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Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa

versión impresa ISSN 1646-5830

Acta Obstet Ginecol Port vol.16 no.2 Algés jun. 2022  Epub 30-Jun-2022

 

Editorial

Perda Gestacional Recorrente: Um longo caminho a percorrer

Recurrent Miscarriage: Still a long way to go

1. Assistente Hospitalar Sénior, Departamento de Medicina Materno-Fetal do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Central; Portugal.

2. Professora Auxiliar Convidada, Comprehensive Health Research Centre (CHRC), NOVA Medical School | Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa; Portugal.


Poucas são as situações em obstetrícia em que o princípio da “não-maleficência” se aplica de forma tão inequívoca como a perda gestacional recorrente (PGR), exigindo uma reflexão crítica sobre a conduta clínica existente.

A PGR atinge 1 em cada 50 casais em idade fértil e é para a maior parte deles um acontecimento extremamente traumático e com grande impacto na sua qualidade de vida. Embora seja uma entidade extensamente reconhecida na literatura médica, a PGR continua envolta em aspetos controversos. Clínicos e Sociedades Científicas dividem-se ainda quanto à sua definição e às circunstâncias que devem determinar o início de uma investigação. Enquanto o Royal College of Obstetricians and Gynaecologists (RCOG) considera critérios para iniciar uma investigação a existência de pelo menos 3 perdas consecutivas, já a American Society for Reproductive Medicine (ASRM) recomenda um estudo etiológico após duas perdas clínicas consecutivas e a European Society for Human Reproduction and Embryology (ESHRE) depois de duas perdas gestacionais, consecutivas ou não1,2,3. A decisão deve ser individualizada, partilhada com o casal e deve ter em conta os recursos existentes.

A identificação de fatores médicos associados é importante pois permite desenvolver estratégias de vigilância e terapêutica numa gravidez subsequente. Contudo, o caráter heterogéneo da perda gestacional, a caracterização inadequada das doentes e das perdas, assim como diferentes metodologias utilizadas no seu estudo, têm resultado em estudos epidemiológicos de fraca qualidade e dificultado a sua compreensão. As investigações e os tratamentos com evidência científica comprovada são escassos e a PGR continua uma questão frustrante quer para os casais, quer para os clínicos, permanecendo muitos casos sem uma causa identificada4.

É comum, os casais recorrerem a diversos clínicos, em busca de uma explicação e na esperança de uma solução. Na tentativa de responder às suas expectativas, os clínicos optam com frequência por uma multiplicidade de investigações, algumas das quais onerosas e não validadas e, muitas mulheres aderem a terapêuticas ineficazes, desnecessárias e eventualmente prejudiciais.

Com o objetivo de melhorar a qualidade da assistência a estas situações e reduzir a variabilidade da prática clínica nacional, é publicada neste número da ACTA a norma de orientação clínica da SPOMMF para a PGR. Coordenada por Monteiro et al., resulta de um trabalho de reflexão sobre a evidência clínica mais atual5. Este documento chama a atenção sobre a importância do aconselhamento reprodutivo destes casais com enfoque na promoção de estilos de vida saudáveis. Reforça a importância da realização do estudo genético do produto de conceção a partir da segunda perda gestacional, cujo resultado permitirá orientar estudos adicionais. Recomenda também a suplementação com progesterona em casos de PGR inexplicada, particularmente nas situações que cursam com hemorragia do 1.º trimestre.

Muitas questões e aspetos relativos à PGR são ainda controversos e um longo caminho espera ainda os casais e os clínicos. A abordagem dirigida às diferentes necessidades de cada casal e situação, conduzindo à compreensão quer das razões médicas, quer da situação emocional das perdas, é essencial para garantir um processo de luto normal e um melhor acompanhamento em gestações futuras.

Referências bibliográficas

1. Royal College of Obstetricians and Gynaecologists, Guideline No. 17. The investigation and treatment of couples with recurrent miscarriage. 2011; 17: 1. [ Links ]

2. Practice Committee Opinion of the American Society of Reproductive Medicine. Evaluation and treatment of recurrent pregnancy loss: a committee opinion. Fertil Steril 2012; 98: 1103. [ Links ]

3. ESHRE Guideline Group on RPL, Bender Atik R, Christiansen OB, Elson J, Kolte AM, Lewis S, Middeldorp S et al. ESHRE guideline: recurrent pregnancy loss. Hum Reprod Open. 2018 Apr 6; 2018(2):hoy004. DOI: https://doi.org/10.1093/hropen/hoy004. [ Links ]

4. Serrano F. Perda embriofetal recorrente. In: Medicina Materno-Fetal (3ª edição) págs. 326-333. Luís Mendes da Graça (Coord.). Lidel, Lisboa 2017. ISBN: 978-972-757-654-8. [ Links ]

5. Monteiro SB, Lebre A, Serrano F, Martins I, Reis I, Lima J et al, on behalf of the SPOMMF. Recurrent pregnancy loss. Acta Obstet Ginecol Port 2022; 16 (2): 177-87. [ Links ]

Endereco para correspondência Fátima Serrano E-mail: fatima_serrano@hotmail.com

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