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Motricidade

versão impressa ISSN 1646-107X

Motri. vol.8 no.3 Vila Real jul. 2012

https://doi.org/10.6063/motricidade.8(3).1151 

Um obrigado ao atleta Olímpico

A thank-you to the Olympic athlete

 

J. Vasconcelos-Raposo

 

 

Este editorial da Motricidade, inevitavelmente, debruça-se sobre os jogos Olímpicos de Londres 2012.

Os Jogos Olímpicos são na sua essência a festa de uma das facetas culturais que mais se predispõe à redefinição da excelência das capacidades humanas: O desporto. De quatro em quatro anos reunem-se os melhores atletas que cada país tem nas muitas das modalidades desportivas que por lá se praticam. Em Londres estiveram presentes de 204 países e pela primeira vez todos se fizeram representar por atletas de ambos os sexos. Este é o feito que elegemos para destacar o que de mais verdadeiro há no Espírito Olímpico moderno.

Quando pretendemos falar dos Jogos Olímpicos, são muitas as facetas que podem servir de base para a análise do evento olímpico e decerto que todas são válidas. Na imprensa e nos media da especialidade desportiva, escreve-se muito sobre o número de medalhas, sobre a relação entre investimento económico e obtenção de resultados que quase sempre são medidos por medalhas e em alguns casos pelas classificações pessoais. Excecionalmente essas avaliações são feitas em função dos próprios atletas, por regra tendem a servir de validação da liderança das instituições que são apresentadas como parte constituinte da família olímpica. Mas em verdade são os atletas, no seu conjunto, quem efetivamente expressam o que de melhor há a ser promovido pelo Olimpismo moderno.

O olimpismo atual alicerça-se em três grandes valores socioculturais: Excelência, amizade e respeito. A presença dos atletas nos Jogos deverá ser um exemplo de como estes princípios, exemplificados de forma extrema na prática desportiva, na realidade devem ser parte integrante do processo educativo que visa “construir” melhores seres humanos e, consequentemente, melhores cidadãos. Apresentam-se aos Jogos os melhores que cada país tem para se fazer representar. A todos os atletas é exigido que, tanto na competição como na vida, se comportem como agentes dignificadores da imagem de cada Nação, algo que não é conseguido com a mera conquista de medalhas, mas pelo percurso que tiveram ao longo dos anos que medearam a realização dos jogos. Cada atleta, ao longo de muitos anos, teve de enfrentar contrariedades, abdicar de muito para aderir a um estilo de vida que só está ao alcanse de alguns. Nessa caminhada conheceram momentos de vitória e de derrota e sempre procuraram aprender com ambas as sensações, para melhor se prepararem para a festa que se quer Universal e que está representada nos Jogos Olímpicos. Ninguém chega aos Jogos Olímpicos sem ter uma caminhada onde evidenciou ter dado o melhor de si quer nas competições em que participou quer na vida que teve de ter durante esse percurso. Por estas razões é que todos, independentemente dos resultados que obtenham nos Jogos propriamente ditos, são exemplos vivos do que se deve entender por excelente. E por nos quererem representar são merecerdores do nosso respeito, admiração e gratidão, porque o que reconhecemos e apreciamos foi o esforço, o empenho e a motivação que foram evidenciados ao longo do percurso. Se vierem medalhas, melhor e mais gratificante para o atleta porque foi o melhor entre os melhores, mas se as medalhas não vierem o respeito, a admiração e a gratidão mantêm-se porque nunca deixarão de ser o melhor que cada país teve para dar.

Durante os Jogos, na aldeia Olímpica, os seus habitantes convivem e na tranquilidade do encontro e da conversa facil dão forma a uma maneira de estar que deveria inspirar as populações de todo o Mundo, em particular nos momentos de escolha dos seus agentes políticos. O sentimento de amizade que se experimenta não é compatível com o que ocorre em tantos dos países que ali estão representados. Países em guerra, durante a vivência dos Jogos, poderão aprender como no confronto leal da competição a convivência e até a discordia são possíveis sem que a Paz seja perturbada. Em cada atleta Olímpico poderemos encontrar um embaixador da paz, um promotor e um exemplo do respeito mútuo e por mais estes motivos, em cada um deles, poderemos espelhar um pouco da esperança de que um Mundo melhor está ao alcance de todos os Homens e Mulheres de boa vontade.

A aldeia é, por excelência, um local onde se reunem sonhadores, porque nunca atleta algum chegou lá sem a fantasia de poder ser melhor do que em qualquer outro momento da sua caminhada. Esse sentimento anima-lhes e enche-lhes de ânimo, para poderem ser mais fortes e irem mais alto e mais longe. Todos que respeitam o seu próprio trabalham empenham-se para que assim seja. Mas a realidade é que nem todos os sonhos se poderão concretizar e que só poucos se consagrarão entre eles próprios: os Olímpicos. É nesta troca intensa de experiências pessoais que nascem amizades e solidariedades que nunca seriam possíveis se ao longo de uma vida de esforço não se tivessem consagrado como os melhores dos seus países.

Nos jogos, Homens e Mulheres convivem num ambiente de liberdade que deveria ser descrito com mais detalhe e riqueza por aqueles que o viveram. É durante os Jogos que a igualdade entre os sexos mais se acentua e os Jogos de 2012 foram um exemplo maior deste facto. Todos os países estiveram representados por atletas de ambos os sexos. Foi dado um exmplo de como com engenho e boa vontade todas as dificuldades podem ser ultrapassadas. As adversidades políticas forma postas de lado e no livre convívio, promovido pela competição desportiva, novos olhares ganharam forma e um pouco mais de tolerância foi aprendido por quem viveu de perto a experiênica de se ser Olímpico.

O respeito é de entre os valores básicos do Olimpismo talvez o mais simples de por em prática, mas é também aquele que os atletas mais tendem a infrigir e em parte porque o que está na essência deste valor parte de um sentimento de confiança nos outros. Tal como toda a criança acredita nos pais também os atletas confiam naqueles que lhes ensinam ser a família Olímpica, ou seja, os Comités Olímpicos, as Federações Desportivas, as Associações e os Clubes em que cada atleta se integra. Aparentemente, com o passar dos anos, esta estrutura familiar apresenta-se disfuncional, na medida em que centra a sua intervenção não no sucesso dos seus atletas, mas sim na contabilização egoísta dos resultados, porque como dirigentes procuram apoderar-se do sucesso dos atletas para se autopromoverem esquecendo que o seu papel garantir e apoiar os atletas ao longo de todo um percurso de anos até ao momento da competição olimpica. Os atletas acabam sendo transformados em instrumentos ideológicos e, infelizmente, de afirmação pessoal de quem se limitou a apoderar-se dos meios para nutrir a excelência. Uma vez nos Jogos, todos os atletas dão o melhor de si e em todos os momentos. O momento Olímpico, tal como preconizado pelo seu espírito, vai muito para além do momento da competição. Saber dar forma a cada um dos valores do Olimpismo requer que os atletas sejam educados sobre esses mesmos valores e sobre os momentos mais adequados para se os viver. Mas quem de entre os membros da família dedicou esse tempo para ensinar estes aspetos aos que lá vão pela primeira vez? Quem os ensinou a gerir as emoções e controlar o dispendio energético de forma a melhor salvaguardar a concretização das prestações máximas? Ninguém pode afirmar ter dado tudo aos atletas para que fossem bem sucedidos quando na realidade nem lhes deram os aspetos mais elementares para serem bem sucedidos num evento com as caraterísticas dos Jogos Olímpicos. Gastasse muito dinheiro na preparação dos atletas, é um fato, mas a forma como esse capital é gasto serve mais para justicar gestores e instituições do que efetivamente apoiar os atletas propriamente ditos.

Aqueles atletas que têm a felicidade de repetir as suas participações em Jogos Olímpicos, pela experiência acumulada, gerem melhor os seus tempos da vida na aldeia olímpica. Apenas os agentes socializantes, como são os dirigentes desportivos e os treinadores de capacidades reduzidas, cingem a sua intervenção à construção de tarefas e imposições aos atletas para conseguirem resultados e de preferência na forma de medalhas. Esquece-se que na realidade são os atletas que competem e que eles estão presentes, como representantes da família Olímpica para apoiar os atletas nos momentos bons, mas também, e principalmente, nos momentos idesejados, talvez por isso, esses “familares” ignoram aquilo que de mais belo há na competição e que se quer leal e honesta: a imprevisibilidade do resultado.

Os “familiares disfuncionais” são aqueles que procuram afirmar-se como dirigentes de sucesso à boleia do sucesso dos atletas na competição. Os familiares saudáveis são aqueles que se esforçaram para apoiar os atletas ao longo dos períodos longos de preparação (anos) e que sabem avaliar a eficácia do seu contributo com base naquilo que foram as condições proporcionadas aos atletas: devem chegar ao fim dos Jogos com a consciência tranquila que fizeram o que estava ao seu alcance para que os atletas se preparassem da melhor forma – foi essa a sua única missão. Os resultados desportivos devem ser entendidos como algo da quase exclusiva responsabilidade dos atletas com a conivência dos seus treinadores e equipa técnica e por essa razão as únicas opiniões efectivamente relevantes para entendermos a alegria ou a tristeza deles é aos atletas e aos membros da equipa tecnica que importa dar voz. Aos outros, os dirigentes, compete apoiar esses membros da família e com eles festejar o sucesso do culminar de período da vida que optaram ter para a todos nós representarem.

Ao público em geral fica o esplenderoso espetáculo que os atletas nos proporcionaram e a gratidão por termos, durante dias, vivenciado momentos em que mais que a nossa limitada condição de nacionalista nos foi possível ter os nossos próprios herois e cada um deles com a sua nacionalidade. Todos aqueles atletas proporcionaram-nos a oportunidade de nos afirmarmos como melhores Seres Humanos, porque fomos capazes de ir além do nosso nacionalismo e de outros aspectos culturais para nos centrarmos na excelência humana representada em cada atleta que apoiavamos e cujas prestações nos enriqueceram emocionalmente.

Neste momento de balanço a Motricidade, neste editorial, homenagea todos os atletas e treinadores Olímpicos e expressa a sua gratidão pelo maravilhoso espetáculo que nos proporcionaram e pelos exemplos de vida que nos deram.

Londres acabou e o Rio de Janeiro vem a caminho e com o calor e o humanismo que tipificam o Brasileiro só podemos estar certos que tudo o que de melhor foi conseguido no Espírito Olímpico durantre os Jogos de Londres melhor será nos Jogos do Rio-2016.

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