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Revista :Estúdio

versão impressa ISSN 1647-6158

Estúdio vol.4 no.8 Lisboa dez. 2013

 

ARTIGOS ORIGINAIS

ORIGINAL ARTICLES

Paisagem fragmentada na gravura de Maria Gabriel

The fragmented landscape of Maria Gabriel's prints

 

Joanna Latka*

 

*Polónia, artista plástica, investigadora de gravura. Mestrado em Educação das Artes Plásticas no Instituto das Artes, na Universidade de Pedagogia em Cracóvia, Polónia, (2003), Pósgraduação em Ilustração pelo ISEC (2006).

AFILIAÇÃO: Universidade de Lisboa. Faculdade de Letras. Instituto de História da Arte (bolseira FCT). Alameda Universidade 1600-214 Lisboa, Portugal.

 

Endereço para correspondência

 

RESUMO:

Este artigo focar-se-á especificamente na extraordinária visão paisagística de Maria Gabriel, tal como na análise de algumas das suas obras, como por exemplo Paisagem fragmentada (1969), O apelo à paisagem (1972); e algumas colagens fragmentadas de gravuras com outros médios da série Ritmos Campestres (2000), e tem como objectivo chamar a atenção para notável trabalho de Maria Gabriel.

Palavras-chave: gravura / xilogravura / Maria Gabriel / paisagem / colagem.

 

ABSTRACT

This article will focus specifically on the extraordinary vision of Mary Gabriel landscape, such as the analysis of some of his works, such as exemplo Paisagem fragmentada (1969), O apelo à paisagem (1972), and some fragmented collages of prints with other medium series Ritmos Campestres (2000), and is intended to call attention to impressive work of Mary Gabriel.

Keywords: printmaking / woodcut / Maria Gabriel / landscape / collage.

 

Introdução

Este artigo focar-se-á especificamente na extraordinária visão paisagística de Maria Gabriel (Lisboa, 1937), tal como na análise de algumas das suas obras, como por exemplo xilogravuras Paisagem fragmentada (1969), O apelo à paisagem (1972); ou colagens fragmentadas de gravuras com outros médios da série Ritmos Campestres (1998 – 1999); onde observamos uma componente lúdica e intrigante que se tem sempre manifestando ao longo das suas obras em pintura e gravura (Tavares, 1997:s/p). Através dos exemplos referidos, descobrimos uma rica apresentação paisagística de múltiplas metáforas, tanto numa perspetiva técnica como na sua formalidade. Visto que a irracionalidade tem tomado conta deste mundo incerto onde cada vez existe menos lugar para o poético (Gabriel, 2003:3), é exatamente dentro dessa linguagem bastante poética, que a artista prova que a temática campestre pode ser incrivelmente interessante e mostrada de forma nada banal. Assim, com os seus notáveis trabalhos, a artista convida-nos a abandonar por momentos o difícil mundo exterior do quotidiano terrestre onde o peso do corpo existe (Patrício, 1995: s/p).

 

1.

Maria Gabriel, é uma referência interessante na gravura contemporânea portuguesa. No seu currículo podemos contar com inúmeras exposições individuais e coletivas de gravura, pintura e desenho, tanto no território nacional como no estrangeiro. A artista, foi por diversas vezes premiada em Portugal, e representou o país nas mais importantes competições internacionais. A obra de artista encontra-se em várias coleções públicas e privadas em Portugal, Alemanha, Canadá, França, Inglaterra e nos Estados Unidos da América.

Maria Gabriel começou a sua carreira artística aprendendo pintura na SNBA – Sociedade Nacional de Belas Artes em Lisboa, em 1959. Entre 1967 e 1968 frequentou os cursos de gravura artística na Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses – GRAVURA, com orientação de Alice Jorge e João Hogan. Em seguida, depois da sugestão de João Hogan, ficou bolseira da Fundação Calouste Gulbenkian para desenvolver a técnica de talhe doce na gravura em madeira. A partir 1972, ainda viajou para Alemanha onde estagia por vários períodos na Hochshule für Bildende Kunst (Hamburgo), com os professores Almir Mavignier e Peter Paul, e ainda Rainer Oehms. Nos anos 1988/89 a artista foi também bolseira do Fundo de Fomento Cultural.

[...] a obra de Maria Gabriel impõe, entre o jogo, o susto e a raiva, uma dramaticidade real e bem presente. Talvez, mais do que possamos imediatamente julgar, venha a tornar-se o retrato possível em que todos entramos ou de que, esforçadamente e sem glória, queremos, enfim sair (Azevedo, 1984: s/p).

Além destes fatos, há a destacar que a artista, teve uma importante atividade educativa na formação de novos gravadores em cursos organizados pela Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses, ou na publicação – em coautoria com Alice Jorge – do único livro português sobre a aprendizagem das técnicas de gravura artística: Técnicas de gravura artística (Livros Horizonte, 1986). Este livro resulta da sua própria experiência nos estágios em Hamburgo, e do facto de Alice Jorge, então sua colega no domínio das artes, ter sido responsável pela sua iniciação na área da gravura. Lembramos também, que a artista foi membro de direção da Sociedade Cooperativa de Gravadores Portugueses de 1969 a 1973, e que desde 1977 até hoje em dia, faz a parte de Corpos Diretivos de SNBA.

 

2.

A representação de campestre surge no trabalho de Maria Gabriel na forma de "Paisagem fragmentada", tanto numa perspetiva técnica como na sua abordagem formal. Por um lado, por exemplo, na xilogravura, a artista constrói a matriz de forma fragmentada como um puzzle (recorre a várias madeiras, pinta cada pedaço com cor diferente, através dos variados modos de aplicação de tinta – talha doce, rolo, etc.; – juntando todos elementos numa única peça). Por outro lado, as suas paisagens surgem como composições geométricas e abstratas, acentuando o cariz simbólico, resultante da sua própria interpretação do tema, revelando o seu intimo mundo da imaginação campestre das memórias das suas viagens ou das memórias de infância. A Maria Gabriel, com este seu desafio permanente, cria a grande dúvida que permanece insuportável e insustentável, e cuja construção sofre múltiplas metamorfoses. [...]. A artista, juntamente com a sua dramaticidade que se desenvolve em figuras antropomórficas, raiadas pelo absurdo [...] e por uma interpretação cubista (Tavares, 1987:s/p). A gravadora, através das suas obras, refere que tudo na vida se dilui metaforicamente com a natureza, visto vivermos tempos em que tudo é fragmentado, até na nossa própria linguagem, que é a nossa forma mais vulgar de comunicação (Gabriel, 2013). Por isso, a artista cria um dialogo com as suas reflecções gráficas que:

[...] simulam um diálogo incessante e tautológico. Ao mesmo tempo é secreto, mas deixa-se comunicar nas linhas e nas cores. De que diálogo se trata? Nesse desejo imenso de quebrar a solidão a que nos conduziu a sociedade contemporânea, restará ao ser humano a transmissão da sua subjetividade como único meio para se libertar? (Tavares, 1987, s/p)

3. Paisagem Fragmentada

Experimentando, num modo espontâneo, Maria Gabriel encontrou no trabalho de xilogravura o que podia fazer na pintura, achando na construção das suas matrizes fragmentadas (puzzle), uma forma de expressão que ficasse parecida com o seu registo em pintura (Gabriel, 2013). A artista para criar a sua matriz, juntava vários fragmentos de madeira numa única peça, pintando com variados modos de tintagem (talha doce ou e/com rolos), cada elemento com cor diferente, chegando a obter assim, provas de várias cores opacas, através numa única impressão. Todavia, a obra de artista tanto na pintura como na xilogravura nunca foi muito "material", tendo sempre mais de concepção do que de textura. Aliás, a forma plástica que Maria Gabriel pretende mostrar na sua obra, é a linha do desenho e a sua própria construção geométrica (Gabriel, 2013).

Portanto, olhando para obras efectuados em técnica de madeira (Figura 1, Figura 2), percebemos, que além de linhas de desenho, a obra não tem textura gravada propositadamente, e a única textura que está presente na sua obra é a pintura colorida de superfícies de madeira. Percebemos ainda, que através dessas gravuras, tal como noutras provas da sua forte atividade artística, na obra de Maria Gabriel a paisagem está sempre presente, nunca de forma direta, somente de forma metafórica.

 

 

 

 

No entanto, na série Ritmos Campestres, apresentada em 2000 no Museu de Traje Nacional (Lisboa), a artista recorre ao modo de colagem para realizar as suas visões naturalistas, criando os elementos gráficos das suas peças. Maria Gabriel simplesmente desenha/pinta (aguarela) e cola os fragmentos dos antigos trabalhos (xilogravuras, provas de estado em papel offset, etc.), ou outras matérias encontradas no ambiente do seu atelier (panos de limpeza dos pincéis), que a artista guarda para utilizar mais tarde, fazendo uma reutilização do que em principio deveria ser considerado desperdício (Gabriel, 2000:6). Recolhendo este modo de expressão plástica, a artista volta assim, às memórias da juventude campestre da sua terra familiar, onde artista passou a sua infância dos 5 aos dez anos (conselho de Covilhã), ou das suas memórias dos passeios pelo parque Monteiro-Mor, que Maria Gabriel nos apresenta em forma de colagens fragmentadas – os seus lindos contos de temática campestre, como por exemplo Puzzle Campestre (1999) ou Ritmos Campestres (1999). Porém, a criadora pela utilização destes desperdícios tem ainda o significado de introduzir nas suas atuais composições memórias de outros trabalhos, restos do que já foi feito como se quisesse fazer florescer de novo o que já pereceu e foi dado como finito, acabado morto (Teixeira, 2000:4).

Está ornamentada com elementos naturais que nos esclarecem sobre a verdade das flores e a sabedoria do belo na grandeza límpida e encantatória de um jardim das delícias. Segue-se a apresentação de um núcleo de peças que primam pela ambiência floral, pela simplicidade e pela alegria na exaltação da festividade campestre, edificante de valores morais, espirituais e estéticos; de eterno no retorno, sempre que se desenham as pequenas e grandes crises individuais e colectivas (Teixeira, 2000: 3)

Conclusão

Com este conjunto de obras que foram aqui apresentados, esperamos ter chamado à atenção para a notável produção de Maria Gabriel, que sem dúvida merece uma maior atenção para a descoberta das metáforas que lhe estão subjacentes.

E este enigma que vincula a obra de Maria Gabriel a uma dimensão dramática onde a angústia, o medo, o espectro da morte e as dúvidas várias se amontoam sem esperarem resposta. A não ser … o simples bálsamo da comunicação potencial com o outro que somos todos nós. Porventura é esta dimensão dramática e profundamente existencial que torna a obra de Maria Gabriel íntima de todos nós, e por isso (e) "perigosamente" singular no contexto de arte actual (Tavares, 1987: s/p).

 

Referências

Azevedo, Fernando de (1984) Maria Gabriel, Espaço a Clube Cinquenta, Lisboa.         [ Links ]

Gabriel, Maria (2003) Personagens e Pássaros do Atelier da Artista, Galeria de Arte Ygrego, Lisboa.         [ Links ]

Latka, Joanna (2013) entrevista com Maria Gabriel, Linda-a-Velha, (2013-06-27).         [ Links ]

Patrício, Madalena (1995) Encontros Marítimos, Mares e Peixes, Galeria de Arte Ygrego, Lisboa.         [ Links ]

Tavares, Cristina, Azevedo (1997) Outras Figurações, Galeria Municipal de Exposições de Vila Franca de Xira, Vila Franca de Xira.         [ Links ]

 

Artigo completo recebido a 8 de setembro e aprovado a 24 de setembro de 2013

 

Endereço para correspondência

 

Correio eletrónico: jolatka@gmail.com (Joanna Latka)

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