SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.11 issue3Functional capacity retention in older women after multicomponent exercise cessation: 3-year longitudinal studyThe agreement between physical activity time reported by the IPAQ and accelerometer in postmenopausal women author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Journal

Article

Indicators

Related links

  • Have no similar articlesSimilars in SciELO

Share


Motricidade

Print version ISSN 1646-107X

Motri. vol.11 no.3 Ribeira de Pena Sept. 2015

https://doi.org/10.6063/motricidade.4034 

ARTIGO ORIGINAL

 

Escala de Crenças Irracionais aplicadas a atletas: Proposta de interpretação através do Modelo de Créditos Parciais

 

The Irrational Belief Scale applied to Brazilian athletes: Interpretation proposal through the Partial Credit Model

 

 

Evandro Morais Peixoto1,*; Tatiana Cássia Nakano1; Bartira Pereira Palma2

1 Pontifícia Universidade Católica de Campinas PUCC, Brasil
2 Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFEU-SP), São Paulo, Brasil

 

 


RESUMO

Nesta pesquisa buscou-se evidências de validade e precisão, bem como normas de interpretação da ECI frente à população de atletas brasileiros. Participaram do estudo 205 atletas com idade entre 18 e 48 anos (média ± desvio padrão = 22.44 ± 5.25; 50.7% homens), representantes das seguintes modalidades esportivas: Futsal, Basquete, Vôlei, Rugby, Natação e Atletismo, categorias Adulta (73.7%) e Juvenil (26.3%). As respostas a ECI foram submetidos aos seguintes procedimentos estatísticos: Análise de Componentes Principais, Análise Paralela,  análise da consistência interna. Através do Modelo Rasch-Masters Partial Credit Model avaliou-se as propriedades dos itens, índices de dificuldade e ajuste (infit e outfit) e mapa de pessoas-itens. Resultados indicaram que escala avalia o construto Crenças Irracionais através de duas dimensões: passividade diante situações ou características que não podem ser modificadas; e capacidade de resolução de situações atuais e futuras, com índices de consistência interna condizentes com os indicados pela literatura 0.76 (n=10) e 0.66 (n= 18) respectivamente, 0.80 para escala total (n= 18). Em relação aos ajustes dos itens, todos se mostraram adequados (> 0.76 < 1.21 infit) e (> 0.71 < 1.3 outfit, com exceção de um item). A análise dos mapas proporcionou aumento da compreensão das pontuações obtidas pelos participantes em cada item do instrumento, apontando a ECI como um instrumento promissor a ser utilizado entre os psicólogos do esporte.

Palavras-chave: Testes psicológicos, Teoria de resposta ao Item, Psicologia do Esporte, Crenças, Irracionalidade.


ABSTRACT

Validity and reliability evidences, as well as interpretation standards for ECI in Brazilian athletes were assessed in this study. The study sample consisted of 205 athletes. They were all between 18 and 48 years (mean ± SD = 22.44 ± 5.25; 50.7% men). The volunteers were practitioners of the following sports modalities: Indoor Soccer, Basketball, Volleyball, Rugby, Swimming and Athletics. Further they were of two sport levels: adult (73.7%) and juniors (26.3%). Subject’s answers to ECI were subjected to the following statistical analyses: Principal Components Analysis, Parallel Analysis, Internal Consistency. Items properties, indices of difficulty and adjustment (Infit and Outfit) and analysis of the person-item map were assessed through Rasch-Model Masters Partial Credit Model. It was observed that the ECI evaluates the construct Irrational Belief through two dimensions: passivity when facing situations or characteristics that cannot be modified and ability to solve current and future situations. Internal consistency indices for these dimensions were consistent with those indicated by the literature 0.76 (n = 10) and 0.66 (n = 18) respectively, 0.80 for the total scale (n = 18). All items settings were suitable (> 0.76 <1.21 infit) and (> 0.71 <1.3 outfit, except for one item). Analysis of the maps increased the understanding of the scores obtained by the participants in each item of the scale thus pointing to ECI as a promising instrument to be used by sport psychologists.

Key-words: Psychological testing, Item response theory, Sport psychology, Beliefs, Irrationality.


 

 

INTRODUÇÃO

O objetivo geral desta pesquisa foi obter evidências de validade e precisão, apresentar uma proposta de interpretação da Escala de Crenças Irracionais (ECI) baseada na Teoria de Resposta ao Item frente a uma população de atletas, bem como comparar essas evidências com os estudos que introduziram a escala no Brasil, realizado com amostra compostas por estudantes universitários (Yoshida & Colugnati, 2002).

Definidas como interpretações ilógicas que sujeito desenvolve a respeito de si mesmo, das pessoas ao seu redor e do mundo em geral, as crenças irracionais caracterizam-se como o foco principal da Terapia do Comportamento Racional Emotivo-REBT desenvolvida por Ellis (1995). Sua importância baseia-se no fato de que as mesmas caracterizam-se como produtoras de emoções negativas e comportamentos disfuncionais, o que consequentemente distancia os indivíduos de comportamentos adaptativos e dificulta o alcance das metas e objetivos, podendo inclusive originar distúrbios emocionais, comportamentais e interpessoais (David, Lynn, & Ellis, 2010; Ellis, 2003).

Nessa perspectiva, o principal objetivo do psicoterapeuta fundamentado na REBT é despender esforços junto ao paciente para identificar essas crenças, compreender o desenvolvimento e manutenção destas ideias, e substitui-las por crenças racionais, ou seja, aquelas pautadas em percepções realistas de si mesmo, das relações pessoais e do ambiente do qual faz parte (Ellis, 2003). Segundo Lega (2002) ao contrário das crenças irracionais, as crenças racionais baseiam-se em percepções funcionais do indivíduo, o que possibilita interações mais realistas consigo mesmo, com o ambiente ao redor e eventos futuros.

Pesquisas empíricas têm demonstrado à efetividade da REBT junto ao contexto esportivo. Nesta direção, o estudo conduzido por Elko e Ostrow (1991), apresentou eficácia das REBT para o rebaixamento de elevados níveis de ansiedade de ginastas universitárias. Turner e Barker (2013) observaram a diminuição significativa de crenças irracionais e ansiedade cognitiva em jovens atletas da modalidade críquete após serem submetidos a três sessões de aconselhamento, realizadas semanalmente, e duas tarefas realizadas em casa com foco no controle da ansiedade e reconhecimento das próprias necessidades. Também Turner, Slater, e Barker (2014) verificaram os efeitos de um workshop educacional, baseado no modelo REBT, nas crenças irracionais de atletas de futebol. Análise pré e pós intervenção, avaliados antes do workshop (pré-teste), imediatamente após (pós-teste), e seis semanas após o workshop (follow-up) demonstraram redução temporária das crenças, com tamanho do efeito avaliado através do d de Cohen igual a 1.11 para pós teste e 0.74 para (follow-up), de modo a indicar a efetividade desta técnica frente à população de atletas. 

Vale ressaltar que a definição de crenças irracionais passou a ser valorizada no contexto esportivo desde as discussões propostas pelo próprio Albert Ellis, quando apresentou as crenças irracionais mais comuns aos atletas e suas influências no desempenho esportivo (Ellis, 1982, 1994). Segundo Ellis (1982) existiria quatro principais crenças irracionais específicas que podem acometer os atletas e interferir negativamente no rendimento esportivo: 1) “Devo ser perfeito em minha modalidade esportiva, se eu não conseguir serei um incompetente”; 2) “Devo fazer tudo certo para ganhar o amor e a aprovação dos outros”; 3) “Todo mundo deveria me tratar com respeito e justiça sempre; e 4) “as situações enfrentadas diariamente nunca devem sair do meu controle”, as quais deveriam ser identificadas quanto sua presença e seus efeitos  minimizados através de intervenções psicológicas pertinentes. Além disso, Ellis (1994) identificou crenças irracionais gerais que poderiam prejudicar os atletas na busca de seu melhor desempenho: “Se eu não fizer bem, eu sou incompetente” e “Devo fazer bem, porque se não, o que vão dizer?”, as quais também merecem atenção.

Para Ellis (2003) quando as pessoas desenvolvem grande apego ao sucesso e ao reconhecimento tendem a tornarem-se ansiosos devido a incessante busca desses objetivos, o que consequentemente contribui para desenvolvimento de perturbações psicológicas e prejuízo quanto à resolução das tarefas que o levariam ao sucesso. Especificamente no contexto esportivo, o autor destaca que as crenças irracionais são desenvolvidas no decorrer do desenvolvimento pessoal do atleta, bem como na sua relação com as equipes esportivas. Como consequência podem refletir desde as pressões sofridas pelos pais e pessoas significantes no início da carreira, até mesmo as exigências sociais, dos técnicos e companheiros de equipe pela vitória a qualquer custo (Ellis, 1982, 1994). De acordo com Llamas e Abello (2008) as crenças irracionais podem prejudicar os atletas à medida que estes se distraem emocionalmente e distanciam-se do foco necessário para a realização das tarefas ligadas aos treinamentos e competições, de maneira a aumentar as emoções negativas e prejudicar diretamente o desempenho esportivo.

Nessa direção, pesquisadores (Llamas & Abello, 2008; Román & Savoia, 2003; Turner & Barker, 2013) tem buscado descrever a relação entre crenças irracionais e outros fatores psicológicos no contexto esportivo. De modo geral o que se observa é a hipótese de que indivíduos com maiores índices de crenças irracionais apresentam menor desempenho esportivo e maior desgaste emocional, ao contrário dos sujeitos que apresentam menores índices, os quais desfrutam de melhor desempenho, bem como menor sofrimento psicológico (Ellis, 1994; Sparkes, 2011). Por esse motivo, torna-se essencial que as crenças irracionais sejam trabalhadas junto a esportistas, e que o profissional prático tenha disponíveis instrumentos adequados para avaliação deste construto (Turner & Barker, 2014).

É crescente o número de pesquisas empíricas com o objetivo de operacionalizar e estimar as relações entre crenças irracionais e outros construtos psicológicos, bem com o rendimento esportivo. Para Matta, Bizzaro, e Reppood (2009) os volumosos investimentos científicos relacionados a esse construto estão diretamente relacionados à importância clínica das crenças irracionais nos mais diferentes contextos, haja vista que elas são causas de desconforto psicológico, comportamentos disfuncionais e psicopatologias. Dessa maneira, o conhecimento a respeito das crenças irracionais passa ser um importante requisito aos profissionais da psicologia para que possam fazer frente a elas junto a seus pacientes, notadamente pelos profissionais inseridos no contexto do esporte e do exercício físico (Castiblanco & Delgado, 2004; Ellis, 1994; Sparkes, 2011; Taylor, 1994). Haja vista a importância do sucesso esportivo na vida dos atletas e a pressão sofrida por eles no decorrer de competições e treinamentos (Sarkar & Fletcher, 2013), a impossibilidade de pensar racionalmente o paradoxo sucesso/fracasso profissional (Dryden & Branch, 2008) acaba por atuar de modo a contribuir para o desenvolvimento de crenças irracionais.

Contudo, estudos envolvendo crenças irracionais no contexto esportivo têm sofrido de uma limitação, a falta de instrumentos que apresentem evidências de validade e precisão na avaliação deste construto nessa população específica (Turner & Barker, 2014). Observa-se também que essa limitação não se restringe ao âmbito científico, mas atinge também o contexto prático onde os psicólogos do esporte estão inseridos, especialmente quando considerado o número de atletas existentes nas equipes esportivas, o que exige dos profissionais inúmeras estratégias a fim de capturar tais informações. Dessa forma, um instrumento com objetivo de avaliar as crenças irracionais com evidências de validade e precisão, adaptado para uso junto a essa população traria benefícios ao processo avaliativo, aos profissionais que atuam na área e aos sujeitos avaliados, principalmente se houver a possibilidade de colher as informações através de uma aplicação coletiva e, portanto mais rápida. A criação ou adaptação de um teste voltado especificamente para uso em atletas permitiria ainda que as inferências realizadas a partir dos escores dos instrumentos apresentassem suporte em evidências empíricas apropriadas, conforme recomendação da área (AERA, APA, NCME, & Joint Committee on Standards for Educational and Psychological Testing, 1999; Muñiz, 2005; Primi, Muniz, & Nunes, 2009), de modo a oferecer segurança quanto aos seus resultados e interpretações em uma área ainda marcada pela lacuna existente em relação à avaliação psicológica.

Isso porque, o que se observa atualmente é uma escassez de pesquisas que se prestem a esse objetivo, destacando-se os trabalhos desenvolvidos por Mariño (2003), de estudos de adaptação e normatização do Irracional Beliefs Test (IBT) para a população de atletas colombianos. É notável também esforços despendidos por estudiosos de diferentes partes do mundo para preenchimento desta lacuna por meio da utilização de instrumentos que apresentem estudos de validade e precisão para outras populações. Dentre estes estão Sparkes (2011) que avaliou uma amostra composta por snooker e golfistas londrinos utilizando os seguintes instrumentos: Common Beliefs Survey (CBS) desenvolvido por Bessai (1997) e o Shortened General Attitude and Belief Scale (SGAB) de Linder, Kirkby, Wertheim, e Birch (1999). O último instrumento também foi utilizado por Turner e Barker (2013) para avaliação de cricketers ingleses, bem como por Turner, Slater, e Barker (2014) para avaliação de futebolistas da mesma nacionalidade. Já Siqueira (2011) avaliou adolescentes futebolistas brasileiros por meio do Inventário de Crenças Irracionais (ICI) de Newmark, Frerking, Cook, e Newmark (1973) e o Inventário de Crenças Irracionais (ICI) de Hayslip, Galt, Lopez, e Nation (1994). No entanto, nota-se que no Brasil grande parte das pesquisas realizadas com esportistas faz uso de estratégias qualitativas para obtenção de informações a respeito das crenças irracionais (Román & Savoia, 2003), o que consequentemente limita o tamanho da amostra destes estudos.

Considerando a importância do construto psicológico crenças irracionais para os psicólogos inseridos no contexto esportivo e a necessidade de um instrumento capaz de avaliar essa população de forma precisa e válida, esta pesquisa teve como principal objetivo a obtenção de evidências de validade, precisão e desenvolvimento normas interpretativas da Escala de Crenças Irracionais-ECI (Malouff & Schutte, 1986) para a população de atletas. Vale ressaltar que a escala foi traduzida para o português por Yoshida e Calugnati (2002) e as primeiras evidências de validade foram obtidas  em amostra composta por estudantes universitários.

Para a escolha do instrumento a ser utilizado nesta pesquisa baseou-se nos fato do instrumento já contar com versão em português que contemplasse um número reduzido de itens e que já apresentasse evidências validade e precisão para alguma população diferente da estudada nesta pesquisa. A partir de então, foram elaboradas questões que nortearam a pesquisa aqui relatada: 1) Qual é a estrutura fatorial que a ECI apresenta quando avaliados atletas de alto rendimento? 2) A ECI é precisa e confiável para avaliar essa população? 3) Quais são os índices de dificuldade e ajuste dos itens da ECI?. Além disso, buscou-se estimar as primeiras normas interpretativas da escala para uma população de atletas, bem como comparar os resultados obtidos com os encontrados no estudo realizado com amostra de estudantes universitários.

 

MÉTODO

Participantes

A amostra, selecionada por conveniência foi composta por 205 atletas com idade entre 18 e 48 anos (média ± desvio padrão = 22.44 ± 5.25), dos quais 50.7% eram do sexo masculino. Os participantes eram representantes das seguintes modalidades esportivas: Futsal (26.3%), Basquete (23.4%), Vôlei (21.5%), Rugby (10.7%), Natação (9.3%) e Atletismo (6.8%), inscritos nas instituições federativas estaduais das respectivas modalidades esportivas nas categorias Adulta (73.7%) e Juvenil (26.3%). Quanto ao estado civil 86.8%  eram solteiros, 11.2% casados e 2% divorciados. Já em relação ao nível de escolaridade, 17.6% possuíam ensino superior completo, 35.6% com ensino superior incompleto, 34.1% ensino médio completo, 10.7% ensino médio incompleto, 0.5% ensino fundamental completo e 1.5% ensino fundamental incompleto.

Instrumentos

Dados sociodemográficos: esta ferramenta teve como principal objetivo a investigação das características da amostra como idade, sexo, estado civil, modalidade esportiva e escolaridade.

Escala de Crenças Irracionais: desenvolvida por Malouff e Schutte (1986) é composta de vinte itens, nos quais os respondentes apontam a concordância/discordância através de uma escala de tipo Likert de 5 pontos que variam de “discordo fortemente” (1) a “concordo fortemente” (5). Na avaliação final a somatória de pontos que vai de 20 a 100 indica a magnitude do traço latente (crenças irracionais). Embora não existam estudos de normatização para população brasileira assume-se que maiores índices no escore total do instrumento estão associados a maiores intensidades no traço psicológico avaliado (Matta et al., 2009; Yoshida & Colugnati, 2002).

Com o objetivo de adaptar este instrumento à realidade brasileira, Yoshida e Calugnati (2002) realizaram estudos de tradução, precisão e validade da ECI para a população de universitários. Para tanto utilizaram os métodos de tradução reversa, consistência interna, teste-reteste e análise de componentes principais. As análises resultaram na extração de 16 itens agrupados em uma solução unidimensional, com variância explicada de 18.87%. O alfa de Cronbach obtido foi de 0.73. O índice de precisão teste-reteste da escala foi 0.88 para a amostra masculina e 0.82 para a amostra feminina. Já o estudo da versão original, realizado com uma amostra de estudantes universitários americanos, obteve solução unidiensional, composta pelos 20 itens da escala original e apresentaram índices de consistência interna igual a 0.80, medido através do coeficiente alfa de Cronbach, bem como índices de correlação Pearson para análise de teste-reteste igual 0.89 (Malouff & Schutte, 1986).

Procedimentos

Inicialmente o projeto da pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos (Parecer 9899/2012). Posteriormente, o pesquisador realizou contato com as equipes esportivas através das informações contidas em sites de federações esportivas, bem como por sua rede de contatos. Em um segundo momento, foram contatados os diretores dessas equipes esportivas a fim de obter autorização formal por parte das instituições. Assim, entrou-se em contato com os técnicos das respectivas equipes para agendar uma apresentação da pesquisa aos potenciais participantes (atletas). No intuito de interferir o mínimo possível na rotina dos indivíduos envolvidos, as apresentações foram agendadas para momentos posteriores aos treinamentos, nos quais o pesquisador informava os objetivos da pesquisa aos atletas e técnicos, procedimentos de participação, riscos e cuidados éticos. Aos atletas que aceitavam participar da pesquisa solicitava-se que assinassem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. As aplicações dos instrumentos foram realizadas em espaços localizados nos próprios centros de treinamentos, coletivamente, sendo que, para tanto, buscava-se condições mínimas de privacidade para a aplicação dos procedimentos propostos.

Análises Estatísticas

Para a análise das evidencias de validade da estrutura interna da ECI avaliou-se inicialmente a medida de adequação da matriz de correlação através do Kaiser-Meyer-Olkin (KMO) e Teste de Esfericidade de Bartlett. Posteriormente realizou-se análise de componentes principais. De acordo com Hair, Black, Babin, Anderson, e Tatham (2009), trata-se de uma técnica de interdependência que tem por principal objetivo a definição das estruturas inerentes entre as variáveis em análise. As definições desses grupos de variáveis recebem o nome de componentes, que representam padrões de correlações entre as variáveis observadas que possam ser explicados por construtos latentes (Gouveia, Santos, & Milfont, 2009; Primi, 2012). Assim, os componentes adquirem significados diante daquilo que, em conjunto, as variáveis representam. Por fim, realizou-se  a análise paralela com objetivo de determinar o número ótimo de componentes da escala (Horn, 1965).

Na busca de evidências da precisão da ECI frente à população de atletas, as respostas ao instrumento foram submetidas à análise empírica para a estimativa de consistência interna, por fator e para a escala total, por meio do coeficiente Alfa de Cronbach (α ). O principal benefício desta técnica refere-se à necessidade de única aplicação do instrumento. Em relação aos índices de precisão, conforme indicado na literatura, considerou-se a existência de confiabilidade das medidas quando alcançado coeficientes superiores a 0.70 (Gouveia et al., 2009; Martins, 2006; Primi, 2012).

Para determinar o tamanho da amostra foi utilizado o critério da “razão itens/sujeitos” segundo o qual a amostra deve ter entre 5 e 10 sujeitos, por item do instrumento (Hair et al., 2009). Além disto, atendeu-se ao critério de número mínimo de participantes sugerido por Pasquali (2010) e Gouveia et al. (2009) para a realização da análise de componentes principais, o que sugerem que a amostra seja superior a 200 participantes. Assim sendo, atingiu o número de participantes necessário para obtenção de probabilidade de erro do Tipo 1 de 0.05 e uma probabilidade de erro do Tipo 2 de apenas 1% ou poder estatístico de 0.99 quando atingido alfa menor que 0.05.

Por fim, utilizou-se a Teoria de Resposta ao Item (TRI), mais especificamente o Modelo Rasch-Masters Partial Credit Model através do método de estimação maximum likelihood, para a verificação dos seguintes parâmetros: índices de dificuldade dos itens (theta), índices de ajuste dos itens (infit outfit) e níveis de traço latente dos participantes (theta). Neste cenário, os índices de ajustes se referem ao sumário dos resíduos entre respostas esperadas pelo modelo e observadas. Entende-se por infit o nível de ajustamento dos padrões de respostas, sensível em categorias com valores de dificuldade próximos aos valores de theta da pessoa. Já o outfit é sensível a padrões inesperados de respostas quando a diferença entre o theta e a dificuldade das categorias é muito grande (Primi, Carvalho, Miguel, & Muniz, 2010). Segundo Linacre (2002)) estes valores podem variar de 0 ao infinito, onde valores próximos de 1 indicam bom ajuste. Desta forma, seguindo critérios convencionalmente adotados na literatura buscou-se valores maiores que 0.7 e menores que 1.3 (Bond & Fox, 2001; Smith, 1996).

Para o desenvolvimento de normas de interpretação para ECI, foram utilizados procedimentos estatísticos específicos, como a análise do mapa de pessoas-itens, para interpretação com referência no item (Embretson & Reise, 2000). Vale destacar que as análises com base na TRI foram realizadas separadamente para cada um dos componentes que compuseram a ECI, em respeito aos pressupostos de unidimensionalidade e independência local, exigidos por esse procedimento (Pasquali, 2007; Pasquali & Primi, 2003). Para tanto se utilizou o programa WINSTEPS (Linacre, 1991) para as análises de TRI, e o IBM SPSS versão 20, para análise de componentes principais, analise paralela e avaliação da consistência interna.

 

RESULTADOS

Estrutura interna

Quanto aos indicadores de adequação do modelo e fatorabilidade dos itens, observou-se medida de adequação KMO igual (0.794) e o teste de Esfericidade de Bartlett igual a χ² (190) = 810.05, p <0.01, valores que indicavam a adequação dos dados ao tipo de análise pretendida. Com base nestes resultados avançou-se para análise de componentes principais, sem a utilização de método rotacional, onde obteve solução com seis componentes com eigenvalues superiores a um e total de variância explicada igual a 55%. Considerando a fragilidade do critério de Kaiser para retenção dos componentes recorreu-se a análise paralela (Hayton, Allen, & Scarpello, 2004), que demostrou a pertinência de extração de dois componentes, conforme apresentado na Figura 1.

De acordo com a Figura 1 a Análise Paralela indica que os dois primeiros eigenvalues obtidos através dos dados reais apresentam valores superiores aqueles obtidos através das matrizes fatoradas aleatoriamente, os três primeiros valores foram (4.50, 1.65 e 1.44) para os dados reais e (1.70, 1.56 e 1.50) para os dados aleatórios. Diante desses resultados optou-se pela definição “a priori” do número de componentes a serem extraídos. Para tanto, foi testada a solução com dois componentes, com método rotacional Promax, para a escolha do método rotacional oblíquo, baseou-se no racional teórico de existência de correlações entre possíveis componentes que emergiram do construto em avaliação. A través da solução com dois componentes (Tabela 1), obteve-se explicação de variância igual a 30.77%, bem como agrupamentos dos itens passíveis de interpretação teórica, uma vez que estes abarcavam duas diferentes dimensões do construto Crenças Irracionais.

 

 

Conforme apresentado na Tabela 1, a primeira dimensão, foi composto por 10 itens, nota-se que todo os itens apresentaram bons índices de cargas componenciais entre 0.37 e 0.67, o que demonstra representatividade dos mesmos na avaliação da dimensão proposta (Marôco, 2010). Quanto à interpretação teórica esses itens tinham como principal objetivo a avaliação das Crenças Irracionais ligadas a situações ou características que não podem ser modificadas, nas quais restavam aos indivíduos permanecerem na situação atual e não despender esforços para modificá-la. Nesse sentido, o foco da avaliação corresponde à verificação do nível de Crenças Irracionais embutido nos sentimentos e percepção dos sujeitos frente situações passadas.

O segundo componente foi constituído de 8 itens, todos se mostravam bons representantes do construto com cargas componenciais que variavam entre 0.54 e 0.78. Em relação à interpretação teórica pode-se observar que esta dimensão congregava itens com objetivo de avaliar Crenças Irracionais frente à resolução de situações atuais e futuras. Assim as principais questões a serem avaliadas por esses dizem respeito ao grau em que as características pessoais impedem a resolução de problemas atuais e futuros.

Além disso, pode se observar  índices de correlação item-total entre os itens e componentes delimitados que variavam entre 0.30 e 0.61 para o primeiro componente, e entre 0.31 e 0,44 para o segundo. A apropriada definição desta solução dimensional foi avaliada também através dos índices de consistência interna destas dimensões, que apresentaram alfa de Cronbach igual a 0.76 e 0.66, respectivamente. Contudo, observa-se que os itens 1 e 7 não apresentaram carga componencial acima de 0.30 em nenhuma das dimensões, sendo excluídos. Dessa forma a escala foi delimitada com 18 itens, dos quais 10 compuseram a primeira dimensão e oito deles a segunda, com índice de consistência interna para a escala total igual 0.80. Tais resultados mostram-se favoráveis às primeiras evidências de validade da estrutura interna e precisão da ECI frente à população de atletas.

Análise das propriedades dos itens através TRI

A partir Modelo Rasch, mais especificamente o Masters Partial Credit Model, buscou-se estimar os seguintes parâmetros dos itens dificuldade  (parâmetro b), e índices de ajuste (infit e outfit). Os resultados são apresentados na Tabela 2. Salienta-se que, no procedimento de ancoragem optou-se por fixar as médias de dificuldade dos itens em zero, possibilitando assim a identificação da métrica.

Observa-se, na Tabela 2, pouca variação em torno da média em relação à dificuldade dos itens de ambas as dimensões, apontando a predominância de itens com dificuldade média, ou seja, nenhum item apresentando-se como muito fácil ou muito difícil para amostra avaliada (Primi et al., 2010). Contudo, nota-se que, para o segundo fator, esta variação é ainda menor (M=0; DP=0.36; Min=-0.44; Max=0.66) quando comparado ao primeiro (M=0; DP=0.41; Min=-0.38; Max=0.91), todos com  baixo índice de erro padrão adicionado à medida. Destaca-se que os índices negativos denunciam itens mais fáceis de serem endossados pela amostra avaliada, haja vista procedimento de ancoragem utilizado.

Já em relação aos índices de ajustes os resultados mostraram, conforme pode ser visualizado na Tabela 2, que os valores de infit para o primeiro fator revelaram variações entre 0.76 (item 14) e 1,21 (item 15), indicando que todos os 10 itens que representam o fator apresentaram índices considerados adequados (menor que 1.30), conforme recomendação da literatura. O mesmo foi observado para os itens que compõem o segundo fator, vide as variações dos índices entre 0.86 (item 15) e 1.07 (item 13).

Na avaliação da estatística outfit observa-se que no fator 1 os índices variaram entre 0.71(item 14) e 1.41 (item 15), salientando-se o valor apresentado por este último, pouco acima do valor desejado, de modo a indicar que o mesmo não se ajusta as previsões esperada pelo modelo. Já para o segundo fator esta variação não assume valores extremos, entre 0.77 (item 19) e 1.06 (item 11). Assim pode-se considerar que ambas as dimensões são representadas por itens com bons índices de ajuste.

Análise dos mapas de itens

O último passo consistiu em uma tentativa de estimar normas preliminares para interpretação da ECI quanto à avaliação de atletas. Para tanto, utilizou-se os fundamentos da TRI e a interpretação referenciada no item (Primi et al., 2010), por meio da análise do mapa de itens. Vale ressaltar que, no mapa, os itens são apresentados em ordem de dificuldade e não em ordem numérica. Desta maneira, o item mais facilmente endossado pelos participantes localiza-se na base do mapa, seguindo uma ordem crescente de dificuldade, sendo que, o mais difícil de ser endossado, localizar-se-á no topo do mapa. Os mapas são apresentados para cada um das dimensões nas Figuras 2 e 3, respectivamente.

 

 

 

 

Na Figura 2 pode-se observar que sujeitos que apresentam nível de traço latente um desvio padrão abaixo da média (representado pela letra S na linha horizontal, lado esquerdo, na parte de baixo da Figura), no caso, as crenças irracionais, tendem a assinalar a alternativa “nem concordo nem discordo” em todos os itens que compõem a primeira faixa, a qual contempla os itens 18, 8, 6, 15, 20, 10 e 14, marcando usualmente a alternativa 3 na escala Likert. Assim, mostram ter dúvidas em identificar-se com os conteúdos apresentados pelos itens, os quais envolvem alta necessidade de ser amado por pessoas importantes, achar terríveis situações que apresentem resultados diferentes do que gostaria e não gostar de incertezas sobre o futuro. Já em relação à segunda faixa, composta pelos itens 13, 12 e 5, os sujeitos tendem a discordar quanto à capacidade destes itens descrevê-los, endossando a alternativa “discorda um pouco” (ponto 2 na escala Likert). Desse modo que não reconhecem em si o conteúdo de tais itens, os quais envolvem intensão de punir pessoas que tirar vantagem injustamente, aborrecimento frente a situações ruins eminentes e maneiras de agir tão cristalizadas que jamais poderiam ser modificadas.

Por outro lado, pessoas com níveis de crenças irracionais um desvio padrão acima da média tendem a concordar fortemente com o conteúdo apresentado nos itens 18, 8, 6, 15, 20, 10, assinalando a alternativa 5 da escala Likert (“concorda fortemente”). Tais itens envolvem crenças relacionadas necessidade de se sentir amado por pessoas importantes, alta frustração frente situações apresentem resultados diferentes do que gostaria, necessidade de estar realizando algo para obter autossatisfação e não gostar de incertezas sobre o futuro. Já em relação à segunda faixa, no item 14 tais indivíduos usualmente tendem a marcar a alternativa 4, “Concorda um pouco” o qual aborda crença relacionada a frustração quando as coisas não ocorrem da forma que eles gostariam, sendo que somente no item 5 os sujeitos apresentaram dúvida quando a concordância ou discordância, assinalando “não concorda nem discorda”, cujo conteúdo versa sobre impossibilidade de modificar maneiras de agir habituais.

Isso indica a relativa facilidade de endosso dos itens para amostra avaliada, haja vista que sujeitos com nível de theta médio apresentariam pontuações elevadas nesta dimensão: de acordo com o procedimento de transformação em escore total,  proposto pelo modelo de créditos parciais, igual a 38, enquanto indivíduos localizados na escala de theta 1 DP abaixo de média 26 e sujeitos com nível de theta 1 DP acima da média igual a 43. Ressalva-se que os escores podiam variar entre 10 e 50.

Em relação aos resultados apresentados no mapa de itens referentes à segunda dimensão observa-se, na Figura 3, que os indivíduos com nível de crença irracional abaixo da média (um DP), tendem a discordar de todos os itens que compõem o fator, vide que tendem a endossar a alternativa 2, “Discorda um pouco” nos itens 16, 2, 3, 17, 4 e 11, cujo conteúdo abrange crenças relacionadas a sentimentos de que as situações não poderão apresentar resultados melhores que os habituais, percepção das emoções negativas como resultantes de pressões externas, falta de controle sobre as coisas que saem erradas, percepção das pessoas injustas como ruins, bem como percepção de que o passado influencia intensamente as decisões futuras. Tendem a discordar fortemente do conteúdo representado pelos itens 9 e 19, os quais dizem respeito à impossibilidade melhorar uma situação ruim da vida, e entendimento de que é melhor ignorar os problemas pessoais do que tentar resolvê-los.

Em outro oposto, indivíduos com nível de crenças irracionais um desvio padrão acima da média tenderiam a assinalar a alternativa “concorda um pouco” (4 na escala Likert), nos itens 16, 2, 3 e 17, concordando parcialmente com crenças de que as situações não poderão apresentar resultados melhores que os habituais, emoções negativas como resultantes de pressões externas e falta de controle dos sentimentos quando as coisas que saem erradas. Contudo estas pessoas apresentariam dúvida nos itens 4, 11 e 9, que se referem à percepção das pessoas injustas como ruins,  influencia intensa do passado sobre decisões futuras, bem como sensação de que é  melhor esperar do que tentar melhorar uma situação ruim da vida.  E por fim discordariam do item 19 que diz respeito à impossibilidade de resolver os problemas pessoais sendo, portanto, melhor ignorá-lo.

O que indica, para amostra avaliada,  maior dificuldade em endossar os itens que compõem a segunda dimensão da ECI. Nesta direção sujeitos com nível de theta médio apresentaram escore total igual a 19, os indivíduos com nível de theta  um 1 DP abaixo da média 13, enquanto sujeito com nível de theta 1 DP acima da média 28. Considerando que os escores podiam variar entre 8 e 40.

 

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Esta pesquisa orientou-se através dos seguintes objetivos: obter evidências de validade e precisão, apresentar normas de interpretação da Escala de Crenças Irracionais (ECI) frente à população de atletas, bem como comparar essas evidências com os estudos realizados com a população universitários. No entanto,  a sua realização esteve  pautada na necessidade prática de ampliação do espectro instrumental disponíveis aos psicólogos que atuam junto a atletas na tarefa de avaliar e fornecer a melhor intervenção a estes indivíduos, haja vista a importância deste construto para a população de esportistas (Ellis, 1982, 1994; Llamas & Abello, 2008; Román & Savoia, 2003; Turner & Barker, 2013, 2014).

Quanto às propriedades psicométricas da ECI observa-se que a solução bidimensional apresentou-se mais adequada quanto à proposta de avaliação de atletas. Contudo, observa-se que a estrutura obtida neste estudo diferencia-se da estrutura unidimensional apresentada por (Yoshida & Colugnati, 2002) junto à amostra composta por estudantes universitários de modo que pode-se hipotetizar a influência das características da amostra nos resultados obtidos. Pois embora os participantes de ambas as pesquisas apresentem idade próxima (22.44 anos; DP= 5.25, para os atletas e 21.3 anos; DP=3.98 para os universitários), suas atividades profissionais, bem como nível de escolarização foram consideravelmente diferentes, o que o que confirma os apontamentos teóricos quanto à necessidade de estudos específicos deste construto para população esportiva (Mariño, 2003; Sparkes, 2011; Turner & Barker, 2014).

Nos resultados apontados pela análise de componentes principais, destaca-se que os itens 1 e 7 não apresentaram cargas componenciais consideráveis em nenhuma das dimensões. Desta maneira a escala ficou constituída, em uma versão com evidência de validade para esta amostra específica, por 18 itens com índice de consistência interna, similares ao encontrado por Malouff e Schutte (1986) junto a estudantes universitários americanos. Em comparação com os estudos realizados com a população de estudantes universitários brasileiros por Yoshida e Calugnati (2002), observa-se que os índices alcançados nesta pesquisa apresentaram melhor adequação ao definido pela literatura. Para a população de universitário foi sugerida solução unidimensional com variância explicada de 18.87% e consistência interna igual a (α= 0.73). Embora nesta pesquisa tenha-se adotado uma solução bidimensional observam-se melhores índices de variância explicada: 22.49 para o primeiro fator e 8.26 para o segundo. Além disso, a solução adotada neste estudo congrega maior número de itens do que a versão para universitários, ou seja, 18 ao invés de 16.

Através do Masters Partial Credit Model pode-se verificar os índices de ajustes infit/outfit, e dificuldade de cada um dos itens que compuseram ambas as dimensões. Os resultados indicam que, com exceção do item 15, todos os  itens da escala se ajustaram ao padrão de resposta esperado pelo modelo. Contudo, o item 15 apresentou Infit dentro do esperado, portanto não precisa ser visto com um problema a dimensão, já que é capaz de prever o padrão de resposta de sujeitos que apresentam nível de habilidade próximo ao seu nível de dificuldade, apresentando-se menos indicado apenas para previsão de resposta entre sujeitos com nível de habilidade muito distante do seu nível de dificuldade, o que é menos preocupante (Smith, 1996; Wright & Linacre, 1994).

No que diz respeito à dificuldade dos itens as estatísticas descritivas demonstram que nenhum item (em ambas as dimensões) se apresentou muito difícil ou muito fácil de serem endossados pela população estudada. Contudo, observa-se no mapa de itens que aqueles que compuseram o primeiro fator, são em geral mais fáceis de serem endossados pelos atletas quando comparado aos itens que compuseram o segundo fator. Nesse sentido vale lembrar que os maiores pontos na escala Likert indicam maior concordância com  afirmativa, e consequentemente maiores índices de Crenças Irracionais. Tais achados convergem com as expectativas teóricas de que os atletas sejam pessoas treinadas para confrontar os problemas atuais e futuros inerentes ao contexto e ao cotidiano esportivo (Peixoto, 2012). Para tanto são submetidos a treinamentos extensivos e competições para que possam dar soluções a esses problemas, eliminando a possibilidade dos fracassos do passado serem determinantes para os insucessos no futuro.

Já em relação ao primeiro fator, que compreende Crenças Irracionais ligadas a situações que não podem ser modificadas, essas se tornam mais fáceis de serem identificadas pelos atletas. Desse modo caracterizam-se como itens mais fáceis de serem endossados por eles, de maneira a não se mostrarem muito discriminativos na identificação dos diferentes níveis de crenças irracionais. Desta forma, pode-se afirmar que os itens que compõem o segundo fator são, nesse sentido, mais informativos para identificação de pessoas com maiores níveis de Crenças Irracionais, dada a necessidade de maior nível de traço latente para que o sujeito marque valores mais altos na escala, tais informações apresentaram-se como de grande relevância quando aplicadas ao contexto prático, onde o instrumento é utilizado para compor o diagnóstico esportivo, fundamentando a escolha da melhor intervenção psicológicas a ser realizada.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Entende-se que a pesquisa em questão pode responder ambas as perguntas estabelecidas inicialmente quanto à determinação da estrutura fatorial que a ECI apresentaria na avaliação de atletas de alto rendimento, obtenção de evidências de confiabilidade,  indicativos dos níveis de dificuldade e ajuste dos itens, bem como apresentação de normas interpretativas para a escala. Por tanto, conclui-se que o instrumento apresentou boa adequação para avaliação da população de atletas, mostrando-se promissor para o uso profissional. Em relação ao desenvolvimento das normas interpretativas através da TRI, mais especificamente o procedimento mapa de item-pessoas apresentou-se como uma alternativa importante aos profissionais e pesquisadores da área, haja vista que este possibilita não apenas saber a localização sujeito em relação à média, mas também o entendimento do padrão de resposta com base no conteúdo do item. Desta forma, este trabalho pode servir como o primeiro passo rumo ao preenchimento desta lacuna ainda existente na psicologia do esporte brasileira.

Por fim, destacam-se as algumas das limitações dessa pesquisa como a composição de uma mostra por conveniência e não aleatória, a falta de representatividade nacional, já que os participantes eram prioritariamente da região sudeste do país, bem como a necessidade de novos estudos que busquem outras evidências de validade para ECI frente essa população específica.

 

REFERÊNCIAS

American Educational Research Association, American Psychological Association, National Council on Measurement in Education, & Joint Committee on Standards for Educational and Psychological Testing. (1999). Standards for educational and psychological testing. Washington, DC: American Educational Research Association.         [ Links ]

Bessai, J. L. (1997). A factored measure of irrational beliefs. Apresentado na Second National Conference on Rational-Emotive Therapy, Chicago.         [ Links ]

Bond, T. G., & Fox, C. M. (2001). Applying the Rasch Model: Fundamental Measurement in the Human Sciences. East Sussex, UK: Psychology Press.         [ Links ]

Castiblanco, J., & Delgado, P. (2004). Estudio descriptivo sobre los pensamentos irracionales en voleibolistas universitarios. Bogotá: Universidad Nacional de Colombia.         [ Links ]

David, D., Lynn, S. J., & Ellis, A. (2010). Rational and Irrational Beliefs: Research, Theory, and Clinical Practice. New York: Oxford University Press, USA.         [ Links ]

Dryden, W., & Branch, R. (2008). Fundamentals of Rational Emotive Behaviour Therapy: A Training Handbook. West Sussex: John Wiley & Sons.         [ Links ]

Elko, P. K., & Ostrow, A. C. (1991). Effects of a rational-emotive education program on heightened anxiety levels of female collegiate gymnasts. Sport Psychologist, 5(3), 235–255.         [ Links ]

Ellis, A. (1982). Self-direction in sport and life. Rational Living, 17(1), 27–33.         [ Links ]

Ellis, A. (1994). The sport of avoiding sports and exercise: A rational emotive behavior therapy perspective. The Sport Psychologist, 8(3), 248–261.         [ Links ]

Ellis, A. (1995). Changing rational-emotive therapy (RET) to rational emotive behavior therapy (REBT). Journal of Rational-Emotive and Cognitive-Behavior Therapy, 13(2), 85–89. http://doi.org/10.1007/BF02354453        [ Links ]

Ellis, A. (2003). Early Theories and Practices of Rational Emotive Behavior Therapy and How They Have Been Augmented and Revised During the Last Three Decades. Journal of Rational-Emotive and Cognitive-Behavior Therapy, 21(3-4), 219–243. http://doi.org/10.1023/A:1025890112319        [ Links ]

Embretson, S. E., & Reise, S. P. (2000). Item Response Theory for Psychologists. Mahwah, NJ: L. Erlbaum Associates.         [ Links ]

Gouveia, V. V., Santos, W. S., & Milfont, T. L. (2009). O uso da estatística na avaliação psicológica: comentários e considerações práticas. Em C. S. Hutz (Ed.), Avanços e Polemicas em Avaliaçao Psicologica (pp. 127–155). São Paulo: Casa Do Psicologo.         [ Links ]

Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., Anderson, R. E., & Tatham, R. L. (2009). Análise multivariada de dados (6a ed.). Porto Alegre, RS: Bookman.         [ Links ]

Hayslip, B., Galt, C. P., Lopez, F. G., & Nation, P. C. (1994). Irrational beliefs and depressive symptoms among younger and older adults: a cross-sectional comparison. International Journal of Aging & Human Development, 38(4), 307–326.         [ Links ]

Hayton, J. C., Allen, D. G., & Scarpello, V. (2004). Factor Retention Decisions in Exploratory Factor Analysis: a Tutorial on Parallel Analysis. Organizational Research Methods, 7(2), 191–205. http://doi.org/10.1177/1094428104263675        [ Links ]

Horn, J. L. (1965). A rationale and test for the number of factors in factor analysis. Psychometrika, 30(2), 179–185. http://doi.org/10.1007/BF02289447        [ Links ]

Lega, L. I. (2002). A terapia racional-emotiva: uma conversa com Albert Ellis. Em V. E. Caballo (Ed.), Manual de técnicas de terapia e modificação do comportamento. São Paulo: Santos.         [ Links ]

Linacre, J. M. (1991). A User’s Guide to WINSTEPS MINISTEP Rasch-Model Computer Programs. Chicago, IL: winsteps.com.         [ Links ]

Linacre, J. M. (2002). What do Infit and Outfit, mean-square and standardized mean? Rasch Measurement Transactions, 16(2), 878.         [ Links ]

Lindner, H., Kirkby, R., Wertheim, E., & Birch, P. (1999). A Brief Assessment of Irrational Thinking: The Shortened General Attitude and Belief Scale. Cognitive Therapy and Research, 23(6), 651–663. http://doi.org/10.1023/A:1018741009293        [ Links ]

Llamas, C. A. S., & Abello, R. (2008). Burnout y pensamientos irracionales en deportistas de alto rendimiento. Psychologia. Avances de la disciplina, 2(1), 49–78.         [ Links ]

Malouff, J. M., & Schutte, N. S. (1986). Development and validation of a measure of irrational belief. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 54(6), 860–862.         [ Links ]

Mariño, N. (2003). Adaptación, validación y estandarización de la prueba I.B.T. (Irracional Beliefs Test) para evaluar pensamientos irracionales en deportistas (de disciplinas de conjunto e individuales) de las ligas de deportes de Bogotá (Tese de Doutoramento). Universidad Nacional de Colombia, Bogota, Colombia.         [ Links ]

Marôco, J. (2010). Análise de Equações Estruturais: Fundamentos teóricos, software & Aplicações. Pêro Pinheiro: ReportNumber, Lda.         [ Links ]

Martins, G. A. (2006). Sobre a confiabilidade e validade. Revista Brasileira de Gestão de Negócio, 8(20), 1–12.         [ Links ]

Matta, A. da, Bizarro, L., & Reppold, C. T. (2009). Irrational beliefs, psychological adjustment and life satisfaction in college students. Psico-USF, 14(1), 71–81. http://doi.org/10.1590/S1413-82712009000100008        [ Links ]

Muñiz, J. (2005). La validez desde una óptica psicométrica. Acta Comportamentalia: Revista Latina de Análisis de Comportamiento, 13(1), 9–20.         [ Links ]

Newmark, C. S., Frerking, R. A., Cook, L., & Newmark, L. (1973). Endorsement of Ellis’ irrational beliefs as a function of psychopathology. Journal of Clinical Psychology, 29(3), 300–302.         [ Links ]

Pasquali, L. (2007). Teoria da resposta ao item: Teoria, procedimentos e aplicações. Brasília: LabPAM.         [ Links ]

Pasquali, L. (2010). Testes referentes a construto: Teorias e modelos de construção. Em L. Pasquali (Ed.), Instrumentação Psicológica: Fundamentos e práticas (pp. 165–198). Porto Alegre: Artmed Editora.         [ Links ]

Pasquali, L., & Primi, R. (2003). Fundamentos da teoria da resposta ao item: TRI. Avaliação Psicológica, 2(2), 99–110.         [ Links ]

Peixoto, E. M. (2012). Desenvolvimento de versão da Escala Diagnóstica Adaptativa para Atletas (EDAO-AR-A) (Dissertação de Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Campinas, Brasil.         [ Links ]

Primi, R. (2012). Psicometria: fundamentos matemáticos da Teoria Clássica dos Testes. Avaliação Psicológica, 11(2), 297–307.         [ Links ]

Primi, R., Carvalho, L. F., Miguel, F. K., & Muniz, M. (2010). Resultado dos fatores da BFP por meio da Teoria de Resposta ao Item: interpretação referenciada no item. Em C. H. S. S. Nunes, C. S. Hutz, & M. F. O. Nunes (Eds.), Bateria Fatorial de Personalidade (BFP): manual técnico (pp. 153–170). São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Primi, R., Muniz, M., & Nunes, C. H. S. S. (2009). Definições contemporâneas de validade de testes psicológicos. Em C. S. Hutz (Ed.), Avanços e polemicas em avaliaçao psicologica (pp. 243–265). São Paulo: Casa Do Psicologo.         [ Links ]

Román, S., & Savoia, M. G. (2003). Pensamentos automáticos e ansiedade num grupo de jogadores de futebol de campo. Revista Psicologia - Teoria e Prática, 5(2), 13–22.         [ Links ]

Sarkar, M., & Fletcher, D. (2013). How should we measure psychological resilience in sport performers? Measurement in Physical Education and Exercise Science, 17(4), 264–280. http://doi.org/10.1080/1091367X.2013.805141        [ Links ]

Siqueira, T. D. A. (2011). Crenças irracionais e auto-aceitação em adolescentes. Revista de Psicologia da IMED, 3(2), 571–584. http://doi.org/10.18256/2175-5027/psico-imed.v3n2p571-584        [ Links ]

Smith, R. M. (1996). Polytomous mean-square fit statistics. Rasch Measurement Transactions, 10(3), 516–517.         [ Links ]

Sparkes, J. (2011). Irrational beliefs and sports performance: A study examining the relationship between irrational beliefs and sport performance from an REBT perspective (Dissertação de mestrado). Goldsmiths University of London, Londres, Inglaterra.         [ Links ]

Taylor, J. (1994). On exercise and sport avoidance: A reply to Dr. Albert Ellis. Sport Psychologist, 8(3), 262–270.         [ Links ]

Turner, M. J., & Barker, J. B. (2013). Examining the efficacy of rational-emotive behavior therapy (REBT) on irrational beliefs and anxiety in elite youth cricketers. Journal of Applied Sport Psychology, 25(1), 131–147. http://doi.org/10.1080/10413200.2011.574311        [ Links ]

Turner, M. J., & Barker, J. B. (2014). Using rational emotive behavior therapy with athletes. Sport Psychologist, 28(1), 75–90. http://doi.org/10.1123/tsp.2013-0012        [ Links ]

Turner, M. J., Slater, M. J., & Barker, J. B. (2014). Not the end of the world: the effects of rational-emotive behavior therapy (REBT) on irrational beliefs in elite soccer academy athletes. Journal of Applied Sport Psychology, 26(2), 144–156. http://doi.org/10.1080/10413200.2013.812159        [ Links ]

Wright, B. D., & Linacre, J. M. (1994). Reasonable mean-square fit values. Rasch Measurement Transactions, 8(3), 370.         [ Links ]

Yoshida, E. M. P., & Colugnati, F. A. B. (2002). Questionário de crenças irracionais e escala de crenças irracionais: propriedades psicométricas. Psicologia: Reflexão e Crítica, 15(2), 437–445.         [ Links ]

 

Agradecimentos:
Nada a declarar.
Conflito de Interesses:
Nada a declarar.
Financiamento:
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Proc. nº 99999.007298/2014-05

Artigo recebido a 23-06-2014; Aceite a 19-11-2014

 

 

* Autor correspondente: Rua Liliane Regina, 03 – Vila Cretti, Carapicuíba –SP – Brasil. E-mail: epeixoto_6@hotmail.com

Creative Commons License All the contents of this journal, except where otherwise noted, is licensed under a Creative Commons Attribution License