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GOT, Revista de Geografia e Ordenamento do Território

versão On-line ISSN 2182-1267

GOT  no.14 Porto set. 2018

https://doi.org/10.17127/got/2018.14.013 

ARTIGO

 

A relevância das transferências de recursos aos municípios na federação brasileira. Notas sobre a Região Metropolitana de Campinas (SP-Brasil)

The relevance of transfers of resources to municipalities in the Brazilian federation. Notes about the Metropolitan Region of Campinas (SP-Brazil)

 

Rosalin, João1; Gallo, Fabrício1

1Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, IGCE/DEPLAN; 13590-000, Rua Antonio Munhoz, 80 – Jardim Paulista. Dourado – SP – Brasil; jprosalin@hotmail.com; fgallo@rc.unesp.br

 

RESUMO

Criada no ano 2000 através da lei complementar estadual nº 870, a Região Metropolitana de Campinas (São Paulo – Brasil) agrega hoje, aproximadamente 2,5% do PIB brasileiro, além de ser considerada o 3º maior centro industrial do país e o maior polo de alta tecnologia da América Latina. O presente trabalho propõe uma análise sobre a transferência voluntária de recursos do ente federado estado de São Paulo para os municípios da Região Metropolitana de Campinas e, a partir disso, entender como estes municípios se destacam numa nova reorganização regional uma vez que passam a ter, cada vez mais, elevada a densidade técnica instalada em seus limites.

 

Palavras-chave: Território Usado; Convênios; Solidariedades Federativas; Região Metropolitana de Campinas.

 

ABSTRACT

Created in 2000 through the supplementary state law No. 870, the Metropolitan Region of Campinas (São Paulo – Brazil) adds today, about 2.5% of national GDP, and is considered the 3rd largest industrial center of the country and the largest center of high-tech in Latin America. This work proposes an analysis of the voluntary transfer of resources of the federal entity state of São Paulo for the Metropolitan Region of Campinas and, from this it to understand how these cities stand out in a new regional reorganization once they start to have, increasingly high density technical installed on their limits.

 

Keywords: Used Territory; Covenants; Federal Solidarities; Metropolitan Region of Campinas.

 

 

1. Introdução[1]

Neste trabalho buscamos investigar o processo de financiamento da renovação das materialidades no território paulista (SANTOS e SILVEIRA, 2001) a partir dos recursos repassados pelo ente federado estado de São Paulo, por meio da modalidade Transferências Voluntárias, aos municípios paulistas.

Para tal análise, este processo será verificado a partir dos financiamentos deste para a renovação seletiva das materialidades e para a ampliação dos investimentos das empresas nos municípios paulistas. Tais fatos podem ampliar a densidade técnica deste recorte do território nacional (SANTOS, 2002).

Como compromisso analítico para este trabalho é sugerida a análise da reorganização das solidariedades federativas no território brasileiro no período atual. Para esta tarefa, propõe-se compreender o território usado através da ótica do Estado.

Vemos no artigo 18 da Constituição Brasileira de 1988 que “a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, todos autônomos [...]”. Assim, considerando o princípio de isonomia entre os entes da federação, pode-se afirmar que com a atual constituição aos municípios foi assegurada uma autonomia que não existia anteriormente, considerando o fato de estes terem agora a possibilidade de organizarem e gerir suas Leis Orgânicas.

Um ponto que reforça a autonomia municipal é o fato de a Constituição Federal deixar explícito em seu “Capítulo VI – Da Intervenção” que um ente não tem o poder de intervir em outro ente (salvo sob condições especiais também mencionadas no mesmo texto). Havendo a necessidade de previsão constitucional para que um ente intervenha em outro, afirma-se o princípio de igualdade (ou seja, isonomia). Se os entes fossem desiguais – se existisse a subordinação de um ente ao outro – não seria cogitada a necessidade de autorização constitucional expressa (GALLO, 2011, p. 20).

Além da isonomia entre os entes, a Constituição Federal de 1988 lhes garantiu autonomia e competências exclusivas (inclusive tributária) para tratar de determinados assuntos, estabelecidos constitucionalmente como próprios a cada ente. Conforme Alves (2001, p. 147), “não é dado a nenhum dos entes federativos tentar invadir a esfera competencial tributária alheia sob pena de inconstitucionalidade”.

Há de se considerar também que, no plano jurídico, os municípios e o Distrito Federal ocupam o mesmo plano hierárquico. Entretanto, Alves (2001, p.147) mostra que “suas diferenças moram nas competências distintas que receberam diretamente da própria Constituição Federal”.

No entanto, discute-se na literatura jurídica nacional a efetiva autonomia política dos municípios. Clève (1993), afirma que houve uma centralização das competências políticas na esfera federal. Para ele,

A competência remanescente dos Estados-Membros é quase um nada, em face do número de matérias que são ou de competência privativa da União ou de competência concorrente, cabendo, neste caso, como se sabe, à União editar normas gerais (CLÈVE, 1993, p.83).

Além da questão da autonomia política dos entes, vale ressaltar que a Constituição Federal de 1988 garantiu também uma maior autonomia tributária aos municípios[2].

 

 

2. A atual distribuição orçamentária brasileira e as dependências externas dos municípios

Considerando-se a existência de vários níveis de governo em países de organização política federativa, um sistema de gestão fiscal, conforme Prado et al. (2003), deve atender algumas exigências, dentre as quais: a) estruturar um sistema de competências tributárias; b) formatar um sistema de transferências intergovernamentais e c) atribuir, de forma equilibrada, os encargos entre os níveis de governo. Para Afonso (1994, p. 354),

é bom lembrar que a descentralização fiscal não deslanchou somente após promulgada a Constituição Federal de outubro de 1988. Esta só ampliou e consolidou um processo, iniciado ao final da década de 70, de esvaziamento financeiro do governo Central e de rápido crescimento da participação no setor público e na economia dos Estados, e, notadamente, dos municípios.

Uma vez que as normas de 1988 garantem aos estados e municípios autonomia de arrecadação, estas preveem também que alguns dos tributos arrecadados pela União e pelos estados membros devem retornar aos municípios, fato que gerou um aumento destes entes no Brasil (são hoje, ao todo, 5.570 municípios). Observa-se, dessa forma, que foi no nível municipal que se ampliaram os recursos de transferências intergovernamentais. Por isso, é relevante dizer que esse crescimento é oriundo mais das transferências que as municipalidades recebem de outros entes do que de sua própria capacidade de arrecadação. A manutenção do equilíbrio de poder entre as esferas federativas – União, estados e municípios – necessária devido a existência de dissimetrias econômicas, impõe constantemente negociações políticas e pactos entre os entes (GALLO, 2011). Faz-se importante mencionar que a esses três níveis de governo são asseguradas autonomia e competências legiferantes e administrativas exclusivas, concorrenciais e complementares[3].

Em virtude, também, à desigualdade na arrecadação de impostos, existem mecanismos intergovernamentais de distribuição de recursos, dos quais se destacam: (i) as transferências constitucionais e legais (com regras previstas na Constituição Federal e em Leis e Decretos Federais)[4]onde todos os entes têm asseguradas suas parcelas de recursos vindos de outros, e, (ii) as transferências voluntárias das quais se destacam os convênios para ações diversas, formalizados entre a União e os estados e municípios e entre os estados e os municípios. Neste tipo de transferência todos os entes subnacionais podem pleitear recursos, todavia, isso não garante a formalização do convênio, tampouco a liberação do dinheiro.

Além disso, o sistema de transferências intergovernamentais no Brasil atende tanto a um equilíbrio entre a disponibilidade e a demanda de recursos, além de tentar garantir um mínimo padrão de oferta de bens, serviços e direitos sociais em todo o território nacional.

Ocorre que a interpretação da liberação dos recursos oriundos de convênios (via transferências voluntárias) sugere a existência de uma diferenciação entre os entes de mesmo nível subnacional, ou seja, a isonomia federativa não seria assegurada. Considerando que os recursos citados são verbas liberadas segundo critérios técnicos de análise dos projetos, mas sujeitos a ingerências políticas, entende-se que o orçamento público adquire grande importância porque regula maiores ou menores autonomias municipais e regionais, tendo em vista que algumas parcelas do território recebam mais recursos do que outras, proporcionando assim uma modernização pontual e seletiva (GALLO, 2011, 2013).

Com a descentralização tributária realizada a partir de 1988, aqueles entes federados que já eram mais pujantes do ponto de vista orçamentário passam a ter aumentado seu poder de arrecadação e de influência sobre os outros. Isso fez aumentar o poder do estado de São Paulo perante outros entes estaduais, isto é, o poder econômico do governo paulista faz com que a arrecadação própria de tributos estaduais seja elevada. A promoção de uma difusão seletiva das modernizações no estado de São Paulo por meio da celebração de convênios entre os municípios paulistas e o próprio governo estadual, aponta indícios de como o processo de regionalização no estado e a desigual distribuição de recursos pode potencializar os desarranjos na isonomia federativa (GALLO e GOMES, 2010).

Acreditamos que tal proposta se faz pertinente porque podemos afirmar que a maneira como ocorre a difusão das modernizações, ou, difusão do meio técnico-científico e informacional (SANTOS, 2002) não é isenta ao quadro institucional federativo brasileiro, ou seja, a distribuição pelo território das grandes obras de engenharia, dos objetos técnicos modernos e dos aparelhos de realização da cidadania, obedecem não só a uma localização racionalizada por caracteres técnicos, mas também por escolhas estabelecidas em razão do próprio ser da federação, ou seja, os pactos e acordos políticos (GALLO, 2011).

A Constituição Federal de 1988 estabelece, a partir de seu artigo 158, a porcentagem pertencente aos municípios do produto da arrecadação dos impostos do Estado, repassada através de transferências constitucionais. Os incisos III e IV referem-se a participações dos municípios na arrecadação do Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), que é igual a 50% (cinquenta por cento) e no Imposto Sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS), que é igual a 25% (vinte e cinco por cento)[5].

Além das transferências constitucionais são vinculações orçamentárias do Estado de São Paulo a Educação, que recebe anualmente, conforme o artigo 255 da Constituição do Estado de São Paulo[6] no mínimo 30% da receita resultante dos impostos; a Saúde, que recebe o equivalente a 12%; a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP, que recebe no mínimo 1%. Em todos os casos, o valor do repasse se dá já excluindo o valor liberado através das transferências constitucionais. Também são vinculações orçamentárias do estado paulista os precatórios, que determinam o pagamento de dívida de Estado por meio da inclusão do valor do débito no orçamento público (no caso do estado de São Paulo, 1,5% de sua Receita Corrente Líquida  é destinada para essa finalidade); e o Fundo de Melhoria das Estâncias que garante, conforme a lei nº 6470, da constituição do Estado de São Paulo, a transferência de  recursos diretos para a execução de obras e programas ligados ao desenvolvimento do turismo nas cidades reconhecidas como estâncias[7]. Existem ainda outras despesas obrigatórias como o serviço da dívida do estado com a União, que possui limite máximo de comprometimento de 13% da Receita Líquida Real; as contribuições para o Programa de Integração Social e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público – PIS/PASEP, prevista na Lei nº 9.715[8]; além de outras obrigações de pequeno valor.

Mesmo com todas estas vinculações tributárias obrigatórias, aponta-se que por ser o estado que mais arrecada impostos na federação, São Paulo possui um volume maior de recursos para celebração de convênios (leia-se Transferências Voluntárias) diretamente com seus municípios (isto é, uma relação direta entre o Executivo estadual e os Executivos municipais). Os municípios de outros estados (aqueles que arrecadam menos do que São Paulo) ficam, na maioria das vezes, dependentes da celebração de convênios apenas com a União dada a baixa arrecadação dos entes estaduais.

Neste artigo pretendemos analisar os convênios celebrados entre o ente federado estado de São Paulo e os municípios da Região Metropolitana de Campinas (RMC). Em nossa proposta de trabalho optamos por um recorte empírico que considera a materialização desses recursos de convênios no território, ou seja, consideramos aqueles que se transformaram em materialidades ampliando assim a densidade técnica do território provendo-o de novos objetos técnicos ou promovendo a melhoria dos existentes.

 

 

3. A gênese e a relevância da Região Metropolitana de Campinas

No estado de São Paulo, pode-se considerar que o atual estágio de metropolização é um processo de interesses, o qual beneficia agentes e favorece municípios, visto que ao serem definidos como metropolitanos, estes entes federativos passam a ter acesso a fundos especiais dos quais podem pleitear verbas públicas estaduais, bem como participar em Conselhos de Desenvolvimento e Consultivos e institucionalização de uma Agência Metropolitana da região.

Conjuntamente com os benefícios, o aumento da ocorrência deste processo nos últimos anos decorre do fato de a metropolização ser, na visão governamental atual, pautada em “uma forma de gestão compartilhada do Estado (...) e possibilidades de gerar ao menos no discurso, políticas de integração regional e intermunicipal” (RESCHILIAN, 2012, p.12). Portanto metropolização torna-se sinônimo de desenvolvimento e planejamento, os quais muitas vezes sendo uma ação verticalizada, frutos de interesses externos, não coincidem com a lógica e gestão local. Deste modo, apesar da existência de interesses e problemas comuns aos municípios, ainda se tem a “ausência de mecanismos claramente definidos de gestão metropolitana” (idem, p.17).

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2016 existiam no Brasil 70 regiões metropolitanas, distribuídas por todas as grandes regiões do país. Seis são as Regiões Metropolitanas em São Paulo: RM da Grande São Paulo, RM da Baixada Santista, RM de Sorocaba, RM do Vale do Paraíba e Litoral Norte, RM de Ribeirão Preto e RM de Campinas (esta última, foco central desta pesquisa).

A Região Metropolitana de Campinas (RMC) foi criada pela lei complementar estadual nº 870, de 19 de junho de 2000. Segundo o artigo 1º desta lei, esta unidade regional do estado de São Paulo é constituída pelo agrupamento dos seguintes Municípios: Americana, Arthur Nogueira, Campinas, Cosmópolis, Engenheiro Coelho, Holambra, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba, Jaguariúna, Monte Mor, Nova Odessa, Paulínia, Pedreira, Santa Bárbara d’Oeste, Santo Antônio de Posse, Sumaré, Valinhos e Vinhedo. A partir de 13 de março de 2014, por meio da Lei Estadual nº 1.234, o município de Morungaba passou a ser integrado a Região Metropolitana de Campinas.

Conforme informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Região Metropolitana de Campinas agrega 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB) Nacional, cerca de 30 instituições de ensino, 20 institutos de pesquisa e tecnologia, 15% da produção científica nacional, além de ser considerada o 3º maior centro industrial do país e o maior polo de alta tecnologia da América Latina (fatos estes que evidenciam a importância desta região no âmbito paulista).Conforme o último estudo divulgado pelo órgão, o PIB da Região Metropolitana de Campinas atingiu R$ 142,3 bilhões em 2013[9], O PIB da região supera o de 18 estados, ficando atrás das unidades federativas de São Paulo (R$ 1,7 trilhão), Rio de Janeiro (R$ 626,3 bilhões), Minas Gerais (R$ 486,9 bilhões), Paraná (R$ 332,8 bilhões), Rio Grande do Sul (R$ 331,0 bilhões), Santa Catarina (R$ 214,2 bilhões), Bahia (R$ 204,2 bilhões), Distrito Federal (R$ 175,3 bilhões) e Goiás (R$ 151,0 bilhões). Além disso, seis municípios da RMC estão entre os 100 maiores geradores de riqueza do País: Campinas (11º), Paulínia (62º), Sumaré (68º), Indaiatuba (74º), Americana (80º) e Hortolândia (86º).

Convém entender que a criação e organização de Regiões Metropolitanas (RMs), que anteriormente era vinculada à esfera federal brasileira, tornou-se, a partir da Constituição de 1988, um processo de responsabilidade dos entes estaduais. Desta forma, ampliaram-se os agentes e consequentemente os interesses envolvidos na constituição deste processo de regionalização, fato este que acarreta mudanças nas dinâmicas locais, tendo em vista que a metropolização possibilita uma maior influência e atuação política da esfera estadual sobre os municípios desta nova região, atuando muitas vezes como verticalidades (SANTOS, 2002).

Ao buscarmos entender a relevância das RMs enquanto escalas de atuação faz-se conveniente verificar sua capacidade e autonomia. Sobre este assunto Caffé Alves (1998) aponta, sob a ótica jurídica, que a criação de uma Região Metropolitana não implica na criação de um “novo poder” legiferante em nível de federativo, pois esta não se constitui como ente federado, assim, entendemos que uma nova organização política acontece em âmbito estadual já que, da mesma forma, uma nova solidariedade regional se cria em torno desses municípios e o peso deste conjunto se altera nas decisões que são tomadas. Desta forma, uma nova política, agora baseada nas influências, se estabelece a partir de então.

Tadeu Arrais (2012) traz uma tipologia relevante a este tópico. Conforme o autor, o processo de metropolização pode ser apreendido em suas dimensões a priori (na qual a escala metropolitana é resultado de uma institucionalização a partir de um ente federado) e a posteriori (considerando o processo de metropolização deve ser entendido como um fenômeno de alta complexidade, fruto da urbanização ampliada que resulta, também, em polarização significativa na cidade-sede – considerada como metrópole – e em integração intensa desta com espaços periféricos. Ainda conforme este autor, no entendimento da metropolização a posteriori é frequente que a integração transpasse limites político-administrativos, o que produz integração territorial entre áreas de diferentes municípios, estados e até mesmo países.

Este problema em compreender a escala de atuação dos poderes nas RMs é apontado por Garson (2009) quando menciona que as dificuldades de compartilhamento dos poderes residem, em parte, em nossa cultura federativa. Segundo a autora (2009, p. 21):

O processo de descentralização federativa não foi acompanhado pelo desenvolvimento de instituições que estimulem a cooperação entre os entes da federação e de fóruns de negociação e resolução de conflitos. Identificando a descentralização com municipalização, os municípios assumiram uma postura autárquica”.

Além das alterações na dinâmica regional, este processo de metropolização implica no aumento do poder de influência e de atuação do governo estadual sobre a área e as políticas destes municípios, sendo estes pontos de grande importância no estudo de criação de uma RM, já que o estado de São Paulo, como ente federado estadual mais “poderoso” – por deter mais recursos do que os outros entes (tanto se comparado a outros entes da escala estadual quanto se comparado aos da escala municipal) – pode determinar amplas estratégias de difusão seletiva do meio técnico-científico-informacional (SANTOS, 2002) por partes do território paulista. Isto pode ocorrer por meio da implantação de novas infraestruturas que ampliam a densidade técnica de alguns pontos do território paulista tornando-os luminosos enquanto outros permanecerão opacos (SANTOS; SILVEIRA, 2001).

Desta forma, mesmo que a Constituição Brasileira de 1988 apregoe a autonomia dos entes federados, a organização de um grupo de municípios em uma Região Metropolitana implica novos acordos políticos, novas influências políticas e novas negociações entre os entes da federação. Em concordância com Ribeiro (2004), podemos afirmar que este processo de regionalização se apresenta como uma ação política, pois segundo a autora, regionalizar é “a expressão espacial dos interesses e das práticas de distintos agentes” (p. 200), e entre estes agentes pode-se ter o Estado, grandes corporações e atores civis.

Conforme Monteiro (2007, p. 47),

Não podemos mais continuar considerando o planejamento como produto da razão, consciência e seriedade de seu formulador, - como um processo neutro e mediador dos conflitos, mas sim como resultado dos interesses de quem o promove. Na realidade, é um instrumento que pode ser manipulado diferentemente de acordo com quem detém “as suas rédeas”.

Diante desta complexidade, é importante ressaltar a impossibilidade de se ter a regionalização como um processo neutro, pois envolve ideologia e ações político-administrativas, sendo cada vez mais forte a influência de agentes privados nas políticas públicas ou de outros entes (tais como o ente estado de São Paulo), nas políticas públicas de perfil metropolitano. Políticas estas que visem um desenvolvimento efetivo do território paulista, e para isto, é preciso reconsiderar a visão seletiva do território, é necessária uma visão que enxergue as diferenças e soluções para áreas sem estrutura, bem como compreender que modelos já prontos, que deram resultados positivos em locais com realidades diferentes, tendem a não ter sucesso quando aplicados em outras realidades.

 

 

4. Transferências Voluntárias e a materialização dos convênios entre o Estado de São Paulo e a Região Metropolitana de Campinas.

O pacto federativo brasileiro, além de reconhecer a igualdade formal e institucional entre os entes da Federação (União, estados e municípios), adere a seus objetivos fundamentais a redução das desigualdades, possibilitando, no plano do federalismo fiscal, que certas regiões sejam favorecidas por políticas de transferências intergovernamentais no intuito de sustentar seu desenvolvimento econômico-territorial. Dessa forma, o relacionamento financeiro entre União, estados e municípios compreende um significativo conjunto de transferências intergovernamentais, além da partilha do produto da arrecadação de tributos federais.

No Brasil, como mencionamos anteriormente, as transferências intergovernamentais podem ser de dois tipos: i) constitucionais ou ii) voluntárias (convênios). As transferências intergovernamentais são bastante relevantes na composição das receitas totais dos municípios. Conforme dados do ministério da Fazenda[10], entre 2003 e 2010, do total das receitas municipais, em média, 52,6% foram oriundas de transferências intergovernamentais da União e dos estados (transferências constitucionais e voluntárias), contra apenas 18,3% de receitas resultantes do exercício da capacidade tributária municipal.

Para Putomatti (2013), do ponto de vista econômico-fiscal, a lógica de um sistema de transferências intergovernamentais está em diminuir desequilíbrios verticais (diferenças entre os entes de diferentes níveis de governo) e as desigualdades horizontais (diferenças entre os entes de um mesmo nível de governo).

Um ponto interessante a se considerar é o de que quando receitas (federais ou estaduais) são distribuídas a governos municipais, é grande a probabilidade de que governantes e seus partidos também se utilizem delas para: i) beneficiar seus principais apoiadores; ii) ampliar sua influência eleitoral; iii) punir adversários políticos; e/ou iv) montar coalizões legislativas. Especificamente, as transferências voluntárias, por definição, são recursos que permitem aos governantes uma ampla discricionariedade em sua aplicação. Para Avelino (1994), no caso brasileiro, a lógica do uso de transferências como moedas políticas encontra argumentação teórica no que ele chama de “clientelismo eleitoral”. Conforme o autor, políticos maximizam o seu arco de influência eleitoral e operam como intermediários entre seus eleitores e os recursos públicos.

Visto isso, não é difícil encontrar na literatura evidências empíricas[11] que apontam que convênios são usados como motivações políticas e que municípios recebem, em média, maior quantidade de recurso em caso de alinhamento político, se o prefeito for do mesmo partido ou pertencer à coligação que elegeu o governante (seja ele governador do estado ou presidente).

Acreditamos que o entendimento da atuação do ente federado estado de São Paulo a partir da celebração seletiva de convênios com municípios paulistas poderá trazer luz à nossa proposta de analisar e buscar compreender o papel ativo do território na reorganização das solidariedades federativas.

Conforme informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o estado de São Paulo é o maior estado do Brasil em termos econômicos e fiscais, pois representa pouco mais de 33% do PIB nacional, possui o maior orçamento depois do governo federal, e detém aproximadamente 40% da arrecadação de impostos do país. Entre 2003 e 2010, as transferências voluntárias a municípios mantiveram sua participação, em média, em torno de 2,64% das receitas totais do estado[12]. O processo de aprovação de convênios no estado de São Paulo possui etapas de avaliação baseadas em critérios técnicos[13] e as iniciativas para propostas e encaminhamentos de projetos para a realização de convênios podem partir das secretarias setoriais do estado ou das próprias prefeituras.

Os convênios paulistas realizados com as prefeituras são acompanhados pela Unidade de Articulação com Municípios (UAM) da Secretaria de Planejamento e Gestão do Estado de São Paulo[14] (SPG). A função da UAM é formalizar convênios com os municípios paulistas, visando atender a demanda municipal por infraestrutura urbana, pavimentação, recapeamento, guias, sarjetas, galerias de águas pluviais, iluminação pública, sinalização de vias públicas, canalização de córregos, construção de pontes, construção civil (edificações/reformas), aquisição/reforma de equipamentos, bem como programas emergenciais visando resguardar as condições de vida da população desempregada e/ou de baixa renda.

Nesta pesquisa, nossa análise interpretou as transferências voluntárias de recursos (os convênios) do estado de São Paulo para os municípios da Região Metropolitana de Campinas e, a partir disso, buscou entender como estes municípios se destacam (cada vez mais) numa nova reorganização regional.

As análises da realidade encontrada na RM de Campinas, apontam para a existência de uma escala de interações que se dá entre os entes da federação, de cima para baixo (do estado de São Paulo para os municípios). Assim, podemos dizer que tais interações seriam qualificadas como interações espaciais verticais ou interações espaciais federativas, pois se realizam dentro dos parâmetros legais da arquitetura política da federação brasileira (GALLO, 2011, 2013). Neste contexto, as interações espaciais verticais ocorrem entre os municípios e outro nível da federação, o ente federado estado de São Paulo.

Para compreender este processo, buscamos analisar dados obtidos junto à Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo[15]. Estes dados correspondem a todas as transferências voluntárias realizadas entre o ente estadual e os 20 municípios da RMC, no período entre setembro de 2015 e agosto de 2016[16]. Conforme nossa proposta, teremos por recorte a materialização desses recursos de convênios no território, por isso, realizaremos uma diferenciação entre aqueles recursos que se transformaram em materialidades ampliando assim a densidade técnica do território (investimentos)[17], daqueles que têm por finalidade a manutenção de despesas municipais (custeios).

No gráfico 1 mostramos os valores liberados, por categoria, para cada município da RMC. Por conta da disparidade das cifras obtidas por Campinas, optamos por colocar o município em separado.

 

 

Percebem-se, de imediato, duas coisas, ao analisarmos o gráfico acima: i) os municípios com maior população[18], não, necessariamente, possuem maior quantidade de convênios firmados – excetuam-se aqui os municípios de Campinas (1.173.370 hab.), Americana (231.621 hab.) e Santa Bárbara d’Oeste (191.024 hab.); ii) com exceção de Holambra, Hortolândia e Morungaba, a maior parte das transferências voluntárias requeridas pelos municípios são as do tipo “custeio”.

O dinheiro empregado em custeio é utilizado para a aquisição de equipamentos de rápido fluxo, tais quais material hospitalar, material de escritório, combustíveis e materiais escolares. Este tipo de convênio é utilizado, também, para cobrir as despesas com salário. Ao analisar as tabelas de repasse para os 20 municípios da RMC disponíveis na página as Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo[19], é possível constatar que as Secretarias de Governo, de Educação e de Saúde de cada um são as principais solicitantes deste tipo de verba.

Cabe a nós uma análise detalhada sobre os convênios destinados a investimentos, entendendo, dessa forma, a constituição do território na medida em que incorpora todos os atores, tornando-se, portanto, numa totalidade fundada em duas matrizes: de um lado as materialidades e, por outro lado, constituídas pelas ações políticas. “O território usado, visto como uma totalidade, é um campo privilegiado para a análise na medida em que, de um lado, nos revela a estrutura global da sociedade e, de outro lado, a própria complexidade do seu uso” (SANTOS et al., 2000, p. 12)[20].

O município de Americana recebeu, no período, R$ 230.000,00 destinados a investimentos. Toda essa verba foi requerida pela Secretaria de Desenvolvimento Social do município para a construção de duas obras: aquisição de equipamentos para a Associação Regional de Atletismo Centro/Norte (R$ 80.000,00) e reforma do prédio da Associação de Promoção ao Menor de Americana – APAM (R$ 150.000,00).

Arthur Nogueira foi contemplado com R$ 1.279.186,94 em convênios para investimentos. Destes, R$ 1.142.186,94 foram destinados para a Secretaria de Educação para a construção de uma creche. A Secretaria de Desenvolvimento Social recebeu R$ 137.000,00 para a aquisição de equipamentos para a Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais.

Em Campinas, R$ 499.072,38 foram destinados, em sua totalidade, à Secretaria de Desenvolvimento Social. R$ 100.000 foram utilizados para a compra de equipamentos para o Grupo Primavera. Com este intuito, também foram utilizadas verbas de convênios pela Associação Nazarena de Assistência Beneficente (R$ 89.623,00), Associação Pestalozzi de Campinas (R$ 49.461,18), Associação Promocional Oração e Trabalho (R$ 50.000,00) e Lar dos Velhinhos de Campinas (R$100.000,00).

O município de Engenheiro Coelho recebeu R$ 606.705,64 em convênios para investimentos. A Secretaria de Desenvolvimento solicitou para R$ 40.000,00 para a aquisição de equipamentos de natureza permanente. Outros R$ 566.705,64 foram destinados para a Secretaria de Educação para a construção de uma creche.

O município de Holambra recebeu R$ 5.062.807,47 para investimentos. Para a construção de uma creche, a Secretaria de Educação solicitou R$ 566.705,64. A Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude, com o recurso, reformou o ginásio municipal (obra de R$ 200.000,00) e o campo de futebol municipal (R$ 100.000,00). Pela Secretaria de Justiça, Defesa e Cidadania foram utilizados R$ 1.096.198,70 para a revitalização e desassoreamento do Lago Holandês. Para a construção de uma estação elevatória de água, foram utilizados R$ 1.660.000,00 pela Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos. Por fim, a Secretaria de Turismo utilizou R$ 1.459.903,13 divididos entre a construção da Cidade das Crianças (R$ 250.904,69), a construção da Praça do Moinho dos Povos Unidos (R$ 30.000,00), a construção de três fontes luminosas (R$ 42.513,51), a colocação de lâmpadas de LED nos postes públicos (R$ 31.261,85), o recapeamento de diversas ruas do município (R$ 142.223,08) e a remodelação da Alameda Maurício de Nassau (R$ 943.000,00).

Em Hortolândia, os investimentos somaram R$ 1.730.194, 60 em convênios. Para a aquisição de equipamentos de natureza permanente, para o centro comunitário São Pedro, a Secretaria de Desenvolvimento social utilizou R$ 29.436,00. A Secretaria de Educação utilizou, por sua vez R$ 1.700.758,60 para a construção de uma creche.

Indaiatuba firmou R$ 1.944.865,19 em convênios para investimentos. A Secretaria de Desenvolvimento Social destinou, para aquisição de equipamentos de natureza permanente, R$ 100.000,00 para a APAE e R$ 50.000,00 para o Educandário Deus e a Natureza. A Secretaria de Educação utilizou R$ 163.169,56 para aquisição de equipamentos para natureza permanente e outros R$ 1.631.695,63 para a construção de uma creche.

Em Itatiba, foram liberados R$ 2.562.678,26 para investimentos.  A Casa Civil utilizou R$ 800.000,00 para a construção de duas pontes sobre o rio Jacaré e R$ 1.000.000,00 para o recapeamento de via públicas. Pela Secretaria de Educação R$ 652.678,26 foram destinados para a construção de uma creche. E pela Secretaria de Saúde, foram utilizados R$ 110.000,00 para a aquisição de equipamentos de natureza permanente.

O município de Monte Mor recebeu R$ 2.888.201,05 em convênios do tipo investimento. Foram R$ 591.265,63 solicitados pela Casa Civil para pavimentação de vias. Pela Secretaria da Educação R$ 1.376.285,15 foram utilizados para a construção de uma creche e outros R$ 161.915,90 para a compra de material de natureza permanente. Pela Secretaria de Governo, outros 758.734,37 foram solicitados, também para pavimentação de vias.

Em Morungaba, R$ 7.437.598,50 foram destinados para investimento. A Secretaria de Educação utilizou R$ 1.047.853,71 para a construção de uma creche. Para obras de infraestrutura da Secretaria de Habitação, foram utilizados R$ 200.000,00. A Secretaria de Turismo utilizou R$ 1.670.072,25 na construção de um anfiteatro na Praça dos Italianos, R$ 98.734,31 para a construção do centro do artesanato, R$ 515.563,00 para a construção da infraestrutura da estância turística de Morungaba, R$ 104.973,80 para a reforma do Centro Cultural Sobrado Amalf, R$ 253.129,39 para a reforma e revitalização do Lago dos Italianos, R$ 58.919,04 para a reforma e revitalização do Parque Ecológico, R$ 63.990,45 para a revitalização de pontes, R$ 1.547.399,2 para revitalização dos passeios públicos e pontos turísticos, R$ 1.341.243,41 para a revitalização das praças, R$ 60.391,88 para a sinalização de vias públicas da área central e R$ 475.327,99 para a urbanização de pontos turísticos.

Em Nova Odessa houve o requerimento de R$ 623,974,81 em convênios para investimentos. A Casa Civil utilizou, para a ampliação e duplicação do segundo trecho da rodovia Rodolfo Kivitz, R$ 573.974,81. Já para a aquisição de equipamentos de natureza permanente para a APAE, a Secretaria de Desenvolvimento Social investiu R$ 50.000.

Pedreira recebeu R$ 400.000 em convênios para investimento. Para a aquisição de equipamentos para o Lar dos Velhinhos, a Secretaria de Desenvolvimento social investiu R$ 100.000,00. Por sua vez, a Secretaria de Governo reformou e cobriu a quadra poliesportiva municipal, num investimento total de R$ 300.000,00.

Em Santa Bárbara d’Oeste, os convênios destinados a investimentos atingiram a cifra de R$ 2.021.299,00. A Casa Civil investiu R$ 100.000,00 na revitalização da praça Dona Carolina. R$ 50.000,00 foram investidos pela Secretaria de Desenvolvimento Social para a compra de materiais permanentes para a APAE. Na Secretaria de Educação, R$ 1.671.299 foram utilizados para a construção de duas creches. A Secretaria de Esportes, Lazer e Juventude utilizou R$ 100.000,00 para a construção de uma quadra poliesportiva e o mesmo valor para a reforma da praça de esportes Antonio Gomes Cardoso.

Em Santo Antonio de Posse, R$ 50.000,00 foram liberados para a Aquisição de equipamentos para o Lar São Vicente de Paulo, através da Secretaria de Desenvolvimento Social.

No município de Sumaré, houve o investimento da Secretaria de Desenvolvimento Social, no valor de 58.320,00, para a aquisição de equipamentos permanentes do Centro Educacional Rebouças.

Em Valinhos, os convênios para investimentos liberaram recursos no valor de R$ 1.403.568,96. A Secretaria de Agricultura e Abastecimento investiu R$ 332.633,52 na reabilitação de estradas rurais do município. R$ 946.583,42foram utilizados pela Casa Civil para a duplicação do primeiro trecho da avenida Joaquim Alves Corrêa. Pela Secretaria de Desenvolvimento Social foram repassados R$ 94.352,02 para a associação beneficente Instituto Vida e R$ 30.000,00 para a Casa da Criança e do Adolescente. Ambas as verbas destinadas à aquisição de equipamentos de natureza permanente.

O município de Vinhedo solicitou R$ 64.098 em investimentos, através da Secretaria de Desenvolvimento Social, para a aquisição de equipamentos de natureza permanente para a ARCA- Associação de Responsabilidade Cristã e Assistencial.

Os municípios de Cosmópolis, Jaguariúna e Paulínia não solicitaram convênios com o estado de São Paulo na categoria investimento.

Após esta descrição, como se percebe, o principal alvo dos repasses oriundos do governo paulista na categoria investimento se deu, sobretudo, para a aquisição de equipamentos para instituições sociais. Os números analisados correspondem, justamente, com a afirmação da Diretoria de Convênios e Contratos do município de Campinas, que havia chamado nossa atenção para o fato de que as Secretarias de Desenvolvimento Social dos municípios são as principais solicitantes de convênio com o governo estadual[21].

No intuito de permitir uma análise comparativa, o gráfico 2, no mesmo padrão do anterior, ilustra a dimensão dos valores conveniados entre os municípios da RMC e o Governo Federal. Os municípios de Monte Mor, Paulínia e Santo Antonio de Posse não realizaram convênios com o governo federal no período estudado e por conta disso não aparecem no gráfico.

 

 

Se compararmos os valores repassados na rubrica “Investimento” aos municípios da RMC pelo estado de São Paulo e pela União, é possível perceber que a maior parte dos convênios para investimentos em obras são oriundos do governo federal. Assim,

é possível observar que a estrutura montada para as Transferências Voluntárias [convênios] de recursos federais, funciona como um mecanismo que pode se configurar em promotor de novas seletividades e hierarquias entre os lugares, reafirmando os espaços luminosos e os espaços opacos (SANTOS, 2002) do território (GALLO e GOMES, 2012, p. 182).

No quadro 1 reunimos os dados de convênios firmados entre os municípios da RMC e o estado de São Paulo e entre os municípios da RMC e a União, no intuito de mostrar sua representatividade mediante a arrecadação própria de cada município. Podemos perceber que em alguns casos (como em Engenheiro Coelho e Morungaba) a relevância dos convênios é tão significativa para o orçamento municipal que podem atingir cifras maiores do que a arrecadação própria de alguns municípios.

 

 

O mapa 1, organizado em quantil, a seguir, ilustra o quadro acima, mostrando a parcela de representatividade dos convênios federais e estaduais perante o orçamento de cada município da RMC.

 

 

Conforme o mapa, podemos perceber a relevância da distribuição dos recursos, oriundos tanto da União (com maior aplicação na categoria de investimentos), quanto do estado de São Paulo (em sua maioria, destinados à categoria de custeio) na composição orçamentária dos municípios. Portanto, sugere-se que do ponto de vista federativo não se pode compreender as dinâmicas locais sem uma mais justa compreensão das articulações entre as escalas de poder (GALLO, 2011). Para Vainer (2006, p. 28) “o poder, mais do que nunca [...] está na capacidade de articular escalas, de analisar e intervir de modo transescalar”. Isso é complementado por Harvey (2005), para quem a atenção não deve ser dirigida apenas ao governo local, pois o poder de organização da vida de uma cidade muitas vezes está em outra parte, em coalizões de forças mais amplas, em que o governo e administração locais desempenham apenas papel facilitador e coordenador.

 

 

5. Considerações finais

A Constituição Federal de 1988 garantiu aos municípios autonomia e competências exclusivas (inclusive tributária) para tratar de determinados assuntos, estabelecidos constitucionalmente como próprios a cada ente.  Entretanto, as demandas por recursos nem sempre coincidem com os recortes institucionais, o que só dificulta as ações integradas, pois “para cada município incluso no arranjo metropolitano há um conjunto de atores correspondentes, ampliando, de igual forma, a base de conflitos” (ARRAIS, 2012, p. 10). Conforme Arrais (2012, p. 7-8),

A Constituição Federal e as Constituições Estaduais reafirmam a autonomia municipal financeira, administrativa e política. É nessa convergência entre a irrestrita autonomia municipal, como escala de poder, e a possibilidade de construção de outra escala, prevista de forma marginal no pacto federativo, que se localizam alguns dos problemas de gestão dos espaços metropolitanos. Os dilemas se expressam, claramente, no difícil funcionamento dos conselhos metropolitanos e na falta de recursos para compor os fundos para o desenvolvimento metropolitano. Ao que tudo indica, o que resta para as regiões metropolitanas, para além dos passivos institucionais, são problemas que insistem em demandar ações conjuntas.

Em concordância com Ribeiro (2004), podemos afirmar que este processo de regionalização se apresenta como uma ação política, pois segundo a autora, regionalizar é “a expressão espacial dos interesses e das práticas de distintos agentes” (p. 200), e entre estes agentes pode-se ter o Estado, grandes corporações e atores civis. Diante desta complexidade, é importante ressaltar a impossibilidade de se ter a regionalização, enquanto instrumento do planejamento, como um processo neutro, pois envolve ideologia e ações político-administrativas, sendo cada vez mais forte a influência de agentes privados nas políticas públicas ou de outros entes (tais como o ente estado de São Paulo), nas políticas públicas de perfil metropolitano. Tal debate já foi apontado por Circe Monteiro (2007), segundo esta autora “não podemos mais continuar considerando o planejamento como produto da razão, consciência e seriedade de seu formulador, - como um processo neutro e mediador dos conflitos, mas sim como resultado dos interesses de quem o promove” (p. 47).

Inclusive, a inserção de algum município em uma região metropolitana pode, segundo Arrais (2012, p. 19), conter interesses por participações em ações governamentais, a nível estadual ou federal, permitindo ao ente situação privilegiada, deixando a ação de cooperação intermunicipal em segundo plano.

Por outro lado, a criação de Autarquias estaduais, tais como a AGEMCAMP (Agência Metropolitana de Campinas), pode permitir a integralização entre a organização, o planejamento e a execução das funções públicas de interesse comum na região metropolitana, bem como a fiscalização das execuções das leis que dispõem sobre regiões metropolitanas e suas respectivas sanções, angariando, desta forma, recursos para investimentos de interesse metropolitano e intermunicipal. No entanto, é importante mencionar que na RMC o papel desempenhado por esta Agência é, praticamente, superficial, já que os investimentos realizados por meio do FUNDOCAMP – Fundo de Desenvolvimento Metropolitano de Campinas são relativamente baixos e destinados a obras que, muitas vezes, têm pouca relevância para a integração territorial metropolitana.

Os convênios tornam-se importantes estratégias para a composição do orçamento anual dos municípios brasileiros, sobretudo daqueles com pouco percentual de arrecadação de tributos, já que possibilitam uma ampliação da densidade técnica em seu território.

Grande parte dos convênios, tanto na categoria custeio, quanto em investimento é destinada à manutenção do Sistema Único de Saúde – SUS. Embora essas transferências não sejam constitucionais, elas são regidas por uma legislação própria detalhada. O que, segundo Ferreira e Bugarin (2007), “poderia ser argumentado que tais gastos do governo federal não seriam corretamente classificados como transferências voluntárias” (p.275).

Ademais, após a análise dos dados colhidos durante a pesquisa, ficou evidente, ao compararmos os valores repassados na chancela de “Investimento” aos municípios da RMC pelo estado de São Paulo e pela União, é possível perceber que a maior parte dos convênios para investimentos em obras são oriundos do governo federal. Fato que nos faz compreender, conforme Gallo e Gomes, (2012) que a estrutura montada para as transferências voluntárias de recursos federais “funciona como um mecanismo que pode se configurar em promotor de novas seletividades e hierarquias entre os lugares, reafirmando os espaços luminosos e os espaços opacos (SANTOS, 2002) do território”. (p. 182). Assim, ao governo estadual são solicitadas, em maior parte, cifras voltadas para a categoria “custeio”, destinadas principalmente para aquisição de materiais de rápido uso e repasses financeiros.

 

 

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[1] Os autores agradecem à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), pela bolsa de Iniciação Científica (processo nº 2016/05046-7) que possibilitou a realização de partes desta pesquisa.

[2] Desde a Constituição Federal de 1988 os municípios passaram a deter uma autonomia tributária muito superior aos períodos anteriores já que o texto da Carta Magna de 1988 lhes conferiu poderes até então não experimentados. Entretanto, na doutrina jurídica brasileira muitas são as discussões acerca da efetiva autonomia política conferida aos municípios. Silva (1998, p. 475) entende que o município seria um componente da federação, mas não entidade federativa. Para ele, “não é porque uma entidade territorial tenha autonomia político-constitucional que necessariamente integre o conceito de federação brasileira”[2]. Além disso, destaca que entre outros requisitos das unidades federadas, os municípios não dispõem de Poder Judiciário próprio ou representante exclusivo no Senado Federal. O mesmo argumento é apresentado por Fernanda Alves (2001, p. 146) ao explicar a questão da participação ou não dos municípios na federação nacional. Segundo a autora, embora a Constituição de 1988 declare os municípios membros da Federação com competências exclusivas e capacidade de autoconstituição, “[...] não previu sua participação na formação da vontade central, como ocorre com os Estados e o Distrito Federal por meio do Senado Federal. Falta, assim, um dos requisitos que a doutrina arrola na caracterização do ente federativo”. No entanto, convém apontarmos que este é um debate que não é o cerne deste artigo. Para maiores esclarecimentos sobre este debate, sugere-se a consulta às obras: em Baracho (1982), Clève (1993), Affonso (1995), Camargo (2001), Souza (2005), Tavares (1997).

[3] Para Dweck (2005, p. 4) a “atribuição de competência legal para o exercício das funções governamentais, representa a distribuição do poder, logo, depende da configuração das forças políticas existentes na sociedade. Em geral as competências podem ser classificadas em três categorias: exclusiva, concorrencial e supletiva ou complementar. No primeiro caso o poder é conferido a uma das esferas de governo, ficando o mesmo automaticamente vedado às demais [...]. A competência concorrente é aquela exercida simultaneamente por vários níveis de governo, em graus e formas diferentes [...] que congregam atividades relativas às três esferas de governo. Já a competência supletiva estabelece que a provisão dos bens e serviços é fruto de uma ação conjunta e complementar entre as diferentes esferas de governo”. Para um maior aprofundamento no que tange às competências tributárias de cada ente federado brasileiro sugerimos a consulta aos trabalhos de Arretche (2012, 2005), Garson (2009), Rodrigues (2006), Gallo (2011).

[4] Para maior detalhamento das transferências constitucionais entre entes, ver Gallo (2011)

[5]Artigo 158 da Constituição Federal Brasileira de 1988, disponível em:http://www.jusbrasil.com.br/topicos/10665434/artigo-158-da-constituicao-federal-de-1988

[6]Artigo 255 da constituição do Estado de São Paulo, disponível em:http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/dh/volume%20i/constituicao%20estadual.htm

[7] Fonte dos dados: https://www.fazenda.sp.gov.br/

[8]Lei nº 1715 de 25 de novembro de 1998, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9715.htm

[9] Conforme o Banco Central do Brasil, para fins de comparação, em 31 de agosto de 2016: € 1,00 = R$3,61 ou US$ 1,00 = R$3,23. Fonte: http://www4.bcb.gov.br/pec/conversao/conversao.asp. Acessado em 28 de dezembro de 2016.

[10]Disponíveis em: https://www.tesouro.fazenda.gov.br/-/area-tematica-4-financas-estaduais-e-municipais Acesso em 05/12/2016.

[11] No trabalho de Ferreira e Bugarin (2007) as transferências voluntárias (convênios) são de melhor forma explicadas por variáveis políticas do que variáveis que mensuram as diferenças sociais e econômicas entre as regiões. Todos estes autores encontram evidências que confirmam os efeitos do alinhamento político sobre o maior recebimento, em média, de transferências voluntárias (convênios) entre governo federal e os governos subnacionais, bem como seu impacto sobre os resultados eleitorais na esfera municipal.

[12]Conforme dados do IBGE (2010), a participação do Estado de São Paulo no PIB brasileiro por setor é dividida em: 7% da produção agrícola; 40% da produção industrial e 34% de serviços.

[13]O Manual de Formalização de Convênios com as Prefeituras disponível pela internet http://www.planejamento.sp.gov.br/(acesso em 15/12/2016) é um documento que explica as diversas fases a serem percorridas e orienta as prefeituras sobre a forma de organizar os documentos a serem apresentados. A solicitação deve ser direcionada ao governo do Estado (UAM), conforme o manual, e uma vez autorizada, a SPG comunicará o atendimento ao pleito e solicitará ao município a documentação administrativa e técnica necessária à formalização do convênio, por meio dos Escritórios Regionais de Planejamento. Há 13 escritórios regionais da UAM no Estado: Araçatuba, Baixada Santista, Barretos, Bauru, Campinas, Central, Franca, Marília, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São José do Rio Preto, São José dos Campos, Sorocaba e Vale do Ribeira.

[14]Fonte das informações: http://www.planejamento.sp.gov.br/ Acesso em 15/12/2016.

[15]Disponíveis em: https://www.fazenda.sp.gov.br/ Acesso em:  15/12/2016.

[16]Ficam disponíveis para consulta, na página da Secretaria da Fazenda, os dados sobre recursos liberados em até um ano anterior em relação ao dia vigente. Entendendo que em período eleitoral há o congelamento de liberação de verbas, e no ano de 2016 ocorreram as eleições municipais, optamos por manter os dados atualizados até o mês de agosto, onde esta pesquisa ainda se encontrava em estágio inicial.

[17] Entendemos que a ampliação da densidade técnica na RMC (entendidas como sendo desde as grandes obras de engenharia, os objetos técnicos modernos e os aparelhos de realização da cidadania, tais como, hospitais, postos de atendimento básico de saúde, escolas, creches e Universidades) ocorre de forma heterogênea, isto é, alguns pontos do território metropolitano recebem mais investimentos em relação a outros, fato este que acaba por gerar uma desigualdade nesta escala.  Isto aponta que tal distribuição não é isenta ao quadro institucional federativo brasileiro, ou seja, a distribuição pelo território (seja nacional, estadual, metropolitano ou municipal) obedece não só a uma localização racionalizada por caracteres técnicos, mas também por escolhas estabelecidas em razão do próprio ser da federação, isto é, os pactos políticos.

[18]Levando em consideração as estimativas da população residente nos municípios brasileiros com data de referência em 1º de julho de 2016, disponível em http://www.ibge.gov.br/Estimativas_de_Populacao/Estimativas_2016/estimativa_2016_TCU.pdf, consultado em 19/12/2016.

[19]Fonte dos Dados: https://www.fazenda.sp.gov.br/TransferenciaVoluntaria/Sistema/Novo/PaginaInicial.aspx Acesso em: 04/08/2016.

[20] A análise detalhada dos investimentos que apresentamos na sequência do texto, município a município da RMC, num primeiro momento pode parecer uma leitura cansativa, no entanto, optamos pela apresentação na forma de texto corrido (e não em tabelas) justamente para evidenciar os detalhes de cada um dos convênios repassados e, com isso, apontar como o dinheiro público se materializa no lugar, ou seja, como este recurso se incorpora ao território na forma de materialidades, objetos técnicos que ampliam o dinamismo dos lugares.

[21] Em entrevista realizada em 02 de dezembro de 2016.

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