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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental

versión impresa ISSN 1647-2160

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental  no.25 Porto jun. 2021  Epub 30-Jun-2021

https://doi.org/10.19131/rpesm.0305 

Editorial

Políticas de saúde mental: A mudança de paradigma necessária

Lara Guedes de Pinho1 

1 Enfermeira especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica; Doutora em Psicologia; Doutora em Enfermagem e Saúde; Investigadora Integrada no Comprehensive Health Research Centre (CHRC), Investigadora Auxiliar Convidada na Universidade de Évora, Rua do Cardeal Rei, s/n, 7000-849 Évora, Portugal. E-mail: lmgp@uevora.pt


As perturbações mentais estão entre as principais causas, a nível mundial, de anos vividos com incapacidade (índice YLD), ocupando as perturbações depressivas e de ansiedade lugares de destaque (James et al., 2018). Em 2016, Portugal era o quinto país com maior percentagem de pessoas com perturbação mental, de entre os países da União Europeia, sendo esta de 18,4%, de acordo com o relatório “Health at a Glance: Europe 2018: State of Health in the EU Cycle” (OCDE/EU, 2018). Além disso, no mesmo país, em 2017, as perturbações depressivas e de ansiedade ocupavam a 4.ª e 6.ª causa de YLDs, respetivamente (Conselho Nacional de Saúde, 2019).

Promover e melhorar a saúde mental da sociedade deve ser uma prioridade a nível global, não só pelo facto de prevenir a doença, quer mental, quer física, como também pelo aumento do bem-estar e da qualidade de vida das pessoas. Esta é uma tarefa complexa que os decisores políticos enfrentam que engloba um conjunto de determinantes, como a educação, a habitação, a economia, a segurança social, os estilos de vida, a acessibilidade e a oferta de serviços de saúde. Quando falamos de saúde mental estamos também a falar de todo um conjunto de fatores que a influenciam direta ou indiretamente e que, por sua vez, afetam a saúde em geral. Os serviços de saúde devem, por isso, ser bem coordenados e estar interligados entre si e com outros serviços para que as estratégias de promoção da saúde mental sejam eficazes.

A formulação de políticas em saúde mental deve basear-se nas necessidades das pessoas, devendo o primeiro passo ser a realização de um diagnóstico de situação a nível local, regional e nacional. Haverá as que são transversais a todo o país, mas outras haverá que são específicas das comunidades locais, dado que o contexto e os recursos existentes influenciam os vários determinantes em saúde. Só através da identificação destas necessidades se conseguirá traçar um plano eficaz e que vá ao encontro da satisfação das mesmas, de forma a promover o bem-estar e a qualidade de vida. Este plano deve ser equitativo, acessível a todos e promotor de estilos de vida saudáveis, eliminando barreiras e colocando a pessoa no centro de ação.

Conforme nos indica o Relatório Mundial de Saúde (World Health Organization, 2001), a recolha e análise de informação epidemiológica é crucial para identificar os grandes determinantes psicossociais das perturbações mentais, identificando o grau e o tipo de problemas na comunidade. Além deste levantamento é ainda importante conhecer os recursos e as estruturas existentes nas comunidades e regiões, fazendo uma análise crítica sobre a sua capacidade de resposta às necessidades definidas (World Health Organization, 2001). Este mesmo relatório acrescenta ainda que as políticas em saúde mental devem promover o desenvolvimento de cuidados de saúde integrados baseados na comunidade, com respostas ao nível dos cuidados de saúde primários; promover a emancipação das pessoas, famílias e comunidades, incentivando o estabelecimento de parcerias entre estas e os profissionais de saúde; criar um sistema que respeite, proteja e fomente os direitos humanos das pessoas com perturbações mentais; focar-se em práticas baseadas na evidência; fornecer uma adequada dotação de prestadores de serviços convenientemente preparados para garantir que a política possa ser implementada; monitorizar e avaliar de forma contínua os serviços; responder às necessidades das populações mais desfavorecidas e vulneráveis; implementar estratégias de prevenção da doença e de promoção da saúde; e promover a vinculação intersectorial do sector da saúde mental com outros sectores (World Health Organization, 2001).

Em Portugal, vinte anos depois da publicação deste relatório, apesar de alguns avanços, como por exemplo, a criação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados para a Saúde Mental (Decreto-Lei n.o 8/2010), para pessoas com doença mental grave, muito há ainda a fazer para promover e melhorar a saúde mental das pessoas com ou sem perturbação mental. Mais recentemente, o Despacho n.º 2753/2020, cria um projeto-piloto constituindo dois tipos de equipas comunitárias de saúde mental, uma para a população adulta e outra para a infância e adolescência. A criação deste projeto poderá ser o rastilho para uma maior intercooperação entre os cuidados de saúde primários e os cuidados hospitalares de forma a prestarem cuidados integrados e continuados focados nos interesses e necessidades do cidadão. Para que tal possa acontecer é necessário que se promova uma coordenação eficaz quer a nível central quer a nível loco-regional, com orientações claras e um acompanhamento de proximidade. É necessário que nesta fase piloto se realize um diagnóstico de situação e haja uma avaliação dos resultados em saúde no sentido de promover uma melhoria contínua da qualidade dos cuidados. A posteriori deve ser dada continuidade ao trabalho desenvolvido por estas equipas, aumentando consideravelmente o número de equipas por Administração Regional de Saúde, de acordo com a dispersão geográfica, as necessidades da população e os recursos da comunidade.

É ainda essencial que os cuidados de saúde primários criem programas de promoção da saúde mental, fazendo estes parte da carteira de serviços, sendo desenvolvidas atividades de avaliação, promoção e prevenção em todas as fases do ciclo vital. Os profissionais deste tipo de cuidados devem trabalhar em parceria com as equipas comunitárias de saúde mental, referenciando os utentes que necessitam de cuidados especializados. Devem ainda estabelecer parcerias com outros recursos da comunidade de forma a serem implementadas estratégias promotoras de saúde mental. Para tal, é necessário que as políticas sejam favoráveis ao desenvolvimento destes programas, considerando-os como prioritários e criando indicadores específicos para a avaliação da saúde mental e desenvolvimento deste tipo de intervenções.

A pandemia atual veio despoletar uma nova crise, com efeitos adversos na saúde mental das pessoas. Ora, tal exige que “se invista na saúde como forma de capacitar melhor os cidadãos e de a ultrapassar saindo da mesma com mais competências que as que se tinha antes” (Observatório Português dos Sistemas de Saúde, 2015). É, portanto, necessária uma mudança de paradigma que coloque as pessoas no centro do sistema, sendo para tal fundamental:

  • Priorizar politicamente a implementação de atividades que promovam a saúde mental e previnam e doença;

  • Desenvolver a nível local ações recreativas, culturais, sociais e desportivas como forma de promover o bem-estar;

  • Desenvolver ações de promoção da literacia em saúde e de combate ao estigma;

  • Melhorar a acessibilidade aos serviços de saúde mental;

  • Aumentar os recursos existentes;

  • Dotar os profissionais de saúde dos cuidados de saúde primários de competências para atuar ao nível da promoção da saúde mental e prevenção da doença;

  • Rentabilizar e valorizar as competências dos profissionais de saúde mental, como por exemplo, dos Enfermeiros Especialistas em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, com a prestação de cuidados especializados, ao invés da prestação de cuidados gerais;

  • Estabelecer parcerias entre os serviços de saúde e as estruturas da comunidade no sentido de proporcionar mais e melhor habitação e mais apoio social a pessoas vulneráveis e carenciadas;

  • Criar oportunidades no acesso ao emprego a pessoas com doença mental;

  • Aumentar a resposta da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados para a Saúde Mental;

  • Dar continuidade ao projeto piloto das equipas comunitárias em saúde mental, formando novas equipas e alocando os recursos necessários para dar resposta a toda a população;

Referências Bibliográficas

Conselho Nacional de Saúde (2019). Sem mais tempo a perder. Saúde mental em Portugal: um desafio para a próxima década. Lisboa: CNS. [ Links ]

República Portuguesa. Decreto-Lei n.o 8/2010, Pub. L. No. Diário da República n.o 19/2010, Série I de 2010-01-28. [ Links ]

James, S. L., Abate, D., Abate, K. H., Abay, S. M., Abbafati, C., Murray, C. J. L. (2018). Global, regional, and national incidence, prevalence, and years lived with disability for 354 diseases and injuries for 195 countries and territories, 1990-2017: A systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2017. The Lancet, 392(10159), 1789-1858. [ Links ]

OECD/European Union (2018). Health at a Glance: Europe 2018: State of Health in the EU Cycle. OECD Publishing, Paris/European Union, Brussels. [ Links ]

Observatório Português dos Sistemas de Saúde. (2015). Acesso aos cuidados de saúde. Um direito em risco? Relatório de Primavera 2015. OBSS. [ Links ]

World Health Organization. (2001). The World health report 2001. Mental health: New understanding, new hope. World Health Organization. https://apps.who.int/iris/handle/10665/42390Links ]

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