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Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa

versão impressa ISSN 1646-5830

Acta Obstet Ginecol Port vol.15 no.1 Coimbra mar. 2021  Epub 31-Mar-2021

 

Editorial

Editorial: FSPOG

Daniel Pereira da Silva1  , Ex-presidente

1 Ex-presidente da FSPOG no biénio 2018-2021. Portugal.


Estávamos por volta do ano 2000 ...

O panorama em Portugal das sociedades científicas na área da saúde da mulher, era composto pela Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Ginecologia (SPOG) a mais antiga criada em 1954, pela Sociedade Portuguesa de Ginecologia (SPG) fundada em 1975, pela Sociedade Portuguesa de Medicina da Reprodução (SPMR) que teve os seus estatutos aprovados em 1978 e pela Sociedade Portuguesa da Menopausa (SPM) que havia iniciado a sua atividade em 1995.

O relacionamento entre as várias sociedades não era o melhor. Havia conflito de interesses entre a SPOG e a SPG a nível interno e internacional. As duas sociedades dirigiam a sua atividade para uma área comum, a ginecologia, o que criava, no mínimo, um ambiente de concorrência, senão mesmo de alguma discórdia. Nos organismos internacionais essa desarmonia era igualmente patente. A SPOG fazia parte da FIGO-Internacional Federation Of Gynecology and Obstetrics pelo que a inscrição da SPG nesse organismo não tinha sido aceite. A SPG juntamente com o Colégio de Ginecologia e Obstetrícia da Ordem dos Médicos integravam a board de ginecologia e obstetrícia da UEMS-European Union of Medical Specialists, que mais tarde transitou para o EBCOG-European Board and College of Obstetrics and Gynaecology, onde a SPOG não se fazia representar.

Foram realizados alguns contactos entre as duas sociedades, com o objetivo de se harmonizar interesses e linhas de atuação, mas tais diligências não tiveram sucesso.

Em 2001 iniciaram-se novas conversações entre a SPOG então presidida pelo Prof. Carlos Santos Jorge, a SPG presidida pelo Dr. Daniel Pereira da Silva, a SPMR presidida pelo Dr. Pedro Sá e Melo e a SPM presidida pelo Dr. Mário Sousa. Estabeleceu-se uma relação cordial e de confiança, que tornou o diálogo menos ensombrado.

Tendo em consideração as conversações anteriores e o património histórico das duas sociedades, pareceu óbvio que não havia condições para que a SPOG passasse a dedicar-se exclusivamente à obstetrícia e medicina fetal, embora fosse muito claro que essa área da especialidade era de uma importância extrema e que merecia a criação de uma sociedade científica a ela dedicada. Nesse contexto, a ideia da SPOG evoluir para uma estrutura federativa era a solução que se impunha - consagrava a história da SPOG e criava um organismo agregador e harmonizador dos legítimos interesses dos grupos dedicados às mais diversas disciplinas. Permitia, por outro lado, criar uma relação de colaboração estreita com o Colégio da Especialidade da Ordem dos Médicos e ter uma representação externa condizente com toda a especialidade.

Os méritos da ideia tiveram aceitação por parte do presidente e de outros elementos da direção da SPOG, dos quais destaco, para além do Prof. Carlos Santos Jorge, o Dr. José Vicente Pinto, pelo papel mediador e conciliador, que foi de grande importância.

Redigiram-se os princípios do acordo para a transformação da SPOG numa estrutura federativa das sociedades científicas da área da saúde da mulher, com a colaboração da Sociedade Portuguesa de Medicina da Reprodução, representada pelo seu Presidente em exercício, o Prof. João Luís Silva Carvalho e da Sociedade Portuguesa da Menopausa.

O acordo foi assinado no dia 12 de Junho de 2004, na Herdade do Esporão, em Évora, por ocasião da 147ª Reunião Científica da SPG. Foi um momento marcante. Havia alguma tensão, conheciam-se algumas reações contrárias ao entendimento, daí que no uso da palavra o Dr. Daniel Pereira da Silva tenha realçado que estávamos perante um momento histórico de afirmação da nossa especialidade, de reconhecimento do património histórico das sociedades já existentes, momento de abertura ao futuro onde todos tinham lugar, momento de respeito pelos legítimos interesses das mais diversas áreas de diferenciação da especialidade já criadas ou a criar. Salientou, ainda, que todos estavam de boa fé no projeto de criação da federação, enalteceu a importância da criação de relações de confiança e respeito mútuo que haviam sido estabelecidas e por isso, numa analogia a uma situação social bem conhecida que implica a assunção formal de um compromisso para a vida, lançou o repto: “Se houver alguém que esteja contra este acordo deve pronunciar-se agora ou cale-se para sempre?”. Seguiu-se um salva de palmas efusiva por todos os presentes.

Estavam lançadas as sementes do projeto de criação da federação.

No cumprimento do acordo, o Dr. Daniel Pereira da Silva, o Prof. João Luís Silva Carvalho e o Dr. Mário de Sousa inscreveram-se como sócios da SPOG. Integraram uma lista candidata aos corpos sociais daquela sociedade, que tinha a seguinte composição: Direção - Prof. Carlos Santos Jorge, Dr. José Vicente Pinto, Drª. Ana Aroso Monteiro, Dr. Daniel Pereira da Silva, Prof. João Luís Silva Carvalho e Dr. Mário de Sousa; Assembleia Geral - Prof. Luís Mendes Graça, Prof. Paulo Moura e Dr. Carlos Marques; Conselho Fiscal - Prof. Jorge Fagulha, Prof. José Sousa Barros e Dr. José Ferreira Marques.

A lista apresentou-se a sufrágio e foi eleita no dia 12 de Novembro de 2004, com o seguinte programa de ação: “1. Promover a criação da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal (SPOMMF), 2. Preparar as alterações estatutárias necessárias à transformação da SPOG em federação, na qual se integrarão as quatro sociedades, já com a SPOMMF”.

Seguiu-se o processo de alterações dos estatutos da SPOG, cujo enunciado veio a ser aprovado em assembleia geral no dia 9 de Junho de 2005, cuja escritura notarial foi lavrada em 28 de Dezembro de 2005. Seguiu-se igualmente o processo de criação da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal que teve os seus estatutos aprovados em 2007.

No seguimento da aprovação dos estatutos da federação, no dia 21 de Janeiro de 2006, realizou-se a primeira Assembleia Geral Eleitoral, onde foram eleitos os primeiros corpos sociais da federação: Direção - Prof. Carlos Freire de Oliveira (Presidente), Dr. Daniel Pereira da Silva (Secretário geral) e Prof. Diogo Ayres de Campos (Tesoureiro), Assembleia Geral - Drª. Ingeborg Carneiro Chaves, Drª. Ana Maria Aroso (Secretária) e Prof. Nuno Aires Montenegro (Secretário), Conselho Fiscal - Dr. José Vicente Pinto (Tesoureiro), Drª. Ana Maria Correia de Campos (Secretária) e Dr. Carlos Caseiro Alves (Secretário). Integravam ainda os corpos sociais, por inerência, com o cargo de Vice-presidentes - Prof. José Martinez de Oliveira (Presidente da SPG), Prof. João Luís Silva Carvalho (Presidente da SPMR), Dr. Mário de Sousa (Presidente da SPM) e Prof. Luís Mendes Graça (Presidente da SPOMMF); com o cargo de vogais da direção Prof. Fernando Fernandes Mota (Secretário geral da SPG), Drª. Isabel Nóbrega Reis Buhler (Secretária-geral da SPMR) e Dr. João Macedo Dória (Secretário-geral da SPM).

A liderança do Prof. Carlos de Oliveira foi da maior importância. Numa organização em construção é fundamental que a liderança seja consensual e se imponha pelos seus valores éticos. Foi isso que aconteceu, a personalidade do Prof. Carlos de Oliveira, o seu equilíbrio, a sua capacidade de diálogo e de criar consensos, estiveram na construção da matriz funcional da federação, dos laços de confiança e diálogo que se estabeleceram.

Desde logo, se verificou que os estatutos da federação continham algumas desconformidades, a começar pelo próprio nome dado à federação - “Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Ginecologia”, embora a sua composição e objetivos estivessem conformes aos objetivos de uma federação de sociedades científicas.

O nome foi alterado na assembleia geral realizada no dia 21 de Janeiro de 2006, para “Federação das Sociedades de Medicina da Reprodução, da Mulher e do Feto”, mas essa denominação não reunia consenso alargado.

Em 03 de Junho de 2006, em assembleia geral, foi decidido proceder à revisão dos estatutos da federação que passou a chamar-se de “Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia - FSPOG”. Esse processo terminou no dia 14 de Dezembro de 2007 com a outorga da escritura pública, que consagrou os estatutos vigentes da FSPOG.

Por imperativos legais, foram membros fundadores da federação as seguintes sociedades científicas: Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Ginecologia, Sociedade Portuguesa de Ginecologia, Sociedade Portuguesa de Medicina da Reprodução, Sociedade Portuguesa de Menopausa e Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal.

Na assembleia geral de 26 de Janeiro de 2008 a Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Ginecologia foi extinta.

No respeito pelos imperativos jurídicos a situação legal da federação estava consumada. Seguiu-se a construção do património da FSPOG - a definição prática dos seus objetivos e base doutrinária.

Criaram-se entendimentos na calendarização das reuniões, que tiveram em consideração o histórico de cada sociedade, mas projetaram o futuro com a determinação de datas para cada reunião e a periodicidade dos congressos, entre os quais o da federação que passou a realizar-se de 3 em 3 anos. O Colégio da Especialidade passou a ter um representante na Assembleia Geral da federação com a qualidade de observador, bem como a PONTOG, à semelhança de todos os membros do Conselho Fiscal. Foi incrementado o diálogo interpares, entre os diversos organismos que têm a responsabilidade da formação, regulação e desenvolvimento da especialidade, estreitaram-se relações entre internos e especialistas, entre diferentes sensibilidades e experiências. A representação e a intervenção junto de organismos internacionais foi igualmente consensualizada.

Estas foram as linhas mestras funcionais da federação. São a matriz da sua coesão, que assenta no princípio de que é uma estrutura que pretende apenas harmonizar os legítimos interesses de afirmação e desenvolvimento das sociedades científicas na área de saúde da mulher, que têm uma atividade de grande mérito. Criou-se um ambiente de diálogo entre todos os agentes envolvidos na regulação e desenvolvimento da especialidade.

Uma outra iniciativa de grande impacto foi a desvinculação da Revista de Ginecologia e Obstetrícia, que era propriedade da empresa Momento Médico, mas que tinha a chancela científica da SPOG. Criou-se a Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa, que teve o Prof. Diogo Ayres de Campos como primeiro editor chefe. A criação de um corpo de revisores e a adoção de normas de publicação plasmadas de revistas internacionais congéneres, imprimiu desde o primeiro número um sinal de rigor e qualidade que tem sido a sua marca, reiterada pelo editores-chefe que lhe seguiram - Dr. Nuno Clode e Profª Carla Ramalho.

Desenvolveram-se outras iniciativas de muito interesse. Sob a coordenação científica do Prof. Carlos de Oliveira foi publicado o Manual de Ginecologia em 2009, obra com 2 volumes e 53 capítulos, que cobrem as mais diversas áreas da ginecologia.

A realização de um congresso que envolva toda a especialidade foi outro marco importante. O primeiro congresso organizado pela FSPOG, foi logo em 2008, em colaboração com a EBCOG - European Board and College of Obstetrics and Gynaecology, que teve elevada aceitação nacional e internacional. O congresso nacional realiza-se com o contributo de todas as sociedades afiliadas, com a periodicidade de 3 em 3 anos. Têm sido momentos de expressão do desenvolvimento e afirmação de todas as áreas da especialidade.

Criaram-se alguns prémios, entres os quais o de Mérito Científico que é atribuído de 3 em 3 anos e entregue na sessão de abertura do congresso da federação. É sempre um marco importante de reconhecimento público de uma personalidade nacional, reconhecido interpares pelo contributo dado à evolução da Ginecologia/Obstetrícia.

Algumas iniciativas não tiveram o sucesso esperado nomeadamente a criação de grupos de peritos sobre tópicos de maior controvérsia, por exemplo “Cancro e Gravidez” e “Cancro e Fertilidade”, dos quais se esperavam documentos de reflexão ética e orientações, mas que não viram a luz do dia. Outra iniciativa que não teve o sucesso pretendido foi a atribuição de créditos aos eventos formativos realizados pelos serviços hospitalares ou sociedades científicas.

O grupo das sociedades afiliadas teve nova composição em 2011 com a admissão da Sociedade Portuguesa da Contracepção então presidida pelo Dr. David Rebelo. A Sociedade Portuguesa de Menopausa foi extinta em 2013, deixando naturalmente de integrar a federação. Na assembleia geral de 30 de janeiro de 2021 a Associação Portuguesa de Diagnóstico Pré-natal foi aceite como afiliada da FSPOG, o que veio alargar o âmbito das organizações representadas na federação.

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