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Revista Portuguesa de Ortopedia e Traumatologia

versão impressa ISSN 1646-2122

Rev. Port. Ortop. Traum. vol.20 no.4 Lisboa dez. 2012

 

CASO CLÍNICO

 

Variante sólida do quisto ósseo aneurismático da 5ª vértebra lombar

 

André PinhoI; Vitorino VeludoI; Francisco SerdouraI; Joana FreitasI; Manuel CarvalhoI; Rui PintoI

I. Grupo de Coluna. Serviço de Ortopedia. Hospital de São João. Porto. Portugal.

 

Endereço para correspondência

 

RESUMO

Há poucos casos descritos da variante sólida do quisto ósseo aneurismático (ABC) envolvendo coluna vertebral e, ainda menos, localizados no corpo vertebral lombar. Esta entidade clínica deve ser considerada, mesmo quando há um envolvimento predominante do corpo vertebral. Os autores descrevem um caso de um homem de 23 anos de idade que apresentou lombalgia de instalação insidiosa e dor radicular direita trajecto de L5, com resposta parcial aos AINEs. A tomografia computadorizada e ressonância magnética revelaram uma lesão lítica expansiva envolvendo o corpo e pedículos da vértebra L5. O tratamento consistiu na fixação percutânea posterior (L4-S1) e biópsia com agulha seguida em 2ª tempo de abordagem anterior com corporectomia L5 e colocação de espaçador preenchido com enxerto ósseo autólogo. O exame histopatológico do material ressecado foi consistente com a variante sólida do ABC, confirmando o resultado da biópsia por agulha. Com três anos de acompanhamento não há sinais de recidiva local na ressonância magnética. A variante de sólido do ABC deve ser considerada no diagnóstico diferencial das lesões líticas expansíveis, incluindo aquelas que envolvem o corpo vertebral. A ressonância magnética e tomografia computadorizada fornecem informações úteis, mas somente a biópsia permite o diagnóstico definitivo. Excisões radicais proporcionam um bom resultado clínico, e minimizam o risco de recorrência local

Palavras chave: Variante sólida, quisto ósseo aneurismático, fixação percutânea posterior, corporectomia, espaçador.

 

ABSTRACT

There are few reported cases of solid variant of aneurysmal bone cyst (ABC) involving the spine and even less located in the lumbar vertebral body. However, this clinical entity must be considered, even when there is predominantly affects the vertebral body.

The authors describe a case of a man 23 years of age who had low back pain of insidious onset and right leg L5 with partial response to NSAIDs. Computed tomography and magnetic resonance imaging revealed a lytic lesion involving the body and pedicles of the L5 vertebra.

The treatment consisted of percutaneous fixation back (L4-S1) and needle biopsy followed on 2nd time anterior approach with corporectomy L5 and spacer filled with autologous bone graft Histopathological examination of the resected material was consistent with the solid variant of ABC, confirming the results of the biopsy needle.

With three years of follow-up no signs of local recurrence on MRI. The solid variant of ABC should be considered in the differential diagnosis of lytic lesions expanding, including those involving the vertebral body. Magnetic resonance imaging and computed tomography provide useful information, but only a biopsy allows a definitive diagnosis. Radical excisions provide a good clinical outcome, and minimize the risk of local recurrence

Key words: Solid variant, aneurismal bone cyst, posterior percutaneous fixation, corporectomy, spacer.

 

INTRODUÇÃO

A incidência de clássico ABC na coluna é de 3,4 a 20%[1-5]. A variante sólida do ABC é uma identidade rara com apenas 12 casos localizados na coluna vertebral, descritos na literatura até 2004[6]. Eles envolvem predominantemente o arco neural[1,2,4,6]. Neste doente o tumor está localizado principalmente no corpo vertebral lombar.

 

CASO CLÍNICO

Homem de 23 anos de idade, iniciou um quadro clínico de instalação insidiosa de dor lombar baixa e radicular L5 direita acompanhado de dormência, sem alterações na marcha. Ao exame físico não havia rigidez significativa da coluna lombar. Sem défices neurológicos. Os achados laboratoriais apresentavam de positivo uma anemia (9,9 Hgb) e uma VS de 70 mm. A radiografia simples revelou uma lesão osteolítica envolvendo o corpo de L5 sem reacção periosteal (Figura 1). A TC mostrou (Figura 2) uma estrutura quística multilocular do corpo vertebral. A RMN (Figura 3) evidencia uma severa mudança da arquitectura do corpo L5, com comprometimento da parede posterior vertebral e invasão intra-canalar no entanto sem invasão dural, com a presença de líquido no quisto multiloculada, apontando para ABC. A cintigrafia óssea revelou fixação electiva do difosfonato no corpo vertebral L5. Os autores decidiram realizar uma fixação posterior transpedicular percutânea e uma biópsia com agulha. O exame histopatológico foi consistente com a presença da variante sólida do ABC. Duas semanas depois, realizaram uma abordagem anterior retroperitoneal esquerda, com corporectomia L5 e curetagem dos pedículos ( excisão alargada com margens livres ). Foi colocado um espaçador preenchido com enxerto autólogo de ilíaco entre L4 e S1 (Figura 4) . O exame histológico confirmou os achados da biópsia com evidência de fragmentos de osteoclastos, com células gigantes, algumas cavidades de sangue cercado por osteoclastos e áreas sólidas, com baixos índices de mitose e sem sinais de malignidade. Não houve complicações cirúrgicas, e não existem sinais de recidiva local na ressonância magnética realizada em 3 anos após a cirurgia (Figura 5). Clinicamente, o doente apresenta lombalgia mecânica ocasional, sem qualquer dor radicular, tendo retornado a sua actividade laboral.

 

Figura 1

 

 

 

 

Figura 5

 

 

DISCUSSÃO

ABC são tumores benignos que podem envolver a coluna vertebral. Eles mostram preferência pelo fêmur distal e tíbia proximal. Pensa-se que a variante sólida do ABC é uma resposta reactiva à hemorragia intra-óssea e é também chamada de granuloma reparativo de células gigantes ou reacção de células gigantes. Quando acometem a coluna vertebral envolvem principalmente o arco neural posterior[4,8]. Na revisão de 12 casos apresentados por Michihiro Suzuki apenas um deles envolveu predominantemente o corpo vertebral. Os estudos imagiológicos simples e a tomografia computadorizada mostram que esses tumores, apresentam-se como lesões expansivas com um fino anel de calcificação. O osso trabecular e os septos dão ao quisto uma aparência de bolha de sabão. A ressonância magnética, muitas vezes mostra vários níveis líquidolíquido, um anel intacto de osso e múltiplos septos internos[6]. A variante sólida do ABC foi descrito por Sanerkin et al, como uma lesão intra-óssea incomum fibroblástica, com elementos osteoclásticas, osteoblástica e fibromixóide, com um componente predominante de canais cavernosos. Não há diferenças entre apresentação clínica e radiográfica[7]. Apenas a ressonância magnética e a histologia permite a diferenciação entre a variante clássica do ABC, a variante sólida, e alguns tumores benignos ou lesões da coluna vertebral “ tumorlike “. A falta de anaplasia ao exame histológico sugere fortemente que este não é um tumor maligno, tal como osteossarcoma ou fibrossarcoma. Outras entidades, como o osteoblastoma ou o tumor de células gigantes deve ser excluído[2,6]. Uma vez que o diagnóstico é estabelecido, o tratamento da variante sólido de ABC é cirúrgico, com alguma brevidade, dado a possibilidade de complicações neurológicas e mecânicas[2,5]. Usando o novo sistema de classificação a lesão é classificada como intracompartimental dado que envolve o corpo e pedículo sem envolvimento da lâmina e apófise espinhosa[8]. Em alguns casos os estudos de imagem isolados permitem estadiar o tumor. O melhor sistema para o estadiamento dos tumores da coluna foi proposto por Boriani em 1997. De acordo com este sistema, o tumor envolve sectores 3 a 11 e as camadas de B à D (tumor extra dural e extra ósseo)[ 9]. A radioterapia é uma opção para situações inoperáveis ou em doentes com risco cirúrgico elevado[3,4]. Nesses casos, e em associação com a embolização, a radioterapia pode permitir o controlo da doença. Está descrito um caso de uma menina de 9 anos de idade, com variante sólida do ABC na 3 ª vértebra lombar com boa resposta a baixas doses de radioterapia, mas esta situação não é a regra[4,7]. ABC da coluna mostram uma taxa de recorrência bastante elevada, nos primeiros 6 meses, após a ressecção incompleta ou radioterapia. (2,4) A recorrência depende do tratamento e equipa cirúrgica, variando entre 0- 25%[9]. No entanto, 8 casos anteriores da variante sólida do ABC da coluna não recidivaram após um período de seguimento médio de 45 meses. Este comportamento, distinto do ABC convencional, particularmente na coluna vertebral, sugere que a variante sólida deve ser reconhecida antes da cirurgia. Apesar da descrição que o ABC cura com a radioterapia existe um risco de degeneração maligna[3,5]. A possibilidade de cura com a ressecção completa do tumor justifica a opção pela ressecção ampla com margens livres de tumor[2,4,8,10]. No presente caso, o primeiro procedimento, a fixação percutânea e a biópsia com agulha, permitiu o diagnóstico e desde logo a estabilização da coluna vertebral, uma vez que estava iminente, dado que a ocorrência de um colapso parcial ou mesmo total vertebral está descrito nestas lesões. O segundo procedimento, a corporectomia L5, com curetagem dos pedículos e fusão L4/S1 anterior com espaçador com enxerto ósseo autólogo, permitiu a realização o mais alargada e radical possível da lesão, a fim de evitar uma das suas complicações mais temíveis: a recorrência local. A opção de tratamento agressivo justifica-se para diminuir o risco de recidiva e morbilidade / mortalidade de outro procedimento[4].  radioterapia adjuvante não é geralmente recomendado para o ABC, quer pelo risco de  desenvolvimento sarcoma pós-radioterapia e quer pelos bons resultados obtidos com a excisão alargada do tumor[1, 3].

 

CONCLUSÃO

A variante sólida do ABC deve ser considerada no diagnóstico diferencial de tumores mesmo quandoenvolvendo principalmente o corpo da vértebra. O diagnóstico é possívelcom base em imagens de ressonânciamagnética e histopatologia. O tratamento deverá consistir na excisão radical e estabilização para evitar arecorrência local e colapso.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Capanna R., Albisinni U., Picci P.. Aneurysmal bone cyst of the spine. JBJS Am. 1995; 67: 527-531        [ Links ]

2. Franco Carvalho M., Lynn L, Rubens J. Surgical treatment of aneurismal bone cysts of the spine. Coluna / Columna. 2007; 6 (1): 1-6

3. de Kleuver Marinus, van der Heul Roy O., Veraart Ben. Aneurysmal Bone Cyst of the Spine: 31 Cases and the Importance of the Surgical Approach. Journal Pediatrics Orthopaedics Part B. 1998; 7 (4): 286-292

4. Papagelopoulos PJ, Currier B, Shaughnessy W. Aneurysmal Bone Cyst of the spine. Spine. 1998; 23: 621-628        [ Links ]

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7. Sanerkin NG, Mott MG, Roylance J. An unusual intraosseous lesion with fibroblastic, osteoclastic, osteoblastic, aneurismal and fibromyxoid elements: "solid" variant of aneurismal bone cyst. Cancer. 1983; 51: 2278-2286        [ Links ]

8. Tomita K, Kawahara N, Baba H. Total en bloc spondylectomy. A new surgical tecnhique for primary malignant vertebral tumours. Spine. 1997; 22 (3): 324-333        [ Links ]

9. Cottalorda Jérôme, Bourelle Sophie. Current treatments of primary aneurismal bone cysts. Journal Pediatric Orthopaedics B. 2006; 15 (3): 155-167        [ Links ]

10. Boriani S, De Iure F, Campanacci L. Aneurysmal bone cysts of the mobile spine: report 41 cases. Spine. 2001; 26 (1): 27-35

 

Conflito de interesse:

Nada a declarar.

 

Endereço para correspondência

André Pinho
Alameda Professor Hernâni Monteiro
Serviço Ortopedia e Traumatologia
Centro Hospitalar S. João
4200 Porto
Portugal
arpcinco@hotmail.com

 

Data de Submissão: 2012-08-02

Data de Revisão: 2012-09-28

Data de Aceitação: 2012-10-30

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