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Motricidade

versão impressa ISSN 1646-107X

Motri. vol.15 no.4 Ribeira de Pena dez. 2019

https://doi.org/10.6063/motricidade.20137 

ARTIGO ORIGINAL

Solidão no idoso institucionalizado com dependência funcional

Loneliness in the institutionalized elderly with functional dependence

Vítor Rodrigues1[*], Cristiana Costa1, Amâncio Carvalho1, Mariana Vidal1, Marisa Caiado1, Cristina Antunes1, António Almeida1, Carlos Almeida1

1 Escola Superior de Saúde, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, UTAD, Vila Real, Portugal

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

RESUMO

Tanto a quantidade como a qualidade das relações sociais que estabelecemos afetam a saúde mental e física, comportamentos saudáveis e risco de mortalidade. Com a longevidade a aumentar de ano para ano, têm aumentado também os casos de solidão na velhice. Solidão essa que traz consequências para a saúde e bem-estar geral dos idosos. Estudos indicam ainda que idosos institucionalizados estão também sujeitos à ocorrência de solidão. Foi nosso objetivo avaliar a presença de solidão em idosos institucionalizados com dependência funcional; descrever o grau de solidão nos idosos; descrever o grau de dependência nos idosos. Trata-se de um estudo descritivo exploratório transversal, com idosos institucionalizados, de uma região do norte de Portugal; recorreu-se a uma amostra por conveniência (n= 135). Foi utilizado um questionário composto por caracterização sociodemográfica, Índice de Barthel e Escala de Solidão UCLA. A maioria da amostra apresenta-se independente ou com dependência leve. Relativamente à solidão, a pontuação media é de 47.77 pontos. A a presença da solidão parece manifestar-se mais nos idosos com dependência severa. Foi encontrada uma relação com significado estatístico entre o Género e a solidão, mostrando valores mais elevados de solidão nos Homens.

Palavras-chave: saúde; idosos; institucionalização; solidão; dependência.


 

ABSTRACT

Both the quantity and the quality of the social relations that we establish affect mental and physical health. With longevity increasing year by year, the cases of loneliness in the elderly have also increased, bringing consequences for the general health and well-being of the elderly. Studies also indicate that institutionalized elderly people are also subject to the occurrence of loneliness. It was our objective to evaluate the presence of loneliness in institutionalized elderly with functional dependence; describe the degree of loneliness in the elderly; describe the degree of dependence in the elderly. This is a descriptive cross-sectional study with institutionalized elderly from a northern region of Portugal; a convenience sample was used (n= 135). A questionnaire was used to collect data on sociodemographic characterization, Barthel Index, and UCLA Solitude Scale. Most of the sample is independent or with mild dependence. As far as loneliness is concerned, the average score is 47.77 points. The presence of loneliness seems to manifest more in the elderly with severe dependence. A relationship with statistical significance was found between gender and loneliness, showing higher values of loneliness in men.

Keywords: health; elderly; institutionalization; loneliness; functional dependence.


 

Introdução

O rápido envelhecimento populacional está a ocorrer em todos os países e espera-se que até 2050, uma em cada cinco pessoas terá 60 anos ou mais, totalizando 2 bilhões de pessoas em todo o mundo (“WHO | Age-friendly environments,” 2018). Em Portugal, o Índice de longevidade tem vindo a aumentar de ano para ano, proporcionando grandes oportunidades e escolhas que influenciam, a longo prazo, o decurso e a qualidade de vida das pessoas. No entanto, os problemas de saúde que caracterizam o decurso da vida das pessoas mais velhas, são frequentemente associados a condições crónicas que levam a declínios significativos na capacidade funcional dos mesmos (Com, 2017). Num estudo desenvolvido por Ribeiro & Pinto, (2014), as condições crónicas constituíam o motivo de dependência mais frequente (63,6%) seguido pela velhice (31,5%), sendo estas, consequentemente, duas das maiores causas de institucionalização dos idosos. Um estudo realizado por Altinay, Song, Madanoglu, & Wang (2018) mostra que a interação social entre idosos e outros adultos, clientes de cafés, é capaz de aumentar a satisfação pessoal e o bem-estar social dos idosos, contribuindo assim para uma melhor qualidade de vida e sentido de inclusão. Por outro lado, a ocorrência da institucionalização dos idosos leva à restrição de contacto social, contribuindo para a solidão e decréscimo do bem-estar psicológico dos idosos (Runcan, 2012). Portanto, este estudo tem como objetivos: avaliar a presença de solidão em idosos institucionalizados; descrever o grau de dependência nos idosos e perceber se existe relação entre o grau de dependência e a solidão.

Método

Uma vez que este estudo descreve sucinta e organizadamente, informações sobre as características dos idosos institucionalizados, abordados num tempo específico, trata-se de um estudo descritivo, exploratório e transversal.

Participantes

Para a realização do estudo utilizou-se a amostragem não probabilística, por conveniência. Para tal, foram aplicados como critérios de inclusão: idosos presentes, no momento de análise, nas sete Estruturas Residenciais para idosos a norte de Portugal; com 65 ou mais anos; conscientes e com orientação temporal, espacial e propriocetiva. Assim, a amostra resultante é de 135 idosos (94 do género feminino e 41 do género masculino), com idades compreendidas entre os 65 e os 99 anos (idade média de 83.2 anos). Relativamente ao tempo de institucionalização, o mínimo de tempo apresentado foi de meio ano e o máximo de 30 anos, com uma média de 4.5 anos. No que diz respeito ao estado civil: 59.3% dos idosos é viúvo; 23% é casado; 13.3% é solteiro e 4.4% é divorciado.

Instrumentos

Para a colheita dos dados estatísticos foi aplicado um questionário constituído por 15 itens referentes à caracterização sociodemográfica da amostra, estado de saúde, Índice de Barthel e Escala de Solidão UCLA. O Índice de Barthel foi desenvolvido em 1965 e validada e adaptada para português em 2007 - Escala Modificada de Barthel. Esta escala tem como objetivo avaliar a capacidade funcional para o realizar das Atividades de Vida Diária (AVDs) como a alimentação, transferência, utilização da casa de banho, mobilidade, subir escadas, vestir e controlo de esfíncteres. Cada item apresenta 3 a 4 opções de resposta classificadas entre 0, 5, 10 e 15 pontos. A pontuação final pode variar entre os 0 e 100 pontos, sendo que quanto menor a pontuação maior o grau de dependência (F. Araújo, Ribeiro, Oliveira, & Pinto, 2007). A Escala de Solidão UCLA (UCLA) foi desenvolvida em 1980 e validada e adaptada para Português em 1989. Esta versão é composta por 18 itens e faz uma avaliação indireta da solidão, avaliando de forma subjetiva os sentimentos e emoções a ela associados. A resposta a cada item é feita através de uma escala tipo likert com 4 parâmetros, em que 1 corresponde a “nunca” e 4 corresponde a “frequentemente”. O resultado final pode variar entre 18 e 72 pontos, em que quanto maior o resultado maior a presença de solidão. (Neto, 1989)

Procedimentos

A realização deste estudo começou pela obtenção da autorização da Comissão de Ética da UTAD nº 13/2018 de 28/02/2018 e das várias Instituições onde o estudo decorreu. Após esta etapa procedeu-se à obtenção do consentimento informado dos participantes, onde foram garantidos o anonimato e confidencialidade dos dados, e posterior distribuição dos instrumentos da recolha de dados.

Análise estatística

De forma a identificar qual a distribuição da amostra em estudo, foram aplicados os testes: Shapiro-Wilk (p> 0.05), o histograma, o QQ-plot na versão IBM SPSS Statistics 21.0. Dado que a amostra não apresentou distribuição normal, foram utilizados os testes não paramétricos: Teste de Kruskal-Wallis e Teste de Mann-Whitney.

Resultados

De forma a perceber qual a causa de dependência dos idosos foi possível perceber que: a causa mais apontada (por 24.6% dos idosos) foram as Doenças do Sistema Osteomuscular e do Tecido Conjuntivo; seguidas pelas Doenças do Aparelho Cardiovascular (20.7%); as Doenças Mentais e as Doenças do Sistema Respiratório com uma representação de 7.6% e as menos apontadas foram as Doenças da Pele e do Tecido Celular Subcutâneo (2.5%). No que diz respeito à manifestação de incapacidade, 41.1% dos idosos apresenta incapacidade a nível da mobilidade, 35.9% a nível visual; 15.6% a nível auditivo e 2.6% a nível da fala. Relativamente ao motivo de institucionalização, o motivo mais frequente (23.0%) foi a falta de tempo dos familiares para cuidar do(a) idoso(a). Em seguida, os motivos apresentados foram: viver sozinho (20.7%); agravamento do estado de saúde (20.0%); o facto da família residir numa zona geográfica diferente (7.4%). A dificuldade em realizar tarefas da vida diária, morte do cônjuge e perda de autonomia foram equiparados com uma representatividade de (5.9%). Os motivos com menor representatividade foram dependência física (5.2%) e as fracas condições de habitabilidade face às necessidades do idoso (1.5%). A informação sobre a Escala Modificada de Barthel é apresentada na tabela número 1, que demonstra que uma maioria (58.6%) encontra-se independente ou com dependência leve, 19.5% com dependência moderada e 21.8% tem dependência severa ou total.

 


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Após analisar a aplicação da escala UCLA, e sendo esta uma escala sem intervalos padronizados, podemos inferir que o mínimo da pontuação foi de 29 pontos e a pontuação máxima foi de 60 pontos (M= 47.77 pontos).Após a aplicação do teste Kruskal-Wallis, percebemos que embora não ocorram diferenças estatisticamente significativas entre o nível de dependência e a presença de solidão (p= 0.139) é possível perceber, através da comparação das médias, que a presença de solidão parece mais evidente em idosos com dependência severa. Com a aplicação do mesmo teste, percebemos que embora não ocorram diferenças estatisticamente significativas entre o estado civil e a presença de solidão (p= 0.824), é observável, pela comparação de médias, que após os idosos solteiros e viúvos, os idosos casados são os que estão mais associados a presença de solidão. Embora não se possa afirmar que existe correlação entre a idade e a presença de solidão (p= 0.69) podemos afirmar que o grupo etário dos 65 aos 70 anos é onde se encontram valores mais altos de solidão. Através da aplicação do teste de Mann-Whitney podemos inferir que existem diferenças estatisticamente significativas entre a presença de solidão e o género (p= 0.029) evidenciando, que a solidão está mais associada ao género masculino.

Discussão

Tal como em estudos realizados previamente a norte de Portugal (Araújo, Jesus, Araújo, & Ribeiro, 2017), a dependência é vivenciada pela maioria dos idosos institucionalizados. O aumento da dependência associada a incapacidade na mobilidade, causam claras limitações para a vida pessoal tal como demostrado na bibliografia. Estudos realizados por Araújo et al. (2017), mostram ainda que as causas geradoras de dependência são: doenças do aparelho circulatórios e os transtornos mentais e comportamentais. No entanto, na nossa amostra, a causa com maior representação são as doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo e só depois as doenças do aparelho cardiovascular. A interpretação da UCLA mostra, que tal como estudos realizados sobre a população portuguesa (Santos, 2015), que amostra apresenta um nível elevado para solidão. Em estudos realizados por Santos (2015), a pontuação média obtida na UCLA foi de M= 40.18, menos 7.77 do que a nossa amostra provando que o nível de solidão nos idosos institucionalizados tende a aumentar. Estudos realizados por Zhao et al., (2018), mostram que a população idosa institucionalizada sofrem com um ou mais fatores stressores. Neste estudo, os mais frequentes foram as doenças cronicas, incapacidade funcional e problemas psicológicos.

Conclusões

A institucionalização dos idosos é uma prática cada vez mais comum em Portugal. Para além da vida ativa dos familiares que impossibilita o cuidar dos idosos, temos também o tipo de incapacidade ou aumento da dependência funcional que dificulta o cuidado por parte de um cuidador informal. Neste estudo, as patologias mais associadas à institucionalização dos idosos foram as doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo e as doenças do aparelho cardiovascular, que caracterizam a amostra com dependência leve. Também se verificou que quase metade dos idosos inquiridos manifesta incapacidade na mobilidade. Este facto associado à falta de tempo dos familiares para cuidarem dos idosos levam à institucionalização dos idosos. Podemos ainda inferir que a solidão aparece associada a idosos viúvos; idosos do género masculino e idosos com dependência severa. Tal como referido anteriormente, a solidão em acréscimo à dependência funcional, prejudica o envelhecimento saudável da população. Assim, é relevante identificar medidas e implementar estratégias que: numa primeira abordagem diminuam as patologias originarias de dependência funcional na realização de AVDs e posteriormente, medidas que promovam maior contacto e acompanhamento dos idosos institucionalizados de forma a diminuir a solidão nas estruturas de residência para idosos.

 

REFERÊNCIAS

Altinay, L., Song, H., Madanoglu, M., & Wang, X. L. (2018). The influence of customer-to-customer interactions on elderly consumers’ satisfaction and social well-being. International Journal of Hospitality Management, (March), 0-1. DOI: 10.1016/j.ijhm.2018.09.005        [ Links ]

Araújo, F., Ribeiro, J. L. P., Oliveira, A., & Pinto, C. (2007). Validação do Índice de Barthel numa amostra de idosos não institucionalizados. Revista Portuguesa de Saúde Pública, 25(2), 59-66. Retrieved from https://repositorio-aberto.up.pt/bitstream/10216/15740/2/84575.pdf        [ Links ]

Araújo, I., Jesus, R., Araújo, N., & Ribeiro, O. (2017). Perceção do apoio familiar do idoso institucionalizado com dependência funcional. Enfermería Universitaria, 14(2), 97-103. DOI: 10.1016/j.reu.2017.02.003        [ Links ]

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Neto, F. (1989). A escala de solidão da UCLA: Adaptação portuguesa. Psicologia Clínica, 2, 65-79.         [ Links ]

Ribeiro, O., & Pinto, C. (2014). Caracterização da pessoa dependente no autocuidado: um estudo de base populacional num concelho do norte de Portugal. Revista Portuguesa de Saude Publica, 32(1), 27-36. https://doi.org/10.1016/j.rpsp.2013.07.001        [ Links ]

Runcan, P. L. (2012). Elderly institutionalization and depression. Procedia - Social and Behavioral Sciences, 33, 109-113. https://doi.org/10.1016/j.sbspro.2012.01.093        [ Links ]

Santos, M. N. (2015). Solidão e Saúde Mental de Idosos Institucionalizados. Universidade de Lisboa. Retrieved from http://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/23453/1/ulfpie047799_tm.pdf        [ Links ]

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Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

[*] Autor correspondente: Escola Superior de Saúde, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, UTAD, Quinta de Prados, 5001- 801 Vila Real E-mail: vmcpr@utad.pt

 

Agradecimentos:

Nada a declarar

Conflito de Interesses:

Nada a declarar.

Financiamento:

Projeto SAICT-POL/24048/2016 - “NIE - Interfaces naturais com idosos”, com referência NORTE-01-0145-FEDER-024048, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia e cofinanciado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) através do Programa Operacional Regional do Norte (NORTE2020).

 

Artigo recebido a 29.11.2018; Aceite a 21.03.2019.

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