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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  no.78 Lisboa jun. 2023  Epub 30-Jun-2023

https://doi.org/10.23906/ri2023.78a02 

As crises do Afeganistão e do Iraque em perspetiva

Espanha na Cimeira das Lajes: o fim do consenso na política externa

Spain in the Lajes Summit. The end of the consensus in foreign policy

Rafael García Pérez1 

Manuel Iglesias Cavicchioli2 

1 Universidad Pablo de Olavide, Área de Direito Internacional Público e Relações Internacionais, despacho 6413, Carretera de Utrera km1, 41013 Sevilha, Espanha | rgarcia@upo.es

2 Universidad Pablo de Olavide, Área de Direito Internacional Público e Relações Internacionais, despacho 14216, Carretera de Utrera km1, 41013 Sevilha, Espanha | miglcav@upo.es


Resumo

A chamada «Cimeira das Lajes» marca um ponto de viragem de enorme relevância na política externa espanhola. Denunciada pelo conjunto da oposição política como o paroxismo da posição belicista de José María Aznar e reivindicada por ele como o apogeu da sua política externa, a Cimeira das Lajes é o símbolo de um período tremendamente agitado da política espanhola. Este artigo analisa a importância desta cimeira como ponto de viragem de uma mudança muito profunda no modelo de política externa até então implementado. Será também prestada atenção ao significado da cimeira no seu vigésimo aniversário e à forma como marcou, em grande medida, o desenvolvimento da política externa de Espanha, apesar das duas décadas volvidas.

Palavras-chave: José María Aznar; Cimeira das Lajes; política externa espanhola; atlanticismo

Abstract

The Azores Summit marks a turning point of enormous significance in Spain’s foreign policy. Criticized by the entire political opposition as the culmination of José María Aznar’s warlike position and claimed by him as the zenith of his foreign policy, the Azores Summit is the symbol of an extremely tumultuous period in Spanish politics. This article examines the importance of this summit as the turning point of a profound change in the foreign policy model implemented until then. It will also pay attention to the meaning of the Azores Summit on its 20th anniversary and how it has largely influenced Spain’s foreign policy in the two decades since.

Keywords: María Aznar; Azores Summit; Spanish foreign policy; Atlanticism

O encontro realizado nas Lajes (Açores), há vinte anos, continua vivo na memória das sociedades cujos representantes políticos dirigiram um ultimato ao regime de Saddam Hussein, consumado imediatamente a seguir com a invasão do Iraque. A agressão ocidental, baseada em informações falsas deliberadamente manipuladas, provocou a desintegração do Estado iraquiano, mergulhado numa prolongada guerra civil cujos terríveis efeitos ainda hoje são visíveis, tornando quase impossível a coexistência pacífica entre as diferentes comunidades étnicas e religiosas que habitam o interior das suas fronteiras.

O prolongamento do conflito a que a invasão deu origem, com a sua interminável lista de vítimas, ficou associado na memória das sociedades democráticas ocidentais ao repúdio provocado pela guerra e à ideologia neoconservadora que a inspirou. Repúdio que mobilizou, nos países europeus, as maiores manifestações desde o fim da Segunda Guerra Mundial1.

Para a sociedade espanhola, a Cimeira das Lajes simboliza o fim do consenso entre os principais partidos políticos sobre a direção da política externa espanhola. A decisão do presidente José María Aznar (Partido Popular) de procurar o alinhamento incondicional com os Estados Unidos, mesmo em operações de guerra que não tinham o apoio da Organização das Nações Unidas (ONU/Nações Unidas), mergulhou a política externa de Espanha em mudanças abruptas de oscilação pendular que se foram sucedendo desde então a cada mudança de governo.

Da Cimeira das Lajes (15 de março de 2003), em que Aznar tentou elevar a proeminência internacional de Espanha muito para além das suas possibilidades materiais, passou-se, sem solução de continuidade, para a Aliança das Civilizações promovida por José Luis Rodríguez Zapatero (Partido Socialista) perante a Assembleia Geral das Nações Unidas (21 de setembro de 2004), uma iniciativa reativa ao alinhamento pró-americano do seu antecessor e diametralmente oposta nos seus objetivos2. Entre uma política e outra não havia qualquer coerência, nem um fio condutor que as unisse. Ambas eram igualmente partidaristas e colocavam entre si uma contradição quase insuperável3. De armas hoje nada resta, exceto a memória. Uma memória amarga, no caso da primeira.

Um alinhamento incondicional com os EUA

A viragem atlantista do Governo de Aznar foi coerente com a ideologia de líderes seduzidos pelo thatcherismo, sem experiência diplomática e cuja visão da política internacional estava enquadrada num binómio simplista que fazia corresponder a globalização económica à segurança. Em ambas as dimensões, o contributo oferecido pela União Europeia (UE) foi considerado insuficiente para as suas ambições. Assim, a única alternativa de que dispunham era alinharem-se de forma decidida com os Estados Unidos.

Aznar e o seu grupo mais próximo representaram um canal de transmissão das posições neoliberais e neoconservadoras do mundo anglo-saxónico que se traduziram num crescente ceticismo em relação à Europa. Numa ótica de um pragmatismo simplificador, considerou-se que o contexto internacional criado após a Guerra Fria confirmava os Estados Unidos como potência hegemónica, razão pela qual Espanha devia jogar as suas cartas para obter vantagens dentro dessa nova ordem unipolar4. Quanto mais próxima estivesse dos Estados Unidos, mais oportunidades haveria para ganhar influência.

O papel desempenhado por Espanha no início da Guerra do Iraque refletia a evolução que o pensamento de Aznar tinha sofrido na sua conceção da política externa de que Espanha necessitava5: se o objetivo era «estar entre os grandes» ou «jogar na primeira divisão» (ambas as expressões foram muito repetidas à época), a melhor forma de o conseguir era alcançar o maior grau possível de proximidade com os Estados Unidos, conquistando a sua amizade em momentos de dificuldade. Espanha fez tudo o que era possível, desde a presidência rotativa do Conselho de Segurança das Nações Unidas (Conselho de Segurança), que então ocupava, para promover uma resolução das Nações Unidas favorável às teses norte-americanas6, chegando mesmo a pressionar os governos do Chile e do México de forma a conseguir o seu voto favorável, o que não se verificou.

Aznar tomou a iniciativa de promover uma carta pública7 através da qual os presidentes de oito países europeus apoiavam a posição dos Estados Unidos de levar a cabo uma intervenção militar. O documento, conhecido como «a carta dos oito», foi divulgado poucos dias depois de os ministros dos Negócios Estrangeiros da União assinarem, por unanimidade, uma declaração conjunta em que manifestavam o seu apoio ao Conselho de Segurança como único órgão com legitimidade para autorizar uma ação de força. Esta carta permitiu falar a Donald Rumsfeld da existência de uma «nova Europa» face a uma «velha Europa» decadente, aprofundando o fosso que se abria nas relações transatlânticas8.

Tudo isso teve um custo elevado. No plano interno, houve a quebra do consenso em matéria de política externa entre as forças parlamentares, sem conseguir o apoio de uma opinião pública ainda mais antiamericana, até, do que a francesa9, o que acabou por ter repercussões nas eleições realizadas em 2004, quando o Partido Socialista obteve a vitória. Externamente, a viragem atlantista reduziu a capacidade negocial de Espanha no seio da UE e enfraqueceu a sua influência regional na América Latina.

Esta mudança abrupta na posição internacional de Espanha foi uma decisão pessoal de José María Aznar10. O alinhamento incondicional com os Estados Unidos não foi o resultado de um cálculo racional e pragmático alicerçado na defesa dos interesses nacionais. Pelo contrário, deveu-se à adesão entusiástica a uma determinada ideologia. Foi a assunção do quadro axiológico do neoconservadorismo norte-americano na política externa (neoliberalismo económico, propagação da democracia e guerra global ao terror) que acabou por determinar a mudança de rumo na política externa espanhola11.

Uma viragem radical na política externa: rutura e mudança de modelo

A Cimeira das Lajes não pode ser totalmente compreendida ou corretamente analisada senão no quadro das mudanças radicais que a política externa espanhola veio a sofrer na última metade do segundo e último mandato de José María Aznar como presidente do Governo. Estamos perante o período mais turbulento e controverso da política externa espanhola desde o referendo sobre a continuidade na NATO convocado em 1986 pelo Governo socialista de Felipe González. Não é por acaso que a Cimeira das Lajes se tornou de imediato no evento mais representativo do segundo mandato de José María Aznar, e tenha sido sempre por ele reivindicada como o principal marco internacional dos seus governos12.

Ao contrário do que tem sido sustentado por alguns setores políticos e académicos13, a política externa desenvolvida neste período não representou o culminar de uma evolução natural do primeiro Governo Aznar de 1996, mas antes uma profunda mudança qualitativa, de natureza ruturista, que se afastou radicalmente dos eixos fundamentais da política externa espanhola em vigor até àquele momento. De facto, no período 2002-2004, nasceu um novo modelo de política externa, pela mão direta do presidente do Governo, que constitui uma rutura substancial com os pilares em que fora erguida a política externa, os quais constituíam um dos mais árduos consensos da transição democrática espanhola14. Esta rutura com as linhas mestras da política externa espanhola porá fim ao consenso político até então existente entre os principais partidos espanhóis, principalmente entre o Partido Popular e o Partido Socialista15, num sistema político, como o espanhol, caracterizado então por um sólido bipartidarismo imperfeito.

A nova política externa delineada por Aznar será estruturada em torno dos seguintes cinco eixos fundamentais. Em primeiro lugar, a emergência de um atlantismo ideológico que se tornará no principal pilar da nova política externa. Partindo da premissa de que a hegemonia mundial dos Estados Unidos tem um carácter benevolente e do pressuposto de que Espanha partilha interesses e valores fundamentais com a superpotência americana, as relações hispano-americanas tornar-se-ão, pela primeira vez em democracia, o pilar mais importante da política externa espanhola, deslocando assim o eixo europeu16. Este eixo atlantista assenta numa leitura unipolar do mundo: segundo Aznar, a hegemonia americana é uma realidade indiscutível e é também a melhor opção possível para a ordem internacional e, claro, para um país ocidental como Espanha. Um mundo multipolar é necessariamente mais perigoso e prejudicial para os valores ocidentais e para as expectativas de Espanha. Além disso, coerente com esta análise, Aznar entende que os Estados Unidos são o derradeiro garante da segurança nacional espanhola. Consequentemente, Espanha deve colaborar ativa- mente, na linha da frente política, com os Estados Unidos na preservação da chamada Pax Americana.

O atlanticismo ideológico da política externa espanhola atinge o seu apogeu, precisa- mente, na Cimeira das Lajes, que, não por acaso, o próprio Aznar considerará muitos anos depois como o momento mais brilhante e importante da sua política externa. Para Aznar, naquele momento, a relação bilateral com os Estados Unidos é fundamental, embora considere que a NATO precisa de ser politicamente reformada e revitalizada num futuro próximo17.

Em segundo lugar, uma deriva eurocética sem precedentes, uma vez que o novo atlantismo é imposto, minando claramente o sólido pilar europeu e pró-europeu da política externa espanhola. Se a adesão às Comunidades Europeias foi o objetivo nacional prioritário absoluto de Espanha desde 1977, desde a sua adesão efetiva, em 1986, a política europeia espanhola tornar-se-á o eixo mais importante da política externa de todos os governos, incluindo o do próprio Aznar, até 2002. A partir desse momento, o europeísmo espanhol será menosprezado em favor de uma visão economicista e antifederalista da UE18.

Aznar considera que o lugar de Espanha na UE, à sombra da Alemanha e, sobretudo, da França, é um obstáculo à emergência do poder espanhol e à defesa dos seus interesses nacionais na cena internacional19. Segundo Aznar, a Europa não pode nem deve aspirar a ser um ator geopolítico autónomo que tenta constituir-se como uma contrapotência aos Estados Unidos, como pretendiam à época Paris e Berlim. O conflito com Marrocos, por ocasião da ocupação marroquina da ilha de Perejil, em 11 de julho de 2002, confirmará, na opinião de Aznar, que a França não é um parceiro fiável em matéria de segurança e defesa e que, ao invés, os Estados Unidos, graças à relação de proximidade que foi trabalhada, claramente o são20.

A gestão da crise iraquiana irá gerar uma profunda divisão intraeuropeia que, por sua vez, conduzirá a uma grande divisão transatlântica. Aznar não hesita em fazer parte dessa «nova Europa» evocada por Donald Rumsfeld, colocando a sua relação com os Estados Unidos à frente do eixo franco-alemão, e decidindo reforçar os laços com a Grã-Bretanha e a Polónia21.

O terceiro eixo é uma ideia de grandeza nacional que visa dar a Espanha o lugar que merece na cena internacional. Aznar entende que, no início do século, Espanha é um país desvalorizado pelas potências europeias e que desempenha um papel irrelevante nos grandes assuntos internacionais. Num processo semelhante ao vivido por George W. Bush nos Estados Unidos, Aznar acredita que o 11 de Setembro mudou o mundo, e que Espanha tem de se adaptar urgentemente ao novo cenário, que se apresenta como uma oportunidade única para ganhar peso internacional. Trata-se, em suma, de uma busca por melhorar o estatuto de Espanha: chegou o momento de fazer com que um grande país como Espanha saia, finalmente, do «canto da História» ao qual tinha sido relegada durante demasiado tempo22. Para alcançar o ambicioso objetivo de melhorar a posição de Espanha, tornava-se essencial uma política de bandwagoning em relação aos Estados Unidos23.

A Cimeira das Lajes, nesse sentido, será o epítome do novo modelo de política externa, a oportunidade histórica de regressar à mesa das grandes potências que tomam as decisões cruciais para a configuração do cenário geopolítico internacional.

Em quarto lugar, a securitização da política externa espanhola será outra novidade fundamental deste período. Ao contrário da natureza eminentemente economicista da política externa desenvolvida entre 1996 e 2001, o período 2002-2004 será marcado pela segurança nacional e internacional, com Espanha intensamente envolvida na Guerra ao Terror lançada pela Administração Bush. Após a intervenção no Afeganistão, iniciada a 7 de outubro de 2001, a gestão da crise iraquiana nas Nações Unidas dominará a agenda internacional desde setembro de 2002. A presença conjuntural de Espanha como membro não permanente do Conselho de Segurança desde janeiro de 2003 conduzirá ao seu pleno envolvimento na questão, cujo resultado terá lugar, precisamente, na Cimeira das Lajes.

Antes de a questão iraquiana ter chegado à ribalta política e mediática em julho de 2002, as já deterioradas relações com Marrocos viveram um momento de grande tensão com a ocupação da ilha de Perejil por gendarmes marroquinos e a subsequente intervenção militar espanhola para restabelecer o statu quo ex ante no dito território insular desabitado.

Por fim, a redefinição substancial do eixo axiológico, afetado nos seus aspetos centrais, quando os valores da política externa de Espanha democrática foram abandonados para abraçar valores alternativos ligados ao primado indiscutível dos EUA nas relações internacionais. Até então, a política externa espanhola estava ancorada no respeito e na promoção do multilateralismo institucionalizado e do direito internacional24. Uma política externa de base internacionalista iniciada pelos governos da União do Centro Democrático de Adolfo Suárez e Calvo Sotelo, promovida por Felipe González e seguida por Aznar durante o seu primeiro mandato e parte do segundo. Se a política externa da Espanha democrática defendia uma ordem internacional baseada em regras, no seu biénio final Aznar promoverá abertamente uma ordem internacional baseada no poder e nos valores americanos.

Nesse sentido, a natureza democrática dos Estados Unidos e os seus aliados são decisivos. Segundo Aznar, é legítimo alinhar-se com o líder do mundo livre, especialmente quando ele pede ajuda a seus aliados para se defender da vesânia terrorista em defesa dos valores democráticos ocidentais. A declaração atlântica dos Açores e as declarações do próprio Aznar na conferência de imprensa após a cimeira reivindicam expressamente a ligação transatlântica como elemento essencial para enfrentar as novas ameaças aos valores ocidentais25. Da mesma forma, na sua reiterada defesa da importância histórica da cimeira, Aznar deixou claro que a causa nela defendida não era outra, em última análise, senão a dos valores democráticos representados pelos Estados Unidos e os seus aliados face à tirania, encarnada, na altura, por Saddam Hussein. Assim, implicitamente, assume o discurso neoconservador que considerava a Guerra ao Terror como uma nova guerra mundial em que estavam em jogo a liberdade e a democracia do Ocidente26.

Recordemos, por outro lado, que o ultimato emitido nos Açores pelos dirigentes ali reunidos era, em si mesmo, uma ameaça de uso da força contrária ao artigo 2.4 da Carta das Nações Unidas. Uma declaração unilateral ao arrepio do sistema de segurança coletiva que usurpou a autoridade do Conselho de Segurança na manutenção da paz e da segurança internacionais. Apoiando ativamente a intervenção militar liderada pelos Estados Unidos - um verdadeiro ato de agressão -, Espanha encontrava-se na linha da frente política de uma flagrante violação do direito internacional27. Alguns meses depois, Aznar virá a abraçar expressamente a doutrina de Bush sobre a guerra preventiva e a justificar o unilateralismo num mundo em que o multilateralismo está mergulhado numa crise profunda28.

Como compreender esta mudança drástica provocada pelo Governo de José María Aznar, no seu último biénio no poder, que levou à adoção de um novo modelo de política externa? Pois bem, acreditamos que esta mudança deve ser explicada à luz de três níveis de análise complementares: os principais desenvolvimentos no contexto internacional, a evolução da política interna e a liderança exercida pelo presidente do Governo.

O contexto internacional

O primeiro trimestre de 2003 remete-nos para o mundo turbulento e incerto da Guerra ao Terror, no quadro da estratégia hegemónica engendrada pela Administração Bush. Depois de iniciar uma guerra no Afeganistão em retaliação pelos ataques de 11 de setembro, os Estados Unidos estão determinados a substituir o regime iraquiano, cumprindo uma velha pretensão de vários «falcões» então presentes na Administração norte-americana de redesenhar o mapa do Médio Oriente, trazendo a democracia ao Iraque e a outros países da região29. Os Estados Unidos consideram que vários Estados párias ou vilões (rogue states), como o Iraque de Saddam Hussein, desafiam há anos e impunemente o poder americano. São países que constituem um «eixo do mal» que ameaça diretamente a segurança nacional americana e a segurança internacional30.

A natureza interna dos Estados torna-se agora uma questão prioritária para a política externa dos Estados Unidos e, por extensão, para a política internacional. Os Estados Unidos acreditam que a democracia deve ser preservada e difundida em prol da sua segurança, pois um mundo mais democrático é um lugar mais seguro para os valores democráticos americanos. Esta versão neoconservadora da teoria da paz democrática serve de base ideológica para o intervencionismo norte-americano e procura legitimar a mudança de regime e a imposição da democracia manu militari.

O sistema de segurança coletiva das Nações Unidas e o multilateralismo institucionalizado vivem a sua maior crise desde o fim da Guerra Fria. A autoridade do Conselho de Segurança será abertamente questionada, bem como os princípios estruturais do direito internacional, como a proibição geral do jus ad bellum31, defendendo-se uma extensão da autodefesa a esquemas que vão além de ataques antecipados para justificar uma ação militar preventiva face a ameaças incertas e indeterminadas, mas hipoteticamente dotadas de uma enorme capacidade destrutiva32.

A UE, por seu lado, está em vias de concluir o chamado «grande alargamento» para Leste, o que, segundo Aznar, tornaria muito mais difícil a tomada de decisões no seio da UE e deslocaria o centro de gravidade do eixo Paris-Berlim para os novos membros. A gestão da crise iraquiana provocará um profundo confronto a nível europeu entre apoiantes e opositores da posição dos Estados Unidos. Por fim, as relações sempre conturbadas com Marrocos viveram um momento particularmente turbulento no verão de 2002 devido ao conflito de Perejil. Como já foi referido, o papel antagónico desempenhado pela França e pelos Estados Unidos relativamente a este conflito é indicativo, segundo Aznar, da realidade internacional de Espanha.

Política interna

O segundo Governo de Aznar consegue obter a maioria absoluta nas eleições gerais de 12 de março de 2000 e isso precipitará o fim dos acordos até então existentes com os partidos nacionalistas catalães (Convergência e União) e basco (Partido Nacionalista Basco) que serviram de apoio ao primeiro Governo do pp (1996-2000). O clima político de diálogo e compromisso que caracterizou o primeiro mandato será em breve substituído pelo confronto e pela dissidência, consideravelmente exacerbados quando a questão iraquiana entrar na disputa33.

O terrorismo da ETA (Euskadi Ta Askatasun) continuará a ser uma condicionante extraordinária da democracia espanhola. Para o Governo popular, será prioritário lutar e der- rotar a ETA com todos os instrumentos do Estado de direito. Depois do 11 de Setembro, Aznar tentará associar o terrorismo da ETA ao terrorismo jihadista internacional, afirmando que «todos os terroristas são iguais, os que estão lá e os que estão aqui»34. A experiência espanhola na luta contra o terrorismo será uma das justificações recorrentes para o apoio aos Estados Unidos na Guerra ao Terror.

Por último, importa referir que, a partir de 1996, Espanha experimentará um boom económico significativo, tornando-se a oitava economia do mundo e cumprindo os requisitos exigidos por Bruxelas para fazer parte da zona euro desde a sua fundação35. Aznar acredita que a posição económica de Espanha não é correspondida pelo seu poder político e que cabe à sua liderança, precisamente, equipar ambas as dimensões para dar a Espanha o seu lugar de direito na arena política internacional. Nesse sentido, ao longo destes anos, o presidente do Governo espanhol acalenta a possibilidade de entrar no fórum do G8, um objetivo não expressamente declarado, mas que se tornou um segredo aberto36.

O fator pessoal: a liderança de Aznar e as suas fontes ideológicas

Tanto o contexto internacional como o doméstico explicam as mudanças vividas na política externa espanhola. No entanto, o elemento pessoal da liderança é verdadeiramente decisivo para compreender a mudança operada e, sem a sua influência, a emergência do novo modelo de política externa que ocorreu nesse período não pode ser totalmente compreendida37.

A nova política externa de Aznar foi concebida no seu círculo pessoal mais próximo, sem a participação do Conselho de Ministros, do Partido Popular ou da oposição par- lamentar. Aznar assume na primeira pessoa a autoria intelectual do novo modelo de política externa e ganha protagonismo na execução da ação externa. Perante uma liderança tão marcadamente personalista, que apresenta mesmo traços cesaristas38, a visão do mundo de Aznar torna-se um elemento verdadeiramente decisivo e remete-nos para a implementação de uma ideologia até então alheia ao panorama político espanhol. Referimo-nos à irrupção em Espanha do neoconservadorismo norte-americano, que, nessa altura, estava a ter um impacto muito considerável na formulação da política externa dos Estados Unidos39. Aznar mostra-se firme e determinado em implementar a sua nova agenda de política externa e em alcançar os seus objetivos à margem do Parlamento e da opinião pública. Ele não hesitará em manter a sua decisão de apoiar os Estados Unidos face às massivas mobilizações sociais contra a Guerra do Iraque e ao repúdio frontal de toda a oposição parlamentar. Neste sentido, convém recordar que Aznar foi muito mais longe do que outros aliados dos Estados Unidos, tal como a Itália liderada por Silvio Berlusconi, e desejava ter um papel político ativo no apoio à decisão da Administração Bush de invadir o Iraque e derrubar Saddam Hussein. Em 2007, José Manuel Durão Barroso, anfitrião da Cimeira das Lajes, declarou-se disponível para organizar o encontro em território português a pedido dos seus amigos e aliados, recordando que foi precisamente Aznar quem mais insistiu na realização da cimeira trilateral40. Apesar de não ter participado diretamente na invasão militar levada a cabo por americanos e britânicos poucos dias depois da cimeira, Aznar decidiu aparecer nos jardins do Palácio da Moncloa para justificar a ação militar recém-iniciada, numa encenação típica de um sistema presidencialista como o norte-americano.

A longa sombra da Cimeira das Lajes

Em Espanha, a memória da Cimeira das Lajes está intrinsecamente ligada à chamada fotografia dos Açores. A imagem, que foi transmitida em todas as capas da imprensa internacional, mostra os três protagonistas do encontro com o anfitrião, José Manuel Durão Barroso, a ocupar um discreto segundo plano.

A fotografia capta os três aliados, muito sorridentes, no momento em que lançam o seu ultimato a Saddam Hussein, com base no argumento de que o Iraque possuía armas de destruição maciça, de acordo com as informações disponibilizadas pelos serviços secretos norte-americanos41. Uma informação que se revelou falsa e desmentia os resultados da investigação desenvolvida no terreno pela Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA) durante os meses que antecederam a invasão. De facto, o presidente da AIEA, Mohamed El-Baradei, informou o Conselho de Segurança de que as provas dos Estados Unidos sobre o alegado fornecimento de urânio do Iraque ao Níger eram falsas42. Em 2005, El-Baradei e a AIEA receberam o Prémio Nobel da Paz. Hoje, ele ainda se manifesta «perplexo com a quantidade de enganos e mentiras» empregues por aqueles que defendiam a guerra naquela ocasião43.

Um ano após o início da invasão, o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, também foi inequivocamente crítico: «do ponto de vista da Carta da ONU, a guerra foi ilegal»44. Com o passar do tempo, à medida que as consequências catastróficas da invasão se tornavam evidentes45, os protagonistas daquela foto foram-se desculpando em diferentes graus, se não expressando o seu arrependimento, pela decisão tomada em 2003. Quase todos eles.

Os seus argumentos centraram-se nos dados ambíguos recebidos dos serviços de informações, que os induziram em «erro», o qual constitui para George W. Bush «o maior arrependimento de toda a presidência»46. Um erro que, no entanto, não exige um pedido de perdão: «Quero dizer, pedir desculpas basicamente significaria dizer que a decisão foi uma decisão errada […]. E não acredito que tenha sido uma decisão errada»47.

Nas suas memórias, esquivou-se à sua responsabilidade nestes termos: «Em retrospetiva, é claro, todos nós deveríamos ter pressionado mais os serviços de informações e revisto as nossas suposições. Mas, na altura, as provas e a lógica apontavam no sentido contrário»48.

Por seu lado, Tony Blair, em declarações à CNN em 2015, desculpou-se pelos «erros cometidos na Guerra do Iraque», embora tenha continuado a defender a intervenção sob o argumento de que manter Saddam teria sido pior49.

Também José Manuel Durão Barroso afirmou que foi iludido pelos dados fornecidos pelos serviços de informações que lhe foram apresentados, na posição que ocupou na reunião, enquanto anfitrião, «no banco de trás»50.

A única exceção a este pesar coletivo manifestado pelos protagonistas do encontro é José María Aznar, que reiterou arrogantemente o seu orgulho em ter participado nessa cimeira51. As insistentes declarações de Aznar sobre este encontro são tão grandiloquentes como desproporcionadas: «Espanha esteve nos Açores porque não pôde participar nos desembarques na Normandia»; «foi o momento histórico mais importante que Espanha teve em 200 anos»; «Iria cem vezes, cem mil vezes» à cimeira sobre o Iraque, «se estivesse em causa o interesse nacional de Espanha»52.

À parte os traços de carácter pessoal de cada protagonista que exprimem as suas manifestações, a fotografia dos Açores reflete, como nenhuma outra imagem, a soberba autossuficiência com que o Ocidente se perceciona a si mesmo. «Húbris ocidental», na expressão certeira de Kishore Mahbubani53.

Seria, neste caso, a confiança absoluta demonstrada pelo pensamento liberal nas relações internacionais, passada nesta ocasião pelo crivo do messianismo neoconservador, de que todo o conflito humano é passível de ser resolvido, desde que aplicada a determinação necessária para tal. Os apoiantes da política de mudança de regime, com a desculpa beatífica de espalhar a democracia pelo mundo, acabam por justificar as terríveis consequências dos seus atos como erros evitáveis. Com um melhor planeamento, mais meios e tempo suficiente, talvez o Iraque se tivesse tornado uma democracia, como aconteceu na Alemanha depois do nazismo. Não há equívocos, apenas falta de determinação, ou uma vontade fraca.

Neste contexto ideológico, a atitude adotada por um dos mais ativos promotores intelectuais da invasão, Robert D. Kaplan, é honrosa e excecional. No seu último e recente livro54, o autor, mergulhado numa depressão clínica depois de visitar o Iraque em 2008 e ver in situ o estado de decomposição em que o país se tinha afundado, assume que o principal erro em que este tipo de ideologia incorre reside na incapacidade ocidental de pensar em termos trágicos:

«Acreditar que o poder dos Estados Unidos pode sempre corrigir o mundo é uma violação da sensibilidade trágica. E, no entanto, elementos significativos da nossa elite de política externa em Washington subscreveram esta noção. Porque a política em si é um processo que procura melhorar - idealmente corrigir - inúmeras condições no exterior, a elite acre- dita que todos os problemas são solucionáveis, e que discordar disso constitui fatalismo»55.

Conclusões

A Cimeira das Lajes representa na perfeição uma política externa que rompe abrupta- mente com o consenso político e social existente nesta matéria. O principal objetivo de Aznar não seria outro que não participar na mesa das grandes potências para abandonar a posição irrelevante de potência média que, na sua opinião, Espanha ocupava. O tempo decorrido desde então permite-nos ver, ainda mais claramente, que tal objetivo era mais um devaneio do que uma expectativa realista.

A viragem fortemente personalista liderada por Aznar deu origem a um novo modelo de política externa, tão controverso quanto efémero, que gerou uma profunda e dura- doura divisão política entre o Partido Popular e o Partido Socialista. Vinte anos depois da sua celebração, pode-se afirmar que a Cimeira das Lajes pôs fim à política externa espanhola entendida como uma política de Estado fruto do acordo entre os grandes partidos. A mudança de Aznar teve consequências a médio e a longo prazo, inaugurando uma longa etapa marcada pela ideologização da política externa, transformada em mais um tema da batalha partidarista, que lançará as bases da polarização em que tem vivido imersa a política espanhola durante os últimos anos.

Tradução: Samuel Jerónimo

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Notas

1 HABERMAS, Jürgen; DERRIDA, Jacques - «Europa: en defesa de una política exterior común». In El País. 4 de junho de 2003. Disponível em: https://elpais.com/diario/2003/06/04/internacional/1054677620_850215.html.

3 GARCÍA PÉREZ, Rafael - «Redefinir la política exterior: iniciativas contrapuestas de los gobiernos del PP y PSOE (2000-2009)». In Historia del Presente. N.º 15, 2010, pp. 139-153.

4 BARDAJÍ, Rafael - «Más allá de Iraq: España en un orden unipolar». In ABC. 11 de março de 2003. Disponível em: https://www.abc.es/opinion/abci-mas-alla-Iraq-spain-unipolar-order-200303100300-167220_noticia_amp.html.

5A evolução do pensamento de Aznar reflete-se em dois discursos relevantes proferidos nessas datas: «Discurso del Presidente del Gobierno en el CESEDEN» (Madrid. 20 de outubro de 2003. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4580152.pdf) e «DISCURSO ÍNTEGRO de Aznar ante el Congreso de EEUU» (Elmundo.es. 4 de fevereiro de 2004. Disponível em: https://www.elmundo.es/elmundo/2004/02/04/espana/1075913788.html).

6 ARIAS, Inocencio - Confesiones de un diplomático. Barcelona: Planeta, 2006. Memórias do embaixador espanhol nas Nações Unidas durante esse período.

7 AZNAR, José María, et al. - «Europa y América deben permanecer unidas». In El País. 30 de janeiro de 2003. Disponível em: https://elpais.com/diario/2003/01/30/opinion/1043881206_850215.html.

8 BAKER, Mark - «Rumsfeld’s “Old” and “New” Europe. Touches on uneasy divide». Radio Free Europe / Radio Liberty. 24 de janeiro de 2003. Disponível em: https://www.rferl.org/a/1102012.html.

9 FRANKEL, Glenn - «Poll: opposition to U.S. policy grow in Europe». In The Washington Post. 4 de setembro de 2003. Disponível em: https://www.washingtonpost.com/archive/politics/2003/09/04/poll-opposition-to-us-policy-grows-in-europe/ab6b4b7c-7e5a-4cc4-9334-b5c-15ce7b084/.

10 AZNAR, José María - Ocho años de Gobierno: una visión personal de España. Barcelona: Planeta, 2004, p. 150.

11 GARCÍA PÉREZ, Rafael - «Dilemas da política externa espanhola no início do século XXI». In FERREIRA-PEREIRA, Laura C., coord. - Relações Internacionais: Actores, Dinâmicas e Desafios. Lisboa: Prefácio, 2010, pp. 171-183.

12 IGLESIAS-CAVICCHIOLI, Manuel - «A period of turbulent change: Spanish-US relations since 2002». In Whitehead Journal of Diplomacy and International Relations. Vol. 8, 2007, pp. 113-129.

13Ver, neste sentido: MUÑOZ-ALONSO, Alejandro - España en primer plano. Ocho años de política exterior (1996-2004). Madrid: Gota a Gota Ediciones, 2007; CRESPO PALOMARES, Cristina - La alianza americana. La estrategia antiterrorista española y las relaciones hispano-norteamericanas (1996-2004). Madrid: La Catarata, Instituto Franklin - UAH, 2016.

14Em 1996, o primeiro governo popular - com o seu ministro dos Negócios Estrangeiros, Abel Matutes, e o próprio Aznar à frente - defendeu que a política externa deveria continuar a ser uma «política de Estado», assumindo assim a herança das principais linhas da política externa desenvolvidas pelos seus antecessores; cf. ARENAL, Celestino del - Política Exterior de España y relaciones con América Latina. Madrid: Fundación Carolina, Siglo XXI, 2011, p. 311.

15 ARENAL, Celestino del - «Consenso y disenso en la política exterior española». Real Instituto Elcano. Documento de Trabajo N.º 25, 2008.

16RENAL, Celestino del - Política Exterior de España…, pp. 112-115.

17De facto, pouco depois de deixar o poder, foi publicado um relatório da fundação presidida por Aznar propondo a reforma e expansão da NATO: FAES - NATO: An Alliance for Freedom. Madrid: Fundación para el Análisis y los Estudios Sociales, 2005.

18Ver, por exemplo, «CONFERENCE BY José María Aznar at St Anthony’s College, University of Oxford». Disponível em: http://www.jmaznar.es. Esta visão da União Europeia, que poderíamos muito bem descrever como eurocética, tornar-se-ia ainda mais explícita uma vez fora do poder: «INTERVENCION de José María Aznar en la presentación de Europa: propuestas de libertad». Conferencias FAES. Londres. 22 de setembro de 2009.

19As importantes divergências sobre o Iraque e uma clara falta de harmonia pessoal terão uma influência importante no seu afastamento do eixo franco-alemão; cf. JONES, Nathan - The Adoption of a Pro-US Foreign Policy by Spain and the United Kingdom. José María Aznar and Tony Blair’s Personal Motivations and their Global Impact. Brighton: Sussex Academic Press, 2017, pp. 99-101.

20Perante a posição ambígua da França, a mediação do então secretário de Estado norte-americano, Colin Powell, foi decisiva na resolução final da crise, como reconheceu o ministro da Defesa espanhol; cf. TRILLO, Federico - Memoria de Entreguerras: mis años en el Ministerio de Defensa (2000-2004). Barcelona: Planeta, 2005, p. 191.

22Intervenção de José María Aznar durante o Conselho da Presidência do Partido Popular de 3 de março de 2003 (El País, 4 de março de 2003), citado em SANAHUJA, José Antonio - «El viraje neocon de la política exterior española y las relaciones con América Latina». In Pensamiento propio. Vol. 11. N.º 23, 2006, pp. 9-36.

23 GARCÍA CANTALAPIEDRA, David - «Entre Bandwagoning y Appeasement: la política exterior de España hacia EE. UU. 2001-2011». In UNISCI Discussion Papers. N.º 27, 2011, pp. 63-72.

24ARENAL, Celestino del - Política Exterior de España…, pp. 112-115.

26Ver, por exemplo, PODHORETZ, Norman - World War IV: The Long Struggle against Islamofascism. Nova Iorque: Doubleday, 2007, pp. 6-15.

27O Governo Aznar agarrou-se à suficiência da Resolução 1441 (2002) do Conselho de Segurança e promoveu uma segunda resolução afirmando que era politicamente aconselhável, mas não juridicamente necessário, autorizar o uso da força contra o Iraque. Aznar ignorou completamente o relatório interno do consultor jurídico internacional do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que apontava que a Resolução 1441 não era uma base suficiente para usar a força legalmente contra Saddam Hussein por não cooperar com as inspeções internacionais; cf. EKAIZER, Ernesto - «El último informe que pidió Exteriores antes de la guerra de Iraq considero ilegal la intervención». In El Pais. 13 de dezembro de 2005. Disponível em: https://elpais.com/diario/2005/12/13/espana/1134428404_850215.html.

28«DISCURSO ÍNTEGRO de Aznar ante el Congreso de EEUU».

29Estes «falcões» sempre censuraram Bush por não ter chegado a Bagdade na Guerra do Golfo de 1991, e Clinton por se ter limitado a lançar um ataque punitivo contra Saddam Hussein, permitindo-lhe desafiar constantemente o poder americano.

30Estas ameaças decorrem da possível conivência destes Estados com organizações terroristas. A combinação de armas de destruição maciça e terrorismo jihadista internacional surge como uma ameaça hiperdestrutiva que deve ser combatida o mais rapidamente possível e abortada o mais cedo possível; cf. THE NATIONAL SECURITY Strategy of the United States of America. Washington, DC: The White House, setembro de 2002.

31 GARCIA SEGURA, Caterina; RODRIGO, Ángel J. - Los limites del proyecto imperial. Estados Unidos y el orden internacional en el siglo XXI. Madrid: La Catarata, 2008.

32 RIPOL CARULLA, Santiago - «La nueva doctrina global de defensa preventiva. Consideraciones sobre su carácter y fundamento». In GARCÍA SEGURA, C.; RODRIGO HERNÁNDEZ, Á. J., eds. - El imperio inviable. El orden internacional tras el conflicto de Irak. Madrid: Tecnos, 2004, pp. 143-152.

33De qualquer modo, refira-se que durante os dois primeiros anos desta segunda legislatura serão alcançados dois pactos de Estado com o Partido Socialista, como foi o caso do pacto anti-terrorista contra a ETA, em dezembro de 2000, e, em maio de 2001, o pacto para a reforma da Justiça. Ambos os pactos foram propostos pelo líder da oposição socialista, José Luis Rodríguez Zapatero.

35Em 2005, constatou-se que, ao longo de 2004, Espanha tinha-se convertido na oitava economia mundial; cf. «ESPAÑA ES YA la octava economía del mundo». Cinco Días. 8 de agosto de 2005. Disponível em: https://cincodias.elpais.com/cinco-dias/2005/08/08/economia/1123480580_850215.html.

37Sobre a liderança personalista de Aznar, em comparação com Tony Blair, ver JONES, Nathan - The Adoption of a Pro-US Foreign Policy…, pp. 71-73.

38 REMIRO BROTONS, Antonio - «La politique étrangère». In MODERNE, Franck; BON, Pierre, dir. - Espagne, les années Aznar. Paris: La documentation Française, 2004, p. 104.

39Para uma análise do desenvolvimento do pensamento neoconservador na Espanha e a sua influência na política externa de Aznar, ver IGLESIAS-CAVICCHIOLI, Manuel - Aznar y los «neocons». El impacto del neoconservadurismo en la política exterior de España. Barcelona: Huygens, 2017. Para um estudo mais específico do neo-conservadorismo e da política latino-americana em Espanha, ver SANAHUJA, José Antonio - «El viraje neocon de la política exterior española …», pp. 9-36.

40Declarações à rádio TSF, a 18 de novembro de 2007, recolhidas pelo Diário de Notícias. «DURÃO BARROSO dice que le engañaron en la reunión de Las Azores». In El País. 19 de novembro de 2007. Disponível em: https://elpais.com/diario/2007/11/19/internacional/1195426812_850215.html.

41A acusação foi lançada por Bush no discurso sobre o Estado da União, em Washington, a 28 de janeiro de 2003. Disponível em: https://georgewbush-whitehouse.archives.gov/stateoftheunion/2003/index.html.

44 ANNAN, Kofi - «Lessons of Iraq war underscore importance of UN Charter». Nova Iorque. 16 de setembro de 2004. Disponível em: https://news.un.org/en/story/2004/09/115352.

45As mortes de civis causadas pelo conflito foram estimadas, em 2006, em mais de 650 mil vítimas. Cf. «UPDATED IRAQ survey affirms earlier mortality estimates». Johns Hopkins University. 11 de outubro de 2006. Disponível em: https://publichealth.jhu.edu/2006/burnham-iraq-2006.

47«Bush admits mistakes, defends decisions». Today. 2 de novembro de 2010. Disponível em: https://www.today.com/popculture/bush-admits-mistakes-defends-decisions-wbna39976132. A notícia inclui a entrevista oferecida à NBC News, a primeira após deixar a presidência.

48 BUSH, George W. - Decision Points. Nova Iorque: Crown, 2010, p. 233.

50«DURÃO BARROSO dice que le engañaron…».

51Numa entrevista recente ao podcast One Decision, Aznar declarou-se «completamente orgulhoso» da decisão tomada («AZNAR: “NO ME voy a disculpar” por haber apoyado la invasión de Iraq». In El Mundo. 2 de fevereiro de 2023 Disponível em: https://www.elmundo.es/internacional/2023/02/02/63dab397fdddff36018b45ba.html).

52«AZNAR ASEGURA que no se arrepiente por la foto de las Azores». Europa Press. 27 de agosto de 2008. Disponível em: https://www.europapress.es/nacional/noticia-aznar-asegura-no-arrepiente-foto-- azores-dice-psoe-pagara-deslealtad-11-20080827234530.html; «AZNAR:“NUNCA he tenido mejor foto que la de las Azores”». In La Vanguardia. 5 de abril de 2017. Disponível em: https://www.lavanguardia.com/politica/20170405/421477079167/aznar-nunca-mejor-foto-azores.html.

53 MAHBUBANI, Kishore - A Queda do Ocidente? Uma Provocação. Lisboa: Bertrand Editora, 2018, p. 58.

54KAPLAN, Robert D. - The Tragic Mind. Fear, Fate, and the Burden of Power. Yale University Press, 2023.

55Ibidem, pp. 7-8.

Recebido: 11 de Março de 2023; Aceito: 08 de Maio de 2023

Rafael García Pérez Professor catedrático de Relações Internacionais na Universidad Pablo de Olavide (Sevilha). É também docente no Instituto Universitario General Gutiérrez Mellado (UNED - Ministerio de Defensa), Madrid.

Manuel Iglesias Cavicchioli Professor auxiliar na Universidad Pablo de Olavide (Sevilha), e doutorado em Relações Internacionais pela mesma universidade.

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