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Motricidade

Print version ISSN 1646-107X

Motri. vol.7 no.3 Vila Real July 2011

 

Precisão de conhecimento de resultados na aprendizagem motora em crianças e adultos

 

N.B. BeltrãoI; R.S. HenriqueII; J.N.C. SantosII; A.M.S. MelloII; M.T. CattuzzoII; A.K.M. SiqueiraIII

I Aluna do Mestrado Associado em Educação Física UPE/UFPB, Recife, Brasil
II Grupo de Pesquisa em Comportamento Motor Humano e Saúde; Escola Superior de Educação Física, Universidade de Pernambuco – Recife, Brasil
III Aluna do Mestrado em Saúde Humana e Meio Ambiente, UFPE. Recife, Brasil

Endereço para correspondência

 

RESUMO

O nível de precisão do conhecimento de resultados (CR) é uma variável que interfere na aprendizagem de habilidades motoras, mas esse efeito parece ser diferente para adultos e crianças. Este estudo verificou o efeito da precisão do CR em crianças e adultos durante a aprendizagem de uma tarefa manipulativa com meta de precisão. Quarenta universitários (mulheres = 21.13 ± 2.26 anos; homens = 20.97 ± 2.17 anos) e quarenta crianças (meninas = 9.10 ± .83 anos; meninos = 9.70 ± .48 anos) praticaram uma tarefa de acertar um alvo disposto sobre uma mesa, mediante lançamento de discos metálicos. Foram formados seis grupos experimentais e dois grupos controle (sem CR), cada um com 10 sujeitos. Os grupos experimentais diferiram de acordo com a precisão do CR (CR pouco preciso, CR preciso e CR muito preciso) e o nível de desenvolvimento (crianças e adultos). A medida de desempenho foi o erro absoluto (EA). Foram utilizadas análises de variância three-way (grupos × idades × blocos) e two-way (grupos × blocos) para as fases de estabilização e adaptação. O conjunto dos resultados permitiu concluir que, nesta tarefa, adultos apresentaram melhor desempenho do que crianças em regimes de baixa e intermediária precisão; em regimes de alta precisão de CR, adultos e crianças mostraram desempenhos semelhantes.

Palavras-chave: aprendizagem, conhecimento de resultados, desenvolvimento humano

 

The effect of level of knowledge accuracy of results on learning of motor skills in children and adults

ABSTRACT

The level of knowledge accuracy of results (KR) is a variable that interferes with the learning of motor skills, however such interference does not work the same way in adults and children. This study examined the effects of KR in children and adults during learning of a manipulative task with target accuracy. Forty adults (female = 21.13 ± 2.26 years; male = 20.97 ± 2.17 years) and forty children (female = 9.10 ± .83 years; male = 9.70 ± .48 years) practiced a task of hitting a target placed on a table by the thrown of metal discs. There were six experimental groups and two control groups (without KR) containing 10 subjects each. Experimental groups differed according to the individual's KR (less precise KR, precise KR and very precise KR) and development level (children and adult). Performance measure was the absolute error (AE). A three-way (age × groups × blocks) and two-way (groups × blocks) analysis of variance for the stabilization and adaptation phases were used. Results showed that adults perform better than children in low and intermediate KR and in high KR adults and children showed similar performance.

Keywords: learning, knowledge of results, human development

 

 

Não parece demais afirmar, para qualquer domínio da atividade humana, que não há aprendizagem sem erro. Na aprendizagem motora, os estudos sobre feedback tratam com as informações sobre o erro durante o processo de aquisição de uma habilidade motora; mediante o mecanismo de feedback o aprendiz toma conhecimento se a ação foi executada conforme o planejado, de modo que ele possa agir para diminuir possíveis desvios da meta (Tani, 1989).

Esse conhecimento sobre o erro pode vir tanto de fontes intrínsecas (a percepção do próprio aprendiz) quanto de fontes extrínsecas ao praticante (por exemplo: do professor, de colegas, de sistemas de reprodução de imagens). A informação extrínseca sobre o erro tem sido considerada, por pesquisadores e professores, uma das variáveis essenciais para aprendizagem (Lee, Keh, & Magill, 1993) e quando ela expressa o resultado (produto) do movimento, é chamada de Conhecimentos de Resultados ou CR (Schmidt & Lee, 1999).

Uma das propriedades do CR é o seu grau de precisão. Segundo Salmoni, Schmidt e Walter (1984) a precisão de CR refere-se ao número de unidades métricas significantes acerca da meta da tarefa e, tradicionalmente, os estudos manipulam a precisão de CR informando a direção do erro, também conhecido como CR qualitativo, ou informando a magnitude do erro ou CR quantitativo (Meira, 2005; Wright, Smith-Munyon, & Sidaway, 1997).

A precisão do CR oferecido a uma pessoa pode influenciar a aprendizagem (Mendes & Godinho, 1994; Salmoni et al., 1984). De acordo com Adams (1987), já na década de 1930, Trowbridge e Cason demonstraram que CR específico produzia aprendizagem mais rápida do que CR genérico. Essa influência positiva da precisão do CR foi confirmada em alguns estudos (ex: Gill, 1975; Godinho & Mendes, 1996; Magill & Wood, 1986; Wright et al., 1997) e a razão desta influência parece estar ligada ao fato que informações precisas permitem elaborar os pontos fundamentais à modificação do comportamento, conforme proposto pela hipótese de guia do CR (Salmoni et al., 1984).

Entretanto, algumas características do método podem limitar a extensão das conclusões. Por exemplo, Mendes e Godinho (1994) mostraram que, embora a maioria dos estudos confirme o efeito positivo de um mais elevado grau de precisão de CR, isso pode não ser generalizável, principalmente pelo fato dos estudos nem sempre utilizarem testes de retenção e/ou transferência. A escala métrica utilizada na tarefa também pode ser um fator limitador (Newell & Kennedy, 1978).

Outra questão acerca do efeito da precisão de CR diz respeito aos níveis de desenvolvimento dos aprendizes. Thomas, Mitchell e Solmon (1979) verificaram que crianças mais velhas (10 anos) parecem beneficiar-se de um aumento da precisão de CR na aprendizagem e retenção de uma tarefa de posicionamento linear e angular, mas o mesmo não acontece com crianças mais novas (7 anos). No estudo de Ximenes (2008) pouca ou nenhuma diferença de desempenho foi encontrada com o aumento da precisão de CR entre crianças de 4 e 6 anos de idade; no estudo de Mendes (1994; citado por Mendes & Godinho, 1994), que teve por objetivo testar o efeito da precisão de CR com adultos e crianças, os resultados sugeriram que o aumento da precisão do CR não pareceu trazer efeitos positivos nem para adultos nem para crianças.

Segundo Mendes e Godinho (1994) as crianças, diferentemente dos adultos, podem não ter capacidade suficiente para processar o aumento da precisão de CR. Os aspectos cognitivos relativos à formação e consolidação de modelos internos (representações) do movimento estão relacionados à maturidade do sistema nervoso das crianças, o que pode explicar as desvantagens dos aprendizes mais novos (Palazzin, 2007). Paralelamente às controvérsias sobre a confirmação ou não do efeito da precisão de CR, os estudos anteriormente apresentados são formatados dentro dos moldes da abordagem dos sistemas motores, muitas vezes utilizando a Teoria do Esquema (Schmidt, 1975). Nesta visão de aprendizagem, o conhecimento sobre o erro constitui-se na informação que irá fortalecer o esquema na sua operação de especificar respostas motoras e suas correções.

Sob uma outra óptica para compreender e avaliar a aprendizagem, Meira (2005) apontou que a redução excessiva de incerteza, manipulada por intermédio de regimes de CR com muita frequência e precisão, não se mostrou necessária para a aprendizagem motora. Este estudo foi desenvolvido na abordagem do Processo Adaptativo, na qual o conhecimento sobre o erro pode ser pensado como mais um elemento que combate a entropia a qual todos os sistemas abertos estão sujeitos, importando ordem para o sistema; os erros podem ser vistos como flutuações necessárias na formação de um estado estável (Manoel, 2001). Nessa abordagem, Tani, Meira e Gomes (2005), estudando a aprendizagem de uma tarefa de preensão manual com adultos, concluíram que além da diminuição da frequência e das atividades interpoladas, a redução da precisão do CR pode ser fonte de instabilidade que não prejudica a aprendi-zagem. Assim, a presença de incerteza parece ser fundamental para garantir o fluxo livre de informação que permite o sistema adaptar-se às novas situações ou demandas.

Considerando a controvérsia existente sobre o efeito da precisão do CR em adultos em crianças, e que na abordagem do Processo Adaptativo só foram feitos estudos com adultos, o presente estudo objetivou verificar o efeito do aumento da precisão do CR em crianças e adultos; especificamente, analisar os efeitos da precisão do CR nas fases de estabilização e adaptação da aprendizagem de uma tarefa manipulativa com meta de precisão espacial.

 

MÉTODO

Esta é uma pesquisa quase-experimental (Thomas & Nelson, 2002), parte integrante de um projeto de pesquisa financiado pelo Edital MCT/CNPq 14/2008 Universal, processo n.º 476940/2008 7, aprovado pelo Comitê de Ética protocolo n.042/08, CAAE 0042.0.097.000-08.

 

Amostra

Participaram do presente estudo quarenta universitários adultos jovens (mulheres = 21.13 ± 2.26 anos; homens = 20.97 ± 2.17 anos) e quarenta crianças (meninas = 9.10 ± .83 anos; meninos = 9.70 ± .48 anos), pareados quanto ao gênero. Os adultos eram estudantes da Escola Superior de Educação Física da Universidade de Pernambuco, e as crianças eram provenientes do Projeto de Extensão “Santo Amaro” da mesma instituição. Nenhum dos participantes tinha experiência anterior com a tarefa. Todos os participantes ou seus responsáveis assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido para participação em pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética da UPE.

 

Instrumentos

A tarefa manipulativa, discreta, com meta de precisão espacial, consistia em acertar o centro de um alvo circular distante 2 m da área de lançamento, mediante o arremesso de discos de metal (3.5 cm de diâmetro, 2 cm de altura e 160 g de peso). O alvo estava disposto horizontalmente sobre uma mesa, que era cercada por uma borda de madeira forrada com material emborrachado, com 20 cm de altura. O alvo era demarcado por quatro faixas circulares e quatro quadrantes. Cada faixa do alvo media 7 cm e a cada uma foi atribuída a pontuação de erro de acordo com a distância do centro do alvo (0, 7, 14, 21 e 28) (Figura 1).

 

Figura 1. Esquema representativo do dispositivo experimental

 

A tarefa foi executada a partir da posição em pé, utilizando a mão dominante e a outra apoiada na mesa. Uma cortina impedia a visualização do resultado do lançamento, fazendo com que o CR verbal dado pelo experimentador fosse a única informação suplementar sobre o erro que o aprendiz teria para o desenvolvimento da sua ação. As coletas foram realizadas no Laboratório de Biomecânica do Centro de Estudos da ESEF-UPE.

 

Procedimentos

Os participantes foram distribuídos aleatoriamente em oito grupos, com dez participantes em cada um e pareados por gênero, de acordo com níveis de desenvolvimento e níveis de CR. Nos grupos pouco preciso de crianças e adultos (PPCr e PPAd) o CR indicava cor da faixa; nos grupos precisos (PCr e PAd) o CR indicava a faixa e o quadrante; nos grupos muito precisos (MPCr e MPAd) o CR indicava o quadrante e a localização exata do disco dentro da faixa; nos grupos controle (CCr e CAd) não era fornecido CR.

Antes de iniciar o experimento cada participante realizou cinco tentativas-ensaio. O experimento foi dividido em duas fases: estabilização e adaptação. Cada participante deveria executar 60 tentativas consecutivas na fase de estabilização, com intervalo intertentativas de 10 s, sob um regime de frequência de CR de 66% (2 tentativas consecutivas com CR, seguida por uma tentativa sem CR) totalizando 40 CRs em 60 tentativas. Os participantes dos grupos experimentais eram informados que às vezes receberiam CR e às vezes não.

Após as 60 tentativas da fase de estabilização, era inserida uma perturbação (colocação de um disco de metal de 5 cm de diâmetro à frente da cortina, obstruindo o centro do alvo), dando início à fase de adaptação composta por 10 tentativas, todas sem CR.

Uma vez que a meta da tarefa e, portanto, da aprendizagem, foi de precisão, a medida de desempenho utilizada no presente estudo foi o escore do erro atribuído à precisão espacial (erro absoluto – EA). Essa medida também foi utilizada em estudos anteriores realizados sob a mesma abordagem teórica (Tani et al., 2005).

Os escores do EA caracterizaram-se como variáveis numéricas discretas e os valores possíveis eram: 0, 7, 14, 21 e 28. O valor zero representava a meta, e o valor vinte e oito representava fora do alvo. Os dados foram analisados mediante a somatória dos pontos em blocos de 5 tentativas.

 

Análise Estatística

Para as análises deste estudo optou-se por utilizar o bloco inicial e final na fase de estabilização e os dois blocos da adaptação. Essa opção deve-se ao fato de que o estudo não teve por objetivo investigar o processo da estabilização, mas o início e o final da mesma.

A utilização de testes paramétricos levou em conta a inspeção dos histogramas, verificação da normalidade da distribuição dos dados (teste Shapiro-Wilk) e homogeneidade da variância (teste de Levene). Foram realizadas análises de variância (ANOVA) para medidas repetidas (blocos). Para identificar a localização das diferenças significativas foi utilizado o post-hoc com o teste de Newman-Keuls.

O nível de significância foi de p < .05. Os pacotes estatísticos utilizados foram o SPSS 17.0 e Statistica 5.1.

 

RESULTADOS

Semelhança inicial dos grupos

Inicialmente foram feitas análises de diferenças entre os níveis de desenvolvimento (teste t para amostras independentes) para o bloco inicial, estratificados por grupo, para verificar se os sujeitos partiam da mesma linha-base. Não houve diferença significativa entre crianças e adultos em qualquer um dos grupos confirmando, portanto, que todos os participantes eram semelhantes no início do processo de aprendizagem.

 

Análise entre grupos

Na fase de estabilização a ANOVA three-way (4 grupos × 2 idades × 2 blocos) indicou existir diferenças entre grupos, F(3,72) = 6.21, p < .001, blocos, F(1,72) = 4.71, p = .003, e idade, F(1,72) = 23.15, p < .001, mas não indicou efeito de interação. Na fase de adaptação a ANOVA three-way indicou diferença significativa somente para grupos, F(3,72) = 2.87, p = .04, e também não houve efeito de interação.

 

Análise entre os níveis de precisão de adultos

Na análise entre os grupos de adultos para a fase de estabilização (ANOVA two-way - 4 grupos × 2 blocos) foi encontrada diferença significativa para grupos, F(3,36) = 4.57, p = .008, blocos, F(1,36) = 18.81, p < .001, mas não para efeito de interação. Na fase de adaptação não foi encontrada qualquer diferença.

 

Análise entre os níveis de precisão de crianças

Entre os grupos de crianças, na fase de estabilização, a ANOVA two-way indicou diferença entre blocos, F(1,36) = 6.89, p = .012, diferença marginal entre grupos, F(3,36) = 2.65, p = .062, mas não houve efeito de interação. Já na análise da fase de adaptação não houve qualquer diferença significativa.

 

Análise entre grupos: Crianças × adultos em cada nível de precisão de CR

A partir de então, a análise objetivou verificar as possíveis diferenças entre crianças e adultos em cada nível de precisão de CR (ver Figura 2), nas fases de estabilização e adaptação, mediante ANOVA two-way. Entre os grupos controle (CCr e CAd), nas fases de estabilização e adaptação não houve diferenças significativas entre crianças e adultos. Também não houve diferença significativa para efeitos de blocos e interação.

 

Figura 2. Média do somatório do erro absoluto, nas fases de estabilização (B1 – B12) e adaptação (B13 – B14) nos grupos controle de crianças e adultos (CAd e CCr), nos grupos com CR preciso (PAd e PCr), nos grupos pouco preciso (PPAd e PPCr) e muito preciso (MPAd e MPCr)

 

Nos grupos tratados com pouca precisão de CR (PPCr e PPAd) houve diferença significativa, com superioridade para os adultos na fase de estabilização, F(1,72) = 2.87, p = .03, mas isso não ocorreu na adaptação. Houve diferença significativa para efeitos de blocos, F(1,18) = 9.35, p = .006, mas não houve efeito de interação.

Nos grupos que receberam CR preciso (PCr e PAd) também houve superioridade significativa dos adultos na fase de estabilização, F(1,72) = 5.04, p = .03, mas não houve diferenças na fase de adaptação. Houve diferença significativa para efeitos de blocos, F(1,18) = 9.80, p = .005, mas não houve efeito de interação.

Nos grupos tratados com o mais alto grau de precisão de CR (MPCr e MPAd) não houve diferença estatisticamente significativa entre crianças e adultos tanto na fase de estabilização, como na fase de adaptação. Verificou-se uma diferença significativa para efeitos de blocos, F(1,18) = 17.78, p < .001), mas não se verificou um efeito significativo de interação.

 

DISCUSSÃO

CR como guia para a ação correta

O objetivo desse estudo foi verificar o efeito de diferentes regimes de precisão de CR em crianças e adultos. Uma das hipóteses era que a presença de CR beneficiasse a aprendizagem. Verificou-se que todos os grupos que receberam CR, independentemente do nível de precisão, conseguiram uma melhora significativa do desempenho, em relação ao início da estabilização, indicando que a presença de CR foi efetiva. Esses dados evidenciam a funcionalidade do CR como um elemento que conduz o aprendiz para a ação correta e estabilização do desempenho (Blackwell & Newell, 1996; Salmoni et al., 1984). Já na fase de adaptação, a presença de CR não trouxe vantagem para qualquer um dos grupos. Esse resultado sugere, portanto, que a modulação oferecida pela presença do CR durante a estabilização do sistema não foi revertida para a adaptabilidade do mesmo.

Na comparação dos grupos experimentais com os grupos controle, a ausência de CR, tanto para crianças quanto para adultos, parece ter afetado negativamente a aprendizagem. A condição de ausência de CR pode ter elevado a dificuldade nominal da tarefa a qual, de acordo com Guadagnoli e Lee (2004), é a quantidade de dificuldade independente do nível de habilidade do aprendiz.

 

Crianças × adultos: Efeitos da precisão do CR

Outra das hipóteses neste estudo era que adultos seriam superiores às crianças uma vez que elas são consideradas processadores de informações menos eficientes (Newell & Kennedy, 1978; Palazzin, 2007). Essa hipótese foi parcialmente confirmada: o conjunto dos resultados mostrou superioridade para adultos somente quando esses receberam informação em níveis reduzidos ou intermediários de precisão. No grupo de alta precisão de CR, o desempenho de crianças e adultos foi semelhante.

A superioridade dos adultos, nos grupos tratados com CR pouco preciso e preciso, poderia ser um indicativo de que sistemas que acumulam mais experiência têm mais recursos para a aprendizagem de uma nova tarefa – base de conhecimento (Dantas, 2000). Mesmo sendo uma tarefa nova para todos, os adultos podem ter vivenciado habilidades com demandas semelhantes às do presente estudo, ou seja, podem possuir mais conhecimento acerca deste domínio específico (Dantas, 2000). Além disso, fundamentado na abordagem do Processo Adaptativo, pode-se interpretar esses resultados justificando que adultos são sistemas mais complexos que crianças, pois já passaram por muitos ciclos estabilidade–instabilidade, portanto têm maior competência para reduzir incerteza na aprendizagem de novas tarefas. Mas como explicar que num nível mais elevado de CR adultos e crianças mostraram desempenho semelhante? Esse achado contrasta com outros resultados da literatura.

Num artigo que buscou comparar as diferenças desenvolvimentais de adultos e crianças no uso de CR progressivamente mais preciso, Newell e Kennedy (1978) sugeriram que um nível ótimo de precisão de CR variava em função da idade: com o aumento da idade as crianças eram mais competentes para tratar com o aumento da especificidade da informação.

De acordo com nossos achados, o aumento da precisão de CR beneficiou as crianças: elas obtiveram desempenho semelhante aos adultos quando receberam informação mais precisa. A limitada capacidade de processamento da informação das crianças parece ter sido compensada pelo aumento da precisão do CR; ele potencializaria a redução da incerteza presente na tarefa, além de favorecer o foco atencional e o envolvimento cognitivo da criança com a tarefa.

Nossos resultados são consistentes com o quadro Ponto de Desafio proposto por Guadagnoli e Lee (2004), de acordo com o qual os benefícios da prática são maximizados se ela envolver um nível apropriado de esforço cognitivo do aprendiz. Também corrobora com a proposta de Hattie e Timberley (2007) que sugere que quando o CR focaliza a auto-regulação é poderoso na medida em que leva a investir mais esforços na tarefa, para aumentar a auto-eficácia.

 

A escala métrica e o processamento de informação de CR: Diferenças entre adultos e crianças

Um tópico a ser explorado em nosso estudo refere-se à escala métrica do CR. Conforme já foi argumentado em outros estudos sobre precisão do CR (ex: Newell & Kennedy, 1978), é possível que a dificuldade das crianças de interpretar o CR muito específico esteja relacionada à limitação de associar uma escala métrica quantitativa aos estímulos sensoriais (Fajen, Riley, & Turvey, 2008). A métrica utilizada em nosso estudo poderia ser considerada como tendo maior validade ecológica, pois utiliza uma escala gráfica (não-numérica), com níveis crescentes de especificidade da informação sobre o erro, o que poderia ter auxiliado as crianças no processamento da informação.

Outro ponto a ser considerado é que crianças e adultos parecem usar CR de maneira diferente. Num recente estudo comparando crianças de dez anos e adultos jovens, Sullivan, Kantak e Burtner (2008) investigaram o efeito de diferentes frequências de CR, numa tarefa discreta de manipular uma alavanca, com meta de precisão espacial. Durante a prática, os adultos foram significativamente melhores que crianças; adultos que praticaram com CR reduzido (62%) tiveram melhor desempenho na retenção quando comparado com os que praticaram com 100% de CR; em contraste, crianças que praticaram com CR reduzido tiveram um desempenho pior na retenção. Contudo, quando o CR foi reintroduzido num teste de reaquisição, as crianças do grupo de CR reduzido foram capazes de melhorar seu desempenho comparável àquelas do grupo de 100% de CR. Os resultados levaram os autores a concluírem que crianças usam o CR de maneira diferente dos adultos; eles propuseram que para otimizar a aprendizagem as crianças poderiam requerer períodos de prática mais longos com o CR sendo reduzido mais gradualmente.

Finalmente, como limitação desse estudo deve-se lembrar que, possivelmente, a quantidade de sujeitos por grupo (n = 10) pode ter limitado o poder estatístico da análise. Sugere-se que novos estudos que sejam feitos sobre essa temática considerem tanto o tamanho amostral, quanto o cuidado com a escala métrica usada no dispositivo experimental.

 

CONCLUSÕES

Diante do exposto, o conjunto dos resultados do presente estudo permite concluir que, numa tarefa com meta de precisão espacial, adultos apresentaram melhor desempenho do que crianças em regimes de baixa e intermediária precisão de CR durante a estabilização, mas não na sua adaptabilidade. Em regimes de alta precisão de CR, adultos e crianças revelaram desempenhos semelhantes.

 

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Agradecimentos. Os autores agradecem o apoio financeiro - Edital Universal CNPq, processo 476940/2008-7

 

Submetido: 23.05.2010 | Aceite: 11.11.2010

 

Endereço para correspondência: Maria Teresa Cattuzzo, Escola Superior de Educação Física, Rua Arnóbio Marques, nº 310, Santo Amaro, CEP: 50100-130 Recife, PE, Brasil. E-mail: mtcattuzzo@hotmail.com

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