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Medievalista

versão On-line ISSN 1646-740X

Medievalista  no.32 Lisboa jul. 2022  Epub 31-Dez-2022

https://doi.org/10.4000/medievalista.5713 

Recensão/Review

Recensão / Review: Les Archives Familiales dans l’Occident Médiéval et Moderne.Trésor, arsenal, memorial.

1 Universidade Nova de Lisboa, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Instituto de Estudos Medievais 1070-312 Lisboa, Portugal; miguelaguiar@fcsh.unl.pt

Lamazou-Duplan, Véronique. (éd.) -, Les Archives Familiales dans l’Occident Médiéval et Moderne. Trésor, arsenal, memorial. ., Madrid: :, Casa de Velázquez, ,, 2021. (, 555 ppp. )


“A livraria, clara e larga, escaiolada de azul, com pesadas estantes de pau-preto onde repousavam, no pó e na gravidade das lombadas de carneira, grossos fólios de convento e de foro (…) E daí, da sua cadeira de couro, Gonçalo Mendes Ramires, pensativo diante das tiras de papel almaço, roçando pela testa a rama da pena de pato, avistava sempre a inspiradora da sua novela - a Torre, a antiquíssima Torre, quadrada e negra sobre os limoeiros do pomar que em redor crescera, com uma pouca de hera no cunhal rachado, as fundas frestas gradeadas de ferro, as ameias e a miradoura, bem cortadas no azul de Junho, robusta sobrevivência do Paço acastelado, da falada Honra de Santa Ireneia, solar dos Mendes Ramires desde os meados do século X”1.

Casa, família, linhagem, arquivo. Este conjunto de palavras, convocando conceitos endógenos (i.e., categorias criadas e usadas pelos atores históricos no seu tempo2) e conceitos operatórios manobrados pelas ciências históricas e arquivísticas, constituem o núcleo das análises propostas neste livro3. Um conjunto revestido de ambiguidade, quer pelo nem sempre claro diálogo entre representações endógenas e conceitos científicos e operatórios, quer também pela sobrevivência, através da cultura “popular” e erudita, de uma série de imagens sobre eles produzidas. De certa forma, é navegando nesse mar de ambiguidades e representações que Eça de Queirós apresenta a figura de Gonçalo Mendes Ramires, e os topoi associados a uma forma de organização social condenada ao desaparecimento no devir progressista do mundo, suscitando uma simpática nostalgia: a livraria, em que os «papéis» suportam simultaneamente antigas provas da estrutura e funcionamento da «casa» e, cobertos pelo pó, expressam a melancolia; a torre, a verticalidade dos paços medievais incrustados na mítica paisagem senhorial do Entre Douro e Minho, ligados a “linhagens”, reais e/ou imaginárias, remontando a um período anterior à própria nacionalidade. A “livraria” ou o arquivo assume até um lugar “mágico”, na sua localização (um lugar altaneiro) e organização (caixas, estantes e armários fechados), à semelhança de resto do que é descrito por vários autores do livro aqui em análise (particularmente na segunda parte).

Os arquivos constituem parte fulcral da memória e do imaginário acerca de uma ordem social desaparecida, fornecendo ao mesmo tempo, através dos materiais que albergam, os testemunhos que permitem construir a descrição e interpretação sobre o funcionamento desse mundo. O objeto do livro aqui em análise são os arquivos de “família”, abordados, segundo a diretora da obra, nas múltiplas dimensões que eles convocam: a fabricação das identidades e memórias, assim como o seu papel no processo de dominação e reprodução social.

O livro, resultando de um conjunto de encontros científicos ao longo de anos e que revitalizaram este campo de estudos4, divide-se em três blocos:

  • A primeira parte, intitulada Arquivos e arquivos de família, entre arquivística e história5, com texto introdutório de Maria de Lurdes Rosa, apresenta artigos que abordam a “escrituralidade” medieval, a evolução histórica dos arquivos e de certas perspetivas arquivísticas como forma de compreender mutações, e o acesso contemporâneo aos materiais, demonstrando a profunda imbricação destes problemas no que à reflexão epistemológica e heurística do trabalho historiográfico diz respeito.

  • A segunda parte, introduzida por Véronique Lamazou-Duplan (Tesouros de arquivo, de ontem ao presente) divide-se em dois blocos. No primeiro (Sacos, cofres, armários, inventário…descrever e conservar os arquivos ao longo do tempo), e recorrendo sobretudo a casos dos séculos XV-XVI, descrevem-se processos de organização de arquivos através de instrumentos como inventários, e da disposição dos documentos em armários ou noutras peças de mobiliário como forma de organizar a documentação ao serviço da “casa” e da “família”. O segundo bloco (Salvaguardar os patrimónios) apresenta práticas de organização e disponibilização de vários tipos de arquivos, revelando o seu potencial historiográfico.

  • A terceira parte, com texto de introdução de Arsenio Dacosta, Tünde Mikes, Eloísa Ramírez Vaquero e José Ramón Díaz de Durana (Arquivos e famílias: arsenal e memória) divide-se em três blocos. No primeiro (Estruturação arquivísticas e familiares: constituição, conservação, transmissão, reconstituição) reúnem-se alguns textos que apresentam a história de alguns arquivos e a reconstituição que se pode fazer da sua orgânica evolutiva. No segundo (Transversalidade social das práticas) apresentam-se trabalhos que, recorrendo a casos de vários pontos da Península Ibérica, mas também da Toscânia, evidenciam a importância da escrita e da sua preservação para um lastro alargado de grupos sociais. Finalmente, o terceiro bloco (Memória) reúne textos que demonstram a importância da “manipulação” do arquivo como forma de construção da memória de um grupo social em dado contexto, assim como artigos de natureza mais reflexiva acerca da sua importância para os grupos dominantes ao longo do Antigo Regime.

Como se poderá constatar de uma leitura transversal da obra, composta por 34 estudos, os conceitos e abordagens cruzam-se, com maior pendor historiográfico ou arquivístico, com maior concentração ou abrangência cronológica, consoante a formação, percursos e interesses de investigação dos autores, sem que isso prejudique o interesse dos trabalhos e da leitura do livro numa panorâmica geral. Os artigos centram-se sobretudo na Península Ibérica, com algumas incursões pelo espaço francês e italiano. De entre todos eles se detetam elementos transversais, expressos, porém, em moldes e contextos distintos: entre a maior precocidade da estruturação de arquivos “familiares» e/ou «patrimoniais” numa região (como no caso aparentemente especial da Catalunha), e o florescimento de arquivos como parte fundamental da organização das casas senhoriais que marcaram a paisagem social castelhana do período Trastâmara em diante. De um modo geral, todos os textos evidenciam o cruzamento entre várias dimensões da vida social dificilmente desconectáveis nas sociedades europeias pré-industriais6: “família”, poder, organização de atividades produtivas.

De facto, perpassa por todo o livro a consciência de que todos estes conceitos merecem uma cuidadosa definição, tanto na ótica histórica como arquivística, e no essencial mútuo apoio e cruzamento que entre elas deve existir. A perspetiva que se pode oferecer neste texto é a de um historiador num esforço de consciencialização para a importância fundamental de conhecer e compreender os processos subjacentes à conservação e disponibilização dos testemunhos que nos chegaram do passado, e dos sucessivos filtros que sobre eles atuaram, de forma a considerar a análise dos fenómenos históricos tendo sempre presente estas inevitáveis condicionalidades7. Como referíamos, esta perspetiva não se coloca apenas numa tradicional preocupação com a compreensão da mecânica e disposição atual dos arquivos como modo de “encontrar” documentos, mas também e sobretudo num esforço de colocar esta reflexão no centro dos problemas heurísticos e epistemológicos da construção do conhecimento historiográfico.

Alguns dos textos, normalmente estruturados por estudos de caso, procuram reconstituir a orgânica dos arquivos e a lógica que foi enformando as suas sucessivas reorganizações. Para isso, como explica Maria de Lurdes Rosa, é fundamental reconstituir os principais conceitos endógenos que fornecem as linhas-mestras da organização social e, consequentemente, da estruturação e restruturação destes arquivos. São esses conceitos que norteiam as sucessivas operações de recomposição e reorganização, ainda que cada contexto faça intervir objetivos e constrangimentos específicos. No que aos grupos dominantes diz respeito, os conceitos decisivos são a “casa”, a “linhagem” ou a “família”. As aspas sugerem a ambiguidade que eles convocam. De certa forma, o conceito de “arquivo patrimonial” usado por Piñol Alabart e Lluch Bramon parece, em certa medida, aproximar-se dos mesmo princípios, relevando que o feixe essencial na organização e para a preservação destes arquivos foi, em particular no quadro social do Antigo Regime, a preservação dos direitos sobre a terra, quer enquanto base da “empresa familiar”, no que aos grupos não-dominantes diz respeito, quer enquanto bases da “casa” aristocrática, fonte e simultaneamente condição do papel dominante que o grupo exerce no sistema social e na sua reprodução.

Mas os vários casos descritos demonstram também como certos conceitos não se apresentam imutáveis ao longo do tempo (como não poderia deixar de ser), mesmo que a análise historiográfica atribua uma certa coerência global à organização social do Antigo Regime, esbatendo salutarmente as tradicionais divisões cronológicas académicas. Parece-nos que este ponto é particularmente relevante no caso da “família” e da “casa”, cujos contornos jurídicos e função de enquadramento social não são necessariamente os mesmos no século XVII ou no XV, em Portugal ou na Catalunha. O que em certa medida acentua a necessidade de, mesmo no bloco cronológico considerado, acautelar a noção de que uma certa reorganização posterior dos testemunhos históricos pode distorcer a análise da organização social anterior. Quanto a nós, este problema é particularmente visível ao nível dos grupos aristocráticos, em especial antes do século XV (e pelo menos no caso português), em que a estruturação “vertical” sugerida pela “casa”, pelos vínculos e pelos arquivos que lhes dão coerência, aparenta ser alheia à dinâmica de organização e reprodução do grupo8.

Enfim, o conjunto dos textos, sem que por vezes isso fique plenamente explanado nos contributos, evidencia o papel do parentesco como estrutura de base para o funcionamento e reprodução da ordem social. Precisamos aqui o uso de “parentesco” em detrimento de “família”, não por uma simples preferência estilística, mas devido à perspetiva operativa e concetual subjacente a cada um dos termos. Quanto a nós, a definição operativa de “família” revela-se algo problemática, sobretudo se pensada em comparação com a perspetiva concetual e mais global de parentesco, entendendo-o como um sistema de relações socialmente construído. Família convoca uma série de imagens próximas ao senso-comum, atribuindo-as e retroprojetando-as sobre outras épocas históricas (espaço “privado”, “íntimo”, associado à afetividade). É igualmente imprecisa no que ao espetro de parentes diz respeito, movendo-se num campo de indefinição (no caso, entre a célula conjugal e a “família restrita”, e o espetro mais abrangente formado pela “família alargada”)9.

Quanto a nós, a sua composição evolutiva poderia aliás ser resolvida com a noção de parentela, que pressupõe a constelação de relações que se vão redesenhando com o devir geracional. O conceito de parentesco, pelo contrário, pressupõe considerar estas relações num plano mais lato, a começar pelas estruturas globais dentro das quais se podem detetar unidades mais coesas, definidas em torno de elementos identitários e organizacionais, de que assomam as “casas”. As “casas” que, porém, não se estruturam apenas pelas relações de consanguinidade, extravasando-as e mantendo-se aliás com base nas sucessivas redes de alianças que são tecidas; dinâmicas que explicam, por exemplo, as sucessivas incorporações de documentação “familiar” noutros arquivos, tornando-os de certa forma em depósitos compósitos e sucessivamente reestruturados, e justificando, por exemplo, que quase todos os textos mencionem a preservação de contratos matrimoniais nas suas mais diversas formas e em diferentes espetros sociais (contratos de casamento, cartas de dote, de arras, etc.). Assim, se o texto introdutório do livro menciona estas várias soluções (“archives de la parentèle” ou “archives des parents et alliés”), constata-se que elas não são retidas enquanto categorias operatórias, evidenciando a arreigada persistência da “família” nas perspetivas teóricas da historiografia ibérica.

Nesta lógica, as observações gerais que podemos fazer seguem nomeadamente a linha de raciocínio proposta por Joseph Morsel. Estes arquivos - em especial os arquivos aristocráticos, mas não só - mantiveram-se como tal não apenas por causa das relações “familiares” nele expressas, mas por nele caberem e se expressarem um conjunto mais lato de relações sociais, nas quais as estruturas de parentesco também desempenham um papel relevante pois, nestas sociedades, todos estes elementos estão profundamente imbricados.

Para os historiadores que trabalham sobre os grupos aristocráticos, o conhecimento dos sucessivos processos de recomposição dos arquivos e dos fatores que os foram ordenando é essencial para compreender a evolução do grupo social. Tal constatação plasma-se tanto ao nível do que foi preservado e é hoje acessível, e da forma como esses testemunhos foram organizados, como no plano do que não foi preservado, de forma voluntária ou involuntária, sabendo porém da dificuldade subjacente à reconstituição da existência e organização desses materiais “rejeitados”. De resto, os artigos que abordam os inventários dos arquivos revelam-se essenciais nesta matéria, e demonstram a fecundidade de problemas e hipóteses que a partir deles se podem construir10. Tal pressuposto metodológico tem uma transferência direta para a análise das práticas sociais, como sucede por exemplo com as práticas de transmissão. Com efeito, associado à formação das “casas” e em grande medida destes arquivos (uma vez que se trata de duas peças da mesma engrenagem) está também a progressiva importância adquirida por bens indivisíveis, com a ascensão no quadro ibérico da figura jurídica dos vínculos, relacionada ainda, em Portugal e em Castela, com a concessão de senhorios da coroa. Em grande medida, é a sucessão geracional na administração deste tipo de bens que suscita o arquivamento e sucessiva reorganização da documentação.

No que toca à aristocracia curial e senhorial portuguesa entre o final do século XIV e as primeiras décadas do XVI por nós estudada na tese de doutoramento, tivemos oportunidade de procurar demonstrar como esta dinâmica ofusca a existência de partilhas do património próprio (i.e., não vinculado ou pertencente à coroa), subalternizado o papel social desempenhado pela permanente circulação da fortuna. Uma perspetiva tanto mais acentuada pela possível falta de pertinência em conservar na longa duração as cartas de partilha, mesmo que os indícios desta prática sejam abundantes na documentação - neste sentido, os tipos de documentos preservados nestes arquivos que preconizam os movimentos circulatórios da fortuna e, através dela, da densificação das relações sociais, são os contratos de casamento ou outras tipologias associadas à transferência matrimonial de bens.

Em suma, o desconhecimento acerca dos conceitos endógenos estruturantes e dos quadros evolutivos destes arquivos produz uma imagem organizativa assente essencialmente na «casa», mas que, quanto a nós, não deve tornar-se num “totem” historiográfico, sob pena de subalternizar processos sociais igualmente decisivos que com eles se articulam. Na verdade, é a este processo que J. Morsel se refere quando menciona a dimensão “sociogenética” dos arquivos. Tê-la presente enriquece e fortalece os inquéritos de modernistas e medievalistas, sendo igualmente decisivo para estes já que a disposição com que muitos destes materiais chegaram até ao presente pressupõe uma barreira conceptual face à organização social do passado. Esta última observação aplica-se, de resto, para qualquer tipo de arquivo, e em particular para a perceção espontânea da dimensão “aberta” e “estatal” com que, sob a ideologia liberal triunfante, foram reconfigurados ao longo dos séculos XIX e XX, enfatizando assim que não se trata de organismos “neutros”.

De um modo geral, a perspetiva que defendemos para a abordagem historiográfica às sociedades antigas pressupõe um diálogo entre conceitos endógenos e operatórios, e que, quanto a nós, se torna particularmente pertinente no quadro dos arquivos “familiares”. Se há um conjunto de conceitos endógenos, de configuração evolutiva e que vão moldando a organização destes conjuntos documentais, é fundamental conhecê-los para compreender esses processos e a dinâmica que lhes está subjacente. Aqui, assoma sobretudo a “casa”, a “linhagem” ou a “família”. Mas, ao mesmo tempo, o trabalho historiográfico entendido numa perspetiva científica deverá ir além deste plano, assumindo desde logo que os conceitos endógenos são instrumentos criados e mobilizados pelos agentes históricos para agir e moldar a sua realidade, e não necessariamente para descrevê-la. Impõe-se assim a necessidade de diálogo entre conceitos endógenos e operativos, sendo que estes últimos não necessitam obrigatoriamente de fazer parte do campo concetual dos agentes históricos. São, enfim, abstrações produzidas para descrever as dinâmicas e processos sociais num plano mais lato. E é por essa razão que preferimos a noção de parentesco, entendendo-a como estrutura global que fornece um quadro de base à estruturação e reprodução dos grupos sociais, em detrimento da noção de “família”, por mais que esta até se possa tornar hegemónica nas representações endógenas.

Este conjunto de reflexões suscitadas pelo livro que aqui se discutiu atestam do importante contributo que a obra oferece para a reflexão historiográfica. Demonstra, por um lado, as potencialidades deste campo de estudos para perceber a evolução de certas configurações sociais estruturantes (enquadradas pelo parentesco, versando sobre o poder e/ou sobre as atividades produtivas), e permite resgatar dados e informações para inquirir, desde logo, o vazio e a delapidação documental, seja ela premeditada e organizada, ou por simples efeito do tempo. Por outro lado, constitui um contributo relevante para forçar a reflexão epistemológica sobre os documentos escritos e a sua preservação, base essencial - juntamente com outros testemunhos que chegaram até ao presente - do trabalho historiográfico. E forçando, aliás, uma reflexão que vá para além da constatação das “fontes disponíveis”, e pressuponha pelo contrário um trabalho heurístico racional que encare as paisagens documentais contemporâneas enquanto panoramas moldados por séculos de transformações sociais mais ou menos rápidas e profundas, devendo por seu turno constituir o cerne de uma historiografia reflexiva e enquadradora das comunidades do passado nos seus devidos e sucessivos horizontes mentais.

Referências bibliográficas

AGUIAR, Miguel - Aristocracia, parentesco e reprodução social em Portugal no final da Idade Média. Porto/Paris: Universidade do Porto, Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne, 2021. Tese de doutoramento. [ Links ]

CLAVERO, Bartolomé - La grâce du don. Anthropologie catholique de l’économie moderne. Traduction Jean-Frédéric Schaub. Paris: Albin Michel, 1996. [ Links ]

CRONE, Patricia - Pre-Industrial Societies: Anatomy of the Pre-Modern World. Londres: Oneworld, 2015. [ Links ]

GUERREAU-JALABERT, Anita; MORSEL, Joseph Morsel - “De l’histoire de la famille à l’anthropologie de la parenté”. In SCHMITT, Jean-Claude; OEXLE, Otto Gerhard (dir.) - Les tendances actuelles de l'histoire du Moyen Âge en France et en Allemagne, Paris: Publications de la Sorbonne, 2002, pp. 433-446. [ Links ]

SOTTOMAYOR-PIZARRO, José Augusto de - “«E mostrarom duas arcas hua vaçia e na outra andavam cartas». Monastic fonds as family archives in the Middle Ages”. In ROSA, Maria de Lurdes; NÓVOA, Rita Sampaio da; GAGO, Alice Borges; SOUSA, Maria João da Câmara Andrade e (coord.) - Recovered Voices, Newfound Questions: Family Archives and Historical Research. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2019, pp. 23-34. [ Links ]

SOUSA, Bernardo Vasconcelos e - “Linhagem e Identidade Social na Nobreza Medieval Portuguesa (Séculos XIII-XIV)”. Hispania 67/227 (2007), pp. 881-898. [ Links ]

1QUEIRÓS, Eça de - A Ilustre Casa de Ramires. Lisboa: Publicações Europa-América, 2.ª edição, p. 11.

2Usamos este conceito considerando tratar-se da aproximação mais clara ao conceito de “indigène” usado pela antropologia francesa. Optamos por não fazer uma tradução direta uma vez que, em português, o termo remete sobretudo para o imaginário «indígena», e não tanto para as categorias mentais e práticas sociais de uma dada sociedade que não se enquadre num imaginário dito “primitivo”. O que, em última análise, evidencia igualmente de um tratamento das sociedades europeias de Antigo Regime que pressupõe uma ilusão de continuidade e parecença entre «nós» e “eles”, e que é nomeadamente criticada por CLAVERO, Bartolomé - La grâce du don. Anthropologie catholique de l’économie moderne. Traduction Jean-Frédéric Schaub. Paris: Albin Michel, 1996.

3Esta publicação encontra-se disponível em http://books.openedition.org/cvz/25705.

4De que se destaca por exemplo o programa ARCHIFAM: https://arqfam.fcsh.unl.pt/?portfolio=archifam.

5Os títulos estão originalmente em francês. A tradução é da responsabilidade do autor desta recensão.

6Usámos aqui o conceito de “pré-industrial” em paralelo com o de “Antigo Regime”, considerando que as mutações institucionais e concetuais que levaram ao desmantelamento deste último estão profundamente imbricadas com as transformações produzidas com o advento da industrialização. Veja-se CRONE, Patricia - Pre-Industrial Societies: Anatomy of the Pre-Modern World. Londres: Oneworld, 2015.

7A tese de doutoramento que defendemos em junho de 2021 continha alguns capítulos sobre a construção do corpus documental que consideravam explicitamente a importância de determinadas instituições produtoras/arquivadoras de informação na moldagem da paisagem documental para fazer a história dos grupos aristocráticos. Os “arquivos de família e de casas senhoriais” (designação que então adotámos) constituíam parte essencial dessa análise. Um dos principais argumentos que expusemos relacionava-se com a visão sobre as práticas de transmissão, considerando que a estruturação das “casas” aristocráticas e dos seus arquivos principalmente em torno dos bens sucessórios - i.e., indivisíveis, como os senhorios da coroa e os vínculos - menorizava a função social dos movimentos de distribuição das fortunas aristocráticas e, consequentemente, do papel decisivo que as relações sociais nela incrustadas desempenhavam na coesão e reprodução deste grupo social em sentido alargado: AGUIAR, Miguel - Aristocracia, parentesco e reprodução social em Portugal no final da Idade Média. Porto/Paris: Universidade do Porto, Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne, 2021. Tese de doutoramento, vol. 1, pp. 159-180 [Consultado a 16 maio 2021]. Disponível em: https://repositorio-aberto.up.pt/handle/10216/135875.

8Para o caso português, Bernardo Vasconcelos e Sousa já havia chamado a atenção para a difícil aplicabilidade do conceito de «casa» para os séculos XIII ou XIV: SOUSA, Bernardo Vasconcelos e - “Linhagem e Identidade Social na Nobreza Medieval Portuguesa (Séculos XIII-XIV)”. Hispania 67/227 (2007), pp. 881-898. De resto, um dos reflexos desta distinta organização pode até mesmo ser a relação dos grupos com os documentos. Na realidade, os estudos sobre o grupo aristocrático deste período recorrem em grande medida a fundos monásticos, tendo presente a profunda imbricação entre estas instituições e os diferentes estratos da aristocracia. Isto sugere não apenas os interesses dos cenóbios (em particular nas partilhas em que intervinham freiras), mas também possivelmente uma função de arquivadores da documentação das linhagens com quem tinham relações próximas. O que não implicava, porém, que os aristocratas, desde as mais altas esferas até aos simples cavaleiros e escudeiros, não se fizessem acompanhar de documentação que lhes era necessária ou importante, como demonstra por exemplo o interessante estudo de SOTTOMAYOR-PIZARRO, José Augusto de - “«E mostrarom duas arcas hua vaçia e na outra andavam cartas». Monastic fonds as family archives in the Middle Ages”. In ROSA, Maria de Lurdes; NÓVOA, Rita Sampaio da; GAGO, Alice Borges; SOUSA, Maria João da Câmara Andrade e (coord.) - Recovered Voices, Newfound Questions: Family Archives and Historical Research. Coimbra: Imprensa da Universidade de Coimbra, 2019, pp. 23-34.

9Sobre este assunto veja-se nomeadamente o artigo de GUERREAU-JALABERT, Anita; MORSEL, Joseph Morsel - “De l’histoire de la famille à l’anthropologie de la parenté”. In SCHMITT, Jean-Claude; OEXLE, Otto Gerhard (dir.) - Les tendances actuelles de l'histoire du Moyen Âge en France et en Allemagne. Paris: Publications de la Sorbonne, 2002, pp. 433-446.

10Veja-se nomeadamente o projeto INVENTARQ: https://inventarq.fcsh.unl.pt/.

Recebido: 16 de Maio de 2022; Aceito: 16 de Maio de 2022

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