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Acta Obstétrica e Ginecológica Portuguesa

versión impresa ISSN 1646-5830

Acta Obstet Ginecol Port vol.17 no.2 Algés jun. 2023  Epub 30-Jun-2023

 

O Que Há De Novo Em/What Is New In

O que há de novo em Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal? Os melhores artigos do último ano (2022)

What is new in Obstetrics and Maternal-Fetal Medicine? Best articles from the past year (2022)

Nuno Clode1  2 
http://orcid.org/0000-0003-4370-369X

Ana Luísa Areia3  4  5 

Inês Nunes6  7  8 

Sofia Bessa Monteiro9  10 

Susana Santo11  12  13 

1. Assistente Hospitalar Senior de Obstetrícia e Ginecologia - Hospital CUF Torres Vedras. Portugal.

2. Presidente da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno Fetal. Portugal.

3. Assistente Hospitalar Graduada de Obstetrícia e Ginecologia - Serviço de Obstetrícia, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Portugal.

4. Professora Auxiliar de Obstetrícia e Ginecologia - Faculdade de Medicina - Universidade de Coimbra. Portugal.

5. Vice-Presidente da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno Fetal. Portugal.

6. Assistente Hospitalar de Obstetrícia e Ginecologia do Serviço de Obstetrícia e Ginecologia do Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho. Portugal.

7. Professora Auxiliar Convidada do ICBAS School of Medicine and Biomedical Sciences, Universidade do Porto, Porto. Portugal.

8. Secretária-Geral da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno Fetal. Portugal.

9. Assistente Hospitalar Graduada de Ginecologia/Obstetrícia - Serviço de Obstetrícia/Centro Hospitalar de S. João, Porto. Portugal.

10. Tesoureira da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno Fetal. Portugal.

11. Assistente Hospitalar Graduada de Obstetrícia e Ginecologia - Serviço de Obstetrícia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte. Portugal.

12. Professora Auxiliar de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Portugal.

13. Vogal da Sociedade Portuguesa de Obstetrícia e Medicina Materno Fetal. Portugal.


Resumo

Os autores apresentam uma seleção de artigos publicados em 2022 e que consideram importantes para a prática clinica em Medicina Materno-Fetal, Tocologia e Diagnóstico Pré Natal.

Palavras-chave: Obstetrícia; Medicina materno-fetal; Tocologia; Diagnóstico prénatal

Abstract

The authors present a selection of articles published in 2022 considered as the most relevant for clinical practice in Maternal Fetal Medicine, Tocology and Pre-Natal Diagnosis.

Keywords: Obstetrics; Maternal fetal medicina; Tocology; Prenatal diagnosis

A escolha dos artigos que mais influenciaram a prática clínica em Obstetrícia e Medicina Materno-Fetal em 2022 é necessariamente subjetiva e depende da sensibilidade do autor - neste caso dos autores deste texto. Optamos por não selecionar uma área específica, mas sim olhar para o conjunto de vertentes da especialidade (clínica materno-fetal ante e pós-parto, diagnóstico pré-natal, medicina fetal e tocologia) e escolher os textos publicados em 2022 que nos pareceram mais relevantes. Na tarefa de análise dos artigos que escolhemos não podemos deixar de agradecer aos colegas que colaboraram na Sugestão da Semana SPOMMF em 2022 pois a maioria dos artigos que selecionamos foram apresentados nesta rubrica semanal online da Sociedade.

Estava 2022 a terminar quando surge uma revisão de Agustin Conde-Agudelo e Roberto Romero 1 baseada em evidência previamente publicada2 e tentando estabelecer linhas de orientação quanto à utilização de progesterona vaginal para a prevenção do parto pré-termo. Os autores concluem que, numa gravidez unifetal, apenas na presença de colo curto (≤ 25 mm) a progesterona vaginal reduz o risco de parto pré-termo e melhora os desfechos perinatais, haja ou não antecedentes de parto-pré-termo. Frisam também que, embora haja alguma evidência da eficácia da progesterona vaginal na redução do parto pré-termo em gestações gemelares com colo curto (≤ 25 mm), esta ainda é limitada e necessita de investigação adicional e apontam para a ineficácia do seu uso em: a) gestações unifetais com colo > 25 mm, apesar de antecedentes de parto pré-termo; b) gestações gemelares em que o colo seja > 25 mm; c) gestações triplas ou de ordem superior (independentemente do comprimento cervical); d) gestações com patologia uterina (malformação congénita, fibromioma) e e) gestações unifetais com clínica que possa sugerir risco aumentado de PPT (i.e., contractilidade uterina frequente) sem que se evidencie colo curto.

A administração materna de corticosteroides com o objetivo de acelerar a maturação pulmonar fetal é comprovadamente eficaz na diminuição do Síndrome da Dificuldade Respiratória do recém-nascido mas não são claros os riscos a longo prazo. No JAMA Pediatric, Ninan e col. 3 apresentaram uma revisão sistemática e meta-análise em que analisam os desfechos a longo prazo desta administração (≈ 1,5 milhões de crianças com > 1 ano) e concluem que a exposição a um único ciclo de corticosteroides antenatal se associa a uma diminuição do risco de alterações no neurodesenvolvimento em grandes prematuros, mas a um significativo aumento do risco de desfecho cognitivo ou psicológico adverso em recém-nascidos pré-termo tardios (acima das 34 semanas) ou mesmo de termo. Mais uma vez se enfatiza a necessidade de individualizar a administração de corticosteroides e, muito em concreto, de evitar prescrevê-los no termo da gravidez.

O momento do parto, a necessidade de o desencadear e qual a forma mais adequada de proceder continua a ser um tema que preocupa a comunidade obstétrica. O ARRIVE trial4, sugeria que em nulíparas a indução do parto na 39.ª semana não apresentava um maior risco de complicações neonatais e conduzia a uma redução na taxa de cesarianas. Em Maio de 2022, um estudo5 utilizando dados norte-americanos, mostrava que no grupo em que se induziu o parto às 39 semanas apesar de ter uma menor taxa de cesarianas apresentava uma maior necessidade de suporte transfusional materno, assim como de admissão a UCI; não se registaram diferenças nos resultados neonatais. As diferenças registadas não tiveram relevância clínica (a taxa de cesarianas reduziu 0,6% e o incremento de necessidade de suporte transfusional foi de 0,1%) pelo que desencadear o parto de forma sistemática em nulíparas às 39 semanas, embora pareça ser seguro, não tem um impacto notório na diminuição da taxa de cesariana e, na prática obstétrica actual, esta decisão deverá ser partilhada com a gestante.

É lícito interrogarmo-nos se os resultados do estudo ARRIVE4 se aplicam a outras coortes. Foi o que fizeram Uwanaka e col. 6 - comparar os desfechos maternos entre grávidas com cesariana prévia submetidas as a indução de parto na 39.ª semana e aquelas sujeitas a conduta expectante. Observaram uma taxa de cesarianas similar nas duas coortes (24%), mas um aumento significativo dos desfechos adversos maternos na coorte com conduta expectante. Em países com taxa de cesarianas elevada (como Portugal) esta evidência mostra a segurança que traz uma indução de parto neste grupo de grávida e reforça a importância de se tentar o parto vaginal após cesariana.

Controversa continua a ser a forma como se induz o parto. A indução do trabalho de parto é um dos procedimentos obstétricos mais realizados na atualidade e, muitas vezes, pressupõe a maturação cervical prévia. Com este objetivo, a sonda de Foley demonstrou ser um método eficaz, seguro e com um baixo custo associado. Inicialmente colocada apenas em regime de internamento é agora utilizada em regime de ambulatório e, em Fevereiro de 2022, foi publicada uma meta-análise7 que concluiu que as grávidas a quem se tinha colocado a sonda de Foley em ambulatório apresentavam uma menor taxa de cesarianas e uma menor duração de internamento hospitalar, sem diferenças no que respeita aos restantes desfechos obstétricos, maternos ou neonatais. Assim, se se pretende uma diminuição dos custos na prática clínica e uma maior satisfação das gestantes, a utilização da sonda de Foley em ambulatório para maturação cervical deve ser um procedimento que os Serviços de Obstetrícia em Portugal devem considerar na sua rotina nos anos vindouros.

Tratar ou não as grávidas com hipertensão arterial (HTA) prévia à gestação apenas com elevação moderada da pressão arterial? É um assunto polémico e algumas sociedades científicas recomendam a terapêutica farmacológica da hipertensão arterial crónica na gravidez apenas quando os valores tensionais são superiores ou iguais a 160/110 mmHg. A principal justificação para esta atitude prende-se com o potencial risco de comprometer a perfusão placentária e o crescimento fetal se a pressão arterial estiver abaixo dos 140/90 mmHg nas grávidas com HTA prévia. Em Maio 2022, o New England Journal of Medicine publica um artigo sobre este assunto8 onde, através de um ensaio clínico randomizado multicêntrico, os autores comparam os desfechos obstétricos e neonatais entre grávidas hipertensas medicadas com terapêutica farmacológica para manter a pressão arterial (PA) < 140/90 mmHg (grupo de tratamento ativo) e aquelas que apenas faziam terapêutica farmacológica se PA ≥ 160/110 mmHg (grupo de controlo). Concluem que a incidência do desfecho primário (formas de pré-eclâmpsia grave, parto pré-termo iatrogénico, DPPNI, morte fetal), assim como a incidência pré-eclâmpsia e de parto pré-termo, foi inferior no grupo de tratamento ativo sendo a incidência de recém-nascidos com peso < percentil 10 idêntica nos dois grupos. Estes resultados apontam para uma melhoria dos desfechos obstétricos analisados quando se promove um controlo mais estrito da pressão arterial nas grávidas com HTA prévia à gestação, sem que se verifique um compromisso do crescimento fetal.

Na área do Diagnóstico Pré-Natal foi importante concluir que, embora seja possível identificar mais de metade das anomalias cardíacas na ecografia do primeiro trimestre, é improvável que esta seja capaz de detetar todos os fetos com cardiopatias. É esta a mensagem da revisão sistemática e meta-análise publicada em Janeiro de 2022 no Ultrasound in Obstetrics & Gynecology9 onde também se conclui que o tipo de anomalia cardíaca e a utilização de protocolos de estudo mais minuciosos foram fatores importantes para aumentar a taxa de deteção. No reforço da importância do exame ecográfico do 1.º trimestre na deteção de anomalias estruturais graves, encontra-se também o artigo de Bardi e col10 publicado em Novembro 2022 na Prenatal Diagnosis. É um artigo simples mas que claramente demonstra que a conduta de realizar uma ecografia que demonstre a viabilidade da gestação (< 11 semanas) e a determinação de cfDNA a todas as grávidas com realização posterior de uma ecografia de avaliação da morfologia fetal às 18-22 semanas limita-se a atrasar o diagnóstico de anomalias sempre ou potencialmente diagnosticáveis no 1.º trimestre e consequentemente a adiar a interrupção médica de gravidez. Este estudo mostra que a política que é preconizada em Portugal - sugerir o rastreio combinado a todas as gestantes, e aplicar o cfDNA como rastreio contingente - vai de encontro a uma maior eficácia no diagnóstico de anomalias estruturais do feto.

Em Novembro de 2022, enquanto em Portugal se discutia formas do acesso das grávidas à maternidade, no Obstetrics & Gynecology surgia um artigo11 que pretendia avaliar a associação entre a distância residência-maternidade e os desfechos maternos e neonatais adversos. Num estudo realizado nos EUA, na Pensilvânia, englobando cerca de 600 mil partos ocorridos entre 2011 e 2015 (gestações ≥ 20 semanas) foi demonstrado que a maior distância à maternidade onde ocorreu o parto esteve significativamente associada ao aumento do risco de morbilidade materna composta e de admissão neonatal em UCI; estas associações persistiram após ajuste para as características da grávida, o risco obstétrico, ruralidade e características do bairro habitacional. Em Portugal não há estudos similares, mas provavelmente, deveriam ser feitos antes de se tomar a decisão de encerrar maternidades, sobretudo nas áreas mais distantes dos grandes centros habitacionais.

Contributos dos autores

Nuno Clode contribuiu para a pesquisa bibliográfica, escrita e revisão do manuscrito. Ana Luísa Areia contribuiu para a pesquisa bibliográfica, escrita e revisão do manuscrito. Inês Nunes contribuiu para a pesquisa bibliográfica, escrita e revisão do manuscrito. Sofia Bessa Monteiro contribuiu para a pesquisa bibliográfica, escrita e revisão do manuscrito. Susana Santo contribuiu para a pesquisa bibliográfica, escrita e revisão do manuscrito.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não apresentar qualquer conflito de interesse na produção deste artigo.

Referências bibliográficas

1. Conde-Agudelo A., Romero R. Vaginal progesterone for the prevention of preterm birth: who can benefit and who cannot? Evidence-based recommendations for clinical use. J Perinat Med 2022;51(1):125-134. DOI: https://doi.org/10.1515/jpm-2022-0462 [ Links ]

2. Conde-Agudelo A., Romero R. Does vaginal progesterone prevent recurrent preterm birth in women with a singleton gestation and a history of spontaneous preterm birth? Evidence from a systematic review and meta-analysis. Am J ObstetGynecol 2022;227(3):440-461 DOI: https://doi.org/10.1016/j.ajog.2022.04.023 [ Links ]

3. Ninan K, Liyanage SK, Murphy KE, Asztalos EV, McDonald SD. Evaluation of Long-term Outcomes Associated With Preterm Exposure to Antenatal Corticosteroids: A Systematic Review and Meta-analysis. JAMA Pediatr. 2022;176(6):e220483. DOI: https://doi.org/10.1001/jamapediatrics.2022.0483 [ Links ]

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6. Uwanaka O, Raker C, Gupta M, Bicocca MJ, FishelBartal M, Chauhan SP, Wagner S. Maternal and neonatal adverse outcomes in individuals with a prior cesarean birth who undergo induction at 39 weeks. Eur J Obstet Gynecol Reprod Biol. 2022;268:12-17. DOI: https://doi.org/10.1016/j.ejogrb.2021.11.003 [ Links ]

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11. Minion SC, Krans E, Brooks MM, Mendez DD, Haggerty CL. Association of Driving Distance to Maternity Hospitals and Maternal and Perinatal Outcomes. Obstet Gynecol 2022;140(5):812-819 DOI: https://doi.org/10.1097/AOG.0000000000004960 [ Links ]

Recebido: 24 de Maio de 2023; Aceito: 31 de Maio de 2023

Endereço para correspondência Nuno Clode E-mail: nclode@gmail.com

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