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Revista de Gestão dos Países de Língua Portuguesa

versão impressa ISSN 1645-4464

Rev. Portuguesa e Brasileira de Gestão vol.13 no.1 Lisboa mar. 2014

 

ARTIGOS

 

A influência das organizações do Terceiro Setor na Responsabilidade Social e Ambiental das empresas do Polo Industrial de Manaus

 

The influence of Third Sector Organizations in Social and Environmental behavior of Companies located in the Industrial Pole of Manaus

 

La influencia de las organizaciones del Tercer Sector en la responsabilidad social y ambiental de las empresas del Polo Industrial de Manaus

 

 

Mário CostaI; Amílcar RamosII; Sofia PortelaIII

IDoutorado em Gestão Global, Estratégia e Desenvolvimento Empresarial, ISCTE-IUL, ISCTE Business School, Departamento de Marketing, Operações e Gestão Geral. Secretário-geral da Fundação Rede Amazônico. Professor Adjunto na Faculdade FUCAPI, Departamento de Administração, 69075-351 Manaus, Brasil. E-mail: mariocosta@redeamazonica.com.br
IIDoutorado em Gestão Estratégica e Desenvolvimento Empresarial, ISCTE-IUL, Business School. Prof. Auxiliar, ISCTE-IUL, ISCTE Business School, Departamento de Marketing, Operações e Gestão Geral, 1649-026 Lisboa, Portugal. E-mail: amilcar.ramos@iscte.pt
IIIDoutorada em Métodos Quantitativos, ISCTE-IUL, ISCTE Business School. Prof.ª Auxiliar, ISCTE-IUL, Business School, Departamento de Métodos Quantitativos, Av. das Forças Armadas, 1649-026 Lisboa, Portugal. Consultora de empresas. E-mail: sofia.portela@iscte.pt

 

 


RESUMO

Este artigo investiga a influência das Organizações do Terceiro Setor (OTS) no comportamento social e ambiental das empresas instaladas no Polo Industrial de Manaus (PIM). Tem como objetivo verificar as OTS que mais causam mudanças nessas empresas, como se relacionam com elas, o que mudam nelas e as estratégias que aplicam para atingir seus propósitos. Para o procedimento metodológico, adotou-se um método misto de pesquisa qualitativa e quantitativa, que integra as abordagens fenomenológica e positivista. A coleta de dados, nas empresas, deu-se por meio de um questionário estruturado aplicado a executivos; e nas OTS – selecionadas entre as mais propensas a influenciar a Responsabilidade Social Empresarial (RSE) –, foram entrevistados os diretores. O referencial teórico baseou-se em publicações que tratam sobre a relação entre as OTS e as empresas, o qual permitiu perceber que esse tipo de organização constitui um novo setor na governança global e que têm comportamentos antagônicos na relação com as empresas. Os resultados revelam que a convivência entre as OTS e as empresas do PIM varia entre extremamente amigável e conflituosa e que as OTS utilizam diferentes estratégias no campo da RSE. Finalmente, constata-se, no presente, a existência de ampla influência da generalidade das OTS nas empresas – com destaque para as certificadoras – e que essa influência se intensificará ainda mais nos próximos anos.

Palavras-chave: Terceiro Setor, Empresas, Governança Global, Responsabilidade Social e Ambiental


ABSTRACT

This paper investigates the influence of Third Sector Organizations (TSO) in Social and Environmental behavior of Companies located in the Industrial Pole of Manaus (PIM). This aims to determine which TSO bring most of the changes in those companies, how they relate to them, what makes them change routes and what are the strategies applied to achieving their goals. A methodological procedure integrating the phenomenologist and positivism approaches was developed using qualitative and quantitative data. Data collection from enterprises occurred through a structured questionnaire applied to executives, and among the selected TSO most likely to influence CSR (Corporate Social Responsibility), whose directors were interviewed. The theoretical framework was based on the specialized scientific literature about the relationship between organizations from the third sector and companies which also allowed realizing that this type of organization is a new sector in global governance and that they have antagonistic behaviors in relation to companies. The results reveal that the relationship between companies and TSO at the PIM varies between extremely friendly and conflicting and the TSO use different strategies in the field of CSR. Finally, the article concluded the existence of a wide influence of the vast majority of TSO in companies, standing out the certifiers, and that this influence will be even greater in the coming years.

Key words: Third Sector, Businesses, Global Governance, Corporate Social Responsibility


RESUMEN

En este trabajo se investiga la influencia de las organizaciones del Tercer Sector (OTS) en el desempeño social y ambiental de las empresas ubicadas en el Polo Industrial de Manaus (PIM). Tiene como objetivo verificar las OTS que causan los cambios en las empresas, cómo se relacionan entre ellas, lo que cambian en ellas y las estrategias que usan para lograr sus propósitos. Para el procedimiento metodológico, hemos adoptado un método mixto de investigación cualitativa y cuantitativa, que integra los enfoques fenomenológicos y positivistas. La recogida de datos de las empresas se llevó a cabo mediante el uso de un cuestionario estructurado aplicado a los ejecutivos; y en las OTS – seleccionadas entre las más propensas a influir en la Responsabilidad Social Corporativa (RSC) – se entrevistó a los directores. El marco teórico se basó en publicaciones que se ocupan de la relación entre los OTS y las empresas, lo que ha permitido darnos cuenta de que este tipo de organización es un sector emergente en la gobernanza global y que tienen comportamientos antagónicos en la relación con las empresas. Los resultados revelan que la coexistencia entre la OTS y las empresas PIM oscila entre muy amable y de confrontación y que las OTS utilizan diferentes estrategias en el campo de la RSE. Por último, al parecer, en la actualidad, la existencia de influencias generalizadas de la OTS en las empresas – especialmente las certificadoras – y que esta influencia se intensificará aún más en los próximos años.

Palabras-clave: Tercero Sector, Corporaciones, Gobernanza Global, Responsabilidad Social y Ambiental


 

 

No atual mundo globalizado, o comportamento social e ambiental das empresas (RSE) tem-se tornado objeto de contínuos debates na sociedade. Entender o desenrolar desse processo torna-se cada vez mais importante à medida que as Organizações do Terceiro Sector (OTS) – que, entre outras denominações, são designadas como Organizações Não Governamentais (ONG) – ocupam posição estratégica no sistema de governança global, no qual conquistaram posição singular, capaz de intervir no comportamento social e ambiental das empresas.

No universo das OTS, existe variedade organizacional – o que dificulta uma abordagem unificada sobre a forma como suas organizações se comportam, como operam e como respondem às diferentes situações –, a qual se ajusta a diferentes posições ou transpassa de um lado para outro com relativa facilidade, o que dificulta determinar uma classificação precisa do setor.

Para facilitar o entendimento, as OTS foram classificadas em dois tipos: ativistas e prestativas (Elkington e Fennell, 1998; Sustainability, 2005). As ativistas têm a tendência a fazer pressão e a usar o embate; por seu turno, as prestativas tendem a ser colaborativas com as empresas, trabalhando em parceria com as empresas em programas sociais e ambientais.

Notadamente, os estudos sobre o relacionamento entre as empresas e as OTS são relativamente recentes, sobretudo aqueles relacionados à RSE, o que justifica novas investigações para ampliar a compreensão e as implicações desse relacionamento. Por isso, esta pesquisa tem o objetivo principal de verificar quais as OTS que mais impactam na RSE do Polo Industrial de Manaus (PIM), como essas organizações se relacionam com as empresas, o que mudam nas empresas e as estratégias que aplicam para concretizar seus propósitos.

O universo pesquisado foi o PIM, localizado em Manaus, no centro da Amazônia brasileira, um dos mais modernos da América Latina, criado com o objetivo de destacar o Brasil no cenário internacional, por meio de um modelo produtivo que pudesse produzir desenvolvimento socioeconômico ao mesmo tempo em que preservasse os recursos naturais e a biodiversidade da Amazônia. De outro lado, foram pesquisadas, no universo das OTS, as organizações que, de acordo com a literatura, estão entre as que mais influenciam o processo de RSE.

Os resultados da investigação revelam que as empresas inquiridas percebem que a generalidade das OTS exerce significativo impacto no seu comportamento social e ambiental, com destaque maior para as organizações certificadoras. Por sua vez, as OTS confirmam essa influência; relatam melhoria de produtos, processo e benefícios para trabalhadores e consumidores; mostram relações extremamente amigáveis ou conflituosas; revelam estratégias, tais como a utilização do lobby no Governo para obter regulamentações favoráveis, além de usarem a mídia para chamar atenção para os seus propósitos.

 

Revisão da literatura

· O terceiro setor como novo agente na governança global

Não há registro na história da Humanidade que aponte para um período de tamanha transformação social como a experimentada a partir da década de 1970. As causas dessas mudanças estão atreladas ao processo de democratização da sociedade, ao capitalismo e à globalização, que possibilitaram diferentes associações entre indivíduos, redundando na criação de múltiplas organizações com diversificados interesses. Tais entidades, denominadas OTS, tornaram-se defensoras de anseios comuns de indivíduos, grupos ou comunidades.

Para explicar a origem dessas organizações, Teegen et al. (2004) afirmam que, historicamente, os movimentos sociais têm surgido com a finalidade de exigir respostas para interesses não atendidos da sociedade, de sorte que eclodem quando os indivíduos percebem que, ao se associarem uns aos outros, podem alcançar objetivos que não conseguem isoladamente. Por essa razão, cada vez mais, pessoas se juntam em distintas organizações de interesses comuns na busca de implementar decisões que favoreçam suas prioridades como cidadãos (Schmid et al., 2008), o que, de acordo com os interesses e os propósitos, pode tornar as OTS adversárias ou parceiras das empresas (Ferris, 1998).

O que impressiona é que, até 1970, essas organizações eram pouco conhecidas, mas desde então têm apresentado acelerada expansão quantitativa e tipológica, de modo que, em poucas décadas, saíram da obscuridade para assumir destacada posição mundial, ao lado de Governos e de empresas. A expansão das OTS é um fenômeno decorrente do incremento do processo democrático, do capitalismo e da globalização, que funcionam como impulsores desse modelo organizacional. Trata-se de algo inusitado na história da Humanidade: o surgimento de organizações de natureza privada, de interesse público, sem fins lucrativos e não governamentais (Salamon, 1994; Owczarzak, 2010).

De acordo com Kytle e Ruggie (2005), o rápido aprendizado do exercício da democracia e da liberdade de expressão, especialmente por meio da mídia e da Internet, possibilitou às OTS uma forte influência mundial e expandiu o alcance dos desejos de stakeholders. Isso levou Drucker (1989) a considerá-las vitais para a sociedade, pela sólida relação intrínseca com os indivíduos, com as comunidades e com a sociedade em geral.

O espaço ocupado pelas OTS no cenário internacional gerou um novo modelo coparticipativo de governança global, do qual elas participam ao lado de Governos e de empresas multinacionais (Lambell et al., 2008), de forma que ocupam a posição de terceiro «agente» na governabilidade no Mundo (Zadek, 2001), em que ao mesmo tempo contribuem com valores que influenciam a sociedade e se subordinam às forças de influência global (Teegen et al., 2004; Choi et al., 2005), conforme se verifica na Figura 1.

 

 

· O relacionamento entre as OTS e as empresas

Na sociedade do Séc. XXI, o setor empresarial, o Estado e o Terceiro Setor formam a tríade que controla os processos econômicos, políticos e sociais de um mundo interdependente, onde a excelência organizacional tem como requisitos básicos a conduta ética, a valorização do ser humano, da sociedade e do meio ambiente, os quais exigem das empresas tratamento leal a clientes, a trabalhadores e a fornecedores, produtos com qualidade, segurança e garantia, sustentabilidade social e ambiental, desenvolvimento de recursos humanos, condições adequadas de trabalho, remuneração justa, entre outros.

A dinâmica dessa sociedade possibilita mais níveis de pressões do que em qualquer outra época do passado, tendo em vista que os seus membros transmitem e recebem ameaças de variados stakeholders ao mesmo tempo, de maneira que todos pressionam e também são pressionados, à medida que o nível de exigências cresce rapidamente de todos os lados. Todavia, à medida que, para determinadas empresas, a pressão se torna algo quase normal e parte do cotidiano, para outras, não preparadas para lidar com o assunto, representa um sério desafio para a manutenção dos negócios (Kytle e Ruggie, 2005).

Vale ressaltar que os estudos sobre o relacionamento entre as empresas e as OTS são relativamente recentes, sobretudo aqueles relacionados à RSE (Argenti, 2004; Hamann e Acutt, 2004). Para determinados estudiosos, a atual perceção social e ambiental mostrada pelas empresas é resultante da ação das OTS (Sullivan, 2003; Frenkel e Kim, 2004; Prieto e Quinteros, 2004); para alguns, isso decorre devido à troca que faz com que um setor complemente o outro, sendo ambos vitais para erradicar a pobreza e a miséria do Planeta.

O interesse do Terceiro Setor pelo campo empresarial fez que suas organizações passassem a abraçar as áreas dos direitos humanos, das condições de trabalho, da defesa do consumidor, da preservação do meio ambiente, entre muitos outras, com o objetivo claro de mudar o comportamento das empresas nesse contexto (Whittaker e Brammer, 2001; Spar e La Mure, 2003; Bendell, 2004).

· Comportamentos das OTS na relação com as empresas

Os diferentes comportamentos das OTS, na relação com as empresas, são resultantes de vários fatores, que essencialmente se fundamentam nas crenças religiosas, humanistas ou ideológicas professadas por seus membros.

Nas últimas duas décadas, tem aumentado a quantidade e a diversidade de OTS que passaram a cooperar com as empresas, algo intensamente impulsionado pelo status consultivo que essas organizações têm ocupado na ONU, na Organização Mundial do Comércio, no Banco Mundial, entre outras agências internacionais (O’Brien et al., 2000), o que, para Kytle e Ruggie (2005), fortalece ainda mais a posição institucional delas no cenário mundial.

Essas organizações, que nascem dos movimentos sociais e giram em torno de compromissos coletivos e ideais compartilhados, habilmente buscam transformar princípios – religiosos, humanistas ou ideológicos – em legislações ou em políticas públicas nacionais e internacionais, as quais, uma vez instituídas, são popularizadas por meio de livros, panfletos, mídia, Internet, entre outros (Keck e Sikkink, 1998).

A amplitude e a diversidade das OTS dificultam a criação de uma abordagem unificada para determinar como se comportam, operam e respondem às diferentes situações. No entanto, na relação com as empresas, verifica-se que algumas têm postura mais combativa na defesa de seus interesses, enquanto outras têm atitude mais colaborativa (Martínez e Diego, 2005; Choi et al., 2005), embora muitas delas se ajustem a ambas as posições ou evoluam de uma perspetiva para outra com relativa facilidade (Teegen et al., 2004). Na opinião de Porter e Kramer (2006), sejam elas de direita, sejam de esquerda, estão cada vez mais hábeis em impor pressão sobre as empresas. Entretanto, o Banco Mundial (1995) classifica-as em dois grupos: operacionais e de defesa, que aqui, por critério semântico, serão denominadas de prestativas e ativistas, conforme segue abaixo. 

Prestativas: No relacionamento com as empresas oferecem um mix de serviços (Brinkerhoff et al., 2003), com o propósito de preencher o vazio que o mercado não ocupa e que o Governo não sabe, não pode ou não quer atender (Ruggie, 2003; Teegen et al., 2004). Diferentemente das ativistas, preferem a tática da cooperação em vez do confronto; e, por apresentarem baixo risco de conflito, mantêm relacionamento amigável com as empresas (Martinez e Diego, 2005).

Ativistas: Autointitulam-se «cães de guarda» ou «tropa de choque» da sociedade civil (Sustainability et al., 2003; Leisinger, 2007), posicionando-se como contraparte em relação ao poder político do Governo e ao poder econômico do mercado; e, por isso, preferem usar o conflito e o enfrentamento para atingir seus objetivos (Hudson, 2000; Martinez e Diego, 2005). Sua preocupação direciona-se à degradação ambiental, aos baixos salários, aos direitos humanos e trabalhistas e contra a corrupção. Seu propósito de mudar o comportamento das empresas resulta do sentimento de que elas têm acumulado excessivo prestígio e poder no atual cenário internacional, especialmente as multinacionais (Waddock e McIntosh, 2009).

Por fim, para Slater (2007), indiferentemente de serem ativistas ou prestativas, as OTS têm aumentado as pressões para uma maior contribuição das empresas na solução dos inúmeros problemas sociais e ambientais do Planeta. Elas partem do postulado de que as empresas têm recursos financeiros, capital humano e influência global para promover o desenvolvimento da sociedade.

· Estratégias das empresas para lidar com OTS

As empresas percebem que a pressão dos stakeholders pode trazer significativos riscos aos negócios, de maneira que não apenas consumidores e investidores influenciam esse processo, mas também a comunidade, os trabalhadores, os políticos, os fornecedores, as OTS e a mídia (Kytle e Ruggie, 2005).

Para encarar o desafio de prosperar e de manter os negócios, elas desenvolveram uma série de estratégias, com as quais, conforme Doane (2005), têm obtido variados graus de sucesso. Ademais essas táticas objetivam livrá-las de ataques de ativistas, bem como continuar a expansão de seus negócios. De entre as estratégias, destacam-se: fazer lobby e combater outros lobbies, estabelecer um sistema de autorregulação, cultivar uma impressão positiva na opinião pública, controlar a mídia, manter parcerias internacionais com agências, Governos e OTS, preservar a credibilidade nos consumidores e acionistas e manter um relacionamento favorável com os stakeholders.

 

Metodologia

Para verificar as OTS que mais impactam no comportamento social e ambiental do PIM, optou-se por integrar métodos de pesquisa qualitativa e quantitativa, o que, para determinados estudiosos, representa um continuum epistemológico no campo das pesquisas científicas.

A coleta de dados ocorreu em 113 empresas, com base numa amostragem por quotas, dentro do universo de 419 cadastradas na Suframa[1]. Para tal, foi elaborado um questionário estruturado, que foi aplicado a executivos de alto escalão, de forma a levantar dados sobre o presente e o futuro (próximos cinco anos) da influência das OTS nas empresas. Os dados coletados foram analisados mediante técnicas de estatística, com uso do SPSS.

Por sua vez, entre as OTS selecionadas, mesmo mantido sigilo das organizações, somente 13 aceitaram participar da pesquisa. A coleta de dados foi feita por meio de uma entrevista, semiestruturada, que buscava saber a maneira como essas organizações se relacionam com as empresas, o que mudaram nestas e as estratégias que aplicam para tal. As entrevistas foram gravadas, com prévia autorização, e posteriormente foram transcritas para análise, pelo método fenomenológico-hermenêutico, cujo ganho foi um relato oral, substancial, que contribuiu sobremaneira para o objetivo da pesquisa.

 

Resultados da investigação

Em termos médios, as empresas inquiridas consideram que as organizações religiosas e as associações comunitárias atualmente exercem baixa influência na RSE, ao passo que as organizações certificadoras exercem alta influência, e as demais OTS exercem média influência.

Entretanto, para o futuro, as empresas inquiridas esperam, em média, um aumento do grau de influência das organizações ambientalistas, das organizações de defesa do consumidor, das organizações educacionais, das organizações de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, das organizações de direitos humanos e das associações comunitárias (ver Figura 2).

 

 

Para testar se a distribuição da influência das diversas OTS é igual entre o verificado no presente e o esperado para o futuro, procedeu-se à realização de testes de Wilcoxon. De acordo com a amostra coletada, para um nível de significância de 5%, concluiu-se que a distribuição da influência das diversas OTS na RSE não é igual, exceto para os sindicatos e para as organizações certificadoras. Dessa maneira, as empresas do PIM esperam o aumento da influência de todas as outras OTS no futuro ante o verificado no presente.

Em seguida, analisou-se o perfil médio da influência das diversas OTS na RSE no presente e o que as empresas inquiridas esperam para o futuro, cruzando as questões com as diversas variáveis de caracterização geral das empresas. A análise dos dados permite concluir que, de uma forma geral, os vários grupos de empresas inquiridas apresentam, em média, comportamentos distintos, quer no presente, quer no esperado para o futuro, para algumas das OTS em análise.

Para testar se a distribuição da influência das diversas OTS na RSE é igual entre os vários grupos populacionais, procedeu-se à realização de testes de Kruskal-Wallis e de testes de Mann-Whitney. De acordo com a amostra coletada, para um nível de significância de 5%, concluiu-se que a distribuição da influência das diversas OTS é estatisticamente diferente em vários grupos populacionais, quer no presente, quer no que se refere ao esperado para o futuro, encontrando-se as seguintes diferenças estatisticamente significativas:

No presente:

·As grandes empresas consideram que as organizações de defesa do consumidor exercem maior influência na RSE do que percebem as micro, as pequenas e as médias empresas.

·As empresas norte-americanas consideram que as organizações ambientalistas e as organizações de direitos humanos exercem maior influência na RSE do que percebem as empresas brasileiras, as europeias e as asiáticas.

·As empresas brasileiras consideram que as organizações de defesa do consumidor exercem menor influência na RSE do que percebem as empresas europeias e as norte-americanas.

·As empresas europeias consideram que as organizações educacionais e as organizações certificadoras exercem maior influência na RSE do que percebem as empresas brasileiras, as norte-americanas e as asiáticas.

·As empresas que têm até 25 anos consideram que as organizações de defesa do consumidor exercem menor influência na RSE do que percebem as que têm mais de 50 anos.

·As empresas que têm código de conduta descrito consideram que as organizações ambientalistas, as de defesa do consumidor, as de responsabilidade social, as de direitos humanos e as organizações certificadoras exercem maior influência na RSE do que percebem as empresas que não têm o código de conduta descrito.

·As empresas que publicam balanço social consideram que as organizações ambientalistas, de defesa do consumidor e de responsabilidade social exercem maior influência na RSE do que percebem as empresas que não publicam balanço social.

·As empresas que publicam relatório de impacto ambiental consideram que todas as OTS em análise, exceto os sindicatos, as organizações religiosas e as organizações de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, exercem maior influência na RSE do que percebem as empresas que não publicam relatório de impacto ambiental.

No futuro:

·As grandes empresas consideram que as organizações ambientalistas e as organizações certificadoras exercerão maior influência na RSE do que as micro e as pequenas empresas.

·As empresas norte-americanas consideram que as organizações ambientalistas exercerão maior influência na RSE do que as empresas brasileiras e as asiáticas.

·As empresas brasileiras e as asiáticas consideram que as organizações de defesa do consumidor exercerão menor influência na RSE do que as empresas europeias e as norte-americanas.

·As empresas europeias consideram que as organizações educacionais exercerão maior influência na RSE do que as empresas brasileiras, as norte-americanas e as asiáticas.

·As empresas que têm descrito o código de conduta consideram que as organizações ambientalistas e as organizações de defesa do consumidor exercerão maior influência na RSE do que as empresas que não o têm.

·As empresas que publicam balanço social consideram que as organizações ambientalistas, as organizações de responsabilidade social e as organizações de defesa do consumidor exercerão maior influência na RSE do que as empresas que não o publicam.

·As empresas que publicam relatório de impacto ambiental consideram que as organizações ambientalistas, as organizações de responsabilidade social, as organizações educacionais e as organizações de defesa do consumidor exercerão maior influência na RSE do que as que não o publicam.

Em seguida, esquematicamente, na Tabela apresentam-se os resultados das entrevistas com as OTS, em que estas abordaram a temática da influência que exercem na responsabilidade social das empresas do PIM.

As duas organizações comunitárias entrevistadas relataram que não têm quaisquer parcerias com as empresas do PIM, não têm influência e não sabem se a terão nos próximos anos.

 

Discussão sobre os resultados

As empresas do PIM percebem que são impactadas pelas OTS e continuarão a sê-lo no campo da RSE, o que pode comprovar que as reivindicações dos stakeholders têm mudado o comportamento das empresas (Auld et al., 2008). A perceção de que as certificadoras são as mais influentes demonstra que ter produtos e processos certificados se tornou uma imposição para as empresas negociarem no mercado internacional.

A perceção das empresas é a de que as organizações religiosas têm baixíssima influência em RSE, o que é contestado pela organização religiosa entrevistada, especialmente porque, no Brasil, a maioria da população segue uma religião. Esse tipo de organização tem um comportamento bastante comedido ao exigir comportamento ético das empresas (Kapstein, 2001; Manhein, 2003).

As ações integradas de diferentes OTS, em distintas questões sociais e ambientais, demonstram a tendência delas de se unirem em torno de interesses comuns, de se ajustarem a diferentes posições e, estrategicamente, de usarem a mídia e o lobby no Governo para assegurarem o alcance dos seus objetivos. Por outro lado, essa situação está causando alguma espécie de competição entre elas por recursos e por «clientes», o que pode levar ao enfraquecimento de algumas delas na medida em que várias outras adentram o seu campo de atuação.

Provavelmente, a perceção do PIM de não crescimento da influência futura dos sindicatos se deva à concorrência de outras OTS. Sobre isso Egels-Zandén e Hyllman (2006) observaram que tem surgido uma diversidade de organizações que se somam aos sindicatos para representar e para defender os interesses dos trabalhadores.

A perspetiva das empresas para o crescimento da influência da generalidade das OTS em RSE pode comprovar a interferência dos stakeholders nos negócios. Nesse caso, as grandes empresas, as multinacionais, as norte-americanas, as europeias, as que possuem código de conduta descrito e as publicam balanço social e relatório de impacto ambiental são as mais capazes de perceber que as OTS têm grande capacidade de impactar nas regras comerciais globais, conforme já tinha informado o Canadian Council for International Cooperation – CCIC (2001). 

 

Conclusão

A proliferação dos direitos democráticos, do capitalismo e da globalização possibilitaram o surgimento e a entrada das OTS no sistema de governança global. Essas organizações trabalham de forma inter-relacionada, formando redes sociais, utilizam seu poder de influência para expandir o alcance dos desejos de diversos stakeholders perante as empresas, integram-se em torno de interesses comuns, utilizando-se de diferentes estratégias para atingir seus objetivos.

As empresas concordam que a generalidade dessas organizações influencia o seu comportamento social e ambiental e que, futuramente, exercerão maior influência do que o fazem atualmente. Destacam-se, nessa perspetiva, as organizações ambientalistas, as organizações de defesa do consumidor, as organizações educacionais, as organizações de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, as organizações de direitos humanos e as associações comunitárias, que são percebidas pelas empresas como as que aumentarão significativamente a influência sobre elas no futuro próximo. Contudo, as OTS certificadoras são percebidas como as que têm maior influência e que a manterão no mesmo nível, nos próximos anos.

Igualmente as OTS, prestativas ou ativistas, amigavelmente ou por embates, confirmam exercer ações que contribuem para mudar o comportamento social e ambiental das empresas. Para isso, utilizam-se de diferentes estratégias, com destaque para a utilização de lobby no Governo e acesso à mídia, o que, entre outros resultados, tem contribuído para melhorar as condições de trabalho, elevar os benefícios, a remuneração e a capacitação dos trabalhadores, além de favorecer a otimização de produtos e processos e de aproximar as empresas em relação aos consumidores. As OTS confirmam intensificar ações em RSE, nos próximos anos.

Por fim, conclui-se que as OTS exercem ampla influência na RSE do PIM e que essa interferência se intensificará ainda mais nos próximos anos, o que deverá ampliar a pressão das OTS para que tais empresas tenham maior comprometimento com as questões da sociedade e do meio ambiente.

 

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Recebido em julho de 2012 e aceite em fevereiro de 2014.
Received in July 2012 and accepted in February 2014.

 

 

Nota

[1]Suframa – Superintendência da Zona Franca de Manaus: autarquia vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior que administra o PIM.

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