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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  n.24 Lisboa dez. 2009

 

Intervenções Internacionais

Sónia Rodrigues[*]

 

 

Mats Berdal e Spyros Economides (eds.), United Nations Interventionism: 1991-2004

Nova York, Cambridge University Press, 2007, 303 pp.

Em United Nations Interventionism: 1991- -2004 a problemática das intervenções internacionais é revisitada por Mats Berdal e Spyros Economides, numa edição composta com o contributo de professores universitários, diplomatas e funcionários internacionais. Com recurso a oito casos de estudo paradigmáticos dos anos 1990, os vários autores procuram identificar os principais actores envolvidos nas respectivas intervenções internacionais, descrever o contexto de enquadramento específico no terreno – antes, durante e após a presença das Nações Unidas –, elucidar sobre o timing nas relações de poder dos actores internacionais e estabelecer lesson learnings para futuras missões. Enquanto que os insucessos internacionais na Somália e no Ruanda estabeleceram constrangimentos empíricos às posteriores intervenções internacionais, o envolvimento das Nações Unidas em Timor Leste e no Kosovo são considerados casos de relativo sucesso. Os autores analisam também a incapacidade estrutural das missões das Nações Unidas em cumprir o ambicioso mandato no Camboja e as dificuldades internacionais em acompanhar a evolução das relações de poder intrínsecas ao contexto interno e regional no caso da Serra Leoa. É igualmente abordada a presença das Nações Unidas na Jugoslávia, e a respectiva coordenação com as missões da nato e da União Europeia, e no Haiti, através de diversas configurações institucionais. Na obra são inequívocos os dilemas e os constrangimentos das intervenções internacionais, na medida em que «para se fazer a paz tem que se decidir, ou influenciar, quem governa no pós-guerra» e como o poder é repartido, razão pela qual as partes envolvidas divergem a priori. Ao nível de sucesso ou de insucesso da intervenção das instituições internacionais em situações de conflito subjaz uma opção basilar: ou se é imparcial e se assume o controlo ilimitado, ou se é parcial e a intervenção é temporalmente limitada. Neste sentido, torna-se prudente não confundir paz com justiça, uma vez que, empiricamente, o sentido de justiça é sempre perspectivado pelos vencedores sobres os vencidos através de órbitas distintas. Os conflitos na Somália, no Ruanda, no Kosovo e em Timor Leste, e as respectivas reacções internacionais na década de 1990, deram o mote empírico para a criação e aprovação da doutrina de «responsabilidade em proteger», aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2005, mas a realidade internacional do século xxi remete-a para o (quase) arquivamento histórico.

 

 

Jamsheed Marker, Timor-Leste – Relato das Negociações para a Independência

Lisboa, Instituto Diplomático, 2009, 535 pp.

Escrito pelo representante especial do secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan – o diplomata paquistanês Jamsheed Marker – este livro é um relato fascinante das negociações entre timorenses, indonésios e portugueses, com a notável mediação das Nações Unidas, entre Março de 1997 e Outubro de 1999. Jamsheed Marker combina a descrição meticulosa da evolução das negociações com apontamentos pessoais sobre os actores políticos envolvidos e a sua percepção dos cenários envolventes ao processo negocial, nas suas inúmeras viagens entre Lisboa, Jacarta, Dili, Nova York, Genebra, Pretória e Londres. As memórias do diplomata sobre as peripécias que envolveram a sua visita a Xanana Gusmão na prisão de Cipinang, os encontros com Jaime Gama, Jorge Sampaio e António Guterres, em Lisboa, e com o Presidente Suharto, o ministro dos Negócios Estrangeiros Ali Alatas – o «Alex» para os amigos próximos – e várias patentes militares indonésias, constituem um testemunho cativante sobre como se alcançaram os acordos de Maio de 1999. A posterior realização do referendo em Timor Leste, em Agosto de 1999, e o despoletar da violência pelas milícias indonésias após a opção favorável à independência, confirmam as expectativas e os receios deste exímio diplomata paquistanês, que viriam a culminar com o notável desfecho em Maio de 2002, quando Timor Leste passou a ser Estado-membro das Nações Unidas. Timor-Leste – Relato das Negociações para a Independência poderá ser caracterizado como o livro de bordo do barco que não naufragou e chegou a bom porto, muito graças à mestria dos seus tripulantes e às favoráveis condições atmosféricas internacionais.

 

 

Lucy Popescu e Carole Seymour-Jones (eds.), Another Sky: Voices of Conscienc e from around the World

Londres, Profile Books, 2007, 275 pp.

Escrito pelo representante especial do secretário-geral das Nações Unidas Kofi Annan – o diplomata paquistanês Jamsheed Marker – este livro é um relato fascinante das negociações entre timorenses, indonésios e portugueses, com a notável mediação das Nações Unidas, entre Março de 1997 e Outubro de 1999. Jamsheed Marker combina a descrição meticulosa da evolução das negociações com apontamentos pessoais sobre os actores políticos envolvidos e a sua percepção dos cenários envolventes ao processo negocial, nas suas inúmeras viagens entre Lisboa, Jacarta, Dili, Nova York, Genebra, Pretória e Londres. As memórias do diplomata sobre as peripécias que envolveram a sua visita a Xanana Gusmão na prisão de Cipinang, os encontros com Jaime Gama, Jorge Sampaio e António Guterres, em Lisboa, e com o Presidente Suharto, o ministro dos Negócios Estrangeiros Ali Alatas – o «Alex» para os amigos próximos – e várias patentes militares indonésias, constituem um testemunho cativante sobre como se alcançaram os acordos de Maio de 1999. A posterior realização do referendo em Timor Leste, em Agosto de 1999, e o despoletar da violência pelas milícias indonésias após a opção favorável à independência, confirmam as expectativas e os receios deste exímio diplomata paquistanês, que viriam a culminar com o notável desfecho em Maio de 2002, quando Timor Leste passou a ser Estado-membro das Nações Unidas. Timor-Leste – Relato das Negociações para a Independência poderá ser caracterizado como o livro de bordo do barco que não naufragou e chegou a bom porto, muito graças à mestria dos seus tripulantes e às favoráveis condições atmosféricas internacionais. Another Sky reúne testemunhos de 49 pessoas, em 27 países, de quatro continentes. O que têm em comum? «Todas foram coagidas a não escrever.» Este livro resultou da iniciativa da organização inglesa pen que, com 144 centros em todo o mundo, promove a defesa da liberdade de expressão. Desde a Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, detida pelo regime autoritário dos generais birmaneses quando o seu partido venceu as eleições na Birmânia em 1990, a nomes menos conhecidos como Angel Cuadra, preso pelo regime de Fidel Castro, ou Reza Baraheni, detida no Irão, a obra oferece vários géneros literários, incluindo discursos, cartas, poemas e contos. A acção de escrever livremente, um dos direitos fundamentais consagrados na Declaração Universal dos Direitos do Homem em 1948 e um dos indicadores do nível de repressão de um regime não democrático, é muitas vezes considerada uma ameaça à estabilidade política de estados. Como a simples palavra escrita, com conteúdos de contestação ao regime vigente, pode ser motivo para a detenção, o exílio ou até a morte dos seus autores, é sem dúvida um sinal simultâneo de força e de fraqueza de regimes autoritários em todo o mundo. A origem geográfica destes testemunhos possibilita igualmente fazer um lembrete humanitário sobre estados com instabilidade política crítica, como o Zimbabué, a Serra Leoa ou o Congo, o que acontece,muitas vezes, não obstante a presença de missões internacionais das Nações Unidas no terreno. Por outro lado, quando encontramos países como a Turquia e a Tunísia ou o Peru e o México na lista de autores de Another Sky, verificamos que a imposição de restrições à liberdade de escrever não é exclusiva a regimes autoritários e que também regimes de maior ou menor cariz democrático enfrentam desafios diários na manutenção de garantias e de liberdades fundamentais dos seus cidadãos. A morte da russa Anna Politkovskaya, em 2007, ocorreu enquanto esta série de testemunhos era editada, o que confere a necessidade de uma maior premência à defesa contínua da liberdade de expressão e da importância de organizações como a pen, mais que não seja para relembrar que «fazer a caneta fluir livremente no papel» não deve ser motivo para prisão, exílio ou morte, e que a liberdade de autores com vozes (in)cómodas ao regime deve ser promovida e/ou preservada. Por Anna Politkovskaya resta-nos apenas reler as palavras que escreveu em Another Sky.

 

[*]Licenciada em Ciência Política e Relações Internacionais pela FCSH-UNL, mestre em História das Relações Internacionais pelo ISCTE e doutoranda em Relações Internacionais na FCSH-UNL. Investigadora do IPRI-UNL.