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Revista Lusófona de Educação

Print version ISSN 1645-7250

Rev. Lusófona de Educação  no.20 Lisboa  2012

 

Teodoro, António & Jezine, Edineide (Org.) (2011). Movimentos Sociais e Educação de Adultos na Ibero-América. Lutas e desafios. Brasília: LiberLivro.

 

Ana Sofia António*

*sof_antonio@yahoo.com.br

 

O XI Congresso Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, que decorreu na Universidade Federal da Bahia, acolheu no dia 8 de agosto o lançamento do livro Movimentos Sociais e Educação de Adultos na Ibero-América. Lutas e desafios, organizado por António Teodoro e por Edineide Jezine.

São os próprios organizadores que fazem a apresentação, nas primeiras páginas do livro. Trata-se, sem grandes surpresas, de uma apresentação clara e esclarecedora acerca das finalidades, da natureza e dos conteúdos abordados. Pelo que, Teodoro e Jezine começam por descrever sucintamente o aparecimento da Rede Ibero-Americana de Investigação em Políticas Educacionais (RIAIPE), em 2006. Conforme é referido, o RIAIPE foi constituído com o objetivo de se construir um quadro analítico capaz de mapear as políticas desenvolvidas em Educação, nas últimas décadas, em diferentes países: Argentina, Brasil, Chile, Espanha, México, Portugal e Uruguai. Assim, os organizadores deste livro salientam que o RIAIPE tem como finalidade revelar a importância da construção das bases epistemológicas e políticas que conduza a uma agenda educacional "de um novo bloco social interessado em impulsionar (e realizar) políticas progressivas de paz, justiça social, felicidade e liberdade para todos.". É portanto neste contexto que surge a edição da obra Movimentos Sociais e Educação de Adultos na Ibero-América. Lutas e desafios.

Está dividida em duas partes, a primeira parte – O pensar e fazer dos movimentos sociais – é constituída por seis capítulos enquanto a segunda – Educação de adultos e os desafios da emancipação – é composta por cinco. São vários os autores escolhidos para fazerem parte deste desafio: Afonso Celso Scocuglia, Alejandra Montané, Ana Maria Alvarenga, Angel Marzo, António Teodoro, Carlos Alberto Torres, Edineide Jezine, Emília Trindade Prestes, José Beltran, José Eustáquio Romão, Letícia Carneiro Aguiar, Madalena Mendes, Maria da Graça Nóbrega Bollmann e Paula Lindeza; também por isso, vale a pena percorrer os vários capítulos, pois neles podemos encontrar diferentes formas de olhar para uma temática comum. Por outro lado, a nossa atualidade é pautada pelos movimentos sociais que estão a ocorrer em diversas cidades do mundo, muitas vezes, em contestação ao sistema financeiro internacional.

Em O pensar e fazer dos movimentos sociais, título da primeira parte da obra, somos primeiramente conduzidos até ao capítulo de José Eustáquio Romão: Movimentos Sociais, ONGs e Terceiro Setor. O autor defende que procurou, no seu capítulo, introduzir a discussão que se tem estado a fazer dentro do RIAIPE sobre os indicadores educacionais, estes são formulados principalmente pelas agências multilaterais e pelos sistemas nacionais de educação. Romão (2011) refere igualmente que pretende mostrar como os temas dos movimentos sociais, das organizações não-governamentais e do Terceiro Setor se entrelaçam, contudo conclui que estes temas necessitam de estudos empíricos mais exaustivos e aprofundados.

Dançando no convés do Titanic? A Educação de Adultos, o Estado-Nação e os novos Movimentos Sociais. Além de constituir uma agradável metáfora, é também o título escolhido por Carlos Alberto Torres. O autor, apesar de iniciar o segundo capítulo atribuindo à Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) a organização da conferência internacional mais importante sobre educação de adultos, não descura a existência de outras organizações empenhadas na educação de adultos. Aliás, Torres (2009) faz alusão ao Fórum Internacional da Sociedade Civil (2009) em que estiveram reunidas várias das organizações que se preocupam com a educação de adultos. Podemos salientar que o autor classifica como conclusões-chave do Fórum o reconhecimento na legislação, de diferentes nações, de que a educação de adultos é um direito humano; bem como a equiparação da educação popular a um modelo educacional central que pode renovar a educação de adultos em uma perspectiva de transformação social e política. Por outro lado, usando um tom humorado mas crítico, a que, aliás, já nos habituámos, Torres questiona se a VI conferência organizada pela UNESCO foi bem sucedida. Sem querermos reduzir o interesse em torno da questão levantada, podemos adiantar que, de acordo com o autor, esta conferência permitiu promover o interesse de delegados dos Estados-nações e de outros convidados com o objetivo de revigorar programas de educação de adultos. Contudo, Torres (2011), usando a metáfora com que intitula o seu capítulo, sugere que a educação de adultos e a educação continuada têm estado a "dançar no convés do Titanic". Talvez ainda inspirado no desaparecimento de um dos protagonistas, o autor termina o seu artigo salientando a necessidade de se dar atenção aos movimentos sociais.

No terceiro capítulo, Movimentos Sociais em Educação e suas contribuições à Política Educacional Brasileira, Letícia Aguiar e Maria da Graça Bollmann parecem acentuar as especificidades do Brasil. As autoras situam a sua argumentação referindo que o Estado brasileiro se tem caracterizado pela adesão a um modelo económico, assente em políticas orientadas pelos organismos internacionais de crédito – Fundo Monetário, Banco Interamericano de Desenvolvimento e Organização Mundial de Comércio. A argumentação ganha especial importância quando é trazido à discussão o direito de todos a uma educação pública, laica, democrática, gratuita e de qualidade social. Este direito é traduzido, pelas autoras, como um dever do Estado.

Continuando no contexto do Estado brasileiro, o quarto capítulo: O PRONERA como Política de acesso à Educação Superior e os Movimentos Sociais no contexto da Globalização da autoria de Edineide Jezine, visa analisar como o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA) se articula com o acesso e o sucesso dos alunos no Ensino Superior público brasileiro. Neste sentido, a autora define três problemáticas para o seu estudo: como as políticas de acesso à educação superior se configuram na agenda globalizada? Quais as diferenças e significados dos projetos de educação e sociedade para o Estado e os Movimentos Sociais de Reforma Agrária? e Quais as dificuldades dos sujeitos do campo ao terem acesso a Educação superior a partir deste Programa?

Ana Maria Alvarenga e António Teodoro prolongam e aprofundam estas questões no capítulo A Educação e o Movimento Sem Terra, ou Como o Povo (Re)aprende e (Re)constrói a Escola. Os autores não esquecem de sublinhar que o Estado brasileiro é um país marcado por mobilizações sociais desde o início da sua história, nem de salientar que o Movimento Sem Terra faz parte de um movimento de renovação pedagógica caraterizado por pressupostos populares e democráticos. Deste capítulo merece ser citada a expressão "É preciso que seja uma educação fundada não no princípio da inclusão, e sim, sobretudo, no princípio da transformação, no re-aprender e re-significar o mundo." (p.98) pois encerra uma mensagem com um sentido e com uma profundidade únicos.

Nuevos Movimientos Sociales y Propuestas Pedagógicas en Argentina: reconstruyendo la visibilidad del papel político de la educación, o último capítulo, da primeira parte deixa para trás as possíveis particularidades do Estado brasileiro. No entanto, continua a preocupar-se com os movimentos sociais, em especial na Argentina.

Se a primeira parte deste livro nos permitiu uma reflexão profunda acerca dos movimentos sociais, em particular na América latina, na segunda parte somos convidados a pensar a Educação de Adultos e os Desafios da Emancipação.

Madalena Mendes e Paula Lindeza conduzem-nos à primeira reflexão como autoras do capítulo A construção sócio-histórica da Educação de Adultos. Da Educação Permanente à Aprendizagem ao Longo da Vida. As próprias autoras identificam os objetivos do seu texto referindo que procuram analisar o processo de construção e evolução histórica da Educação de Adultos. É, pois, fundamental, no contexto da época que atravessamos em que as lógicas economicistas e gestionárias parecem ecoar em diversas áreas, termos em mente a conclusão a que as autoras chegam: "Situada numa encruzilhada de tensões, ambivalências e reconfigurações, a Educação de Adultos exige a necessidade de um continuado e renovado caminho de questionamento e aprofundamento críticos." (p. 141).

A Educação de Jovens e Adultos na História do tempo presente, título do oitavo capítulo, de Afonso Celso Scocuglia, tem por cerne a leitura e reflexão crítica que o autor faz de La educación de las personas jóvenes y adultas en América Latina y el Caribe – Prioridades de acción en el siglo XXI. Num texto claro, Scocuglia distingue cinco problemáticas que têm sido discutidas no âmbito da Educação de Jovens e Adultos.

José Beltran e Alejandra Montané assinam o nono capítulo – Educación de Personas Adultas para la vinculación social. Logo nas primeiras linhas os autores argumentam que se a Educação de Adultos é um fenómeno histórico, já a sua análise, como corpo teórico, é relativamente recente. Este argumento valida pois toda a leitura do capítulo e naturalmente da obra em que está inserido. Contudo, na parte final do capítulo, Beltran e Montané salientam que, caso a Educação de Adultos seja compreendida como uma nova forma de compromisso cívico e de participação cidadã, pode corresponder a uma possibilidade de transformação social.

Emília Trindade Prestes é autora do décimo capítulo – A Relação entre Educação e Desenvolvimento na América Latina e Caribe e o Discurso da VI CONFINTEA. Como o título indicia, o capítulo é escrito no âmbito da Conferência Internacional de Educação de Adultos, que ocorreu em 2009 e contou com membros de 156 países diferentes. A autora começa, portanto, por contextualizar o seu texto assumindo uma leitura crítica para com as propostas apresentadas na Conferência.

Madalena Mendes, José Eustáquio Romão e Angel Marzo fecham esta obra, sem contudo encerrarem a temática da Educação de Adultos e dos Movimentos Sociais. Em Políticas de Educação de Adultos no Espaço Iberoamericano. (Re)Configurações e Desafios, os autores analisam a três vozes as políticas de Educação de Adultos em Portugal, no Brasil e em Espanha. Num discurso repleto de metáforas e de imagens figuradas renovam a importância da Educação para o futuro que se avizinha.

As últimas páginas do livro oferecem-nos a possibilidade de conhecermos os interesses e os projetos em que os diferentes autores têm estado a trabalhar. É igualmente notória a generosidade dos autores em disponibilizarem o seu endereço eletrónico, vulgo email, convidando os leitores para a interrogação e discussão.

Este é, sem dúvida, um livro que merece ser lido, relido e refletido. Por ser composto por diversos e interessantíssimos artigos de diferentes autorias e, portanto, com pontos de vista distintos, a sua análise crítica surge quase que naturalmente. Não podemos deixar de salientar a importância das referências bibliográficas, que constam em cada capítulo, sobretudo para os jovens investigadores que iniciam agora os seus projetos de investigação.

Um último comentário dirige-se para a importância da Rede Ibero-Americana de Investigação em Políticas Educacionais que, ao assumir o compromisso de dar "uma maior visibilidade da comunidade académica e científica dos países ibero-americanos neste campo específico das políticas de educação", permitiunos comungar nesta reflexão sobre os Movimentos Sociais e sobre a Educação de Adultos.