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Angiologia e Cirurgia Vascular

Print version ISSN 1646-706X

Angiol Cir Vasc vol.16 no.3 Lisboa Sept. 2020

 

ARTIGO ORIGINAL

Relaqueação da junção safeno-femoral no século XXI?

REVAS - Re-ligation of the saphenous femoral junction in the XXI century?

Maria José Barbas1, Ana Gonçalves1, Pedro Barroso1, Ana Raque Afonso1

1Serviço de Angiologia e Cirurgia Vascular do Hospital Garcia de Orta, Almada

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

RESUMO

Introdução: A relaqueação da junção safeno-femoral é considerada um procedimento complexo e demorado, com risco de lesões linfáticas e neurológicas. As técnicas endovenosas para tratamento das varizes, a excisão de trajetos e a injeção de espuma substituíram a maioria das indicações para esta técnica.

No entanto, ainda no deparamos com alguns doentes, em que essas técnicas não resolverão o problema, pelo que procurámos protocolar uma técnica de relaqueação da crossa que pudesse ser utilizada em ambulatório, com baixa taxa de complicações. Apresentamos aqui a nossa experiência.

Materiais e métodos: Foram incluídos os doentes submetidos a re-laqueação da crossa da grande safena em 2015 e 2016 na nossa Unidade de Cirurgia do Ambulatório (UCA)

Incluímos doentes sintomáticos (CEAP >3) com varizes significativas dependentes (mais de 3 mm de diâmetro e mais de 3 segundos de refluxo). Excluímos doentes com mais de 65 anos e obesos (IMC > 30), bem como doentes com mau estado de saúde e outras patologias que podem afetar o sucesso desta cirurgia.

A topografia da veia varicose inclui 3 áreas: a área femoral, a coxa e a perna.

Efetuámos todos os exames ultrassonográficos no nosso laboratório vascular para confirmar a recorrência da junção safeno-femoral e a sua correlação com as varizes. Recorremos ao teste de Brodie-Trendlemburg, associado ao eco doppler quando em dúvida.

A técnica cirúrgica foi feita sob anestesia geral e consistiu numa incisão obliqua sobre a artéria femoral, isolamento da veia femoral superior à junção safeno-femoral, descendo distalmente e procedeu-se à laqueação da mesma na origem, junto à veia femoral, evitando o "cavernoma" venoso. Associaram-se, sempre que necessário, avulsão de trajetos.

Resultados: Incluímos 67 doentes, com uma idade média de 48,8 anos e 83% eram do sexo feminino.

20% dos pacientes estavam no CEAP, enquanto os outros estavam no CEAP 4.

A cirurgia consistiu em re-laqueação bilateral da crossa da grande safena em 20 % dos casos, relaqueação unilateral em 23, 5 % e relaqueação unilateral com outra cirurgia no membro contralateral em 56,5 % dos casos. O tempo médio de cirurgia, incluindo a excisão dos trajetos foi de 42,9 minutos, o que se enquadra nos tepos recomendados para cirurgia do ambulatório.

A média total do tempo cirúrgico foi de 42,9 minutos. Todos os pacientes foram tratados na unidade de cirurgia ambulatória, mas 3 pacientes necessitaram de pernoita (2 porque viviam a mais de 100 km de distância e o outro devido à extensão das varizes).

Nenhum paciente recorreu ao serviço de urgência ou foi hospitalizado devido a complicações precoces ou tardias. Apenas um paciente se queixou de parestesias, que cederam com medicação.

Conclusão: Consideramos a seleção cautelosa dos pacientes, como extremamente, se não determinante para a cirurgia, sendo essencial a comprovação da recorrência de junção safeno-femoral, associada às varizes e CEAP acima de 3. A nossa técnica permite que a re-laqueação seja feita em ambulatório. A cirurgia de redo ainda pode ter lugar para o tratamento de alguns pacientes, com uma baixa taxa de complicações e uma duração razoável da cirurgia.

Palavras-chave: Recidiva de varizes; relaqueação da junção safeno-femoral; cirurgia de ambulatório


 

ABSTRACT

Aim: Re-ligation of the saphenous femoral junction is considered a complex and time-consuming surgery, with risk of nervous and lymphatic injury. The development of endovenous techniques replaced most of the indications, as well as the foam injection and stab avulsion.

But we are still confronted with some patients, where those techniques can´t solve their problem, so we adapted the classical re-ligation technique to allow the ambulatorization. In the following we are going to present our experience.

Methods: We included the patients submitted to saphenous femoral junction re-ligation in the years of 2016-17, in the ambulatory surgery department.

The inclusion criteria included symptomatic patients (CEAP >3) with significative, dependent varicose veins. We excluded patients over 65 years of age and obese (IMC > 30), as well as patients with poor health status and other pathologies that can affect the success of this surgery.

Topography of the varicose vein includes 3 areas: the femoral area, the thigh and the leg.

We have been doing all ultrasonography in our vascular laboratory to confirm the saphenous femoral recurrence and its correlation with the varicose veins, as well as their magnitude. We used the Brodie-Trendlemburg test, using ultrasonography when in doubt.

The surgical technique was done under general anesthesia and consist in an obliqua incision over the femoral arteria, discover and isolation of the femoral vein higher than the saphenous femoral junction, going down distal to the junction and ligation of the saphenous near the femoral vein, avoiding the venous “cavernoma”. Associated surgery was done, like stab avulsion of the varicose veins.

Results: Under the 67 patients included, under the average age of 48.8 years, 83% of them were female. 20% of patients were in CEAP 3, while the others were in CEAP 4.

20 % of the patients were submitted for bilateral re-ligation and additional surgery, and 23,5 % for one limb surgery. The remaining of the patients were submitted for one limb re-ligation and other surgeries in the other limb.

The total average of surgical time was 42,9 minutes. All patients were treated in the ambulatory surgery unit, but 3 patients stayed the night (2 because they lived further than 100 km away and the other because of the extension of the varicose veins).

No patient came to the emergency service or was hospitalized due to early or late complications. Only one patient complained of tight paresthesia and required medication.

Conclusion: Looking at the results, we considered the cautious selection of patients, as extremely, if not determinant for the surgery. Especially, based on the comprovation of the saphenous femoral junction recurrence, associated with the varicose veins and CEAP over 3.

Our technique allows for the re-ligation to be done as ambulatory surgery. The redo surgery still has a place for the treatment of some patients, with a low rate of complications and a reasonable surgery duration.

Keywords: Saphenous-femoral recurrence; religation sapheno-femoral junction; ambulatory surgery


 

Introdução

O tratamento de varizes recorrentes após cirurgia prévia (REVAS) constitui um desafio comum, complexo e responsável por importantes gastos em saúde. Particularmente a abordagem da recidiva da crossa por relaqueação é considerada trabalhosa, invasiva e susceptível de complicações, nomeadamente lesão de nervos e linfáticos adjacentes. (1-3)

Desta forma, cada vez mais se reflete na literatura e em guidelines bem sistematizadas, uma tendência para evitar esta intervenção, estando reservada apenas para casos em que as alternativas menos agressivas como a escleroterapia com espuma, as flebectomais eletivas ou a ablação endovenosa, não conseguem solucionar. (1,3)

Na prática clínica diária, os autores deparam-se com muitos doentes jovens, com gtandes varizes por recidiva daa crossa da grande safena com necessidade de resolução cirúrgica, pelo que protocolámos a nossa técnica para permitir serem intervencionados em regime ambulatório.

Apresentamos aqui a nossa abordagem de re-laqueação da crossa da veia grande safena efectuada na Unidade de Cirurgia do Ambulatório (UCA), incluindo a ténica protocolada e resultados.

Material e métodos

Foram incluídos os doentes submetidos a re-laqueação da crossa da veia grande safena entre Janeiro de 2015 e Dezembro de 2016, na Unidade de Cirurgia do Ambulatório do Hospital-

Todos os doentes incluídos tinham, como cirurgia prévia, a laqueação da crossa e striping da veia grande safena, com ou sem avulsão complementar de trajetos varicóticos.

Na seleção de doentes para cirurgia, foram incluídos os doentes sintomáticos (CEAP > 3), com varizes tronculares significativas (> 3 mm diâmetro e com refluxo > 3 seg).

Foram excluídos os doentes com varizes pouco significativas, idosos (idade > 65 anos e obesos (IMC > 30). Outro factor que foi considerdo foi o estado geral dos doentes e esperança de vida, tendo-se excluído os doentes com co-morbilidades que aumentassem muito o risco cirúrgico ou tornassem a recuperação pós-operatória muito complexa, além dos doentes com contra-indicação geral para cirurgia do ambulatório, de acordo com as Normas da DGS e da Sociedade Portuguesa de Anestesia.

Registaram-se dados demográficos dos doentes (idade, sexo), sintomatologia (CEAP), topografia das varizes e origem dos refluxos (baseada no ecodopler).

Os doentes foram submetidos a re-laqueação da crossa da grande safena, conforme protocolado, unilateral ou bilateralmente, necessitando na maioria das vezes de procedimentos complementares como excisão de trajetos ou escleroterapia. Foi registado a cirurgia efectuada, assim como a duração da mesma.

Foram considerados end-points a necessidade não prevista de pernoita, vindas ao serviço de urgência e internamentos relacionados com complicações da cirurgia, assim como foram registadas as complicações precoces e tardias, nomeadamente infeciosas, neurológicas, linfáticas ou hematomas de grandes dimensões.

Todos os doentes assinaram consentimento informado para a cirurgia efectuada e para os follow-ups.

Os doentes foram avaliados aos 30 dias e aos 3 meses, em consulta externa. No dia seguinte à cirurgia, os doentes receberam telefonema de avaliação pela enfermagem da UCA para avaliar o estado geral e eventuais complicações. Os doentes preencheram questionário de avaliação da UCA e da cirurgia.

Ecodopler venoso dos membros inferiores

Todos os doentes que foram operados e incluídos no estudo, efectuaram ecodopler no Laboratório Vascular do Serviço, para mapeamento adequado ao cirurgião, com aparelho Vivid 7 da HP. O estudo foi efectuado com o doente em ortostatismo, com sonda de 7.5 mHz, tendo sido utilizada manobras de compressão-libertação das massas musculares para estimular o possível refluxo.

Foram estudados os seguintes aspetos: comprovação inequívoca de recidiva da crossa, topografia das varizes recorrentes e seu calibre, outras possíveis origens do refluxo do sistema profundo para o superficial, grau de refluxo (segundos) e dependência entre as varizes observadas e a recidiva da crossa.

Definimos como varizes, as veias superficiais tortuosas, com calibre superior a 3 mm e refluxo significativo (> 3 s), ou com fenómeno de flebite (oclusão total ou parcial por trombo). (Figura 1 e 2)

 

 

 

Em relação à topografia das varizes, consideraram-se os seguintes territórios:

• Virilha

• Coxaface interna/antero-externa.

• Pernaface interna, externa ou posterior.

Considerou-se recidiva da crossa da safena, a existência de coto de safena interna com diametro suuperior a 3 mm e refluxo superior a 0.5 s, existência de colaterais refluxivas ou de cavernoma venoso.

Foram ainda despistados outras prováveis origens de refluxo, verificando sistematicamente os locais de eleição (comunicantes clássicas) considerando-se significativa se diametro da veia com superior a 3 mm de diâmetro e refluxo com duração superior a 3 s entre o sistema profundo e superficial.

Nas situações menos óbvias, para determinar a dependência das varizes observadas em relação à recorrência da crossa, sobretudo nos doentes com varizes unicamente abaixo do joelho ou múltiplas fontes de refluxo, utilizou-se o teste de Brodie-Tredlemburg, em que se colocou garrote a vários níveis da coxa, após decúbito de 1 min. Seguidamente, colocou-se o doente em ortostatismo e verificou-se se reenchiam as varizes, que indicaria que estariam dependentes de fonte de refluxo abaixo da crossa. Se se mantivesse “vazias”, abrimos o garrote e o enchimento das varizes indicaria que a fonte de refluxo estaria proximal ao mesmo.

Técnica cirúrgica utilizada:

Foi utilizada anestesia geral em todos os doentes, tendo sido previamente marcadas as suas varizes em ortostatismo com caneta dermográfica e repetido o ecodopler como auxiliar de marcação sempre que pertinente. Foi efetuada incisão oblíqua na região inguinal, extendida para a zona mais interna, tendo como referencia o pulso femoral. (Figura 2 e 3)

 

 

Através da referência da artéria femoral, isola-se a veia femoral comum proximal à confluência safeno-femoral, evitando o “cavernoma” varicoso, quando presente. Se esta se encontra na face interna da veia, aborda-se a femoral pela face externa. Estende-se a disseção da veia femoral acima e abaixo da confluência safeno-femoral, laqueando-se ainda as colateraiss da veia femoral. Referencia-se o coto da safena interna justa veia femoral e é laqueado com dupla sutura de Vycryl ou Monocry2/0. (foto 3 e 4)

Se existir tronco de veia safena significativo, este é abordado, podendo, nos casos de persistência ou dupla safena, permitir o striping. Se apenas existir “cavernoma”, verifica-se que este diminui francamente de volume e turgência, após a laqueação da crossa na origem, deixando-nos satisfeitos. Caso persista cavernoma muito volumoso, deve ser pesquisada eventual colateral ascendente mais significativa, que esteja alimentar o cavernoma apartir da circulação pélvica e/ou colaterais da veia femoral.

Se aneurisma venoso de dimensões significativas a nível da virilha, procedeu-se também à sua excisão.

Foram utilizadas técnicas adjuvantes como flebetomias com a técnica de Muller ou escleroterapia com espuma, para tratamento dos trajetos varicóticos associados. Se varizes no membro contralateral, estas foram tratadas convencionalmente.

Em todos os doentes foi administrada enoxaparina e antibioterapia profilaticas. No final da cirurgia, procedeu-se à infiltração da região inguinal com anestesico de longa duração (Ropivacaína), para controle da dor pos operatoria.

Foram utilizadas meias elásticas em todos os doentes, que foram usadas continuamente até remoção dos pontos (8 dias) e depois só durante o dia até aos 30 dias.

Resultados

Foram incluídos 67 doentes, com uma média de idade de 48,8 anos, sendo a maioria do sexo feminino (83 %) e os restantes do sexo masculino (17%).

Quanto ao estadio clínico, 21 % foram classificados em CEAP 3 e os restantes 79 % em CEAP 4. (Quadro 1)

 

 

A cirurgia consistiu em re-laqueação bilateral da crossa da grande safena em 20 % dos casos, relaqueação unilateral em 23, 5 % e relaqueação unilateral com outra cirurgia no membro contralateral em 56,5 % dos casos. O tempo médio de cirurgia, incluindo a excisão dos trajetos foi de 42,9 minutos, o que se enquadra nos tepos recomendados para cirurgia do ambulatório. (Quadro 2)

 

 

Em relação à topografia, todos os doentes tinham varizes a nível da coxa na face interna ou anterior e 60 doentes (89,5 %), as varizes estendiam-se até à virilha. Em 62 casos, observavam-se também varizes a nível da perna, mas em 43 destes, observavam-se também comunicantes insuficientes (3 em 12 doentes, 2 em 44 e 1 em sete doentes).

Apenas 3 doentes precisaram de pernoita, 2 por morarem a mais de 100 km e outros 1 pela extensão dos trajetos removidos. Nenhum doentes necessitou de recorrer ao serviço de urgência ou ser hospitalizado por complicação pos operatória. Nenhum doente referiu queixas relacionadas com linfocelo, hematoma ou infeção, tendo retomado o trabalho na data prevista (2 a 4 semanas, de acordo com cirurgia um«ni ou bilateral e tipo de trabalho).

Um doente referiu queixas de parestesias da coxa, que reuqereram medicação, com regressão em cerca de 6 meses. (Quadro 3)

 

 

Discussão

O tratamento cirúrgico da recidiva de varizes é complexo, pelo que a maioria das guidelines atuais remetem a relaqueação da crossa para a derradeira técnica a utilizar. A principal razão desta modificação de abordagem reside na complexidade e maior potencial de complicações, em contraste com as alternativas percutaneas, que são apontadas cada vez mais como preferênciais.(1,4)

Groenendael L, et al, comparou os resultados do tratamento da recurrência de varizes da veia grande safena por cirurgia convencional e por ablação termal por laser (EVLA). Nesse trabalho, concluiu que a era uma técnica fazível nos doentes com recurrencia de varizes da grande safena, incluindo crossa e tronco, com mais rápida retoma da atividade profissional e com menor taxa de complicações, embora com valores não estatisticamente significativos. No entanto, foi um estudo retrospectivo e os doentes foram selecionados para cada um dos braços do estudo de acordo com as caracteristicas da situação clinica. Desta forma, os doentes com varizes com tortuosidade severa, trombos ou com dificuldade de acesso às varizes maiores, foram excluidos da EVLA. (1,5)

As varizes recurrentes após cirurgia de varizes (REVAS) foram definidas na reunião do consenso internacional de Paris, em 1998.(4) Este termo visa evitar a confusão entre as verdadeiras recorrências (veias que voltam a ficar varicosas após tratamento inicial que as eliminou), as varizes residuais (que não foram eliminadas na cirurgia) e as veias varicosas por progressão da doença (noutros territórios), já que a abordagem é diferente para cada uma destas situações.(4)

O consenso defeniu ainda uma classificação para facilitar a prática clínica e definir melhor nas investigações, que inclui 6 itens: topografia das varizes, fontes de refluxo, grau de refluxo, natureza do refluxo (mesmo local do intervencionado ou outro) e factores que contribuem para o tronco incompetente.(4,5)

A classificação REVAS visou complementar a CEAP, pois reconhece a necessidade de complementar o diagnóstico imagiológico com a clínica para determinar a origem das varizes recorrentes após cirurga, caracterizando com precisão a doença varicótica.(4,5)

Nos doentes com REVAS, é frequente existir mais do que uma fonte de refluxo, pelo que é fundamental determinar se a recorrência da crossa é a principal responsável pelas varizes do doente, dada a maior complexidade da sua abordagem.(6) A decisão é feita através da topografia das varizes e da análise da relação das fontes de refluxo com as mesmas. Os doentes com varizes localizadas em territórios não dependentes da crossa da grande safena, mesmo com recidiva da mesma evidente no eco-dopler, foram tratados sem abordagem da crossa e excluídos do estudo.

Consideramos determinante a seleção adequada dos doentes para a “redo” cirurgia, baseada na comprovação inequívoca ultrassonográfica de recidiva da crossa da safena, associada à existência de varizes tronculares em território dependente e CEAP > 3, em doentes com bom estado geral.(7)

Um dos aspetos em que a nossa experiência é concordante com todos os estudos e guidelines é a necessidade de um estudo ultrasonográfico adequado, efectuado em laboratório rotinado na avaliação de doentes operados às varizes. Por esta razão, todos os doentes operados repetiram o seu estudo ultrasonográfico no nosso laboratório vascular, estando o ecografo disponível no bloco operatório para auxiliar de mapeamento ou controle sempre que considerado necessário.(7,8)

Nos casos de concordancia etiológica simples: recidiva da crossa e varizes da coxa, face interna ou anterior, a decisão é linear, muito embora possa haver também contribuição de veias pélvicas na etiologia das varizes.

Recorremos ao “velho” teste de Brodie-Tredlemburg, associado ao eco-dopler, que é um auxiliar precioso na definição da etiologia, sobretudo no grupo de doentes com varizes significativas do distais da coxa e da perna, onde é comum existirem outras fontes de refluxo, que poderão ser as principais responsáveis pela sua existência.(12)

Os objectivos da cirurgia de varizes são variados e tão diversos como a própria doença e incluem: a eliminação do refluxo do sistema profundo para o superficial, supreção das varizes, diminuição da pressão ambulatória venosa, prevenção da progressão para doença venosa severa, evitar recorrencias. Visa essencialmente também melhorar a cosmética, assim como a sintomatologia. Desta forma, efectua-se o encerramento das comunicações entre o sistema profundo e superficial, combinado com a eliminação dos troncos residuais e a ablação de varizes.(6,8)

A recidiva da junção safeno femoral tem sido atribuida a várias causas, destacando-se a persistencia do coto da safena interna, por vezes laqueado muito baixo, a não laqueação das tributárias e a neovascularização. Esta última é mais dificil de controlar e parece ser a principal causa também de recurrêcnia pos re-laqueação da crossa da grande safena, sobretudo se a cirurgia inicial foi feita por cirurgiões experientes.

Estão descritas taxas mais elevadas de recurrencia após as reintervenções, principal ente se na origem da recidiva estava a neovascularização, já que se aborda a origem da safena junto à veia femoral.(5,6)

Por esse motivo, ponderámos utilizar técnicas que têm sido descritas como preventivas desta neovascularização e que incluem a invaginação do coto da safena, a cobertura com fascia cribiforme ou com patch de PTFE, entre outras mais ou menos imaginativas. No entanto, os resultados dos estudos publicados não demonstraram vantagem inequivoca de qualquer deles, podendo no caso da utilização de prótese, poder haver infeção tardia.(7,9-11)

Desta forma, não havendo vantagem significativa dessas técnicas, optámos por uma técnica menos agressiva, sem disseção do cavernoma, de modo a previligiar a menor taxa de complicaçoes e o tratamento dos doentes em ambulatório. A nossa técnica também não expõe o endotélio, o que seria uma vantagem na prevenção da neovascularização No entanto, nos casos de grandes aneurismas ou grandes trajetos venosos a nível da região inguinal, procedemos à sua excisão, sem aumentar a taxa de complicações locais, nomeadamente linfáticas ou neurológicas, que são as mais habitualmente descritas.(4,5)

Com o uso cada vez mais frequente das técnicas de ablação endovenosa para tratamento das varizes, com conservação da junção safeno-fenoral, que têm como principal causa de recorrencia a recanalização em vez de neovascularização, seria de prever deixar de existir a necessidade deste tipo de cirurgia invasiva de re-laqueação da crossa da grande safena.(5)

Seria de esperar assim, que, no século XXI, com vulgarização do ecógrafo presente nos Blocos Operatórios e das técnicas endovenosas serem cada vez mais utilizadas, o perfil de doentes com recurrência de varizes seria de algum modo diferente dos doentes que aqui descrevemos, jovens, com grandes veias varicosas dependentes de recidiva da crossa. Mas temos que reflectir que menos de 50 % dos doentes operados às varizes não o são por cirurgiões vasculares, mas por cirurgiões que não têm experiência em ecodopler, não efectuam técnicas endovenosas e não abordam a recidiva da crossa da grande safena, pelo que consideramos que vão continuar ainda a existir alguns doentes com necessidade desta cirurgia.

Conclusão

Consideramos a seleção cautelosa dos pacientes, como extremamente, se não determinante para a cirurgia, sendo essencial a comprovação da recorrência de junção safeno-femoral, associada às varizes e CEAP acima de 3. A nossa técnica permite que a re-laqueação seja feita em ambulatório. A cirurgia de redo ainda pode ter lugar para o tratamento de alguns pacientes, com uma baixa taxa de complicações e uma duração razoável da cirurgia.

 

BIBLIOGRAFIA

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Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

Correio eletrónico: mjfbarbas@gmail.com (M. Barbas).

 

Recebido a 10 de maio de 2020. Aceite a 29 de setembro de 2020.

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