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Revista Lusófona de Educação

versão impressa ISSN 1645-7250

Rev. Lusófona de Educação  no.23 Lisboa  2013

 

O Diretor de Turma: perfil e competências

The class head-Teacher: profile and skills

Le Professeur Principal: profil et compétences

El Tutor de clase: perfil y competencias

 

Clara Boavista * & Óscar de Sousa **

* Doutoranda em Educação da ULHT
claraboavista@gmail.com

** Director da Licenciatura em Ciências da Educação Subdirector do IE da ULHT Investigador do CeiEF
ossousa@sapo.pt

 

Resumo

Esta investigação visa estudar as conceções que os Alunos e os Diretores de Turma possuem relativamente ao perfil e às funções do Diretor de Turma, bem como analisar as competências que os Diretores de Escola privilegiam num docente para exercer o cargo de Diretor de Turma. Pretende-se saber se, apesar de existir um suporte legislativo que concede a este professor responsabilidades específicas no domínio da coordenação, há inconsistência entre esta atribuição de poderes e a respetiva operacionalização, assim como conhecer o perfil desejado para um Diretor de Turma.

As principais inferências deste estudo reforçam a ideia de que, apesar de haver professores que não se encontram aptos para o exercício desta função, os Diretores de Turma são vistos como pessoas importantes na Escola. Porém, os alunos e os próprios Diretores de Turma não reconhecem, na prática, a autoridade destes docentes relativamente aos demais professores da turma. Quanto ao perfil desejado para um Diretor de Turma, são assinaladas, como as mais importantes, as características do foro psicológico. Das competências privilegiadas pelos Diretores de Escola, destacam-se a disponibilidade, a capacidade de diálogo e de liderança, a experiência, o fácil relacionamento, a tolerância e a dedicação por parte destes docentes.

Palavras-chave: diretor de turma; alunos; perfil; competências; funções.

 

Abstract

This inquiry aims at defining the profile of class manager in the context of the supervision of the School. Main objective of this work is to study which conceptions that the students and the Class Head-Teachers have in regard to Class Head- Teacher´s profile and functions as well as to analyze the competencies/skills that a School Principal requires most from a teacher chosen as Class Head-Teacher. Knowing that there is legislation which grants specific responsibilities to Class Head-Teacher, in the domain of the coordination, it is also intended to know if there exists any inconsistency between this legal attribution and its efficacy in practice. Furthermore, it is also intended to know if the profile required for a Class Head-Teacher, suits the school principal´s perspective, other class teachers and students.

The chosen methodology was of a descriptive nature. We have chosen 198 students from the 9th grade (Junior-High) as target, from six different schools, from the Setúbal district, covering a total of nine classes, with their respective teachers, plus three public School Principals. Students and Class Head-Teachers have answered questionnaires and their responses, grading them on a scale of attitudes. We also used semi-structured interviews, which were sent to School Principals

The main conclusion of this study reinforced the idea that Class Head-Teachers are seen as important in the School, even if they do not have the profile for this function. Yet pupils and Class Head-Teachers themselves do not recognize, in practice, their authority regarding their fellow teachers of the group. School Principals consider the position of Class Head-Teacher as charged with many responsibilities, although in practice the appointment of the Class Head-Teacher is often made without consideration of his training or lack of it, in the area of interpersonal relationships and mediation. As to the desired profile for a Class Head-Teacher, psychological qualities are considered more important than the physical one. In what concerns the skills the Class Head-Teachers should have, the School Directors consider that experience, capacity of leadership, dialogue, good relationship, tolerance and dedication are the most important priorities for the selection of a Class Head-Teacher. For his functions among students it should be noted that both, Class Head-Teacher and students regard “Mediation” as the main role.

Even though, there is legislation that mentions, in detail, what are the administrative responsibilities and profile of the Class Head-Teacher. It is important to understand if the powers that are granted match the challenges the head-teachers face every day in the educational field.

Keywords: head-teacher; students; profile; skills; functions.

 

Résumé

Le but de cette recherche est d’étudier les conceptions que les étudiants et les professeurs principaux ont sur le profil et les fonctions d’un professeur principal, mais aussi d’analyser les compétences que les Principaux des écoles considèrent fondamentales pour qu’un professeur puisse accomplir les tâches du directeur de classe. Il s’agit de savoir si, malgré l’existence d’un support législatif qui accorde à ce professeur des responsabilités spécifiques dans le domaine de la coordination, il y a de l’incohérence entre cette attribution de pouvoirs et la respective opérationnalisation, ainsi que connaître le profil souhaité pour un professeur principal.

Les principales inférences de cette étude renforcent l’idée que, malgré l’existence de professeurs qui ne se trouvent pas aptes à exercer cette fonction, les professeurs principaux sont envisagés comme des sujets importants dans l’École. Toutefois, les étudiants et les professeurs principaux, eux - mêmes, ne reconnaissent pas, dans la pratique, l’autorité de ces professeurs par rapport aux autres professeurs de la classe. En ce qui concerne le profil souhaité pour un professeur principal, on souligne les caractéristiques au niveau psychologique comme les plus importantes. De toutes les compétences mises en évidence par les Principaux, on détache la grande disponibilité, la capacité de dialogue et de leadership, l’expérience, la bonne entente, la tolérance et le dévouement de la part des professeurs principaux.

Mots-clés: professeur principal; étudiants; profil; compétences; fonctions.

 

Resumen

Esta investigación tiene como objetivo estudiar las concepciones que los Alumnos y Tutores de Clase tienen relativamente al perfil y funciones de un Tutor de Clase, así como analizar las competencias que los Directores de Escuela privilegian en un docente para ejercer el cargo de Tutor de Clase. La finalidad es determinar si, a pesar de existir un apoyo legislativo que concede a este profesor responsabilidades específicas en el ámbito de la coordinación, existe inconsistencia entre esta atribución de poderes y la respectiva operacionalización, así como conocer el perfil deseado para un Tutor de Clase.

Las inferencias principales de este estudio refuerzan la idea de que, a pesar de existieren profesores que no están capacitados para ejercer esta función, los Tutores de Clase son vistos como personas importantes en la Escuela. Sin embargo, los alumnos y los propios Tutores de Clase no reconocen, en la práctica, la autoridad de estos docentes relativamente a los demás docentes de la clase. En cuanto al perfil deseado para un Tutor de Clase, señalan-se las características del nivel psicológico como los más importantes. De las competencias privilegiadas por los Tutores de Clase, se destacan la disponibilidad, la capacidad de diálogo y de liderazgo, la experiencia, la facilidad en relacionarse, la tolerancia y la dedicación por parte de estos docentes.

Palabras clave: tutor de classe; alumnos; perfil; competencias; funciones.

 

Introdução

O Diretor de Turma exerce na escola uma valiosa atividade, a qual julgamos merecer uma profunda reflexão. Este docente constitui um elemento determinante na mediação de conflitos, que não se encerram apenas no recinto escolar, ramificando-se e multiplicando-se por toda a comunidade educativa. Acumula ainda numerosas funções burocráticas, necessitando de desenvolver, através de técnicas específicas, capacidades para o exercício de todas as tarefas de coordenação que executa.

Reconhece-se este gestor pedagógico como acumulando uma tripla função, ou seja, a relação estabelecida com os alunos e com os encarregados de educação, além da relação estabelecida com os demais professores da turma. Assim, o Diretor de Turma é um professor posicionado numa estrutura pedagógica de gestão intermédia da escola, particularmente centrado nos alunos e na gestão dos mesmos, especializado na organização de um trabalho cooperativo entre os diferentes professores da turma que dirige, em benefício do desenvolvimento intelectual e pessoal destes discentes. O Diretor de Turma constitui uma peça fundamental na relação interna entre o grupo – turma e o grupo – professores, bem como na relação externa que estabelece com os encarregados de educação.

A massificação da escola portuguesa nas derradeiras décadas do século XX comporta transformações quantitativas e qualitativas, deixando a descoberto a inadequação das suas estruturas organizacionais para responder aos novos problemas que nela se revelam e às novas finalidades que lhe são conferidas (Formosinho & Machado, 2008). As rápidas mutações demográficas, tecnológicas e sociais, levam-nos a reconhecer que a escola é um sistema que necessita do apoio de outros sistemas para que, em conjunto, formem uma rede de apoio ao aluno, sem a qual o seu desenvolvimento não será possível. Todavia, à crescente heterogeneidade dos alunos tem sido associada uma diminuição da qualidade dos ambientes comunitários e destas redes de apoio.

O Diretor de Turma ocupa uma posição importante nas estruturas de gestão intermédia da escola. Ele possui um papel fundamental numa estrutura que envolve a coordenação das atividades dos professores do mesmo agrupamento de alunos, coordenação interdisciplinar horizontal (Formosinho, 1987). Para responder a esta função o Diretor de Turma necessita de estar preparado, visando cumprir todas as valências que são da sua responsabilidade. Mais do que conhecer a legislação e as funções que dela decorrem, este docente carece de uma visão integradora de todos os recursos da escola e da comunidade educativa, de modo a ser capaz de responder a todos os desafios presentes no Projeto Educativo1 da escola.

Contudo, parece pertinente verificar se qualquer exercício do cargo de Direção de Turma operacionaliza todas as potencialidades do mesmo, visando o envolvimento das famílias e a implementação de um trabalho de colaboração entre encarregados de educação, professores e alunos. Em estudos relativos a escolas de qualidade, Harris, Hopkins e Leithwood (2008) referem a necessidade de envolver todos os atores num compromisso de mudança, perspetivando a melhoria das aprendizagens dos alunos. Urge equacionar o que motiva a Direção de Turma a possuir, predominantemente, as características apontadas e desenvolver estudos que possam evidenciar formas criativas e dinâmicas de desempenho das funções dos Diretores de Turma, relativamente à forma como ultrapassam os inúmeros obstáculos e como os superam. Ora, apesar de haver um enquadramento legislativo que lhes concede responsabilidades específicas na coordenação dos professores da turma, existe uma certa inconsistência entre esta atribuição de poderes e a respetiva operacionalização.

Esta visão global da situação levou-nos a formular a seguinte questão de investigação à qual nos propusemos analisar: o que pensam os docentes que exercem o cargo de Diretor de Turma, os alunos do 9º ano de escolaridade e os Diretores de Escola sobre o perfil e as funções que são atribuídas aos Diretores de Turma, as inovações que gostariam de ver introduzidas e os constrangimentos que sentem no dia – a – dia?

1. O diretor de turma e a gestão intermédia da escola

Nas últimas duas décadas, um conjunto de fenómenos sociais proporcionaram aos investigadores que se debruçassem primeiramente sobre a escola, enquanto instituição, e, posteriormente, enquanto organização. Tais reflexões contribuíram para o avanço do conhecimento sobre questões organizacionais, introduzindo inovações, rumo a mudanças necessárias e visando situações sociais emergentes.

Definir a organização escolar é uma tarefa árdua, na medida em que delimitar os conteúdos a serem inseridos nesse contexto evoca a limitação e a polissemia dos termos, além das diferentes perspetivas dos autores que constroem as suas definições de um lugar determinado, com bagagens e repertórios distintos, mais ou menos próximos do universo escolar e dos seus atores, como refere Nóvoa (1992). Clarificando este conceito, poder-se-á afirmar que a organização escolar tem como base múltiplos procedimentos, intimamente relacionados entre si, regulando a vida escolar, quer ao nível dos grupos disciplinares quer ao nível do conjunto de docentes que lecionam a mesma turma e, particularmente, do professor com a turma.

A partir do desenvolvimento da Lei de Bases do Sistema Educativo que aprova o regime de autonomia, administração e gestão dos estabelecimentos do ensino não superior e do Decreto – Lei nº 115 – A/98, de 4 de maio, são afastadas soluções normativas de modelo uniforme de gestão, até então dominantes, adotando-se uma lógica de matriz e estabelecendo regras claras de responsabilização.

Todavia, para que o processo de ensino – aprendizagem seja organizado, visando a sua orientação nas múltiplas dimensões do desenvolvimento do aluno, é necessário estipular um professor que exerça o papel de liderar todo este processo, de modo a que este e o grupo – turma possam alcançar os objetivos educativos (Brás, 2000). É de realçar que a escola tornou-se o local onde o sucesso ou o insucesso é produzido (Lima, 2009), sendo na turma que a participação democrática, a educação para a cidadania, emerge e flui (Conceição & Sousa, 2012).

O Diretor de Turma, no exercício de coordenação interdisciplinar relativamente aos diferentes professores da turma, é colocado numa interface entre duas áreas de intervenção: a docência e a gestão. Assim, ele é simultaneamente um elemento do sistema de gestão da escola, a quem competem responsabilidades na gestão geral no Conselho de Turma a que presidir. As vertentes de atuação do Diretor de Turma visam corresponder aos seus diferentes interlocutores: alunos, professores e encarregados de educação. Contudo, a sua prevalência recai sobre os demais docentes da turma, dimensão fundamental do exercício deste cargo.

É de inequívoca importância o papel que a Direção de Turma desempenha em toda a dinâmica escolar, pelo que todos os aspectos relacionados com a sua atividade revestem-se de uma atenção particular e de uma regulamentação cuidada e adequada, com vista a que os seus objetivos e os da sociedade, em geral, sejam alcançados com sucesso.

2. Abordagem Empírica

Apesar da relevância e da multiplicidade de funções que o Diretor de Turma desempenha, parece-nos que ao nível normativo nem sempre existe um critério rigoroso de lhe proporcionar todas as condições organizacionais e competências profissionais para o desempenho da sua atividade. Além disso, é de salientar o sistema organizacional no qual o exercício do cargo de Diretor de Turma se insere, no quadro da atual escola de massas, bem como a atualidade do tema em questão.

Para responder à questão de investigação anunciada anteriormente, foram elaborados os objetivos específicos deste estudo. Assim, estes pautaram-se por estudar as conceções que o Diretor de Turma e os alunos possuem quanto ao perfil e às funções que cabem ao Diretor de Turma, no contexto da escola atual, bem como analisar as competências que o Diretor de Escola privilegia num docente para exercer o cargo de Diretor de Turma.

A metodologia a aplicar no presente estudo foi do tipo descritivo. Tratou-se de uma população constituída por 475 alunos do 9º ano de escolaridade de seis escolas públicas, pertencentes aos concelhos de Almada e Seixal, Diretores de Turma e Diretores de Escola. A partir desta população procedeu-se à extração de uma amostra, de forma aleatória simples, constituída por 198 alunos, pertencentes a nove turmas do 9º ano de escolaridade do ensino básico. Foi objetivo da presente investigação que qualquer aluno das seis escolas públicas selecionadas fruísse da mesma probabilidade de integrar a amostra e de credibilizar os resultados, para que estes pudessem ser generalizados à população em análise. Além dos alunos, fizeram parte integrante desta amostra os nove Diretores de Turma das respetivas turmas, bem como Diretores de Escola de três escolas públicas selecionadas aleatoriamente.

Para ter acesso à opinião dos alunos e Diretores de Turma recorreu-se à técnica de recolha de dados por “questionário estruturado” (Fox, 1987), fundamentado no quadro teórico que serviu de base a esta investigação. Foram aplicados dois tipos de questionário, especificamente elaborados para estes dois grupos distintos da amostra.

Os dados provenientes dos inquéritos realizados aos alunos e Diretores de Turma foram processados e analisados através de uma folha de Cálculo Excel, tendo-se efetuado uma Análise de Conteúdo a todas as respostas em formato aberto.

Responderam a este inquérito 198 alunos do 9º ano de escolaridade do ensino básico, sendo 104 dos inquiridos do sexo feminino e 94 jovens do sexo masculino, e 9 Diretores de Turma, 6 do sexo feminino e 3 do sexo masculino.

Quanto às funções que o Diretor de Turma desempenha relativamente aos alunos, as respostas podem ser resumidas de acordo com Gráfico nº 1.

 

 

Da análise dos resultados foi possível concluir que, relativamente às funções que o Diretor de Turma desempenha face aos alunos, a “Mediação” é a mais importante, segundo opiniões dos alunos (24%) e dos professores (29%). Os docentes conferem o mesmo teor percentual (29%) para a categoria “Integração e orientação do aluno na vida escolar”. A “Apreciação dos problemas educativos e disciplinares dos alunos” é a segunda categoria mais referenciada pelos alunos (18%), embora os docentes apenas atribuam um nível percentual de 14% para esta última, seguida da categoria “Verificação semanal do registo de faltas”, com 21% e 7% para a “Avaliação da dinâmica global da turma”. Evidencia-se a ausência de respostas, por parte dos docentes, relativamente às funções consignadas na lei e classificadas por “Reuniões entre alunos, Diretor de Turma e demais elementos da comunidade educativa”, “Compreensão e aceitação dos aspectos comportamentais dos alunos” e “Organização/implementação do desenvolvimento curricular”. Relativamente aos alunos, a função dos Diretores de Turma que merece uma menor relevância é aquela que está relacionada com a organização e implementação do desenvolvimento curricular, totalizando 3% das respostas dadas.

Quando é questionado aos alunos e Diretores de Turma quais as funções que o Diretor de Turma desempenha relativamente aos professores da turma, as respostas são múltiplas e podem ser resumidas no Gráfico nº 2.

 

 

Assim, relativamente aos professores da turma, os docentes e os alunos ci-tam como função principal a “União entre os vários elementos da comunidade educativa”, totalizando 50% e 28%, respetivamente. A categoria “Garante de um clima favorável em contexto de sala de aula” obteve uma percentagem de 17% e 25%, na opinião dos docentes e dos alunos respetivamente. Estranhamente, os docentes não referem “Reuniões de Conselho de Turma” e “Organização do Dossiê de Turma” como constituindo tarefas da vida escolar. Ambas as partes inquiridas atribuem um valor semelhante à função designada pela categoria “Coordenação pedagógica e interdisciplinar dos professores da turma”, com níveis de 25% e 21% para docentes e alunos, respetivamente. À categoria “Planificação e avaliação de Projetos de âmbito interdisciplinar”, os docentes e os alunos atribuíram valores reduzidos de 8% e 4%, respetivamente. Ainda, no que concerne à coordenação pedagógica e interdisciplinar dos professores da turma, salienta-se que este foi o motivo dado pelos Diretores de Turma que justificava 9% dos encontros entre o Diretor de Turma e os professores da turma. Desta forma, embora os docentes tivessem corroborado a ideia de que não se sentem como coordenadores dos professores da turma, a verdade é que assumem, timidamente, esta função.

Deste modo, os alunos espelham a importância da figura do Diretor de Turma relativamente a um bom ambiente de trabalho na sala de aula e na união entre os diferentes elementos da comunidade educativa, bem como na coordenação pedagógica e interdisciplinar dos professores da turma. Contudo, não reconhecem o trabalho deste docente no que pertence à organização do Dossiê de Turma e à planificação e avaliação de projetos de âmbito interdisciplinar. A Portaria nº 921/92, de 23 de setembro, estabelece as competências do Diretor de Turma e, de entre outras, afirma que compete a este professor presidir às reuniões de Conselho de Turma, onde deverá ser elaborada a planificação e avaliação dos projetos de âmbito interdisciplinar. Todavia, parece clara a existência de algumas inconsistências nesta matéria, tendo em atenção que também os delegados de turma são convocados para assistir às reuniões de Conselho de Turma.

Por último, no que concerne aos encarregados de educação, há a registar que 33% das opiniões dos docentes citam a função “Organização e convocatória de reuniões com encarregados de educação para informações sobre o comportamento, assiduidade e aproveitamento dos alunos”, enquanto 76% das opiniões dos alunos referem esta categoria. Para os docentes, a categoria mais mencionada alcançou 45% e refere-se ao “Estabelecimento de contactos diversos com os encarregados de educação”, tendo a mesma categoria alcançado, na opinião dos alunos, a percentagem de 13%. A função relativa à “Reflexão com os encarregados de educação sobre o papel que estes desempenham com os filhos em família” não mereceu, por parte dos Diretores de Turma inquiridos, qualquer referência, conforme é possível visualizar no Gráfico nº 3. Os alunos atribuíram às categorias “Estabelecimento de contactos diversos com encarregados de educação”, “Família e modelo participativo de colaboração” e “Reflexão com os encarregados de educação sobre o papel que estes desempenham com os seus filhos em família”, 13%, 9% e 2%, respetivamente.

 

 

Após análise destes resultados, é possível concluir que a principal função reconhecida pelos discentes, relativamente aos encarregados de educação, é pautada pela “Organização e convocatória de reuniões com encarregados de educação para informações sobre comportamento, assiduidade e aproveitamento dos alunos”, detentora de caráter informativo. Tal fato sugere-nos que existe o cumprimento da lei no que concerne a esta matéria, pese embora fique a sugestão de que o cumprimento não se verifica quanto ao estabelecimento de diferentes contactos com os encarregados de educação e, muito concretamente, quanto à participação da família como parceira de educação dos seus educandos.

Com o intuito de se obter um desenho relativo ao perfil do Diretor de Turma, foram registadas 98 características, privilegiadas pelos alunos inquiridos e consideradas fundamentais para o exercício do cargo de Diretor de Turma. Da análise e classificação destes atributos é possível constatar que as cinco características mais mencionadas pelos alunos são: “Responsável” (52%), “Simpático” (29%), “Compreensivo” (24%), “Amigo” (23%) e “Paciente” (17%). Salienta-se que dos 98 atributos referenciados, os que se referem ao perfil psicológico são os mais desejados na escolha de um perfil ambicionado para o Diretor de Turma (41%).

Ainda, com o objetivo de delinear um perfil do Diretor de Turma, foi solicitado aos sujeitos inquiridos que se pronunciassem relativamente a um conjunto de 11 proposições. Para uma melhor visualização dos resultados procedeu-se à elaboração de um gráfico de linhas, Gráfico nº 4, possuidor de duas linhas, respeitantes às conceções dos docentes (vermelho) e dos alunos (castanho) quanto à delineação de um perfil para o Diretor de Turma. Refira-se que em ordenadas, dada a acentuada desigualdade entre o número de alunos e docentes inquiridos, figura uma escala, em termos percentuais, das respostas ponderadas dos sujeitos. Os valores representados em abcissas representam as proposições referentes ao perfil desejado para o Diretor de Turma.

 

 

Relativamente ao que o Diretor de Turma representa para os alunos, é possível verificar que as afirmações nº 2 (“o professor que informa os teus pais sobre o teu aproveitamento, faltas e comportamento”) e nº 4 (“o professor que se preocupa com a tua vida escolar”) obtiveram níveis de concordância elevados. Estas afirmações estão relacionadas com a função do Diretor de Turma face aos encarregados de educação, no que concerne à transmissão de toda a informação relativa ao aproveitamento, assiduidade e comportamento do aluno, bem como à preocupação demonstrada por este docente quanto à vida escolar destes estudantes.

Com um teor de concordância um pouco menos elevado, temos as afirmações nº 10 (“o professor que coordena os outros professores da turma”), nº 11 (“o professor a quem deveria ser atribuído prestígio e dignificação pela sua atividade, considerada fundamental nas nossas escolas”) e nº 5 (“o professor que se preocupa com o teu bem – estar social”).

As afirmações que obtiveram nível de concordância relativamente baixo foram as afirmações nº 9 (“o professor amigo que defende sempre os teus interesses”), nº 6 (“o professor a quem recorres para ajudar a resolver os teus problemas”), nº 3 (“o professor fiscalizador”) e nº 8 (“o professor em quem confias e podes fazer as tuas confidências”).

Com alto nível de discordância encontramos as afirmações nº 7 (“o professor que, embora conhecendo os teus problemas, não contribui para a sua resolução”) e nº 1 (“o mesmo que qualquer outro professor da turma”). Estes resultados permitem-nos concluir que os alunos reconhecem a importância e o contributo do Diretor de Turma face à resolução dos problemas dos alunos, bem como a figura singular que este docente representa, comparativamente aos restantes professores da turma.

Interpretando os dados recolhidos, tendo em atenção as onze proposições citadas, é possível concluir que os alunos consideram o Diretor de Turma um professor, cujo perfil é pouco semelhante ao perfil de qualquer outro docente da turma, que “coordena os outros professores” e que, embora possuindo autoridade sobre os demais professores, não os controlam. Além disso, apreciam-no como um docente que se “preocupa com o bem – estar social dos alunos”, ideia que também é corroborada pelos professores inquiridos, embora estes últimos considerem que o perfil de um Diretor de Turma não deva ser igual a qualquer outro professor. Tanto os discentes como os docentes inquiridos afirmam que o perfil de um Diretor de Turma não deverá ser pautado por um professor “fiscalizador”, nem por um “professor indiferente”, devendo o perfil deste docente ser delineado por “um professor que se preocupa com a vida escolar dos alunos”. Os professores não concordam que o Diretor de Turma deva ser um “professor amigo dos seus alunos e que defenda sempre os seus interesses”, embora alguns discentes exprimam essa vontade, fato declarado pelo nível de concordância atribuído à afirmação supracitada. Relativamente à afirmação nº 8, “ser um professor confidente, em quem os alunos confiam e podem fazer as suas confidências”, apesar de os docentes atribuírem elevado nível de concordância, muitos alunos não lhes confiam as suas revelações, não os encarando como alguém em quem possam confiar e, apesar de os docentes afirmarem que o Diretor de Turma é um “um professor disponível”, a quem os alunos recorrem frequentemente para os ajudar na resolução de problemas, al-guns discentes discordam deste fato, conforme opiniões recolhidas. Ambas as partes inquiridas declaram que o Diretor de Turma deverá possuir a “capacidade de informar os encarregados de educação sobre o aproveitamento, faltas e comportamento dos alunos”. Embora os docentes entendam que os Diretores de Turma não deverão “coordenar os outros professores da turma”, consoante declarações no inquérito que lhes foi dirigido e baixo nível de concordância visualizado no gráfico em análise, os alunos atribuem-lhes elevados níveis de coordenação, admitindo, ambas as partes inquiridas, que ao Diretor de Turma “deveria ser atribuído prestígio e dignificação pela sua atividade, considerada fundamental nas nossas escolas”.

Em termos globais, a afirmação nº 2 foi aquela que suscitou, por parte dos alunos, o maior nível de concordância, fato que nos confirma o indubitável valor do Diretor de Turma, quanto à transmissão de informações referentes aos alunos face aos encarregados de educação. A afirmação que causou maior nível de discordância foi a afirmação nº 7, caso revelador da importância atribuída ao Diretor de Turma, no que concerne à contribuição do mesmo para a resolução dos problemas dos estudantes. Em comum, encontramos a categoria “Alunos/ Turma”, ocupando o centro das atenções quanto à concordância e discordância por parte destes jovens.

Todos os sujeitos que fizeram parte integrante desta investigação afirmaram que nem todos os docentes reúnem condições para o exercício do cargo de Diretor de Turma. Um dos fatores que leva os docentes inquiridos a concluir que nem todos os professores reúnem condições para o exercício do cargo de Dire-tor de Turma é a ausência de capacidade de liderança por parte dos mesmos. Por outro lado, todos os sujeitos inquiridos neste estudo reconhecem a importância do Diretor de Turma na escola, considerando-a transversal ao 2º ciclo e 3º ciclo do ensino básico, bem como ao nível do ensino secundário.

Salientam-se as opiniões dos Diretores de Escola ao evidenciarem que as funções mais importantes exercidas por um Diretor de Turma são as de natureza pedagógica, pautadas pela coordenação de uma equipa de professores do Conselho de Turma, conjuntamente com a relação estabelecida com os encarregados de educação. No que se refere à coordenação de um ensino com critérios de integração e interdisciplinaridade, os Diretores entrevistados declararam que a capacidade de coordenação dos Diretores de Turma poderá ser melhorada, visando o alcance de uma maior interdisciplinaridade. Ainda, neste contexto, os Diretores esclarecem que a tarefa de coordenação possui muitas falhas, em virtude dos Diretores de Turma se concentrarem demasiado nos momentos de avaliação dos alunos, subestimando outras áreas de intervenção igualmente importantes. Referem que além destas tarefas exercem outras de caráter burocrático, consideradas necessárias e inevitáveis. Acrescentam que os Diretores de Turma executam excessivas funções, fruto de “reformas construídas pela dinâmica das próprias escolas”, pelo que as presentes funções dos Diretores de Turma não deveriam ser regulamentadas. Salientam ainda que a escola deveria encontrar o seu próprio modelo de organização, com o objetivo de dar resposta às necessidades de cada realidade escolar. Concluem, por isso, que o Diretor de Turma exerce muito mais funções do que as que são consagradas na lei e, como tal, estas deveriam ser redefinidas.

Globalmente, é constatado que existem algumas incongruências, de entre as opiniões devolvidas pelos alunos, relativamente à autoridade do Diretor de Turma face aos restantes professores da turma, o que poderá ser esclarecedor de alguma improficiência por parte deste docente em reconhecer e/ou saber lidar com o seu poder formal ao nível da organização que representa. Este fato é igualmente analisado pelos Diretores de Escola que reconhecem a reduzida capacidade do Diretor de Turma em assumir o estatuto de coordenador e exercer a autoridade, ainda que “democrática”, face aos seus pares. Porém, verifica-se que estes professores, timidamente, “coordenam” mas não “controlam” os restantes professores da turma. É neste enquadramento legislativo, onde são consentidas responsabilidades específicas aos Diretores de Turma na coordenação de professores da turma, que existe incongruência entre esta atribuição de poderes e a respetiva operacionalização.

No que se refere à dignificação da atividade do Diretor de Turma, os Diretores de Escola referem que a este papel deveria ser atribuído um maior prestígio, realçando a “dureza” desta tarefa. Entendem que o Ministério da Educação poderia respeitar melhor os Diretores de Turma, não lhes criando “dificuldades permanentes ao efetuarem mudanças sistemáticas e readaptações contínuas à legislação”. Acrescentam ainda que os Órgãos Centrais não deveriam exigir o cumprimento de tantas obrigações e tarefas, face a tão reduzido tempo que estes possuem neste “clima de precariedade”.

No que diz respeito ao atendimento que as escolas proporcionam à família, os Diretores afirmam que, muitas vezes, em virtude de existirem cada vez mais famílias desestruturadas, existem inúmeras dificuldades de comunicação, verificando-se desconfiança por parte dos encarregados de educação. Concluem que, desta forma, a realidade das famílias não contribui para a participação efetiva na vida escolar dos alunos.

Relativamente ao modo como os Diretores de Turma encaram e relacionam as suas competências legais com as suas práticas organizacionais, foi possível verificar que os professores encaram as suas competências e as suas práticas de acordo com as suas experiências e as suas capacidades.

Por fim, quanto ao fato de o Diretor de Turma poder ser encarado como “um garante de um clima favorável em contexto da sala de aula para todos os professores da turma”, os Diretores de Escola confessam que nem todos conseguem este efeito da mesma maneira, dependendo da experiência e da capacidade de trabalho de cada um.

Conclusões

O Diretor de Turma é assumido como sendo uma figura de gestão intermédia da escola, depositário de responsabilidades particulares no que concerne à coordenação dos professores da turma, à promoção do desenvolvimento social e pessoal dos alunos e sua integração no ambiente escolar, assim como ao relacionamento estabelecido entre a escola, os encarregados de educação e a comunidade escolar.

Através da Portaria nº 970/80, de 12 de novembro, foi definido um perfil específico para o Diretor de Turma, embora na época a ausência de profissionais qualificados nas escolas permitisse a escolha de professores sem qualquer formação específica para o desempenho desta tarefa. Na Portaria citada foram legislados os requisitos desejáveis para o Diretor de Turma, devendo os atributos deste docente serem passíveis de criar e desenvolver condições para a integração correta dos alunos na vida escolar, assegurar aos professores da turma a existência de meios, documentos de trabalho e orientação necessários ao desempenho das atividades, garantindo a participação efetiva dos professores na planificação das tarefas a desenvolver, na ação disciplinar e nas ações de informação e esclarecimento de alunos, pais e encarregados de educação (Portaria nº 970/80, de 12 de novembro).

É de referir que as especificidades conferidas ao Diretor de Turma, através da Portaria 970/80, de 12 de novembro, são semelhantes às que atualmente vigoram, especificadas no Decreto – Lei nº 115-A/98 e no Decreto Regulamentar nº 10/99, de 21 de julho.

Neste estudo podemos constatar algumas discrepâncias, quanto às funções que o Diretor de Turma desempenha e às que os alunos identificam como sendo parte integrante do seu trabalho. Assim, alguns estudantes não reconhecem no Diretor de Turma a responsabilidade de sanções e recompensas aplicadas aos alunos mais rebeldes, nem a responsabilidade de convocar reuniões ordinárias do Conselho de Turma, sempre que este o entenda. De igual modo, alguns destes jovens não concordam com a ideia de que este docente introduza o modelo participativo de colaboração com a família, nem reconhecem que o mesmo elabore, para os alunos retidos, um relatório incluindo uma proposta de repetição de todo o plano de estudos desse ano ou de cumprimento de um plano de apoio específico, nem que o mesmo tenha a capacidade de prever situações e de resolver os problemas sem os deixar avolumar. Também não reconhecem a função de coordenação, relativamente aos professores e ao ensino, nem as que se referem ao desempenho de algumas das suas tarefas, nomeadamente “providenciar condições para que seja assegurada aos professores da turma a existência de meios e documentos de trabalho e de orientação necessários ao desempenho das atividades e proporcionar aos alunos formação geral adequada ao prosseguimento de estudos, observando as suas tendências e aptidões, visando orientá-los em estudos posteriores”, de acordo com as opiniões recolhidas dos alunos.

Alguns professores consideram não ser necessária formação específica, visando o desempenho do cargo de Diretor de Turma. Todavia, os Diretores de Escola entrevistados consideram fundamental a existência de formação nesta área.

Nesta pesquisa fica claramente percetível a ideia de que os principais fatores limitativos ao exercício da atividade dos Diretores de Turma são o tempo reduzido de que estes docentes dispõem, o excesso de burocracias com que são confrontados no exercício das suas tarefas, as dificuldades sentidas em contatar os encarregados de educação, o próprio perfil dos encarregados de educação, o contexto familiar no qual os alunos estão inseridos, o excesso de alunos por turmas e fatores de ordem social, nomeadamente a dificuldade que os Diretores de Turma sentem em exercer a autoridade que lhe é inerente, enquanto coordenador de um grupo de professores, e gerir a horizontalidade da relação com os seus pares.

Refira-se que os Diretores de Escola consideram que a falta de experiência profissional e a capacidade de trabalho de cada docente são fatores condicionantes ao exercício do cargo de Diretor de Turma, bem como a ausência de espaços adequados, destinados ao atendimento dos encarregados de educação que, por este motivo, obrigam as escolas a utilizarem anualmente soluções de recurso, visando dar respostas às necessidades das mesmas. Referem que a própria legislação, ao estar permanentemente em mudança, é condicionante ao exercício desta atividade. Salientam o fato do cargo de Direção de Turma exigir muitas responsabilidades que o Diretor de Turma não deveria assumir, por não possuir formação na área do relacionamento interpessoal e mediação, devendo, por isso, a designação destes docentes ser pautada por um perfil concreto.

Tal como os Diretores de Escola afirmam, existem docentes que se sentem muito inseguros e outros que não possuem competências para desempenharem determinadas tarefas, pois concluem que a “capacidade de liderança não é definida por decreto”, estando intimamente relacionada com as características pessoais e a personalidade de cada indivíduo. Consideram, por tal motivo, que o exercício do cargo de Diretor de Turma não deverá advir de um horário que é necessário completar, pelo que a escolha de Diretores de Turma deverá ser concebida com base no perfil humano e de competências de um professor.

 

Referências Bibliográficas

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Legislação consultada

Decreto – Lei nº 115-A/98, de 4 de maio.

Decreto – Lei nº 75/2008, de 22 de abril.

Decreto Regulamentar nº 10/99, de 21 de julho.

Portaria nº 970/80, de 12 de novembro.

Portaria nº 921/92, de 23 de setembro.

 

Data de Submissão: Fevereiro de 2012

Data de Avaliação: Maio de 2012

Data de Publicação: Abril de 2013

 

Notas

1 Projeto Educativo é “o documento que consagra a orientação educativa da escola, elaborado e aprovado pelos seus órgãos de administração e gestão para um horizonte de três anos, no qual se explicitam os princípios, os valores, as metas e as estratégias segundo os quais a escola propõe cumprir a sua função educativa” (Artigo 3º do Decreto – Lei nº 115-A/98, de 4 de maio).