Em finais dos anos 70 do século XX, Portugal ainda registava valores de Índice Sintético de Fecundidade (ISF) que lhe permitiam assegurar a substituição das gerações (2,1 filhos por mulher), o que deixou de suceder no início da década de 80, assistindo-se a uma tendência persistente de declínio da fecundidade desde então. Apesar de nenhum país da União Europeia ter assegurada a substituição de gerações, Portugal integra o grupo de países dos 28 Estados-Membros da União Europeia com menores ISF (Portugal, 2020:1.40; UE, 1,5 filhos/mulher). A recuperação observada nos últimos anos fez passar Portugal do país com menores indices de fecundidade da UE 28 em 2013, mantendo-se mesmo assim em 2018, no oitavo País com ISF mais baixo. Esta tendência foi acompanhada do aumento da idade à maternidade (1.o filho), que nos anos 70 se situava nos 24 anos, atingindo, em 2021, 30,9 anos1),2.
Uma parte expressiva das mulheres e dos homens com filhos (45,1% e 58,5%, respetivamente) tiveram o 1.o filho mais tarde do que desejavam. O adiamento foi de pelo menos 5 anos para uma parcela considerável de mulheres e de homens (36,0% e 47,7%).
A maioria das mulheres que planearam o nascimento do seu primeiro filho, independentemente da altura em que o tiveram, consideram o facto de querer ser mãe como motivo muito importante para a decisão de ter o primeiro filho. Para as mulheres que tiverem o primeiro filho na altura ou mais tarde do que desejavam, para além do motivo acima referido, foram apontados também como muito importantes ter um cônjuge/companheiro/a ou ter o cônjuge/companheiro/a com o perfil certo, estabilidade de emprego da própria ou do cônjuge/companheiro/a e vontade do cônjuge/companheiro/a1.
Com a tendência para a maternidade em idade mais avançada, a consulta de Planeamento Familiar pode e deve constituir uma oportunidade de educação para a saúde e de orientação conceptiva. A idade é um fator de risco não modificável, o estilo de vida, o tabagismo, o sedentarismo e a presença de comorbilidades como excesso de peso e obesidade, dislipidemia e HTA, são fatores de risco potencialmente modificáveis e que condicionam negativamente os resultados obstétricos.
Atualmente, consideram-se fatores de risco relacionados com o género, complicações ocorridas na gravidez tais como as doenças hipertensivas, diabetes gestacional, parto pré-termo e perda fetal. A restrição de crescimento intrauterino também tem sido associada a um aumento de risco de dislipidemia, insulina resistência e disfunção diastólica. Com o mesmo sentido preventivo, a identificação e o reconhecimento da importância destas complicações obstétricas pode contribuir para uma intervenção terapêutica em idades mais jovens e para melhoria dos resultados em saúde no âmbito das doenças cardiovasculares, importante causa de mortalidade e morbilidade na população.
Avançamos muito para apoiar a mulher na escolha do número de filhos que quer ter e quando os quer ter, no rastreio e na intervenção terapêutica das complicações durante gravidez e no parto, melhorando a mortalidade e morbilidade materno fetal. O desafio será continuar a promover a preconceção, reconhecer e informar que existem complicações obstétricas que podem condicionar a saúde futura da mulher.