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Revista :Estúdio

versão impressa ISSN 1647-6158

Estúdio vol.3 no.5 Lisboa jun. 2012

 

INTENTO

Enquadramento: Intento

Context: Attempt

 

Fernanda Maio*

*Conselho Editorial; Universidade de Lisboa, Faculdade de Belas Artes, Portugal.

Endereço para correspondência

 

 

RESUMO

Quando analisamos a significação de uma obra no campo da arte, por onde começar? Pela intenção do/a autor/a? Estará ela patente na obra? Terá a obra um propósito acessível e distinto, o qual me colocará irremediavelmente perante um determinado espectro de significações possíveis? Ou terá ela entrado na condição de objecto sem sentido, fruto da convicção de que o Espectador (recém-nascido) e o todo-importante contexto da recepção fornecerão a devida significação, de contornos variáveis, que outrora coube somente ao autor? Qual o propósito da proposta? E, quando não do domínio dos sentidos, como ler os sinais codificados? Convocando outros textos e outras teias de significações às quais podemos, enquanto espectadores/receptores, associá-la criando novas possibilidades de sentido? Os autores cujos textos constituem esta secção tomaram diferentes rumos nas suas abordagens às significações reunidas pelas obras, ilustrando dessa forma a complexidade inerente ao acto interpretativo.

Analisando a obra a partir das significações intimadas pela sua interacção com um espectador / utilizador, Ana Paula de Campos aborda as relações entre o corpo e a jóia na arte-joalheria – desenvolvida ao longo dos últimos 40 anos – através da análise da série Longing for the Body (2006), da artista brasileira Mirla Fernandes. Ao ser produzida no contexto da arte, a jóia almeja destacar-se como "veículo de expressão do sujeito e de seu tempo." Nesta abordagem mais conceptual do objecto-jóia, o corpo é sobretudo suporte de um objecto que o intima e interroga, o que permite à autora do texto criar conexões entre esse campo e a concepção de 'corpo sem órgãos' (Deleuze e Guattari). A jóia permite então "desorganizar, escapar da ordem e abrir o corpo a outras conexões, agenciamentos e limiares inscritos numa espécie de protocolo de experiencias."

Alexandra Cabral situa a sua observação ao nível das dimensões sociais e legitimações pelas quais a obra de Joana Vasconcelos passa. Da obra artesanal à produção em massa, as esculturas de Vasconcelos criticam a sociedade que simultaneamente ilustram, conjugando as ideias de marca e autoria fundamentais para o circuito da arte contemporânea. Para Alexandra Cabral, a escultora "criou a sua própria "indústria criativa", integrando mecanismos de produção e divulgação, nacional e internacional, que resultam da sua faceta multidisciplinar e da sua capacidade de gestão da arte." Nessa perspectiva a autora salienta o carácter funcional e de design que estas obras possuem, considerando a moda como um elemento subjacente, ou mesmo uma linguagem, a partir do qual a escultora "analisa o mundo", propondo retratos sociais que ganham reconhecimento internacional em forma de objectos que, ao invés de vestirem corpos, vestem ideias.

Aparecido José Cirilo investiga, em dois textos distintos, os processos de criação das obras Pela Fresta (1998), de Shirley Paes Leme, e Seu Sami (2007) de Hilal Sami Hilal. Em ambos busca a mesma verdade centrada no tempo de feitura das obras: recuperar o processo criativo que as originou; encontrar as pistas que permitam elucidar acerca das decisões tomadas, desde a "imagem geradora" até à concretização no espaço expositivo. O autor busca compreender os procedimentos, investigando as acções e memória antecedentes à materialização das obras. Relativamente a Shirley Paes Leme destaca a importância do espaço da galeria na obra analisada e explica, por exemplo, a pertinência do procedimento de escolha do título para a relação de sentido que irá ser estabelecida pela obra como um todo. Apresenta-nos ainda indícios da construção da "tensão da memória da artista" em diálogo com a memória do espaço e da matéria, a qual constitui um fio condutor que direcciona a génese das suas obras.

Na análise da obra de Hilal Sami Hilal, o autor centra-se no tempo da génese de uma obra site-specific – indissociabilidade da forma com o espaço – que foi montada em diversas cidades. A partir da geração da obra, complementada com aspectos das suas montagens, o autor busca "evidenciar como tendências e intencionalidades do projeto poético são afetadas na medida em que deixa de ser um site-specific e torna-se uma instalação comum." Assim, neste seu segundo texto, Aparecido José Cirilo põe em confronto o propósito que presidiu à obra – e a sua natureza de site-specific daí resultante – com o contexto expositivo em que a mesma surge posteriormente: "a relocação de Seu Sami altera seu efeito de sentido: retirada do Museu Vale a obra é destruída, embora sua forma física permanecesse […] os espaços novos deixam de ser matéria da obra e se torna uma estratégia de emolduramento."

Joana Tomé examina a obra da artista portuguesa Ana Vieira, nomeadamente as homónimas Ambiente (1971) e Ambiente (1972), relativamente ao entendimento deleuzeano do conceito de simulacro "enquanto poder positivo na insubmissão ao Logos", e ligado, por isso, à condição feminina. O simulacro, ao libertar-se da Ideia, do modelo, existe só por si, autónomo e distinto. A autora propõe-se assim pensar a subversiva potencialidade da invocação do simulacro nas obras de Ana Vieira sugerindo que as mesmas parecem poder "ler-se na linha de uma proposta de reversão" da lógica platónica, tal como propôs Deleuze: "a reminiscência a ter lugar deve ser da matriz/ventre em detrimento do sol / Ideia." Tal como nas obras analisadas, e apesar de apelarem à participação, o espaço nómada do devir é impenetrável e força o espectador a reposicionar-se face ao sistema de representação.

 

 

Endereço para correspondência

Correio eletrónico: fernandamaio_lisboa@hotmail.com (Fernanda Maio).

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