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Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa

versión impresa ISSN 1646-5830

Acta Obstet Ginecol Port vol.11 no.2 Coimbra jun. 2017

 

ARTIGO DE REVISÃO/REVIEW ARTICLE

Tumor anexial na gravidez - como abordar?

Adnexal tumor in pregnancy - how to manage?

Inês Rato*, Luísa Pinto**, Inês Reis***, Margarida Bernardino****, Ana Francisca Jorge*****

Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução do CHLN, HSM

Instituto Português de Oncologia de Lisboa Francisco Gentil

*Interna do Internato complementar de Ginecologia e Obstetrícia do CHLN, HSM

** Assistente Hospitalar Graduada do Serviço de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução do CHLN, HSM

***Assistente Hospitalar do Serviço de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução do CHLN, HSM

****Assistente Hospitalar Graduada do Serviço de Ginecologia do Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil, Lisboa

*****Directora do Serviço de Ginecologia do Instituto Português de Oncologia Francisco Gentil, Lisboa

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

ABSTRACT

In the past, accidental detection of an adnexal tumor in pregnancy was a rarity, occurring most often during a caesarean section. This diagnosis has become more common due to the widespread use of ultrasound in early pregnancy. Most of these tumors are benign and spontaneously resolve, but if they persist there is a risk of torsion, rupture, or obstruction of labor. The possibility of dealing with cancer should also be considered. The clinical management can be challenging, so it’s essential to establish the diagnostic criteria and to define the expectant or surgical approach to adopt.

Keywords: Adnexal tumor; Pregnancy; Malignancy.


 

Introdução

O diagnóstico de tumor anexial ocorre em 0,2 a 2% das gestações1-3. Esta incidência sofreu alterações na literatura mais recente, tendo aumentado nas últimas décadas, coincidindo com o uso generalizado da ecografia na gravidez1.

A maioria dos tumores anexiais são assintomáticos e diagnosticados incidentalmente na ecografia de rotina do primeiro trimestre de gravidez. Se o seu tamanho for significativo podem também causar aumento do volume abdominal (maior do que o esperado em determinada idade gestacional) e tornarem-se palpáveis ao exame objetivo. Podem ainda ser causa de dor abdominal, lombalgias, obstipação ou sintomas urinários que são muitas vezes confundidos com os sintomas próprios da gravidez. A dor aguda ou insidiosa pode ser causada por rotura, hemorragia intraquística, infeção, congestão venosa ou torção anexial1. A suspeição diagnóstica pode também surgir com os resultados dos rastreios de defeitos do tubo neural ou aneuploidias, com valores inexplicadamente aumentados de alfa-fetoproteina ou inibina A1.

Etiologia dos tumores anexiais na gravidez

A maioria dos tumores anexiais detetados na gravidez são benignos e 70% são detetados no primeiro trimestre de gravidez resolvendo espontaneamente na primeira metade do segundo trimestre5, no entanto 1 a 10% são malignos1-3.

Os tumores com ponto de partida ginecológico têm origem no ovário, nas trompas ou no útero, podendo ser benignos ou malignos. Os quistos funcionais são os mais frequentes na gravidez, tal como nas mulheres não grávidas. A persistência do corpo lúteo no segundo trimestre de gestação representa 13-17% das lesões quísticas anexiais, devendo ser feito o diagnóstico diferencial com outras formações, tais como o teratoma quístico (7-37%), cistadenoma seroso (5-28%), cistadenoma mucinoso (3-24%) e endometrioma (0,8-27%)4-10. As lesões paraováricas são na sua maioria de etiologia benigna e a sua distinção ecográfica depende da experiência do observador, sendo por vezes necessário recorrer a outros métodos de imagem. Podem encontrar-se como lesões paraováricas as formações quísticas do paraovário (menos de 5% dos tumores anexiais), a hidrossalpinge e os leiomiomas pediculados (1-2,5%)5.

É importante efetuar diagnóstico diferencial com lesões tumorais anexiais não ginecológicas, podendo estas também ser benignas ou malignas (Quadro I).

 

 

Diagnóstico de tumores anexiais na gravidez

Conforme referido previamente, os tumores anexiais na gravidez são na sua maioria diagnosticados de forma acidental na ecografia de rotina do primeiro trimestre. Podem também ser identificados durante o exame objetivo, que, no entanto, é limitado em fases mais avançadas da gravidez. Tumores detetados no exame físico têm habitualmente diâmetro igual ou superior a 5cm11.

A ecografia pélvica, realizada por via suprapúbica e endovaginal, é o exame de primeira linha, permitindo a caracterização da morfologia do tumor e a estratificação do risco de malignidade. No que se refere à avaliação morfológica, as dimensões do tumor, a irregularidade do seu contorno, a dimensão do maior componente sólido, a presença de septos, o número de locas, a presença e o número de papilas e a associação com ascite têm sido descritas como as características mais importantes na predição de malignidade. Estes parâmetros têm sido integrados em diferentes modelos de avaliação de tumores anexiais, em associação a dados como a idade, o status pré/pós-menopausa, avaliação doppler do tumor e doseamentos séricos de marcadores tumorais6,12-16. O grupo IOTA, que mais amplamente se tem dedicado à avaliação dos tumores anexiais nos últimos anos, recomenda a valorização do componente doppler num score de fluxo relacionado com a densidade de vasos (de 0 = “no flow” a 4= “abundant flow”)21. Os parâmetros do estudo Doppler previamente utilizados têm um valor limitado na análise do risco de malignidade17. Em tumores malignos os índices de resistência e pulsatilidade são geralmente inferiores a 1, mas este padrão também pode ser observado em tumores benignos. Além disso, a vascularização da cavidade pélvica encontra-se alterada na gravidez, o que não permite valorizar estes índices18-20.

O grupo IOTA propõe um sistema de regras simples para a predição de malignidade, bem como 3 modelos para índices de malignidade (LR1 e LR2 e ADNEX) cuja performance e aplicabilidade foi avaliada em ensaios de grandes dimensões21-24.

Se a avaliação ecográfica for inconclusiva pode recorrer-se a outros métodos de imagem, tais como a Tomografia Computorizada (TC) ou a Ressonância Magnética (RM)2.

A RM é segura e útil para esclarecimento de aspetos inconclusivos na ecografia, sendo considerada um método de segunda linha25. A RM tem maior acuidade que a ecografia para tumores de localização retrouterina ou de dimensões extrapélvicas e para lesões quísticas paraováricas12,25. Permite também o estadiamento de lesões malignas e o diagnóstico de apendicite ou doença inflamatória intestinal12,25. A RM é particularmente útil na caracterização de leiomiomas pediculados, leiomiomas em degenerescência, endometriomas e edema ovárico permitindo a sua distinção de lesões malignas25,26. O Colégio Americano de Radiologia (ACR) não distingue o primeiro trimestre dos restantes no risco de exposição à RM27. A grávida deve ser elucidada dos riscos e benefícios dado que não existe evidência que prove a segurança fetal do uso da RM embora não existam também efeitos teratogénicos documentados. Por este motivo alguns autores ainda sugerem que a utilização da RM seja limitada aos 2º e 3º trimestres de gestação. A utilização de gadolínio deve ser evitada na gravidez por ausência de dados relativos à segurança fetal (fármaco classe C)1,27. No entanto, quando a RM com contraste é essencial para o diagnóstico, pode ser administrado gadolínio (na dose mais baixa possível), não sendo necessária a realização de testes neonatais caso seja realizada essa administração28.

A TC expõe grávida e feto a radiação entre 2 e 4 rads5 cujos riscos não estão completamente esclarecidos e deverá ser utilizada apenas se absolutamente necessário29. Por outro lado os materiais de contraste utilizados na TC podem passar a barreira hematoplacentária e os seus efeitos sobre o feto são desconhecidos. A Sociedade Europeia de Radiologia Urogenital (ESUR) define nas suas recomendações de 2013 que em condições excecionais, quando para a caracterização imagiológica é essencial o uso de contraste iodado, este pode ser administrado durante a gravidez, devendo o recém-nascido ser submetido a avaliação analítica da função tiroideia na primeira semana de vida28.

Os antigénios oncofetais (alfa-fetoproteína, gonadotrofina coriónica humana, antigénio carcinoembrionário, CA-125) estão envolvidos em funções biológicas fetais associadas ao desenvolvimento, diferenciação e maturação. Os seus níveis encontram-se fisiologicamente aumentados na gestação e variam com a idade gestacional ou podem estar anormalmente elevados em processos patológicos gestacionais1,30,31 (Quadro II). Por conseguinte, os resultados analíticos destes marcadores são difíceis de interpretar e o seu doseamento por rotina para decisão terapêutica não está recomendado1. Devem ser pedidos no pós-operatório imediato caso se confirme malignidade1.

 

 

Tipos de tumores anexiais nas mulheres grávidas

Quistos associados à gravidez

Incluem quisto do corpo lúteo, quistos hemorrágicos e quistos funcionais. Na maioria dos casos (70%)1 têm menos de 5cm de maior eixo e resolvem espontaneamente até à primeira metade do segundo trimestre. Quando têm dimensões superiores a 5cm podem dar origem a complicações como torção, rotura e obstrução da via de parto, podendo necessitar de monitorização e resolução cirúrgica27.

Um folículo representa uma formação quística funcional simples que tem influência hormonal; o folículo dominante apresenta em média 2-2,4cm; os folículos funcionais (fisiológicos) apresentam por definição até 3 cm na ecografia (definição da Sociedade Norte Americana de Radiologia)27.

Os quistos do corpo lúteo formam-se após a ovulação e persistem até às 9 semanas de gravidez, produzindo progesterona. Podem ser quistos simples, hipoecogénicos e com um “anel de fogo” periférico no estudo ecoDoppler; ou complexos dependendo do componente hemorrágico e do tempo de evolução27,32.

A aparência ecográfica dos quistos hemorrágicos é variável, dependendo da fase de formação do coágulo. Geralmente são formações anecogénicas com conteúdo hipoecogénico no seu interior que adquire um padrão reticular pelos componentes sanguíneos. Tendem a organizar-se em componentes anecogénicos e ecogénicos, estes últimos de conformação retráctil33.

Os quistos teca luteínicos surgem por resposta ovárica aos elevados níveis séricos de BHCG característicos de situações como a doença do trofoblasto, gestações múltiplas ou tratamentos de estimulação ovárica com gonadotrofinas. Ecograficamete surgem em ovários aumentados de volume e com múltiplos quistos34.

Os luteomas da gravidez surgem por proliferação das células luteínicas do estroma ovárico que substituem o parênquima ovárico normal. São células produtoras de androgénios contribuindo para a virilização do feto feminino. Ecograficamente surgem como massas hipoecogénicas de conteúdo heterogéneo34.

Endometriomas

Têm uma incidência de 3-10% na gravidez27. A maioria regride, mas alguns mantêm-se estáveis ou podem mesmo aumentar de tamanho no decurso da gravidez.

A maioria apresenta conteúdo hipoecogénico e homogéneo em “vidro fosco”. No entanto, a sua aparência pode variar de quístico a sólido e mimetizar o quisto hemorrágico35. Podem visualizar-se calcificações internas com cone de sombra35,36. A RM pode ser útil na clarificação destas lesões, nomeadamente na caracterização de focos ectópicos de decidualização na parede do endometrioma, que podem mimetizar características radiológicas de malignidade25.

Tumores de células germinativas

Os teratomas são o tumor anexial que mais frequentemente persiste após as 16 semanas de gestação, sendo bilateral em 10-13% dos casos1,37. Se o seu tamanho não ultrapassar os 6cm raramente ocorrem complicações. Têm um potencial de malignização de 2%37,38. Os teratomas maduros ou quistos dermóides apresentam uma aparência ecográfica variável, sendo geralmente nódulos complexos devido ao seu conteúdo adiposo e aos componentes sólidos e calcificados (Figura 1). Podem surgir nódulos hiperecogénicos na parede com cone de sombra associado e que correspondem a componentes calcificados, gordura ou cabelos (nódulos de Rokitansky); cabelos e sebo podem configurar linhas e pontos hiperecogéneos (“rede dermóide”)3; níveis líquidos de diferentes densidades podem formar-se no interior do tumor37, podendo ainda surgir nódulos hiperecóicos flutuantes representado gordura25. A RM pode ser extremamente útil na caracterização de tumores com características  menos específicas e frequentes25,39.

 

 

Os disgerminomas representam 75% dos tumores das células germinativas na gravidez1 e, excluindo os tumores epiteliais de baixo potencial de malignidade, são o tumor maligno invasivo mais frequente neste contexto26. São normalmente tumores sólidos que podem apresentar um componente anecogénico se sofrerem necrose40.

Tumores das células dos cordões sexuais

Constituem 20-30% dos tumores anexiais malignos na gravidez (50% dos quais são tumores das células da granulosa, 30% são tumores das células de Sertoli-Leydig e os restantes são não classificados)1,40.

Os Fibromas são ecograficamente tumores hipoecogénicos e sólidos que podem conter componentes quísticos. Em 18-52% dos casos podem conter cones de sombra semelhantes a fibromiomas uterinos subserosos calcificados41.

Os tumores das células da granulosa raramente ocorrem na gravidez.

Tumores epiteliais do ovário

Podem ser benignos - cistadenomas mucinosos ou serosos - ou malignos - tumores de baixo potencial de malignidade, cistadenocarcinomas. Os tumores epiteliais malignos do ovário representam metade dos tumores anexiais malignos que ocorrem na gravidez1,27.

Os cistadenomas representam 40-50%34 das neoplasias benignas do ovário, sendo os cistadenomas serosos mais frequentes que os cistadenomas do tipo mucinoso. Os primeiros são quistos simples, de tamanho geralmente superior aos funcionais que podem apresentar septos finos ou projeções papilares (Figura 2); são bilaterais em 20%12 dos casos. Os cistadenomas mucinosos são frequentemente multiloculares e ecograficamente surgem com locas com diferentes ecogenicidades no seu interior40, maioritariamente com conteúdo descrito como “low level” e com aparência em “vidro fosco” na RM41. Podem formar níveis e apresentar finos septos ou projeções papilares41.

 

 

Os cistadenocarcinomas serosos ou mucinosos apresentam-se ecograficamente como massas multiloculares com septos espessos (>2-3mm), projeções papilares com mais de 3mm, paredes irregulares e sinal Doppler demonstrando fluxo sanguíneo nos componentes sólidos, características estas que sugerem malignidade. Podem estar também presentes ascite e implantes peritoneais40.

Os tumores de baixo potencial de malignidade representam 50% dos tumores epiteliais do ovário1, sendo difícil a sua distinção ecográfica das restantes neoplasias epiteliais. Apresentam sinais ecográficos sugestivos de malignidade, embora sem sinais de invasão do estroma ovárico, podendo apresentar “sinal de crescente” (uma faixa de tecido ovárico são adjacente ao tumor)27.

Tumores metastáticos constituem 10% dos tumores malignos do ovário (Figura 3)

 

 

Os tumores que mais frequentemente metastizam para o ovário são os da mama, intestino e estômago27. A maioria tem apresentação bilateral. Ecograficamente são formações muito vascularizadas (color score 3-4) e podem apresentar-se como tumores sólidos (sugestivo de ponto de partida na mama, estômago, útero e linfomas), multilocular-sólidas ou multiloculares (sugestivo de tumor primário do cólon e reto)24.

Abordagem

A abordagem (expectante ou cirúrgica) dos tumores anexiais tem sido um tema controverso na literatura5,6,17,27. A maioria dos tumores anexiais identificados durante a gravidez regride espontaneamente, não necessitando de intervenção2. Os que persistem podem dar origem a complicações como torção (5%), rotura (0-9%) ou obstrução da via de parto (2-17%) e neste sentido alguns autores defendem a sua resolução cirúrgica10,17,42. Por outro lado, 10% dessas lesões podem ser malignas, pelo que alguns autores advogam que a resolução cirúrgica é necessária de modo a melhorar o prognóstico4,17,43.

A análise da literatura permite chegar às recomendações que reúnem maior consenso (Figura 4). Os quistos simples com mais de 5cm ou tumores complexos com sinais imagiológicos de suspeição devem ser reavaliados após um intervalo de 4 semanas11. A maioria resolve espontaneamente47 e os que persistem devem ser abordadas como na mulher não grávida4. Tumores anexiais diagnosticados na gravidez que persistem após o primeiro trimestre e que tenham mais de 10cm de maior eixo ou que apresentem sinais imagiológicos consistentes de malignidade (tumores sólidos, complexos ou com papilas e septos), devem ser ressecadas cirurgicamente de modo a obter um diagnóstico histológico definitivo6,17,44-47. No caso de quistos simples, uniloculares, sem componentes sólidos e com parede fina, pode ser realizada aspiração com agulha (por via vaginal ou abdominal) após as 14 semanas de gestação, mas apenas se houver risco de obstrução da via de parto, apresentação fetal anómala ou sintomas associados48,49.

 

 

Os tumores estáveis com menos de 5cm e sem outras características imagiológicas de suspeição não necessitam de reavaliação a menos que sejam sintomáticos46,49.

Os quistos simples podem ser reavaliados no pós-parto; os quistos hemorrágicos devem ser reavaliados após 6-12 semanas; os endometriomas e os quistos dermóides se estáveis podem ser reavaliados no pós-parto; quistos com septos finos (<3mm) podem ser reavaliados no pós-parto; quistos contendo septos com mais de 3mm, ou alterações no fluxo Doppler devem ser removidos cirurgicamente2,6,13,15,27,54.

A radiografia de tórax pode ser dispensada a menos que a anamnese e o exame objetivo sugiram doença pulmonar ou que a suspeita seja de malignidade (nestes casos o exame deve ser realizado com proteção abdominal e pélvica para diminuir os riscos da radiação para o feto)1.

Se existir indicação cirúrgica esta deve ser realizada durante o segundo trimestre, idealmente entre as 14 e as 18 semanas de gestação1. Opta-se por esta fase porque a taxa de aborto espontâneo é superior no primeiro trimestre podendo ser falsamente atribuída à cirurgia; a organogénese fetal está completa, reduzindo-se o risco de teratogénese; a maioria dos quistos funcionais resolveu espontaneamente; a função hormonal do corpo lúteo já foi substituída pela placenta reduzindo o risco de aborto por diminuição da produção de progesterona consequente à diminuição do tecido ovárico1.

A abordagem cirúrgica dos tumores anexiais na gravidez é semelhante à da mulher não grávida. No entanto, a escolha do tipo de cirurgia depende de aspetos de segurança relacionados com a mãe e com o feto.

A utilização de tocolíticos não é necessária, a menos que ocorra contratilidade uterina11.

Quando o risco de malignidade é baixo pode optar-se pela via laparoscópica, que não está contraindicada na gravidez9,10,43,51-53. Contudo não existem estudos prospetivos comparando a laparoscopia com a laparotomia que permitam avaliar qual das abordagens é mais vantajosa11. Se houver suspeita de malignidade não deve ser realizada uma incisão de Pfannenstiel, mas sim uma incisão mediana a qual permite a exposição adequada dos anexos, minimizando a manipulação do útero gravídico1.

Após entrada na cavidade peritoneal o lavado peritoneal deve ser colhido e enviado para exame citológico1. A cavidade deve ser cuidadosamente inspecionada, bem como o anexo contralateral. Se os achados imagiológicos e intraoperatórios sugerirem tratar-se de um tumor benigno pode ser realizada uma quistectomia. Quando o tamanho do tumor não o permitir, se for sólido e com excrescências à superfície, ou se outros aspetos sugerindo malignidade estiverem presentes, deve ser realizada ooforosalpingetomia e deve ser solicitado um exame extemporâneo1.

Quando o exame extemporâneo revela malignidade deve ser realizada uma cirurgia de citorredução, e seguindo os princípios cirúrgicos utilizados para a mulher não grávida (linfadenectomia, omentectomia, biópsias peritoneais), exceto no que se refere à histerectomia e ao ovário contra lateral. Todas as lesões suspeitas devem ser excisadas. A necessidade de quimioterapia adjuvante será avaliada pela histologia do tumor e pelo estádio da doença1.

Conclusões

O uso por rotina de ecografia na gravidez tornou mais frequente o diagnóstico de tumores anexiais, pelo que se torna imperativo existir um consenso sobre a sua abordagem. A ecografia é o principal exame complementar de diagnóstico e caracterização dos tumores anexiais, dispensando muitas vezes a realização de outros exames. A RM pode ser considerada segura e reserva-se para esclarecimento de ecografias inconclusivas, devendo, contudo, ser ponderada a sua utilização no 1º trimestre.

A atitude expectante é segura nos casos de quistos simples e sem sinais imagiológicos de malignidade. No caso de tumores complexos é necessário avaliar os riscos e benefícios da intervenção cirúrgica, os quais devem ser sempre discutidos com a grávida. Os tumores com sinais imagiológicos fortemente sugestivos de malignidade devem ser removidos cirurgicamente para caracterização histológica. O método de abordagem mais adequado (laparotomia vs. laparoscopia) não está determinado, mas o momento para a sua execução deverá ser o segundo trimestre.

 

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Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

Inês Rato

E-mail: inesmrato@gmail.com

 

Recebido em: 21/04/2016

Aceite para publicação: 22/08/2016

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