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Medievalista

versão On-line ISSN 1646-740X

Medievalista  no.33 Lisboa jan. 2023  Epub 31-Jan-2023

https://doi.org/10.4000/medievalista.6316 

Notas de investigação

Portugal1300: fome, clima e abastecimento em Portugal no final da Idade Média

Portugal1300: famine, climate and provisioning in Portugal at the end of the Middle Ages

Marcelo Cândido da Silva1 
http://orcid.org/0000-0003-3078-1138

Victor Borges Sobreira1 
http://orcid.org/0000-0001-9126-6186

Luís Otávio Pagano Tasso1 
http://orcid.org/0000-0001-6940-1636

Felipe Mendes Erra1 
http://orcid.org/0000-0001-6124-4541

José Francisco Sanches Fonseca1 
http://orcid.org/0000-0002-3699-0953

Marina Duarte Sanchez1 
http://orcid.org/0000-0002-5966-4114

Rudyard Rezende Vera1 
http://orcid.org/0000-0003-3973-0548

1 Universidade de São Paulo, 05508-80 Butantã, São Paulo, Brasil; candido@usp.com; victor.sobreira@me.com; luis.tasso@usp.br; felipe.erra@usp.br; jose.francisco.fonseca@usp.br; marina.sanchez@usp.br; rudyardvera@usp.br


O objetivo deste artigo é apresentar os principais resultados do Projeto Portugal1300, que congrega pesquisadores do Laboratório de Estudos Medievais da Universidade de São Paulo. Iniciado em 2019 e encerrado em 2022, esse projeto consistiu na catalogação das menções ao clima, à fome e ao abastecimento em fontes portuguesas do final da Idade Média. Os dados obtidos ao longo da pesquisa alimentarão um banco de dados, chamado QFAME, que pretende recensear todas as menções à fome nas fontes do período medieval. O projeto Portugal1300 se insere na rede de pesquisa internacional “Epidemics and Famines in the Western Mediterranean” (EPIFAME) e visa contribuir para o atual debate sobre as conjunturas econômicas do final da Idade Média. O uso das tecnologias digitais empregadas (banco de dados e GIS) permite a análise sincrônica de informações em diferentes fontes, além de possíveis correlações entre os eventos catalogados, levando a uma maior compreensão das percepções das crises nas sociedades pré-modernas.

Crise e resiliência no final da Idade Média

Os dilemas contemporâneos acerca das transformações do meio-ambiente têm tido um impacto decisivo na maneira pela qual os historiadores analisam o passado1. Temas clássicos, como o da queda do Império Romano, foram revisitados à luz da nossa experiência recente. Assim, em 2017, Kyle Harper propôs uma explicação sobre a “queda” do Império Romano e as origens da Idade Média baseada, grosso modo, em um resfriamento do clima que teria beneficiado o desenvolvimento de germes e de pandemias devastadoras, no contexto de intensa circulação de homens e de produtos da mundialização romana2. Outras obras recentes, e menos polêmicas, têm destacado as interações das comunidades com o meio-ambiente como uma chave para a compreensão das transformações sociais. Em 2013, o livro Calamities and the Economy in Renaissance Italy se interessou às catástrofes (naturais ou não) e o seu impacto na Península Italiana do início da época moderna3. Em 2014, Daniel Curtis publicou o livro Coping with Crisis. The Resilience and Vulnerability of Pre-Industrial Settlements4, no qual coloca a questão das maiores ou menores susceptibilidades dos assentamentos pré-modernos às crises ambientais. Mais recentemente, em 2019, Jean-Pierre Devroey, em seu livro La nature et le roi, refletiu sobre as relações entre o poder carolíngio e o meio-ambiente5. Não estamos assistindo, evidentemente, a um retorno ao determinismo climático tal como foi preconizado, por exemplo, por Montesquieu. Tampouco se pode reduzir esse fenômeno a uma simples projeção sobre o passado de modelos explicativos contemporâneos.

A emergência dos novos dilemas ambientais impactou a forma pela qual os historiadores enxergam as crises alimentares e os conflitos bélicos. Uma compreensão mais clara do papel dos fatores exógenos (atividade solar e vulcânica, vegetação e emissão de gases de efeito estufa) e endógenos (flutuações das circulações oceânicas e atmosféricas) na variabilidade do sistema climático contemporâneo conduziu os historiadores a se interrogarem sobre o efeito desses fenômenos nas sociedades do passado. Sobretudo, como as diferentes sociedades reagiram a esses fenômenos. Esse questionamento é possível porque dispomos, hoje, de um conjunto muito mais completo de dados paleoclimáticos do que há algumas décadas. Os proxies, arquivos naturais que permitem a quantificação empírica das condições climáticas do passado a partir de indicadores biológicos, geoquímicos ou sedimentares, são abundantes para os últimos dois milênios. Alguns desses proxies, como os pólens, os sedimentos e os anéis de árvores possibilitam a reconstituição das principais crises ambientais que afetaram a Eurásia desde os primeiros séculos da Era Comum.

O uso dos proxies não é uma novidade entre os historiadores da Antiguidade e da Idade Média. Georges Duby dedicou as primeiras páginas de Guerreiros e Camponeses à discussão de como as variações climáticas dos primeiros séculos da Idade Média influenciaram o crescimento econômico do período. Para tanto, utilizou os dados sobre o avanço e o recuo das geleiras alpinas6. São esses mesmos dados que utilizou Emmanuel Le Roy Ladurie em sua história do clima desde o ano mil7. Essa obra, de 1967, rechaçava o determinismo climático, ao mesmo tempo em que constatava a ausência de dados que permitissem a compreensão das causas das flutuações climáticas.

No que se refere às fontes escritas, que são o foco do projeto Portugal1300, os levantamentos mais completos de menções aos fenômenos climáticos de que dispomos até hoje são o livro Le Climat en Europe au Moyen Âge, de Pierre Alexandre, bem como o Projeto QFAME, construído em parceria entre o Centre de recherches Histoire, Arts et Culture des Sociétés anciennes, médiévales et modernes (SOCIAMM) da Université Libre de Bruxelles e o Laboratório de Estudos Medievais da Universidade de São Paulo. Ao longo do recenseamento efetuado, nos interessamos, sobretudo, às formas pelas quais os eventos climáticos e as questões de abastecimento eram evocados nas fontes portuguesas do final da Idade Média. A visão em conjunto dessas menções, por mais sumárias que muitas delas sejam, é um passo importante para a compreensão das percepções da crise nos círculos privilegiados.

Desde a publicação de Maomé e Carlos Magno, de Henri Pirenne, até os livros de Guy Fourquin, Pierre Toubert, Adriaan Verhult, Michael Postan, Bernard Slicher van Bath, entre outros, o debate se concentrou no volume de recursos materiais disponíveis. Uns sustentavam que a escassez de meios técnicos explicaria a escassez crônica e os inúmeros episódios de crise alimentar do período. A terminologia “Crise do século XIV”8 foi adotada, por exemplo, por Georges Duby, Michael Postan e Guy Bois, para indicar uma “crise geral” do sistema feudal, associada a fatores como guerras e a Grande Peste. Tais historiadores viam o mundo rural e a sociedade camponesa como vítimas passivas de fenômenos sobre os quais não tinham controle, como a estagnação técnica, os fenômenos climáticos e as taxas senhoriais. Por outro lado, seus oponentes acreditavam que houve relativa abundância da produção agrícola e que as crises alimentares teriam sido “crises do crescimento”. Um outro tipo de respostas foi dado por autores que colocaram ênfase na proteção ou na degradação do meio-ambiente, explicação comumente dada para o colapso maia ou para a “queda” de Roma. Assim, quanto mais o crescimento populacional e as atividades econômicas degradavam os recursos naturais, mais vulneráveis seriam as sociedades pré-modernas.

O conceito de “Crise do século XIV”, entretanto, jamais conquistou estatuto de paradigma indisputável, sobretudo para pesquisadores trabalhando no espaço do Mediterrâneo9. A historiografia mais recente - François Menant, Monique Bourin, John Drendel, entre outros - apresenta uma outra leitura para o mesmo período, demonstrando a existência de crises episódicas, sem alcance estrutural, e até mesmo momentos de crescimento econômico10. As novas interpretações baseiam-se em uma análise minuciosa das discrepâncias regionais europeias e buscam, assim, confrontar a antiga historiografia do século XIV, mostrando, por exemplo, como diferentes localidades se comportavam diante de situações de carestia e como a atribuição genérica de uma “crise sistêmica” a toda a Europa não encontra respaldo nas fontes11.

Atualmente, dois principais modelos são propostos para explicar as dinâmicas socioeconômicas ocorridas entre os séculos XIII a XV a partir do uso do conceito de “período de transição” e de “conjuntura de 1300”. Em ambos os modelos, a influência de mudanças climáticas ocorridas em escala global surge como um fator novo e de impacto decisivo sobre o curso dos processos históricos. A ideia de “período de transição” (ou “Era de Transição”) tem sido debatida por historiadores especializados na história medieval do noroeste da Europa, e recebeu a formulação mais completa no trabalho de Bruce Campbell, publicado em 2013, e denominado The Great Transition12.

Campbell propõe que, em 1270, uma fase de crescimento econômico, marcado pela efervescência cultural e por uma integração comercial eurasiática, se encerrou. Ela teria dado lugar a uma combinação de eventos que, atingindo de maneira negativa as sociedades europeias, transformaram as estruturas socioeconômicas e consolidaram os fundamentos que possibilitaram a emergência de uma nova fase de crescimento, iniciada apenas em 1470. Entre os eventos, Campbell descreve o impacto negativo causado pela diminuição da irradiação solar e pela diminuição da temperatura em escala global; a incidência de pragas que dizimaram os rebanhos; o reaparecimento de epidemias sobre as populações; o aumento das guerras; a recessão comercial; e uma contração econômica causada pela escassez monetária. De fato, um forte conjunto de evidências descreve um impacto devastador sofrido pelas sociedades do noroeste da Europa nas três primeiras décadas do século XIV; não apenas uma praga dizimou os rebanhos bovinos, reduzindo a quantidade de proteínas disponível e a força de tração animal, quanto uma situação de fome perdurou entre os anos de 1315 a 132113.

A historiografia especializada na Europa Meridional, em contrapartida, tem trabalhado com evidências de caráter mais ambivalente, em que situações negativas coincidem com sinais de crescimento e de efervescência cultural. Entre 1270 e 1340, o comércio marítimo passou por uma fase de expansão contínua, com a formação de rotas que ligavam o Mediterrâneo ao Mar do Norte, e a consolidação das chamadas grandes companhias de comércio e de crédito italianas. As planícies do rio Pó, na Lombardia, passaram por um extensivo processo de conquista agrícola, marcando o aparecimento da República de Milão no cenário político internacional.

No clima mais ameno do Mediterrâneo e da Europa meridional, a historiografia não tem encontrado evidências de que a diminuição das temperaturas tenha causado danos à produção agrícola; ao contrário, a mudança global de temperatura parece ter se manifestado na ocorrência de fortes oscilações nos índices pluviométricos, resultando em enchentes catastróficas - que, em contrapartida, não chegavam a representar um perigo de longo prazo à produtividade dos solos. Finalmente, grandes rupturas no acesso à alimentação foram enfrentadas de forma bem-sucedida pela aplicação de políticas de redistribuição; no Mediterrâneo, os episódios de fome parecem ter surgido menos como o resultado de um déficit agrícola do que como um problema de acesso à alimentação de grupos de menor poder político ou econômico no interior daquelas comunidades. Na economia do Mediterrâneo, a primeira metade do século XIV vivenciou o apogeu do florim como meio de troca internacional.

Diante desse universo heterogêneo, um grupo de historiadores, em substituição à ideia de crise geral, propôs o conceito de “Conjuntura do 1300”14 para caracterizar esse período da história. Ademais, um número cada vez maior de estudiosos, agrupados naquilo que se convencionou chamar de disaster studies, passou a ver os desastres, não como meros eventos naturais, mas como processos sociais que testam as capacidades organizacionais das sociedades, algumas vezes, limitando a desestabilização e movendo-as para uma fase de recuperação. O próprio vocabulário com o qual descrevem os fenômenos de crise mudou, eles preferem a expressão “desastres naturalmente-induzidos”, ao invés de "desastres naturais” 15.

No estágio atual das pesquisas sobre as sociedades pré-modernas, compreender as percepções das comunidades a respeito dos fenômenos climáticos e das crises alimentares é o melhor caminho para se evitar o determinismo ambiental. Daí a importância de reescrever a história desse período integrando sociedade e natureza. Ao mesmo tempo, é preciso lembrar que as sociedades não são conjuntos homogêneos. Nas sociedades desiguais e extremamente hierarquizadas da Bacia do Mediterrâneo, os grupos menos favorecidos eram mais vulneráveis e menos resilientes do que os grupos privilegiados.

Modelos interpretativos

No que diz respeito a Portugal no final da Idade Média, de forma um pouco esquemática, podemos considerar que, no terceiro quarto do século passado, dois modelos de interpretação opostos foram construídos.

O primeiro modelo apareceu em 1962, com a publicação da Introdução à História da Agricultura em Portugal, de Oliveira Marques16. O trabalho teve impacto decisivo na construção de um quadro interpretativo geral da economia portuguesa entre os séculos XIV e XV, e passaria a servir como ponto de referência fundamental para a elaboração das sínteses da História de Portugal publicadas posteriormente17. O quadro construído por Oliveira Marques definia três características basilares da estrutura socioeconômica do reino: a debilidade da produção agrícola, o impacto da “crise do século XIV” e a frágil articulação geográfica e territorial. O historiador sustentava que a pobreza geral dos solos, associada à irregularidade do clima, inevitavelmente aprisionava a população do território em uma situação de produção agrícola insuficiente18. Marques chegou a propor a existência de quinze ocorrências de crises agrícolas entre 1387 e 1496, que se estenderam em um total de 58 dos 110 anos recenseados; os anos de déficit da produção agrícola seriam, desta forma, surpreendentemente superiores aos anos de produtividade no mínimo suficiente.

Assim, se no século XIV a produção cerealífera, base da alimentação daquelas sociedades, já apresentava problemas decorrentes da pobreza dos solos, a incidência da crise, iniciada pelo impacto da Grande Peste - que resultaria em um contínuo déficit de mão de obra para o cultivo da terra - se manifestaria, no século XV, em uma incidência contínua da fragilidade de abastecimento alimentar. A ausência de estradas e de integração entre as comunidades de todo território vinculado à monarquia portuguesa teria impedido que o comércio entre as províncias equilibrasse a insuficiência agrícola que, frequentemente, atingia as comunidades na forma de falta de pão. Apenas Lisboa, pela importação marítima, seria capaz de enfrentar um cenário permanente de escassez.

Para Oliveira Marques, o incremento demográfico de finais do século XV, ao aumentar a mão de obra rural e o cultivo de terras, seria capaz de mitigar, mas não de resolver o problema. O historiador chega a estipular que um dos motivadores da expansão marítima do período esteve justamente na expansão da produção cerealífera em territórios conquistados na África e nas “ilhas atlântidas”19.

O modelo historiográfico construído por Vitorino Magalhães Godinho é diametralmente oposto. Godinho iniciou a publicação do monumental Os descobrimentos e a economia mundial20 em 1963, um ano após a publicação de Oliveira Marques. O último volume da obra ocorreu em 1970; mas apenas entre 1982-1983 a versão definitiva, com acréscimos, alcançou o público. O historiador propõe uma interpretação do abastecimento alimentar a partir da inserção da economia portuguesa na rede de relações comerciais com o norte da Europa, o Mediterrâneo, a África e o Atlântico.

Na obra, é possível discernir a evolução de três situações diferentes, inscritas em uma perspectiva de longa duração. Primeiro, uma situação de abundância de produção cerealífera, com a ocorrência de exportação, ocorrida entre os séculos XIII e XIV. Godinho acredita que a lei de 1272, proibindo a exportação de cereais, longe de indicar uma situação de escassez, se refere a um quadro de abundância; e que, no referido ano, visando enfrentar uma situação inusual de alta de preços, a aristocracia portuguesa encontrou uma solução fácil na retenção de alimentos previamente destinados à exportação. Que as Cortes de 1331 conclamassem que a lei de 1272 fosse aplicada naquele ano significa que a exportação, e, por conseguinte, uma situação de abundância, continuou entre essas duas datas; a retenção significava a utilização da mesma medida para enfrentar uma incomum pressão inflacionária.

Encontramos a medida reiterada em 1391, durante um cenário de guerra contra Castela, quando, provavelmente, a passagem de tropas causou uma súbita pressão sobre a demanda alimentar das vilas e comunidades rurais. Godinho acompanha como a expansão comercial de Portugal, no século XV, ocorreu de maneira concomitante à consolidação de redes de comércio de produtos alimentares. Aqui, já seria possível perceber uma mudança de orientação do fluxo comercial; ao invés da exportação, os portos do reino passariam a receber continuamente produtos alimentares. Uma carta do concelho de Lisboa, de 1399, endereçada a diversas cidades do noroeste da Europa, e convidando comerciantes a carregar trigo para Lisboa poderia ser vista como um divisor de águas.

O autor mostra como, de fato, desde 1380, mercadores da Normandia e da Bretanha estabeleceram um comércio regular com Lisboa, descarregando grãos produzidos no noroeste da França, e carregando as embarcações com um leque de mercadorias21. A consolidação deste comércio foi amplamente beneficiada pela atuação política, a partir do uso frequente de isenção da dízima sobre cereais importados. Nos séculos XVI e XVII, entretanto, há indícios de que o abastecimento urbano, ao menos de Lisboa, tenha se tornado dependente da produção cerealífera produzida fora de Portugal; e que esse comércio, saldado a partir de então menos com mercadorias, e mais com metais preciosos, tenha tido um efeito negativo de redução do estoque monetário disponível para as operações dos mercadores do reino.

O modelo historiográfico de Godinho apresenta três aspectos importantes para o debate atual. Em primeiro lugar, a ideia de que as estruturas econômicas se transformaram profundamente entre os séculos XIII a XVII, nos vacinando contra tentativas de projeção, para o período medieval, de quadros socioeconômicos encontrados no período moderno. Em segundo lugar, a possibilidade de que não tenha existido um “ritmo econômico geral” para a Europa, como implícito no conceito de “crise do século XIV” - e que projeta, para todo o continente, um modelo explicativo criado para compreender as dinâmicas ocorridas na Inglaterra ou na França. Em terceiro lugar, a necessidade de (re)ler a documentação a partir de uma perspectiva não nacionalista, e que leva em consideração que os ritmos econômicos de Lisboa se integravam aos ritmos das cidades portuárias da Normandia com maior intensidade do que as relações comerciais entre o Algarve e o Minho. Logo, o maior objetivo do projeto Portugal1300 foi o de contribuir para essa discussão, que ainda se encontra em aberto.

O projeto

O projeto Portugal1300 se iniciou a partir da formação de uma equipe de historiadores, em diferentes níveis de pesquisa, voltada para um problema específico: como as populações de Portugal, entre 1300 e 1500, enfrentaram uma conjuntura marcada por epidemias, guerras e fome, no interior de uma profunda oscilação climática que atingiu todo o planeta? O projeto se constituiu a partir da articulação de duas metodologias de investigação historiográfica: a construção de uma base de dados e a transformação de dados catalogados em uma disposição cartográfica digital. A questão, debatida com intensidade na medievalística atual, apresenta uma simplicidade cristalina e, ao mesmo tempo, exige um esforço hercúleo para ser enfrentada - se mostrando, portanto, especialmente adequada para um grupo de historiadores trabalhando sobre o mesmo problema. Como vantagem sobressalente, tal objeto de investigação possibilita uma visão de conjunto dos eventos históricos, nos permitindo evitar a divisão artificial, porém muitas vezes necessária, entre uma história da peste, uma história da agricultura e da fome, uma história da guerra etc.

A equipe não pretendeu resolver a questão, mas de construir uma ferramenta que estará disponível para a comunidade de pesquisadores. Por isso, nem a formulação de uma epistemologia, nem a construção de um modelo teórico definido a priori guiaram o trabalho coletivo; antes de mais nada, escolhemos centralizar os esforços na efetivação das duas metodologias de investigação, acima referidas, que fossem capazes de se transformar em conteúdos de investigação disponíveis não apenas para os envolvidos, mas para um público mais amplo de interessados.

Catalogação

A construção de um catálogo de fichas, contendo menções encontradas na documentação sobre os eventos referidos, e passível de, posteriormente, ser transformada em uma base de dados digital, concentrou os primeiros esforços da equipe de trabalho. Decidimos que o catálogo seria constituído pelo maior número possível de menções à escassez ou à abundância alimentar, aos conflitos militares, aos fenômenos climáticos, e às epidemias que ocorreram em Portugal no final da Idade Média. Uma vez determinado que a base seria extensiva e acumulativa, ou seja, permanentemente aberta à inclusão de novas informações, entendemos que a investigação da documentação primária também deveria ser extensiva e acumulativa, ou seja, não restrita a nenhum gênero documental. Isso imediatamente colocou o grupo de pesquisa diante do desafio de estabelecer uma metodologia que permitisse não uma acumulação desordenada de menções, mas que, ao contrário, determinasse um avanço organizado de etapas de investigação, a partir de um agrupamento coerente do(s) grupo(s) de fontes recenseado(s) em cada etapa. Para tanto, a primeira tarefa foi recortar e circunscrever a grande quantidade de documentação primária em duas categorias claramente identificáveis: as crônicas e a legislação. O grupo de pesquisa também decidiu que fontes textuais que não pertencessem claramente a esses dois gêneros não participariam das fases iniciais do catálogo. Em seguida, em razão da facilidade de acesso às edições críticas, a equipe determinou que as primeiras etapas se concentrariam na catalogação das crônicas régias. Isso significa dizer que, em um primeiro momento, teríamos a oportunidade de oferecer um catálogo da fome, da peste, do clima e das guerras assim como relatados pelos cronistas reais de Portugal, sem perder de vista que a base teria de permanecer funcional para agregar, no futuro, menções obtidas em outros gêneros de documentação.

Uma das principais dificuldades enfrentadas foram as diferentes formas com que os eventos foram construídos no interior das crônicas. De maneira geral, podemos dizer que encontramos três diferentes situações narrativas: eventos descritos pelos cronistas como verdadeiros; eventos incertos, em que o cronista não tinha plena convicção da sucessão de fatos; e, não menos importante, eventos que poderiam ter acontecido, mas não aconteceram. A aparentemente óbvia restrição do catálogo à primeira situação narrativa logo se mostrou uma solução inadequada. Decidimos pela inclusão de eventos tidos como incertos, assim como eventos que não aconteceram, pelos mesmos motivos: ambos são capazes de apontar informações importantes sobre o período, assim como puderam ter um impacto decisivo na sucessão de acontecimentos, participando de forma efetiva na construção da história feita pelos homens. Dois exemplos serão suficientes para ilustrar o argumento.

A crônica de D. Afonso V produzida por Rui de Pina narra os pormenores de um conflito entre o rei e seu tio, o infante Dom Pedro, Duque de Coimbra, antigo regente do reino durante o período de menoridade daquele. A narrativa acompanha a escalada do conflito, que resultou na morte de Dom Pedro. Antes disso, em 1449, estando o infante em Coimbra, o monarca, reunindo um grupo de conselheiros, planejou um cerco militar contra seu tio. Diz então Rui de Pina:

“ElRey (...) fazia fundamento cercallo nella (Coimbra), o que pella muyta gente que creceo, e pollos mantymentos, e assy outras provisões que se nom podiam aver, e menos tantas bestas, bois e carros pera as armas, artelharias, e carriagem, que pera tal cerco eram necessarios, parecia muy defycultoso ou ympossivel fazello”22.

Após a consulta, o rei Dom Afonso V foi levado a desistir do cerco à cidade de Coimbra, e repensar sua estratégia de aprisionar Dom Pedro. O evento referido, portanto, não aconteceu. Qual razão nos levaria a incluir esse gênero de citação em um catálogo voltado à história factual? Ocorre que a narrativa de Rui de Pina aporta com detalhes os preparativos que seriam necessários para a realização do cerco militar, e informa ao leitor que a monarquia, no ano de 1449, não teria meios suficientes para alcançá-los. É difícil questionar a riqueza de informações oferecidas pelo cronista, assim como a relação entre Coimbra e Lisboa, e a situação militar e financeira da coroa em meados do século XV.

O segundo exemplo se refere a um período anterior. No ano de 1383, a morte do rei Dom Fernando I, sem herdeiros diretos, causaria o início de uma guerra de sucessão. A aristocracia se dividiu entre apoiar ou recusar a entrega da regência de Portugal à rainha Dona Leonor Teles. Nesse ínterim, porém, já havia surgido como liderança Dom João, mestre de Avis, que, afinal, venceria o conflito e fundaria uma dinastia real.

Em 1383, temendo ser assassinado a mando da rainha de Portugal, o Mestre de Avis iniciou os preparativos para viajar para Inglaterra, deixando o reino. A mera notícia de partida de Dom João, entretanto, agitou a elite urbana de Lisboa, importante protagonista política, e que fazia resistência à entrega da regência à Dona Leonor Teles. Narra o cronista Fernão Lopes que:

“Huũ cuidado era, veersse ficar sem firmeza de paz per morte deIRei dom Fernamdo, pois elRei de Castella nom queria guardar os trautos, segumdo era comtheudo, e viinha contra ho rreino por tomar posse delle. E segumdo, sogeiçom gramde em que esperavom seer postos sob poder de Castellaãos, tememdosse sseer delles sojugados, come de seus mortaaes emmiigos”23.

A notícia da partida de Dom João ensejou uma série de cálculos políticos entre os protagonistas da elite urbana, precipitando, pouco depois, a decisão de apoiar o mestre de Avis como novo rei de Portugal. Não apenas Dom João não saiu do reino, como a cidade de Lisboa passou a funcionar como ponta de lança do apoio à fundação da dinastia de Avis. Um evento que não aconteceu, na crônica de Fernão Lopes, teve papel importante no desencadeamento de ações que influenciaram decisivamente os rumos políticos de Portugal. A não inclusão dessas minúcias narrativas, na base de dados, geraria um empobrecimento não apenas no potencial de contribuição do catálogo, mas, também, uma redução artificial da história, que, aliás, estava longe de ser feita pelos próprios cronistas portugueses da Baixa Idade Média. Ao incluir rumores e eventos que não aconteceram, além de planos políticos fracassados e erros de cálculo, os próprios cronistas registravam, com argúcia de percepção, a riqueza constituinte da história, mesmo a mais factual.

Afinal, a inclusão de eventos incertos, ou que não aconteceram, é capaz de iluminar outro aspecto importante, e que geralmente é entendido como o oposto da história factual: trata-se da dinâmica das representações e do universo da ideologia24. A carestia, por exemplo, não existia apenas como realidade factual de determinado ano, mas como uma realidade virtual, às vezes inscrita na própria experiência de vida, e que influenciava as ações dos protagonistas de todas as categorias sociais. Essa abertura do catálogo permite a utilização dos dados para pesquisas interessantes, como a participação da memória coletiva na constituição do Estado, ou o que, na teoria institucional, surge como o grupo de conhecimentos que propicia um limite de escolhas (set of options) para os protagonistas políticos25.

A base de dados no sistema GIS

Após a leitura das crônicas reais e a organização das informações em fichas, passou-se para a organização desses dados tendo em vista a construção de uma cartografia interativa desse período. A reflexão sobre o espaço não é algo novo entre os historiadores. Entre os mais conhecidos e influentes, podemos citar o estudo sobre o Mediterrâneo na época de Filipe II de Fernand Braudel26. Já entre os especialistas em Idade Média, é um tema fortemente presente há mais de trinta anos. Podemos citar o trabalho de Fabienne Cardot sobre espaço e poder na Austrásia sob domínio dos merovíngios27 e o estudo sobre a relação entre a concepção de espaço na Regra de São Bento de Patrice Noisette28. Na virada do milênio, o espaço continuou a ser um tema presente entre os medievalistas como o livro Imaginary Cartographies: possessions and identity in late medieval Marseille de Daniel Lord Snail29 e o artigo “Analyses de l’espace” de Monique Bourin, presente no livro Les tendances actuelles de l’histoire du Moyen Âge en France et en Allemagne, de 200330. Muitos desses estudos foram influenciados pelas reflexões de geógrafos do século XX como Paul Vidal de la Blache, Henri Lefebvre e Jacques Lévy. A partir de documentos escritos e vestígios arqueológicos, esses historiadores procuraram compreender a noção de espaço em diferentes épocas e lugares.

Por outro lado, o uso de sistemas de informações para a compreensão do espaço é um pouco mais recente. Apesar de alguns trabalhos pioneiros, como o de Robin Fleming, que criou um banco de dados com as informações presentes no Domesday Book na década de 198031, o uso da tecnologia GIS entre medievalistas, ocorreu somente a partir da década de 1990, em trabalhos como o de Keith N. Wilkinson sobre a criação de ovelhas durante a Idade Média em Costwolds32. Contudo, é somente a partir da década de 2010 que esse uso se tornou mais intensivo. No campo conceitual, duas obras se tornaram referência: The Spatial Humanities: GIS and the Future of Humanities Scholarship33 e Toward Spatial Humanities: Historical GIS and Spatial History34, ao consolidar o termo Spatial Humanities. Para ilustrar essa intensificação que ocorreu do uso do GIS entre medievalistas, em uma pesquisa no sistema RI OPAC do termo “GIS”, há 86 artigos listados a partir de 2010; 45 artigos entre os anos 2000 e 2009 e apenas 6 artigos publicados em 1999 ou antes.

Para além da criação de mapas das regiões estudadas, a tecnologia GIS permitiu que os historiadores trabalhassem com uma grande quantidade de informação e os seus diferentes cruzamentos. Após o início do fichamento das menções à fome, conflitos e eventos naturais, como descrito anteriormente, foi observado que nas crônicas portuguesas havia uma preocupação dos autores de delimitar e localizar a maioria dos eventos mencionados. Inicialmente, esses pontos foram inseridos manualmente. Contudo, rapidamente, nos demos conta de que trabalharíamos com centenas de inserções e, por isso, uma tabela CSV passou a ser utilizada para sua posterior inserção no QGIS.

O primeiro passo foi a categorização dos eventos para que pudessem ser inseridos no QGIS. No final, os eventos listados foram divididos em “conflitos”, que inclui cercos, batalhas, guerras, invasões etc.; “eventos naturais”, que inclui excesso ou falta de chuvas, terremotos etc.; “fome” e “peste”. Para uma melhor compreensão da progressão temporal, esses eventos foram organizados em blocos de 25 anos, entre os anos de 1276 e 1500. Dessa forma, é possível criar mapas que ilustrem décadas específicas ou todo o período estudado.

Contudo, criar um banco de dados com informações espaciais e temporais de eventos mencionados nas crônicas portuguesas não é uma tarefa automática e direta, há desafios e limitações. Ao inserir uma informação que será representada no mapa, o QGIS exige a definição de um ponto específico delimitado por coordenadas geográficas. Alguns eventos descritos não têm sua localização exata. Uns são localizados em “Portugal” ou “reino de Castela”; outros, em regiões de fronteira sem uma definição clara; há ainda eventos que ocorreram durante o deslocamento entre duas cidades, mas sem precisar o ponto exato, ou sem localização alguma, como a menção da guerra contra os mouros. É preciso mencionar ainda, como discutido anteriormente, que há menções de fatos que poderiam ter ocorridos, mas não ocorreram.

O banco de dados e os mapas elaborados pelo projeto poderão ser consultados no site Guia Medieval35, indexador de conteúdo acadêmico produzido por pesquisadores na América Latina.

Considerações Finais

Ao olhar para a historiografia portuguesa ou mais amplamente para historiografia europeia, é possível observar que o debate sobre o século XIV está longe de se encerrar. A tentativa de compreender todo o continente a partir de casos locais produziu visões conflitantes sobre o período.

Nesse contexto, a catalogação dos eventos mencionados nas fontes portuguesas permite a construção de ampla base de dados, com diversas ferramentas e filtros (tipo de eventos/categoria/localização), inclusive com o cruzamento de informações de outras bases. Exemplo latente nos últimos anos, os estudos climatológicos acrescentaram dados sobre um tema que contava apenas com relatos esparsos no tempo e no espaço, sendo reproduções das fontes, tomando-as como afirmações da verdade.

O uso de tecnologias digitais (banco de dados, GIS etc.) permite a análise sincrônica de informações que estão espalhadas por diferentes fontes, no caso, as crônicas reais; a separação entre os diferentes eventos mencionados e o estabelecimento de possíveis correlações, assim como a observação espacial de alguns fenômenos ligados ou não à agência humana. Sendo assim, o Projeto Portugal1300 constrói uma base de dados que contribui para o atual debate sobre o tema no reino de Portugal, construindo uma visão mais global sobre as conjunturas econômicas do final da Idade Média.

Referências bibliográficas

Fontes

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1Gostaríamos de agradecer aos ex-bolsistas do projeto Portugal1300 pelo trabalho, e à professora Maria Filomena Coelho e à Ana Luísa Pereira Loureço pela leitura, comentários e sugestões.

2HARPER, Kyle - The Fate of Rome: Climate, Disease, and the End of an Empire. Princeton: Princeton University Press, 2017.

3 ALFANI, Guido - Calamities and the Economy in Renaissance Italy. The Grand Tour of the Horsemen of the Apocalypse. Nova York: Palgrave Mcmilan, 2013.

4CURTIS, Daniel R. - Coping with Crisis. The Resilience and Vulnerability of Pre-Industrial Settlements. Farnham: Ashgate, 2014.

5DEVROEY, Jean-Pierre - La Nature et le roi: Environnement, pouvoir et société à l'âge de Charlemagne (740-820). Paris: Albin Michel, 2019.

6DUBY, Georges - Guerriers et paysans, VII-XIIe siècle. Premier essor de l’économie européenne. Paris: Gallimard, 1973, pp. 13-19.

7LE ROY LADURIE, Emmanuel - Histoire du climat depuis l'an mil. Paris: Flammarion 1967.

8Para uma ótima descrição do contexto ligado à proposição do conceito de “Crise do século XIV”, assim como sua recepção na historiografia nas décadas seguintes, HATCHER, John; BAILEY, Mark - Modelling the Middle Ages. The History and Theory of England´s Economic Development. Oxford: Oxford University Press, 2001; e BOURIN, Monique; MENANT, François; FIGUERAS, Lluís To - “Les campagnes européennes avant la peste”. In BOURIN, Monique; MENANT, François; FIGUERAS, Lluís To (eds.) - Dynamiques du monde rural dans la conjoncture de 1300, pp. 9-101.

9Destaca-se, por exemplo, Charles de La Roncière e Stephan Epstein, ambos especialistas da Itália medieval: LA RONCIÈRE, Charles de - Prix et salaires à Florence au XIV siècle (1280-1380). Roma: École Française de Rome, 1982; e EPSTEIN, Stephan - An island for itself. Cambridge: Cambridge University Press, 1992.

10BOURIN, Monique; MENANT, François; FIGUERAS, Lluís To (eds.) - Dynamiques du monde rural dans la conjoncture de 1300. Roma: École Française de Rome, 2014; e BOURIN, Monique, et al. (eds.) - Les disettes dans la conjoncture de 1300 en Méditerranée occidentale. Roma: École Française de Rome, 2011. Para uma reflexão recente sobre a peste, GREEN, Monica H. (ed.) - Pandemic Disease in the Medieval World: rethinking the Black Death. Kalamazoo: Arc Medieval Press, 2014

11Para o debate atual na historiografia portuguesa, ver: FERREIRA, Leandro Ribeiro - “Recrutar. Produzir. Abastecer: repensar a produção e o comércio agrícolas em tempo de guerras (1369-1400)”. Medievalista Online [Em linha] 18 (2015). [Consultado a 6 Julho 2022]. Disponível em https://medievalista.iem.fcsh.unl.pt/index.php/medievalista/article/view/201.

12CAMPBELL, Bruce - The Great Transition: Climate, Disease and Society in the Late-Medieval World. Cambridge: Cambridge University Press, 2013. Publicação anterior, mas importante, é de DYER, Christopher - An Age of Transition? Oxford: Oxford University Press, 2005.

13JORDAN, William C. - The great famine: northern Europe in the early fourteenth century. Princeton: Princeton University Press, 1996.

14BOURIN, Monique; MENANT, François; FIGUERAS, Lluís To (eds.) - Dynamiques du monde rural dans la conjoncture de 1300; e BOURIN, Monique; et al. (eds.) - Les disettes dans la conjoncture de 1300 en Méditerranée occidentale.

15“Even though humans have been transforming the natural world since at least the Paleolithic era, this usage of natural fails to express the societal aspects of disaster. The term natural disaster is thus somewhat misleading. A more precise alternative would be the phrase nature-induced disaster, which reflects the fact that such catastrophes are brought about by natural phenomena without obscuring their anthropogenic dimensions”. PFISTER, Christian - “Learning from Nature-Induced Disasters. Theoretical Considerations and Case Studies from Western Europe”. In MAUCH, Christof; PFISTER, Christian (eds.) - Natural Disasters, Cultural Responses. Case Studies toward a Global Environmental History. Lanham: Lexington Books, 2009, pp. 17-18.

16MARQUES, António Henrique de Oliveira - Introdução à História da Agricultura em Portugal: a questão cerealífera durante a Idade Média. 3ª Ed. Lisboa: Edições Cosmos, 1978.

17MATTOSO, José; SOUSA, Armindo de - “História de Portugal”. In MATTOSO, José (Ed.) - A Monarquia Feudal (1069-1480). 2 Vol. Lisboa: Estampa Editorial, 1993.

18“O desfavor das condições naturais pode e deve colocar-se em primeiro lugar, na teoria explicativa do deficit crónico do País em cereais de consumo. Solos pobres ou pouco aptos às culturas arvenses e clima extremamente irregular estão na base de produções débeis, em manifesta insuficiência para abastecer o milhão de habitantes do Portugal medievo”. MARQUES, António Henrique de Oliveira - Introdução à História da Agricultura em Portugal, p. 283.

19“A escassez cerealífera - melhor diríamos a crise económica geral-, que as inteligências da época não viam forma de evitar pelo único recurso às possibilidades internas do Reino, esteve na base da expansão africana e da colonização das ilhas Atlântidas”. MARQUES, António Henrique de Oliveira - Introdução à História da Agricultura em Portugal, p. 285.

20GODINHO, Vitorino Magalhães - Os Descobrimentos e a Economia Mundial. 2 Vols. Lisboa: Editora Arcádia, 1963.

21Francisque Michel se refere às seguintes mercadorias exportadas de Portugal para a França, em troca de cereais, entre 1350 e 1400: cítricos, óleo, cera, cochonilha, figos, uva passa, tâmaras, mel, couro, pele, sal, pimenta, algodão e marfim. A ocorrência de produtos africanos aponta para um efervescente entreposto comercial. MICHEL, Francisque - Portugais en France et Français en Portugal. Paris: Guillard, 1882, p. 170-172.

22PINA, Rui de - Crónicas de Rui de Pina. Ed. Manuel Lopes de Almeida. Porto: Lello & Irmão editores, 1977, p. 378.

23LOPES, Fernão - Crónica de D. João I. Vol. 1. Ed. Teresa Amado. Barcelos: Companhia Editora do Minho, 1983, p. 41.

24Mais uma vez, é importante salientar que, na construção da base de dados, não devemos apresentar uma metodologia historiográfica, mas, sim, abrir a possibilidade para que historiadores de diferentes tradições possam trabalhar com os dados coligidos.

25NORTH, Douglass - Institutions, Institutional change and economic performance. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.

26BRAUDEL, Fernand - O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo na época de Filipe II. São Paulo: Edusp, 2016 (1949).

27CARDOT, Fabienne - L'espace et le pouvoir. Étude sur l'Austrasie mérovingienne. Paris: Publications de la Sorbonne, 1987.

28NOISETTE, Patrice - L' "espace" ses usages et ses représentations dans la "règle de Saint Benoit" et les règles monastiques latines du IVe au VIe siècle. Paris: Institut d'urbanisme de Paris, 1984.

29SMAIL, Daniel Lord - Imaginary Cartographies: Possession and Identity in Late Medieval Marseille. Ithaca: Cornell University Press, 1999.

30BOURIN, Monique - “Analyses de l’espace”. In OEXLE, Otto Gerhard; SCHMITT, Jean-Claude (eds.) - Les tendances actuelles de l’histoire du moyen âge en France et en Allemagne. Paris: Publications de la Sorbonne, 2003, pp. 493-510.

31Fleming não chegou a publicar esse pioneiro trabalho, mas acabou utilizando as informações levantadas em diversos trabalhos. Para mais detalhes sobre essa experiência, LOWERRE, Andrew - “Mapping Domesday Book using QGIS”. Newsletter of the English Heritage Research Department 8 (2008), pp. 3-7.

32WILKINSON, Keith N. - “Of sheep and men: GIS and the development of medieval settlement in the Cotswolds”. In HIGGINS, Tony; MAIN, Peter; LANG, Janet S. R. (eds.) - Imaging the Past. Electronic Imaging and Computer Graphics in Museums and Archaeology. Londres: British Museum, 1996, pp. 271-281.

33BODENHAMER, David; CORRIGAN, John; HARRIS, Trevor M. (eds.) - The Spatial Humanities: GIS and the Future of Humanities Scholarship. Bloomington: Indiana University Press, 2010.

34GREGORY, Ian; GEDDES, Alistair (eds.) - Toward Spatial Humanities: Historical GIS and Spatial History. Bloomington: Indiana University Press, 2014.

35Guia Medieval [Em linha]. São Paulo: Laboratório de Estudos Medievais, 2020. [Consultado a 20 agosto 2022]. Disponível em https://guiamedieval.webhostusp.sti.usp.br/.

Recebido: 27 de Agosto de 2022; Aceito: 27 de Agosto de 2022

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