mais tarde, e até 1822, o Comandante do Exército português.

 

Referências bibliográficas

BARRETO, José T. Mascarenhas (1928), Memórias do Marquês de Fronteira e de Alorna. Partes 18, 21, 38 e 48, Imprensa da Universidade, Coimbra, Portugal.         [ Links ]

CHANDLER, David (1966), The Campaigns of Napoleon. MacMillan Publishing Co, Nova Iorque, EUA.

COELHO, Latino (1885), História Política e Militar de Portugal. Imprensa Nacional, Lisboa, Portugal.

COUTO, Abel Cabral (1989), Elementos de Estratégia. Vol I, IAEM, Lisboa, Portugal.

KENNEDY, Paul (1990), Ascensão e Queda das Grandes Potências. Publicações Europa-América, Lisboa, Portugal.

MARQUES, Fernando Pereira (1989), Exército e Sociedade em Portugal, no Declínio do Antigo Regime e Advento do Liberalismo. Publicações Alfa, Lisboa, Portugal.

MARTINS, Oliveira (1888), História de Portugal. 1.ª Ed., Guimarães e C.a Editores, Lisboa, Portugal.

MORDAL, Jaques (1959), 25 Siécles de Guerre Sur Mer. Vol. I, Marabout Université, Verviers, França.

NEWITT, Malyn e ROBSON, Martin (2004), Lord Beresford and British Intervention in Portugal, 1807-1820. Imprensa de Ciências Sociais, Lisboa, Portugal.

SARAIVA, José Hermano (1978), História Concisa de Portugal. Publicações Europa América, Sintra, Portugal.

SELVAGEM, Carlos (1991), Portugal Militar. Imprensa Nacional – Casa da Moeda, Lisboa, Portugal.

SERRÃO, Joaquim Veríssimo (1978), História de Portugal. Vols. VII e VIII, Editorial Verbo, Cacém, Portugal.

WILCKEN, Patrick (2004), O Império à Deriva. Civilização, Lisboa, Portugal.

 

 

*José Manuel Freire Nogueira

nogueira.jmf@gmail.com

Oficial-general na Reserva, Mestre em Estratégia pelo ISCSP, Lisboa, Portugal. Foi professor do Instituto de Altos Estudos Militares, em Lisboa, oficial no SHAPE (Supremo Quartel-General Aliado) na Bélgica e conselheiro militar do embaixador de Portugal na NATO e na União Europeia Ocidental. Além de autor de Pensar a Segurança e Defesa e O Pensamento Estratégico Nacional publicou também As Guerras Liberais – Uma Reflexão Estratégica sobre a História de Portugal (Cosmos/Instituto de Defesa Nacional, 2004), onde aborda o tema de 1808.

Retired Army General holds a Master´s Degree on Strategy, by ISCSP, Lisbon, Portugal. Several times professor at the Army Staff and War College in Lisbon,Intelligence Officer at the Supreme HQ Allied Powers Europe (SHAPE), military counsellor of the Portuguese Ambassador to NATO, co-chairman of the NATO´s Defence Group on Proliferation and finally, Director of the National Defence Course, position he held when retired. Since 2004 has published several books on Defence, Strategy and History, namely The Portuguese Civil War – A Strategy Study on Portuguese History, (Cosmos/Instituto de Defesa Nacional, 2004), where the 1808 issue is addressed.

Oficial-general en la Reserva, postgrado en estrategia por el ISCSP, Lisboa, Portugal. Fue profesor del Instituto de Altos Estudos Militares en Lisboa, oficial en el SHAPE (Supremo Quartel – General Aliado) en Bélgica y consejero militar del embajador de Portugal en la OTAN y la UEO. Además de autor de Pensar a Segurança e Defesa y O Pensamento Estratégico Nacional publico también As Guerras Liberais – Uma Reflexão Estratégica sobre a História de Portugal (Cosmos/Instituto de Defesa Nacional, 2004), que aborda la cuestión de 1808.

 

Recebido em Junho de 2008 e aceite em Março de 2009.

Received in June 2008 and accepted in March 2009.

Creative Commons License Todo el contenido de esta revista, excepto dónde está identificado, está bajo una Licencia Creative Commons