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Angiologia e Cirurgia Vascular

versión impresa ISSN 1646-706X

Angiol Cir Vasc vol.8 no.1 Lisboa mar. 2012

 

Revascularização distal com laqueação arterial (DRIL) – Tratamento de eleição para a isquémia em síndrome de roubo sintomático associado a FAV

 

Pedro Amorim*, João Vieira*, Teresa Vieira*, Fernando Neves**, Pereira Albino*

*Serviço de Cirurgia Vascular II – Centro Hospitalar Lisboa Norte

**FRESENIUS – Santarém

 

|RESUMO|

As complicações relacionadas com os acessos de hemodiálise (HD) são o principal motivo de internamento dos doentes renais crónicos.

O tratamento cirúrgico do síndrome de roubo associado a isquemia grave e crítica é mandatório e urgente.

A única técnica cirúrgica que garante segurança nos resultados no que diz respeito à resolução da isquemia com preservação do acesso vascular é o DRIL.

Os autores apresentam o caso de uma doente, 78 anos, com insuficiência renal crónica hipertensiva, fístula úmero-cefálica e isquemia crítica da mão esquerda.

O quadro clínico, com 13 meses de evolução, foi refractário à terapêutica médica pelo que foi realizado um DRIL. Verificou-se remissão imediata da dor e melhoria progressiva das lesões tróficas dos dedos da mão com preservação do acesso.

Os autores defendem a realização do DRIL como primeira linha no tratamento destes doentes.

Palavras-chave: Acesso Vascular para Hemodiálise, Síndrome de roubo, DRIL

 

Distal revascularization with interval ligation (DRIL) – First line treatment for symptomatic steel syndrome associated to AVF

|ABSTRACT|

Complications related to vascular access for hemodialysis (HD) are the main reason for hospitalization of chronic renal patients. Surgical treatment of steal syndrome associated with severe and critical limb ischemia is mandatory and urgent.

The only surgical technique that ensures safety in the results with regard to the resolution of ischemia and preservation of vascular access is DRIL.

The authors present the case of a 78 year old patient with hypertensive chronic renal failure, humeral-cephalic fistula and critical ischemia of the left hand.

The clinical picture, with 13 months of evolution, was refractory to medical therapy and so a DRIL was performed. There was immediate remission of pain and progressive improvement of ulcerations of the fingers. At the same time the access for HD was preserved and early punctured.

The authors advocate the implementation of DRIL as first-line treatment in these patients.

Key words: Vascular Acess for Hemodyalisis, Steel syndrome, DRIL

 

INTRODUÇÃO

As complicações relacionadas com os acessos de hemodiálise são o principal motivo de internamento dos doentes renais crónicos terminais.

Embora as alterações hemodinâmicas que condicionam redução da perfusão de um membro a jusante de uma comunicação arterio-venosa (A-V) sejam extremamente comuns (73% de todas as fístulas (FAV) e 91% de todos os enxertos arterio-venosos, segundo Kwun) o síndrome de roubo sintomática acontece em 1-9% dos acessos sendo o doente tipo: mulher, com mais de 60 anos de idade, diabética, doença arterial periférica documentada, com acesso A-V que utiliza a artéria umeral como artéria dadora, com enxerto protésico em vez de fístula nativa e com múltiplas intervenções e acessos nesse membro.

Clinicamente foram definidos quatro estadios:

Estadio I (Ligeiro) – Palidez, cianose ou arrefecimento sem dor. Ausência de pulso.

Estadio II (Moderado) – Dor durante exercício ou hemodiálise.

Estadio III (Grave) – Dor em repouso.

Estadio IV (Crítico) – Úlcera, gangrena, necrose.

Cerca de 30% - 50% dos síndromes de roubo clinicamente significativos têm sintomas nos primeiros 30 dias após construção do acesso. A dor em repouso ou a limitação motora imediatamente após a cirurgia implicam revisão imediata da mesma.

Apesar de múltiplas tentativas ainda não dispomos de um método capaz e fiável de predizer com segurança a ausência de risco de isquemia de um membro após construção de um acesso.

 

CASO CLÍNICO

Doente do sexo feminino, 78 anos, com antecedentes de hipertensão arterial desde há 42 anos e uma insuficiência renal crónica com necessidade de hemodiálise há 6 anos.

Foi submetida à construção de uma FAV úmero-cefálica no braço direito, em fase pré-dialítica, funcionante até há cerca de 1,5 anos.

Em Março de 2009 foi construída uma nova FAV, úmero-cefálica, desta vez no membro superior esquerdo.

A doente refere, desde esta data, arrefecimento, parestesias, dor para movimentos de preensão da mão e à elevação do antebraço, superior a 90º.

O quadro clínico evoluiu para dor durante as sessões de hemodiálise, por vezes em repouso, e com marcada impotência funcional.

A sintomatologia foi refractária a múltiplas terapêuticas médicas instituídas.

Ao fim de 12 meses surgiram lesões tróficas em D3 e D4 da mão e aos 13 meses é referenciada à consulta de acessos vasculares do Serviço de Cirurgia Vascular II do Centro Hospitalar Lisboa Norte (Hospital Pulido Valente).

A doente foi submetida a uma angiografia pré-operatória com recurso a manobras de compressão/descompressão e a isquemia objectivada | FIGURA 1 |. Eventuais defeitos de drenagem da FAV foram excluídos.

 

| FIGURA 1 | Angiografia pré-operatória sem e com compressão da FAV.

 

A indicação cirúrgica foi então colocada. A cirurgia consistiu num DRIL usando a veia safena interna esquerda como enxerto | FIGURA 2 |.

 

| FIGURA 2 | DRIL.

 

A angiografia de controlo mostra a manutenção da FAV e a perfusão do membro assegurada pelas três artérias do antebraço | FIGURA 3 |.

 

| FIGURA 3 | Angiografia pós DRIL.

 

A doente encontra-se a fazer diálise pela FAV nativa no membro superior esquerdo. As lesões tróficas cicatrizaram rapidamente e o quadro álgico reverteu quer em repouso, quer durante o exercício ou a diálise. Mantém apenas algumas parestesias da mão.

 

DISCUSSÃO

O síndrome de roubo e a isquemia não são sinónimos. O alvo terapêutico e aquilo que importa tratar é a isquemia ou, se quisermos, o síndrome de roubo sintomático.

No Estadio I preconiza-se apenas vigilância.

Para doentes em Estadio II há lugar à utilização de fármacos para alívio dos sintomas. Está preconizado o uso de antiagregantes plaquetários, bloqueadores dos canais de cálcio e mais recentemente prostaglandinas por via endovenosa.

A terapêutica cirúrgica é mandatória e urgente nos Estadios III e IV.

Esta compreende clàssicamente uma de três abordagens: a laqueação da FAV, a bandagem e a Revascularização Distal com Laqueação Arterial (DRIL).

A laqueação da FAV talvez seja ainda hoje o procedimento de primeira escolha para a maioria dos cirurgiões. Garante eficácia no tratamento da isquemia porém, não cumpre o objectivo de preservação do acesso vascular para hemodiálise. A bandagem, por outro lado, tem vindo a ser descontinuada pelo seu carácter impreciso e, logo, ineficaz.

Recentemente têm vindo a ser descritas outras alternativas cirúrgicas como sejam as técnicas de RUDI (Revisão do acesso Utilizando Inflow mais Distal) e a PAI (Proximalização do Inflow Arterial).

Estas duas alternativas têm como grande vantagem a manutenção da árvore arterial nativa, mas o Gold Standard continua a ser o DRIL.

Apesar de mais exigente tecnicamente é a única que garante segurança nos resultados no que diz respeito à resolução da isquemia com preservação do acesso vascular.

Para muitos autores a interrupção da circulação arterial nativa constitui o calcanhar de Aquiles desta técnica, muito embora nenhum caso de isquemia de um membro tenha ocorrido após esta técnica, mesmo quando oclui o bypass. Mais, há relatos clínicos de tratamento da isquemia apenas com a laqueção arterial a jusante da anastomose A-V.

Num futuro próximo talvez as técnicas de RUDI encontrem lugar em doentes com insuficiência cardíaca, fístulas aneurismáticas, de altíssimo débito e em doentes mais jovens. São sobretudo procedimentos de redução do fluxo com preservação arterial.

As PAI são mais utilizadas em isquemias em FAV de baixo fluxo.

 

CONCLUSÃO

O DRIL deve ser a cirurgia de primeira linha no tratamento dos doentes com isquemia grave ou crítica associada a FAV.

O protelamento cirúrgico não deve ser encorajado não só pela isquemia como pelo sofrimento desnecessário que condiciona.

Outra tónica deve ser colocada na melhor avaliação pré–operatória aquando do planeamento dos acessos A-V com identificação dos factores de risco para estas situações.

Idealmente, nenhuma isquemia de um membro devia ser tratada, todas deviam ser prevenidas.

 

BIBLIOGRAFIA

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