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Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa

versión impresa ISSN 1646-5830

Acta Obstet Ginecol Port vol.10 no.2 Coimbra jun. 2016

 

CASO CLÍNICO/CASE REPORT

Histiocitoma fibroso atípico vulvar -  relato de uma entidade rara

Atypical fibrous histiocytoma of the  vulva - report of a rare entity

Carla Marinho*, Roberto Silva**, Fernanda Costa***, José Manuel Lopes****

Centro Hospitalar Tâmega e Sousa (Penafiel, Portugal) Centro Hospitalar de São João (Porto, Portugal)

*Interna Complementar de Ginecologia e Obstetrícia

**Interno Complementar de Anatomia Patológica

***Assistente Hospitalar Ginecologia e Obstetrícia

****Professor Associado, Chefe Serviço Anatomia Patológica

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

ABSTRACT

Atypical fibrous histiocytoma is a rare and poorly documented variant of cutaneous fibrous histiocytoma.The vulvar localization is rare. Its clinical behaviour is generally benign; however, it presents histological features associated with malignancy. The pathological differential diagnoses include benign and malignant skin tumors; namely, atypical fibroxanthoma, cutaneous fibrous histiocytoma, cutaneous leiomyosarcoma, malignant fibrous histiocytoma, malignant melanoma, and dermatofibrosarcoma protuberans. We report a new case of atypical vulvar fibrous histiocytoma in a young woman whose diagnosis was based on morphological and immunohistochemical features of the tumor.

According our knowledge this is the second documented case of atypical fibrous histiocytoma of the vulva.

Keywords: Atypical fibrous histiocytoma; Vulva.


 

Introdução

O histiocitoma fibroso atípico (HFA), também designado por dermatofibroma de células gigantes, foi descrito pela primeira vez em 1983 por Fukamizu et al1,2.

O HFA consiste numa variante rara do histiocitoma fibroso cutâneo e apesar de estar associado a um comportamento clínico geralmente benigno, tem características histológicas associadas a malignidade3,4. As recidivas locais do HFA são infrequentes e raramente pode metastizar2,5.

Na literatura estão descritos menos de 150 casos de HFA e localizam-se mais frequentemente no tronco e membros4. A localização genital é extremamente rara, existindo na literatura referência a um caso na vulva3, outro no escroto6 e um na região perianal4.

Descrevemos um caso de HFA vulvar diagnosticado numa mulher jovem.

Caso clínico

Uma mulher de 33 anos de idade, sem antecedentes pessoais ou familiares relevantes, foi orientada para a consulta de Ginecologia por uma tumefação vulvar à esquerda com três anos de evolução. A tumefação vulvar não era dolorosa, não se associava a prurido nem a outros sintomas (locais ou sistémicos) e teve um aumento progressivo de tamanho durante o último ano.

A doente apresentava um bom estado geral. No exame ginecológico, identificou-se uma formação nodular vulvar, móvel, de consistência elástica, localizada no polo inferior do pequeno lábio esquerdo, com 4 cm de maior diâmetro. Não apresentava outras alterações valorizáveis no restante exame físico. Foi proposta para exérese cirúrgica da referida formação que decorreu sem intercorrências, encontrando-se as margens da peça operatória livres de lesão.

Macroscopicamente identificou-se formação tumoral com 4,2 cm de maior dimensão, bem delimitada e com superfície de corte compacta e amarelada sem áreas de necrose ou hemorragia.

No exame histológico o tumor tinha padrão sólido bem delimitado e focalmente infiltrativo. O tumor era constituído por células poliédricas e fusiformes, por vezes com padrão turbilhonado, estroma focalmente colagenoso, e frequentes células xantelasmizadas, isoladas ou em grupos. O índice mitótico era de 6 mitoses por 10 campos de grande ampliação (x400), identificando-se mitoses atípicas. Não se observaram áreas de necrose tumoral (Figura 1).

 

 

No estudo imuno-histoquímico observou-se expressão nas células tumorais de vimentina e de CD68 (células fusiformes e xantelasmizadas), CD10, recetor de estrogénio e, em raras células fusiformes, de recetor de progesterona, na ausência de expressão de queratinas (AE1/AE3), proteína S100, actina, desmina, CD34 e ALK (Figura 2).

 

 

As características morfológicas e imuno-histoquímicas observadas coadunam-se com o diagnóstico de histiocitoma fibroso atípico.

Após a cirurgia a doente foi submetida a estudo por tomografia axilar computorizada (TAC) toraco-abdomino-pélvica, que não apresentava alterações valorizáveis.

Considerando o potencial agressivo do HFA, o caso foi discutido em Consulta Multidisciplinar de Ginecologia Oncológica e foi proposta para alargamento das margens, que foi efetuada dois meses após a primeira intervenção cirúrgica. Não se identificou lesão residual na peça operatória.

Dezassete meses após a excisão cirúrgica a doente está assintomática e clinicamente sem evidência de recidiva.

Discussão

O HFA é uma entidade infrequente. O diagnóstico correto é importante pois pode evitar tratamentos agressivos ou inadequados5. O diagnóstico de HFA deve basear-se num exame anátomo-patológico adequado com estudo imuno-histoquímico5, particularmente em localizações raras como no caso presente.

Os HFA são tumores dérmicos geralmente bem delimitados, não capsulados e altamente celulares. Histologicamente distingue-se pelo marcado pleomorfismo que pode ser identificado em baixa ampliação4.

O diagnóstico diferencial anátomo-patológico é amplo e inclui tumores cutâneos benignos e malignos com células fusiformes e/ou citomorfologia pleomórfica incluindo fibroxantoma atípico (FXA), histiocitoma fibroso (HF), fibroma pleomórfico da pele, leiomiossarcoma cutâneo, histiocitoma fibroso maligno (HFM), melanoma maligno e, dermatofibrossarcoma protuberante3,4.

Na maioria dos casos, quando a exérese é completa, o HFA tem um comportamento clínico benigno. No entanto, tem maior tendência para recidiva local quando comparado com o histiocitoma fibroso cutâneo comum (14% contra 1-2%) e raramente pode metastizar3,5.

Os autores efetuaram a revisão dos casos clínicos publicados através de uma procura na Medline usando o termo “atypical histiocytoma”, cujos resultados se resumem no Quadro I. A maior série de casos foi publicada por Kaddu et al em 2002 e dos 59 casos de HFA estudados estavam disponíveis os dados do seguimento clínico de apenas 21. O tempo médio de vigilância foi de 50,6 meses. Foram registadas recidivas locais em 3 doentes e num deles foram documentadas pelo menos 5 recorrências locais ao longo de um período de aproximadamente 8 anos3. Em todos os casos de recidiva local a excisão primária do tumor tinha sido incompleta3. Dos 59 HFA descritos por Kaddu et al., 2 desenvolveram metástases à distância; nestes, as lesões apresentavam características histológicas semelhantes às dos casos que não metastizaram, o que indica a dificuldade na identificação dos (raros) casos com potencial metastático. Em ambos os casos a metastização ocorreu cerca de 12 meses após a excisão cirúrgica inicial do tumor primário. Um dos casos de metastização ocorreu no doente que apresentou múltiplas recidivas locais. Esse doente morreu de doença metastática disseminada 96 meses após a excisão cirúrgica inicial. No outro caso o doente apresentou metástases pulmonares bilaterais e há apenas referência ao facto de se encontrar vivo 16 meses após a excisão cirúrgica inicial3.

De acordo com a revisão efetuada, este é o segundo caso publicado de um HFA em localização vulvar. O reconhecimento desta entidade é fundamental para que seja possível realizar o tratamento assim como o seguimento pós-tratamento adequado. O tratamento do HFA é cirúrgico; a excisão deve ser completa, com margens cirúrgicas livres, para evitar recidiva local. Não está recomendada a realização de tratamentos complementares como parte do tratamento inicial. No que refere ao seguimento pós-tratamento é consensual a vigilância clínica4.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Fukamizu H, Oku T, Inoue K, Matsumoto K, Okayama H, Tagami H. Atypical (“pseudosarcomatous”) cutaneous histiocytoma. J Cutan Pathol. 1983;10:327-333.         [ Links ]

2. Ishitsuka Y, Ohara K, Otsuka F. Atypical Fibrous Histiocytoma of the Skin with Necrobiotic Granuloma-like Features. Acta DermVenereol. 2011; 91(4):482.         [ Links ]

3. Kaddu S, Mcmenamin M, Fletcher C, Atypical fibrous histiocytoma of the skin: clinicopathologic analysis of 59 cases with evidence of infrequent metastasis. Am J Surg Pathol. 2002;26 (1):35-46.         [ Links ]

4. Wang YT, Smart CN. Atypical Fibrous Histiocytoma Arising in the Perianal Area: A Case Report and Rewiew of the Literature. Am J Dermatopathol. 2014;36(2):171-173.         [ Links ]

5. Abdelkrim SB, Belajouza C, Jomaa W, Beizig N, Said ZB, Mokni M, et al. Atypical Cutaneous Fibrous Histiocytoma: An Unusual and Misleading Variant of Fibrous Histiocytoma. Case Rep Pathol. 2011; 2011:612416.         [ Links ]

6. Huan Y, Vapnek J, Unger PD. Atypical Fibrous Histiocytoma of the Scrotum. Ann Diagn Pathol. 2003;56:370-373.         [ Links ]

7. Tsunoda K, Takahashi K, Maeda F, Oikawa H, Akasaka T. A Case of Atypical Fibrous Histiocytoma with Positivity for CD163 and CD44. Acta Derm Venereol. 2013;93:737-738.         [ Links ]

 

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

Carla Marinho

E-mail: carlamar19@gmail.com

 

Recebido em: 22-03-2015

Aceite para publicação: 08-09-2015