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CIDADES, Comunidades e Territórios

versão On-line ISSN 2182-3030

CIDADES vol.44  Lisboa jun. 2022  Epub 15-Jun-2022

https://doi.org/10.15847/cct.25412 

ARTIGO ORIGINAL

Retornar, não retornar ou circulação entre lugares? Diferentes práticas migratórias e seus impactos no presente e no futuro de um lugar de partida (aldeia de Montesinho)

Return, not return or movement between places? Different migratory practices and their impacts on the present and future of a place of departure (Montesinho village)

João Baía1 

1Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, Portugal. E-mail: joaobaiacosta@hotmail.com.


Resumo

A decisão entre realizar ou não uma migração de retorno de carácter definitivo, a opção pela circulação, ou a impossibilidade de escolher serão problematizadas neste artigo que propõe uma tipologia das trajetórias e práticas migratórias para repensar sobre as estratégias residenciais dos migrantes e as mobilidades multilocais entre diferentes lugares de um ou mais países. Perscrutaram-se trajetórias migratórias iniciadas entre as décadas de 1960 e 1970 e procurou-se identificar alguns dos fatores que influenciaram as diferentes escolhas e quais pesaram mais na decisão de retornar, permanecer, ou circular entre diferentes lugares. A tipologia formulada a partir de um contexto específico, do lugar de partida e das múltiplas ligações entre este lugar e outros lugares em Portugal e na Europa possibilitou indicar e questionar algumas das causas que terão determinado uma maior ou menor rigidez/fluidez das práticas migratórias. As migrações deste ciclo migratório que tiveram um forte impacto no passado, presente e futuro destes territórios que viram partir grande parte da sua população, serão analisadas a partir do estudo das (i)mobilidades de um lugar, aldeia de Montesinho, que serve de estudo de caso para pensar em algumas políticas possíveis que contribuam para o desenvolvimento destas regiões, que aproveitem algum do investimento realizado pelos emigrantes nos lugares de onde partiram e que atraiam população para estes territórios. Com a pandemia e as alterações climáticas provocadas pelo aquecimento global, o debate sobre a gestão destes territórios volta a ganhar centralidade e este artigo poderá ser um contributo para a necessária reflexão e intervenção.

Palavras-chave: práticas migratórias; (i)mobilidades; migração de retorno; migrações internas; translocalismo

Abstract

The decision between carrying out a definitive return migration or not, the option for circulation, or the impossibility of choosing will be discussed in this article, which proposes a typology of practices and trajectories to rethink about the migrants' residential strategies and multilocal mobilities among different places in one or more countries. Migration trajectories initiated between the decades of 19(60) and 19(70) were examined and was tried to identify some of the factors that influenced the different choices, and which weighed more in the decision to return, stay or circulate among different places. The typology formulated from a specific context, the place of departure and the multiple connections between this place and other places in Portugal and Europe made it possible to indicate and question some of the causes that will have determined a greater or lesser rigidity/fluidity of migratory practices. These migration cycle which provoked a strong impact in the past, present and future of the territories, that saw the departure of a great part of population will be analysed departing from the (im)mobilities from one place, Montesinho village, which could constitute a study case to think about possible policies which could contribute to the development of these regions, profits of the emigrants investment in departure places and attract people to these same territories. The pandemy and climatic changes provoked by global warming give more centrality to the gestion of these territories and with this article we hope to help to the urgent reflection and action.

Keywords: migratory practices; (im)mobilities; return migration; internal migrations; translocalism

Introdução

As migrações internas e internacionais podem ser estudadas a partir do estudo de um lugar de partida e das relações, fluxos e práticas que ligaram e continuam a ligar um dado lugar a diferentes lugares. Este artigo pretende contribuir para o estudo das migrações a partir da sociedade de partida, e a partir da antropologia, porém, procura um diálogo estreito com outras disciplinas que também se debruçam sobre as migrações, como a sociologia, geografia e história.

A realização de trabalho de campo nos verões de 2015, de 2016 e de 2017 e no inverno de 2017 num lugar fronteiriço transmontano, aldeia de Montesinho, localizada no norte do concelho e do distrito de Bragança (figuras 1, 2 e 3), permitiu compreender alguns dos efeitos e das causas das mobilidades e das imobilidades e conhecer as práticas dos migrantes no presente e num tempo longo. Os mapas da figura 1 mostram a distância em relação à capital do país e a proximidade com a fronteira luso-espanhola. Nas figuras 2 e 3 constam fotografias da aldeia com uma perspectiva muito aproximada, com o Alto do Falgueirão à direita e que dá conta de algumas mudanças a que este território assistiu entre 1958 e 2016. Observa-se um aumento do número de casas e, ao mesmo tempo, a manutenção do espaço ocupado pelas casas e hortas, além de uma diminuição notória da área cultivada à volta do núcleo habitacional.

Figura 1 Localização da aldeia de Montesinho retirado da carta de enquadramento regional do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas 

Fototeca do CEG da Universidade de Lisboa. Cota: 1958-X-36, Trás-os-Montes - Serra de Montesinho, 7495

Figura 2 Fotografia da aldeia de Montesinho do geógrafo Orlando Ribeiro 

Figura 3 Fotografia da aldeia de Montesinho do autor tirada durante o trabalho de campo a 25 de Agosto de 2016 

Este lugar é um nó de múltiplas redes pessoais que se vão reconfigurando ao longo do tempo. Apesar do trabalho de campo se ter realizado nos anos referidos e a situação presente da aldeia condicionar a forma como os informantes percepcionam o passado e o futuro, procurou-se, através das memórias de quem ficou e de quem saiu da aldeia, reconstituir as trajectórias migratórias e as trajectórias não migratórias. Para isso realizaram-se 32 entrevistas semiestruturadas com uma forte componente biográfica. Considera-se que esta técnica da metodologia adoptada se situou entre a história de vida e a entrevista semiestruturada, procurando que todas as questões relevantes fossem colocadas. Optou-se nesta publicação pela anonimização dos participantes no estudo, através do uso de nomes fictícios, por questões relativas à sua segurança, uma vez que se poderia identificar quais as casas ocupadas e vazias durante o ano.

O processo de construção da amostra foi ao encontro de uma amostragem teórica (Glaser & Strauss, 1967, p.45-77) e em bola de neve, procurando representar os vários grupos que se foram considerando mais relevantes para uma maior compreensão do objecto ao longo do processo de investigação. Os entrevistados dos grupos etários sobre-representados têm a sua trajectória biográfica marcada pela forte emigração do ciclo migratório das décadas de 1960 e 1970 que se pretendia focar mais neste estudo, constituindo uma amostragem que tem em conta os processos e as temporalidades que se pretendem estudar (Hergesell, Baur & Braunisch, 2020). Se no início se procurou entrevistar pessoas que emigraram para França1, decidiu-se numa fase posterior alargar a amostra a pessoas que emigraram para outros países e que realizaram migrações internas (Glaser & Strauss, 1967, p.45-77).

Das entrevistas realizadas, 27 foram realizadas na aldeia de Montesinho, quatro foram realizadas em duas aldeias do outro lado da fronteira e uma na aldeia vizinha de Portelo. Os informantes que emigraram, saíram do país nas décadas de sessenta e setenta do século XX. Em relação ao género dos informantes escolhidos para participarem no estudo 14 correspondem ao sexo feminino e 18 ao sexo masculino. Apesar das idades dos participantes nesta pesquisa estarem compreendidas entre os 50 e os 95 anos, os grupos etários mais representados na amostra são os que se situam entre os 60 e os 69 anos de idade, contando com 9 participantes, e entre os 70 e os 79 anos de idade, com 14 participantes (Figura 4). Quanto à escolaridade, a maioria terminou o primeiro ciclo do ensino básico.

Figura 4 Caracterização da amostra com base no sexo, grupo etário e nível de instrução dos entrevistados 

No início da pesquisa em curso questionava-se se teria havido uma emigração em cadeia da aldeia de Montesinho para Pavillons-sous-Bois, situado na periferia de Paris, a norte de Montreuil, porque um morador desta aldeia tinha lá fundado a associação Casa de Trás-os-Montes.

Porém, ao longo do trabalho de campo percebeu-se que a realidade era mais complexa e que tinha havido diferentes cadeias migratórias para múltiplas direcções, sendo as de maior relevo: Glinde, perto de Hamburgo, na Alemanha; Paris e Pavillons-sous-Bois; Montluçon, perto de Clermont-Ferrand, que se situa no centro de França; Mieres e Madrid, em Espanha; e para dentro de Portugal, Lisboa, Estoril, Matosinhos e Bragança (Figura 5).

Figura 5 Mapa com indicação das cadeias migratórias estabelecidas a partir das aldeias de Montesinho a partir dos dados recolhidos neste projecto 

Os que efectuaram migrações internas e que mantêm contacto com a aldeia, na sua maioria ingressaram em diferentes forças policiais: Guarda-fiscal, Guarda Nacional Republicana, ou Polícia de Segurança Pública. Os homens que efectuaram migrações internacionais trabalharam sobretudo como operários fabris, trabalharam no sector da construção civil em França, no porto de Hamburgo, na Alemanha e nas minas das Astúrias, em Espanha. As mulheres que efectuaram migrações internacionais trabalharam em serviços de limpeza de casas particulares, de escritórios, edifícios públicos, prestaram cuidados domiciliários a pessoas idosas e trabalharam em fábricas. Entre as mulheres entrevistadas que emigraram para França, a maior parte teve experiência migratória anterior com direcção a Madrid para trabalhar no serviço doméstico e na restauração.

Entrevistaram-se pessoas que não emigraram e pessoas que saíram da aldeia para outro país ou para outra zona de Portugal que mantêm alguma ligação com o lugar de partida regressando sazonalmente, pontualmente ou definitivamente (Figura 6). Realizaram-se também quatro entrevistas do outro lado da fronteira para poder obter alguns elementos que servissem para compreender as transformações das redes sociais fronteiriças causadas pelos fluxos migratórios que não coincidiram no tempo, nem nos lugares de destino. Durante as estadias no terreno, as entrevistas semiestruturadas realizadas tiveram uma forte componente biográfica. Levou-se a cabo também análise documental em arquivos locais e pessoais, que serviu para uma maior compreensão do objecto de estudo, mas que não será analisada neste artigo. A informação recolhida ajudou a repensar a noção de retorno desenvolvida no estudo das migrações, nomeadamente da “return migration” (King, 2000; De Haas & Fokkema, 2010; Gmelch, 1980).

Figura 6 Caracterização do tipo de (i)mobilidades dos entrevistados  

Inicialmente tinha-se proposto recorrer à etnografia multi-situada, realizando trabalho de campo na sociedade de partida e de acolhimento, porém, quando se concluiu que a emigração foi efectuada em múltiplas cadeias com diferentes direcções optou-se por fazer trabalho de campo apenas no lugar de partida e focou-se sobre as trajectórias migratórias iniciadas entre as décadas de 1960 e 1970, possibilitando comparar as diferentes dinâmicas das migrações internacionais para diferentes países europeus com as migrações internas.

George Marcus propôs a etnografia multisituada, que implicaria:

(…) tracking movements of migrants transnationally in diaspora and exile, or the history of the circulation of objects and techniques or studying the relationships of dispersed communities and networks that define well-designated macro-processes in the global flow of capital and expertise” (Marcus, 2014, p.531).

As investigações baseadas na etnografia multisituada podem correr o risco de uma menor compreensão de cada contexto, de cada lugar com as suas relações de poder e formas de capital, impossibilitando, por vezes, um estudo mais denso sobre o impacto de uma determinada realidade num lugar, nomeadamente quando o tempo e os recursos para a realização da pesquisa são escassos.

Quando se estuda um lugar de forma aprofundada, tendo em conta os diferentes grupos que o compõem, num tempo longo poderá realizar-se o que o antropólogo Noel B. Salazar chama de etnografia glocal, que tenha em conta as diferentes escalas de análise e procure compreender como é que a escala global, nacional, regional e local se relacionam e variam de importância ao longo do tempo (Salazar, 2018, pp.18-19).

Michael Burawoy com o método do estudo de caso alargado junta a reflexividade à etnografia, de forma a compreender o global a partir do local, o macro a partir do micro. Burawoy considera ainda que o passado ligado ao presente permite antecipar o futuro. Este método implica uma reflexão teórica intensa e um diálogo permanente entre o teórico e o empírico (Burawoy, 1998, p.5).

Durante o trabalho de campo procurou-se implementar uma estratégia metodológica próxima do estudo de caso alargado de Burawoy (1998) e da etnografia glocal de Noel B. Salazar (2018).

Este artigo irá centrar-se mais na caracterização dos diferentes tipos de migração, no presente etnográfico dos períodos em que se realizou trabalho de campo, nas observações e reflexões anotadas no diário de campo e nas entrevistas realizadas. Procurar-se-á focar as diferentes modalidades de retorno e o não retorno e reflectir sobre a forma como os informantes descrevem a situação presente da aldeia e imaginam o futuro da aldeia.

Migrações internas e internacionais sob perspectiva translocal

Nos anos noventa uma vasta produção científica centrou-se em novos conceitos para olhar a mesma realidade através de outras perspectivas. O conceito de transnacionalismo, desenvolvido por Nina Glick-Schiller, Cristina Blanc-Szanton e Linda Bash, visava incluir na sua definição as práticas e os processos transnacionais. As autoras definem assim os processos transnacionais:

“The processes by which immigrants build social fields that link together their country of origin and their country of settlement. Immigrants who build such social fields are designated “transmigrants”, Transmigrants develop and maintain multiple relations-familial, economic, social, organizational, religious, and political that span borders. Transmigrants take actions, make decisions, and feel concerns, and develop identities within social networks that connect them to two or more societies simultaneously” (Bash, Glick Schiller, & Blanc-Szanton, 1992, p.2).

David Fitzgerald, no seu estudo sobre associativismo regional mexicano em cidades mexicanas e americanas, não encontrou grandes diferenças entre os migrantes internos e os internacionais e a relação que estabeleceram com o lugar de partida:

“Domestic migrations frequently evince the same decoupling of locality and culture that transnationalists proclaim as evidence of new ways of “being.” There is nothing inherently “transnational” about ties that create an imagined community encompassing both “here” and “there,” as the same relationship reoccurs within almost any domestic or international migratory context” (Fitzgerald, 2010, p.9).

Desde o surgimento e amplo desenvolvimento teórico e empírico em torno do conceito de transnacionalismo, tem crescido uma vontade partilhada entre diferentes perspectivas que buscam a ideia de glocalização (Roudometof, 2014), ou grounded transnationalism (Brickell & Datta, 2011), perpectivas que procuram realizar uma análise bottom-up, que tentam dar mais importância ao lugar e às relações entre os diferentes lugares, permitindo, a partir do estudo desses lugares, compreender dinâmicas locais, regionais, nacionais e globais. Os autores da obra Translocal Geographies: Spaces, Places and Connections inserem o translocalismo na reflexão que tem sido feita em torno do transnacionalismo:

“space where deterritorialized networks of transnational social relations take shape through migrant agencies. This means that translocality as a form of local-local relations exists primarily within the debates on transnationalism” (Brickell & Datta, 2011, p.3).

Partilha-se a posição dos autores que não recusam a importância dos debates e dos desenvolvimentos teóricos e empíricos em torno do conceito de transnacionalismo, porém, julga-se necessário destacar a importância da ligação entre diferentes lugares onde quer que estejam localizados.

Renato do Carmo e Charlotta Hedberg, na sua obra Translocal Ruralism Mobility and Connectivity in European Rural Spaces, consideram que a noção de “translocal” permite abordar questões como mobilidade e produção relacional do espaço, tornando central a mobilidade como uma forma de ligar e transformar lugares:

“A translocal perspective of space brings the activities of mobile actors, such as migrants, to the fore, not only through the activities that occur as they move but also through the consequences that are produced in space through this activity” (Hedberg & Carmo, 2012, p.3).

Nesta investigação, tal como Fitzgerald (2010), também se encontraram semelhanças entre as relações que os migrantes internos e internacionais estabelecem com o lugar de partida. Por isso, o estudo da relação e das práticas entre lugares de um ou mais países que o translocalismo propõe e possibilita pode ser mais abrangente do que o transnacionalismo, que se debruça sobre processos, práticas e relações estabelecidas entre diferentes países.

Russel King, Ronald Skeldon e Julia Vullnetari, num estudo de caso sobre migrações internas e internacionais albanesas, sublinham a escassez de investigações que cruzem os dois tipos de mobilidades, de forma a analisar as diferenças e similitudes das trajectórias migratórias e a relação entre elas, uma vez que a fronteira entre estes dois tipos de mobilidades não é estanque (King, Skeldon, & Vullnetari, 2008). O translocalismo permite estudar relações e práticas regulares estabelecidas entre lugares levadas a cabo pelos migrantes internos e internacionais; já o transnacionalismo, com toda a produção empírica e teórica sobre diferentes contextos, dá prioridade às relações entre diferentes países e às práticas dos migrantes internacionais.

Em Portugal, Alberto Alarcão (1969) e Lucinda Fonseca (1990) ainda hoje são referências que se destacam na parca produção científica nacional a nível teórico e empírico em torno das migrações internas. João Peixoto também se debruça sobre migrações internas realizadas durante a década de 1980 (1998). Se faltam mais estudos sobre migrações internas em Portugal, a falta de estudos que relacionem as migrações internas e internacionais ainda é mais notória. Estudar as mobilidades a partir do lugar de partida permite comparar as trajectórias dos migrantes internos e internacionais e o tipo de ligação mantida com o lugar de partida.

Retornar, permanecer ou circular? Exploração de uma tipologia

Os fluxos das várias fases do processo migratório foram condicionados e continuam a ser pelas governamentalidades migratórias dos países de partida e de chegada e pela maior ou menor capacidade dos migrantes contornarem esses mesmos constrangimentos. O retorno pode ser uma escolha ou uma inevitabilidade, pode ser um desejo partilhado pela família, ou individual. A decisão que numa altura parecia definitiva pode deixar de ser com algum acontecimento disruptor como doença incapacitante, morte de um cônjuge, doença de familiar que necessite de apoio permanente, nascimento de netos e necessidade de apoio no cuidado aos mesmos. O retorno pode não ser a fase derradeira, o fim de um percurso, e passar a ser mais uma fase da trajectória migratória, seguida de uma remigração para a cidade mais próxima do lugar de partida ou para a cidade para onde migraram.

Porém, procurar-se-á identificar os factores que influenciaram as diferentes decisões e quais pesaram mais na decisão de retornar ou não, ou manter-se entre cá, lá e acolá, isto é, optar por circular entre diferentes lugares e por vezes, entre mais do que dois lugares.

Ao longo do trabalho de campo percebeu-se que as estratégias residenciais dos que emigraram e as suas mobilidades poderiam ser multilocais ou translocais. Em vez de realizarem migrações de retorno definitivas, poderiam circular entre diferentes lugares de um ou mais países.

Para analisar os diferentes tipos de mobilidades propôs-se a tipologia que consta na Figura 7, que pretende focar todos os tipos de (i)mobilidades identificadas a partir de um lugar.

Figura 7 Tipologia proposta pelo autor com base na análise dos dados recolhidos nesta investigação 

Os tipos de (i)mobilidades encontradas dividem-se primeiro entre os que permaneceram e os que migraram. Entre os que migraram internamente e internacionalmente, encontraram-se diferentes tomadas de decisão e práticas migratórias em relação ao retorno.

Os que não retornaram e os que retornaram, subdividiram-se em diferentes tipos de práticas migratórias. Entre os que não retornaram, identificaram-se os que retornam esporadicamente (menos de cinco anos de ausência) e os que se ausentam de forma prolongada (durante períodos superiores a cinco anos). A partir das entrevistas concluiu-se que alguns irmãos e pais de participantes nesta pesquisa que emigraram, por exemplo para o Brasil, não retornaram e não visitaram a aldeia, nem vieram a Portugal durante um período superior a cinco anos, não participando na organização da festa da aldeia, vendendo a parte que lhes coube na herança. Porém, mantiveram contacto à distância com os familiares mais próximos.

Dos que migraram para França, direcção do maior fluxo, parte retornou e outra parte não, porém, é difícil perceber a dimensão do não retorno, uma vez que a investigação contou com a participação sobretudo de quem retornou ou ainda mantém uma ligação intensa e regular com a aldeia. Pelas entrevistas, percebeu-se que parte dos que emigraram para França, a maior parte dos que emigraram da aldeia, perderam ligação com a aldeia de partida, não retornaram, nem construíram ou reconstruiram casa na aldeia, nem a visitam há vários anos.

Os que retornaram dividem-se entre os que retornaram de forma definitiva e os que retornam de forma circular. Os que emigraram para a Alemanha e para a Suíça, e que foram todos entrevistados, retornaram de forma definitiva e a maior parte dos participantes no estudo que realizaram migrações internas também.

O retorno circular é realizado pelos migrantes internos e internacionais e assume duas formas: retorno circular pontual com regularidade anual (com estadias inferiores a dois meses) e retorno circular sazonal (com estadias superiores a dois meses). O retorno circular implica uma ligação translocal forte, uma regularidade, um envolvimento nas dinâmicas locais, apoio na realização da festa, manutenção de contacto ao longo do ano e é realizado por migrantes que investiram na casa que herdaram ou compraram.

O retorno circular pontual é realizado normalmente no mês de Agosto e o retorno circular sazonal varia de caso para caso, mas a tendência é residir nos meses mais quentes na aldeia de Montesinho e nos meses mais frios em Bragança, Estoril, Paços de Ferreira, Montluçon ou Paris.

Uma nuance interessante do retorno das migrações internacionais para Portugal e para a aldeia que se poderá analisar noutra oportunidade, é a possibilidade encontrada por alguns migrantes internacionais de retorno definitivo para Portugal, mas ao mesmo tempo circular entre diferentes lugares situados em Portugal. Retorno circular entre a aldeia de origem de cada cônjuge, ou entre a aldeia de origem e a cidade mais próxima, podendo dar origem a um novo tipo - retorno interno circular (pontual ou sazonal) - que poderá ser útil para o estudo do retorno das migrações internacionais, mas que não cabe nesta tentativa de análise cruzada entre as práticas migratórias internas e internacionais.

Contactos à distância e manutenção de laços translocais

Os que efectuaram migrações internas e internacionais a partir da aldeia transmontana em estudo, que retornaram de forma definitiva, ou que retornam pontualmente e sazonalmente e que continuaram a participar na dinamização da festa do lugar em estudo, na reabilitação e manutenção das casas, mantiveram-se em contacto à distância com os familiares que ficaram no lugar de partida durante as suas trajectórias migratórias.

Para além da manutenção do contacto com o lugar de partida existem outros factores que influenciam a decisão entre regressar ou não de forma definitiva ou circular entre diferentes lugares, como a percepção da qualidade dos serviços de saúde, a idade, ser proprietário de uma casa no lugar de partida e de chegada, ou só num dos lugares, ter levado a família consigo ou ter deixado os filhos em Portugal com os avós, custo de vida no país para onde emigraram, nomeadamente nas cidades, muito mais elevado do que na aldeia onde podem ter uma pequena horta e ter participado ou apoiado a organização da festa do santo padroeiro da aldeia.

Na aldeia de Montesinho a festa de Santo António é celebrada em Junho e em Agosto para dar a possibilidade aos que migraram encontrarem os seus familiares e conterrâneos.

A participação e apoio na realização da festa entre os migrantes internos e internacionais que retornaram e retornam de forma circular é muito semelhante nestes excertos em resposta à pergunta se já tinha sido mordomo da festa:

“Já. Já fui três vezes. Fui já não me lembro, fui depois em 2008 e voltei agora a ser no ano passado” (Artur dos Anjos, 68 anos em 2016 - Migrações Internas - Retorno circular sazonal).

“Sim, fui nomeado mordomo em 1992” (Miguel Gomes, 76 anos em 2015 - Emigração para França-Retorno e circulação entre diferentes lugares).

“Já fui mordomo três vezes. Desde que vim de França duas. Ainda fui no ano passado. Fui eu que arranjei o prémio ao meu irmão. Participo como toda a gente” (Jorge Gomes, 67 anos em 2015 - Emigração para França e para a Suíça - Retorno e circulação entre diferentes lugares).

O investimento na recuperação de uma casa herdada ou compra de uma casa na aldeia, tema já focado em trabalhos anteriores (Villanova, 1989; Cardoso, 2008; Saraiva, 2017), é um factor que mais tarde pode influenciar a decisão de retorno, encontrado nos dois tipos de migrações:

“Remodelei-a há 15 ou 20 anos” (Artur dos Anjos, 68 anos em 2016 - Migrações Internas - Retorno circular sazonal).

“Esta comprei. A gente tinha uma e esta foi comprada, mas era uma casa velha. Renovei. Essas obras demoraram três ou quatro anos” (António Ribeiro, 72 anos em 2015 - Emigração para França - Retorno circular pontual).

Com as devidas distâncias e diferenças importantes entre as migrações internas e internacionais, nomeadamente quando se migrou durante a ditadura do Estado Novo, ou seja, antes da revolução de 25 de Abril de 1974 e do início da livre circulação dentro do espaço Schengen, o contacto à distância era mantido tanto pelos migrantes internacionais, como pelos internos por carta e telefone e as férias serviam para fortalecer os laços:

“Sempre e telefonava. Escrever era uma vez por mês ou qualquer coisa. E quando a gente necessitava de escrever para comunicar isto ou aquilo (...). Os quatro anos que estive em Lisboa passei sempre as férias aqui na aldeia. Depois às vezes dava para juntar duas, três ou quatro folgas e também vinha cá. Praticamente cada três, quatro meses a gente já cá vinha fazer uma visita (Jorge Antunes, 67 anos em 2016 - Migrações Internas - Retorno definitivo para o lugar de partida).

“Vinha, vinha sempre de férias no mês de agosto (...). Aqui em Agosto costumava juntar-se tudo. Tinha um irmão que estava na Alemanha, tinha cunhados que estavam na França” (Miguel Torres, 71 anos em 2016 - Migrações internas - Retorno definitivo para o lugar de partida).

“Antes escrevia para os meus pais e para as minhas irmãs, mas depois já havia o telefone. Tinha de esperar que chamassem a minha mãe” (António Ribeiro, 72 anos em 2015 - Emigração para Montluçon, França - Retorno circular pontual).

“Era o posto de telefone público. Era o que havia. Quando houvesse uma urgência grande. Mas de resto no dia-a-dia era por carta. Cuido que quando cá tive os filhos era quase todas as semanas” (Ana Marques, 81 anos em 2016 - Emigração para Paris, França - Retorno definitivo para o lugar de partida).

Os migrantes internos e internacionais que retornaram definitivamente e os que retornam de forma circular investiram e mantiveram contacto regular com a aldeia e apoiaram a realização da festa da aldeia, como acontece noutras localidades portuguesas (Leal, 1996: pp. 583-589; Rocha-Trindade, 2013, pp. 161-176).

Enviaram remessas para apoiar os cuidados que os familiares necessitaram em idade mais avançada:

“Nunca os pudemos ter connosco. Nunca nos pudemos ocupar deles. Pudemos pagar a quem se ocupasse deles. Se não houvesse emigração, certamente não poderíamos” (Hélia Gomes, 67 anos em 2016 - Emigração para Pavillons-sous-Bois, França - Retorno circular sazonal).

E ajudaram no trabalho agrícola os que ficaram, quando vinham em agosto:

“Sim. Antes ficava só um mês. Como os meus pais ainda tinham a agricultura, eu vinha só para trabalhar para os ajudar, para ir ao feno, para ir à segada, para ir à malha” (António Ribeiro, 72 anos em 2015 - Emigração para Montluçon, França - Retorno circular pontual).

A partir da leitura destes excertos notamos que as práticas migrantes dos migrantes internos e internacionais entrevistados têm várias características em comum, como alerta Fitzgerald (2010).

(I)mobilidades a partir do presente

O transporte mais utilizado pelos migrantes que retornam de forma circular a estes lugares é o automóvel e os autocarros internacionais. Preferem o autocarro ao avião pelas razões explicitadas por uma das informantes e por apanharem menos transportes para chegar ao destino:

“Ah sim, há três, quatro carreiras por dia. Agora neste tempo. No inverno há três por semana. Às vezes mais. Ainda há muita gente que viaja. O avião no Porto não nos dá muito jeito. Porque temos de apanhar a carreira para cima depois. Ainda é a carreira que nos calha melhor” (Hélia Gomes, 67 anos em 2016 - Emigração para Pavillons-sous-Bois, França - Retorno circular sazonal).

A decisão familiar de retornar, nem sempre é consensual como podemos verificar nestes excertos:

“Em 2013 viemos pois. Depois arrependeu-se. Ele queria vir e eu não. Depois arrependeu-se mais ele do que eu” (Inês Reis, 71 anos em 2016 - Emigração para Montluçon, França - Retorno definitivo para a aldeia de origem).

O cálculo da reforma pode ser diferente no seio da mesma família, pois a ausência de vínculo contratual formal nas primeiras fases do processo migratório ou uma emigração mais tardia tem influência no montante que cada familiar pode receber mensalmente ao fim de certo número de anos de descontos. O regresso e a altura em que se regressa podem por isso gerar conflito no seio da família e variar consoante o género dos entrevistados:

“Eu não tinha a reforma, não queria vir. Queria estar até à reforma. Por seis anos tinha ficado até à reforma e ele não quis” (Inês Reis, 71 anos em 2016 - Emigração para Montluçon, França - Retorno definitivo para a aldeia de origem).

“Estive lá 27 anos na França. E ele esteve 31. Até que tivemos a reforma. Viemos para cá. Teve ele primeiro do que eu, porque ele era mais velho do que eu. Reformou-se e tive que vir para cá também (...). Dali, depois o meu marido foi para reforma. Para ele estar ali a olhar também se sentia mal. Nunca foi um homem de tabernas, nem de vícios, nem de andar por fora. Tive que vir, antes de ter a minha reforma completa, tive que vir” (Ana Marques, 81 anos em 2016 - Emigração para Paris, França - Retorno definitivo para o lugar de partida).

As decisões relativas à aplicação das poupanças ao longo da trajectória migratória negociada no seio da família também não eram consensuais, condicionando mais tarde o leque de opções em relação à decisão entre retornar, ou não:

“Quando viemos para aqui tínhamos uma casa boa. Tínhamos uma casa muito boa. E estou bem arrependida estava lá uma à venda, logo pelo lado de cima e eu dizia para o meu: “Oh António, se pudéssemos comprar” e ele “Oh filha, mas onde é que temos o dinheiro?”. A gente assim que recebia era só para mandar para aqui. Sempre a mandar para aqui. Mas podiam viver lá duas famílias naquela casa (...). Dali, depois o meu marido foi para reforma” (Ana Marques, 81 anos em 2016 - Emigração para Paris, França - Retorno definitivo para o lugar de partida).

“Nunca comprámos casa lá. Que ele não quis. Foi a asneira. Ainda insisti mais um bocadinho, porque eu gostava, mas ele nunca respeitou a minha vontade” (Inês Reis, 71 anos em 2016 - Emigração para Montluçon, França - Retorno definitivo para a aldeia de origem).

A questão de ter casa ou não nos diferentes lugares influencia a possibilidade de retornar de forma circular. Um dos migrantes internos entrevistados que retorna de forma circular sazonal investiu na compra de um terreno e na construção de uma casa no lugar para onde migrou e aponta o acesso aos cuidados de saúde e a falta de transportes como factores que pesam na decisão de regressar ou não de forma definitiva:

“Depois comprei lá o terreno, fiz a casa. Quer queiramos, quer não é outra vida que não é aqui. Se uma pessoa quiser ir ao médico ou a um sítio qualquer, transportes e tudo, é totalmente diferente. Não há comparações. Isto é bonito assim, mas... (Artur dos Anjos, 68 anos em 2016 - Migrações Internas - Retorno circular sazonal).

O lugar e país de residência dos filhos e netos também influencia a decisão. O apoio aos filhos na prestação de cuidados aos netos é mais referido como um factor importante a ponderar na decisão entre retornar, circular, ou não retornar e que foi mais focado pelas mulheres entrevistadas:

“No verão gosto de estar cá. Ao mesmo tempo também estou muito tempo sem ver os meus netinhos e as minhas filhas. Precisam lá da gente. Às vezes para dar uma ajuda. Estão os filhos doentes é preciso guardá-los, porque não podem ir assim para a creche” (Mariana Gomes, 69 anos em 2015, Emigração para Paris, França - Retorno circular sazonal).

“Quando os meus netinhos têm férias estou sempre lá para os guardar, mas ainda passo mais tempo lá do que cá” (Hélia Gomes, 67 anos em 2016 - Emigração para Pavillons-sous-Bois, França - Retorno circular sazonal).

A maior parte dos entrevistados, mesmo os que retornaram de forma definitiva, mantém ligação com o contexto migratório por razões familiares e por questões de saúde, preferindo os sistemas de saúde desses países.

“Eu agora passo mais tempo cá do que em França. Agora só vou lá ao médico. Quando temos assim qualquer coisa gosto mais de lá ir. Tenho mais confiança. É mais rápido e aqui às vezes para fazer qualquer coisa estamos o tempo todo à espera” (Jorge Gonçalves, 75 anos em 2015 Emigração para Paris - Retorno definitivo e circulação entre lugares).

“O sistema de saúde não se compara" (Mariana Gomes, 69 anos em 2015, Emigração para Paris, França - Retorno circular sazonal).

Entre os entrevistados que efectuaram migrações internas e retornaram definitivamente, há um que ainda se desloca ao Porto para ir a consultas médicas:

“Vou, de vez em quando vou. Quando tenho consultas por exemplo no Porto. Por exemplo no dia 8 de Setembro lá vou” (Miguel Torres, 71 anos em 2016 - Migrações internas - Retorno definitivo para o lugar de partida).

Estar entre cá e lá e circulação sazonal entre lugares é possível se houver recursos económicos para realizar as viagens e saúde, porém, nenhum informante indicou a falta de recursos económicos para deixar de circular entre o lugar ou lugares para onde migrou e o lugar onde reside actualmente.

As redes que se criaram no contexto migratório para além da rede inicial ligada ao lugar de partida, redes criadas na vizinhança e no contexto de trabalho não parecem ser um factor que isoladamente sirva para pesar no conjunto de factores que os migrantes têm em conta aquando da tomada de decisão pela migração circular.

Embora na maior parte dos casos haja uma quebra de contacto e um afastamento dessa rede da parte de quem retorna de forma definitiva, há dois exemplos que ilustram que parte dos que migraram ainda mantêm contacto com alguns membros dessas redes, mas à distância:

“Olhe com uma turca. Uma turca telefona-me e chora muito (...) Muito minha amiga a mulher” (Inês Fonseca, 77 em 2016, Emigração para Hamburgo, Alemanha - Retorno definitivo para o lugar de partida).

“É rara a semana que não me telefona duas ou três vezes. Disse-me ela: “Se eu tivesse aqui a senhora ao pé de mim. Já nunca mais nos juntámos. Éramos vizinhas. No Natal fazíamos o bolo rei em casa e tudo, que ela também é boa patissiére. Pronto coligávamos muito. Já só me resta essa. As outras já foi tudo” (Ana Marques, 81 anos em 2016 - Emigração para Paris, França - Retorno definitivo para o lugar de partida).

A circulação entre lugares ajuda a definir uma realidade que ultrapassa a lógica binária de um país e lugar de partida e de um país e lugar de acolhimento. No caso deste estudo apercebemo-nos que a realidade é mais complexa e que o retorno e o investimento numa casa podem ser realizados em mais do que um lugar. No caso das famílias das pessoas entrevistadas em que a família da esposa e a família do marido são oriundas de lugares distintos isto pode acontecer. O retorno pode ser para a cidade mais próxima da aldeia de onde partiram, para a aldeia do marido ou da esposa, que podem localizar-se em concelhos e distritos distintos, dando origem a uma circulação entre a casa dos filhos dentro e fora de Portugal, entre as casas que conseguiram recuperar nos lugares de partida. Bragança, a 20 km da aldeia de Montesinho é a cidade onde as pessoas da aldeia se deslocam com mais frequência para visitar familiares, para aquisição de bens, por questões de saúde, ou para tratar de alguma questão burocrática. Mesmo quem detém casa em Bragança preferiu viver na aldeia de forma definitiva:

“Nós temos casa em Bragança, mas nunca fomos para lá. Temos lá casa, mas sempre... Ah, eu Bragança não (...). Só se quando eu não puder por causa da saúde, que não me deixe sair às compras e que tenha de estar ali” (Inês Reis, 71 anos e marido em 2016 - Emigração para Montluçon, França - Retorno definitivo para a aldeia de origem).

“Quando viemos ainda fomos viver para Bragança. Mas depois a minha mulher: ‘Estávamos melhor na aldeia. Sempre podemos ter umas galinhas’. Pronto vamos para a aldeia, que mais nos faz estar na aldeia. Temos as mesmas condições que tínhamos em Bragança. Tenho aquecimento central, tenho lenha bastante. (...). Depois é que viemos viver para aqui. Fechámos a de Bragança. Vou lá todas as semanas ver o correio, ver como está aquilo, mas nós praticamente estamos aqui” (Filipe Roque, 76 anos, em 2015, Emigrou para França e mais tarde para a Alemanha - Retorno de forma definitiva para o lugar de partida).

Este último excerto mostra que as decisões que se apresentam em certo momento da trajectória migratória podem ser alteradas e que o ciclo migratório que se encerraria com o retorno para um lugar, pode não estar encerrado. Dora Sampaio, num artigo sobre envelhecimento de imigrantes nos Açores e processos de decisão relativos ao retorno, chega à mesma conclusão:

“More than fixed in time, return aspirations, ageing ‘here’ and/or ‘there’, are inevitably shifting, place induced and context-dependent. Understanding migrants’ rationales and demeanour towards return implies, above all, realizing the fluidity of migration decisions over space and time” (Sampaio, 2017, p.61).

Que futuro para os lugares de partida?

Julgo que poderá ser útil auscultar o que as pessoas que residem nestes territórios rurais com pouca população, ameaçados pelo isolamento, pelo desinvestimento em serviços públicos, pelo extractivismo e pelo perigo dos incêndios têm a dizer sobre a sua trajectória migratória, sobre o presente vivido e ouvir as suas recomendações para os da sua geração já envelhecida (com necessidades específicas a curto, médio prazo) poderem decidir voltar e permanecer, bem como os que emigraram há menos tempo. Se existiu financiamento para estudar a imigração, a imigração irregular, fenómeno que incide mais sobre as grandes cidades nomeadamente sobre a Área Metropolitana de Lisboa, por que não continuar a estudar a emigração recente e a mais antiga, as migrações internas e o seu impacto ao longo do tempo nestes territórios? Os emigrantes que retornam podem ser uma mais-valia para o desenvolvimento destes territórios se houver um acompanhamento dos mesmos em relação aos investimentos que poderão fazer no lugar de origem. As experiências e aprendizagens que trouxeram de fora, ao nível laboral, linguístico, poderão trazer novos valores, novos modos de olhar, que poderiam ajudar a diminuir as desigualdades entre o interior e o litoral.

As redes transfronteiriças, que perderam força com as migrações para fora efectuadas dos dois lados da fronteira com diferentes direcções e desencontradas no tempo, voltam hoje a ter importância, assumindo novas funções e características, sem assumirem, no entanto, a importância do período anterior à década de 1970. Os que retornaram definitivamente e os que retornam sazonalmente ou pontualmente participam nesta reconfiguração das relações transfronteiriças. As redes transfronteiriças, com a emigração realizada em diferentes tempos e para diferentes destinos, voltam a ser reactivadas com o retorno dos que emigraram dos dois lados da fronteira. Se no sentido Espanha-Portugal se organizam rotas de contrabando, percorrendo os antigos trilhos que ligavam as aldeias dos dois lados da fronteira, de Portugal para Espanha vão comprar gás e gasolina devido à diferença de preços, dando continuidade a relações transfronteiriças antigas com outras características.

A circulação entre lugares seria uma forma possível de diminuir a sensação de “dupla ausência” que Abdelmalek Sayad (2010) identificou na emigração argelina. A circulação permitiria a manutenção do contacto regular com a rede familiar no lugar de partida e nos lugares de chegada. A ausência sentida nos diferentes lugares onde residem as pessoas que constituem as diferentes redes interpessoais a que pertencem é compensada com os contactos telefónicos e, segundo alguns interlocutores, através da Internet, hoje, com acesso mais fácil e generalizado, conseguem comunicar através das aplicações referidas pelos entrevistados como o WhatsApp, Skype, Facebook, possibilitando o contacto áudio e visual.

A necessidade de cuidados de saúde específicos, a idade e a viuvez podem alterar as condições para circular entre lugares e mudar a decisão tomada para onde se queria residir definitivamente. A decisão sobre onde viver pode caber aos filhos que poderão trazer os pais para as suas casas ou colocá-los numa instituição cá ou lá. Se o cá é o lugar ou lugares para onde retornaram, o lá pode ser Bragança, Lisboa, Montluçon, Hamburgo, Paris. Nesta situação pode haver uma remigração e o retorno que se imaginou definitivo pode afinal deixar de o ser.

Hein de Haas e Tineke Fokkema, num artigo sobre um projecto que estudou os motivos para retornar ou para retornar de forma circular, que incidiu sobre o Vale do Todgha, em Marrocos, uma região de emigração, coloca a mesma questão:

“The exploratory findings presented in this study also lead to new research questions. (…) And will pendulum migration be a sustainable alternative to either permanent settlement or return, or is it a temporary phenomenon that will persist only as long as income and health allow migrants to carry it out?” (Haas & Fokkema, 2010, p.558).

Neste caso a circulação entre lugares, entre cá e lá, quando há essa possibilidade (capacidade económica para viajar e ter casa cá e lá) acaba por ser a situação preferida. Porém, num determinado momento, a saúde, a idade e o isolamento obrigam a fazer uma escolha definitiva entre lugares diferentes da planeada anteriormente.

O facto de a idade das pessoas que residem durante todo o ano na aldeia, na sua maioria pessoas aposentadas que retornaram das migrações internas e internacionais, se situar entre os 50 e os 90 anos, é indicado como uma das razões apontadas para olharem o futuro da aldeia com alguma preocupação.

A produção de castanha, que tem sido a aposta agrícola dos proprietários da aldeia, poderá trazer alguns dividendos a quem queira permanecer na aldeia. A actividade agrícola é, como referiram José Portela e Sílvia Nobre no caso do retorno para Pinela, “mais actividade ocupacional do que produtiva, sobretudo entre os de saúde debilitada, o que não significa que seja económica e socialmente irrelevante” (Portela & Nobre, 2001, p. 1143).

Algumas casas recuperadas pertencem a pessoas que vivem nas cidades, mas que decidiram comprar como casa de férias. A maioria dessas famílias com o tempo deixou de ir à aldeia com tanta frequência ou deixaram mesmo de ir. Algumas já foram de novo vendidas ou estão à venda.

Um maior investimento nas estradas, na sinaléctica dos percursos pedonais do Parque Natural de Montesinho, nomeadamente na serra de Montesinho, é uma das recomendações de um dos informantes para aumentar a procura pelas unidades de turismo rural na aldeia e o número de visitantes.

Uma família que trabalha em Bragança durante o dia comprou uma ruína na aldeia, recuperou-a e fez da mesma a primeira habitação. Todos os dias da semana percorrem os 23 km de distância em aproximadamente 30 minutos da aldeia a Bragança e vice-versa. Se mais famílias fizerem o mesmo poderá haver uma crescente suburbanização das aldeias à volta da cidade de Bragança, o que poderá, eventualmente, contribuir para uma certa revitalização destas aldeias. As gerações seguintes à que efectuou migrações internas e internacionais nas décadas de 1960 e 1970 acompanharam esse movimento para fora, mas, quando se reformarem, podem querer voltar para viver na aldeia e, quem sabe, aproveitar o investimento já realizado na produção de castanha e no sector do turismo rural feito pelos seus pais e avós.

Duas informantes, que ainda estão a trabalhar em França e que retornam pontualmente durante o verão à aldeia de Montesinho, consideram retornar definitivamente, uma para a aldeia de origem e a outra pretende realizar um retorno circular sazonal entre um lugar no Algarve e a aldeia de Montesinho. Porém, apenas o farão quando atingirem a idade ou os anos de descontos suficientes para obter a reforma.

Quando se perguntou aos informantes o que se poderia fazer para que os que migraram para fora da aldeia quisessem voltar, a resposta foi unânime - criar emprego. Neste excerto, esta entrevistada indica a criação de emprego como uma forma de atrair população:

“Trabalho, número um. Mas eles arranjam mais desemprego do que trabalho” (Júlia Lopes, 53, em 2016 - Emigração para Paris e ainda se encontra a trabalhar e a viver em França, retorno pontual anual).

Os informantes olham para o futuro da aldeia com algum pessimismo. Este entrevistado prevê que aconteça o que já aconteceu a algumas aldeias que foram sendo abandonadas:

“Tem tendência a acabar. É o que eu digo. Porque as pessoas vão morrendo. Estão dois, morre um, vão para ao pé dos filhos. É uma casa abandonada. Não é? Vêm cá uma vez no ano, ou duas ou três. Isso não é nada. Quando a minha geração acabar, que sou eu e o S. por aqui e o I., isto enche-se de silvas, ratazanas, cobras e bichos, então os veados, as corsas já vêm aqui ao pé da igreja. Já vêm aqui ao pé da minha casa. E ainda está a vegetação mais ou menos cortada. Mais dez anitos e desconfio que isto está tudo deserto. Só para turismo (...) Vêm cá. Vai apertando, vai apertando. Vão-se encolhendo até que não passa ninguém. A estrada danifica-se, já está meio danificada, ninguém lhe bota a mão” (Frederico Ribeiro, 53 anos, em 2016 - Emigração para Espanha e Suíça - Retorno definitivo para o lugar de partida).

A previsão da não renovação da população com a vinda de filhos e netos dos proprietários actuais, ou com a vinda de outras pessoas que demonstrem interesse em vir viver para a aldeia, faz com que este informante também olhe para o futuro com algum desânimo:

“Não se vislumbra qualquer futuro risonho nisto, porque não há mão de obra. Como tenho vindo a relatar todas as pessoas que aqui estamos já estamos inactivas. Apenas aquele casal (...), que ainda não está na reforma. De resto estamos todos já inactivos. Isto, se não se trabalha, não se pode desenvolver. Havia aquela expectativa que um ou outro que fosse depois ficando com o turismo rural. Mas isso também como está em decadência, principalmente aqui. Não sei. Francamente não vejo assim grande saída não. Agora há aí uns casais jovens com ideias e projectos, mas aqui não. Isto está de tal maneira que pelo menos a mim, que às vezes ponho cá a pensar e digo “O que é que será disto daqui a 20 ou 30 anos?”. Isto queiramos ou não, pessoas residentes hoje aqui daqui a 30 anos não estamos cá nem uma (...) Não vemos a chegar outras. Portanto o futuro não poderá ser assim aquele que nós gostaríamos que fosse, que eu gostaria que fosse” (Jorge Antunes, 67 anos em 2016 - Migrações Internas - Retorno definitivo para o lugar de partida).

Se o investimento na remodelação das casas nos lugares de partida efectuado pelos migrantes trouxe algum desenvolvimento à aldeia e gerou emprego no sector da construção e reabilitação enquanto retornaram migrantes, com o afrouxar do retorno esse desenvolvimento pode começar a decrescer e a estagnar, podendo pôr até em causa a racionalidade dos investimentos realizados nessas aldeias pelas autoridades locais nos arruamentos e saneamento (Gmelch, 1980, p.149). De igual modo, Ana Saraiva, no concelho de Ourém, testemunha uma “célere transformação nas aldeias, que prossegue com contornos difusos e direcções imprevisíveis” (Saraiva, 2017, p.265) e o presente etnográfico captado pela antropóloga apresenta-se “ambíguo, em metamorfose e com futuro incógnito” (Saraiva, 2017, p.283).

Segundo a antropóloga, o desenvolvimento gerado pela construção das casas de emigrantes, e pelo investimento de parte dos que emigraram na abertura de empresas, a que se juntou o investimento público na construção de infraestruturas, permite que famílias se estabeleçam nestes territórios com casas vazias e com boas condições de habitabilidade, porém, não é isso que está a acontecer, realidade semelhante com o que pudemos observar na aldeia de Montesinho. O contacto com a natureza, a qualidade das casas e a tranquilidade não é suficiente para fazer face à falta de emprego e investimento na região, que pode gerar o que observou na zona que estudou “emigração sem retorno ou com retorno que depois é revertido com o regresso ao país de destino” (Saraiva, 2017, p.281). A situação encontrada em Ourém parece ser um decalque do que se observou na aldeia raiana transmontana ou do que poderá vir a acontecer num futuro próximo se nada for feito em termos de políticas públicas locais, regionais e nacionais - as casas de emigrantes difíceis de manter a nível físico e financeiro, a degradar-se, ou à venda sem haver ninguém que queira dar um valor aproximado do que foi investido; previsível desinvestimento das autarquias na manutenção das infraestruturas das aldeias com menos população; os terrenos abandonados por limpar, aumentando a área combustível à volta das aldeias; populações envelhecidas e a carecer de mais serviços e cuidados de proximidade (Saraiva, 2017, p.281).

Na aldeia de Montesinho parte do investimento na reabilitação das casas até à crise iniciada em 2008 obteve algum retorno com a exploração turística de parte dessas casas, porém, a partir desse ano com a crise económica mundial a procura interna e externa, segundo os entrevistados tinha diminuído na altura em que se realizou trabalho de campo, levando a questionar a viabilidade económica da manutenção da exploração turística destas casas.

Num artigo recente sobre o impacto da Covid-19 no Alentejo, André Carmo e Patrícia Rego reflectem sobre o futuro dos territórios de baixa densidade concluindo que:

“um atributo definidor destes territórios que é habitualmente encarado enquanto problema - a baixa densidade - revelou agora, no quadro da pandemia da Covid-19, que pode também ser visto como virtuoso. Desde que devidamente gerida e potenciada, a baixa densidade de alguns territórios, poderá́ revelar-se um importante eixo estruturante do seu futuro desenvolvimento. Efetivamente, aquilo que parece ser uma debilidade, num mundo pós-pandemia, poderá́ revelar-se um aspeto diferenciador, pela positiva, destes territórios” (Carmo & Rego, 2020, p.167).

Uma conjuntura pandémica como a que atravessámos recentemente (regras impostas pela DGS para conter a propagação do vírus Covid-19, como o confinamento) poderá inverter a quebra da procura provocada pela crise de 2008, aumentando a procura de lugares longe dos centros urbanos, onde as pessoas podem realizar actividades ao ar livre com distanciamento social, fazer caminhadas sem ter que andar de avião, nem sair do país. A possibilidade de estadias mais prolongadas ao longo de todo o ano para trabalhar em regime de teletrabalho, fora das grandes cidades pode quebrar com a sazonalidade deste tipo de turismo. A COVID-19, os consequentes confinamentos e o teletrabalho poderão ter ajudado a revalorizar o turismo rural e de natureza, podendo vir a gerar migrações definitivas, sazonais, ou pontuais para aldeias como a de Montesinho e atrair investimento, criar novas dinâmicas, que poderão trazer outros horizontes para estes territórios.

Dois informantes parece que previram o que poderia acontecer, ao referir a possibilidade de haver guerras ou catástrofes que obrigassem as pessoas a fugir das cidades e a querer voltar para a aldeia. A vontade de viver e visitar estes territórios pode ser temporária ou poderá manter-se, gerando movimentos dos meios urbanos para os rurais e poderá deixar raízes, podendo dar frutos de projectos-piloto que poderão ser replicados noutras zonas rurais do país, alterando a desigual composição social, económica, demográfica do país. As mudanças operadas a partir da década de 1980 com o retorno de muitos dos que migraram já aposentados ou próximos da idade da reforma continuam a não superar o impacto das mudanças provocadas no lugar de partida pelo êxodo da década de 1960 e 1970 (Portela & Nobre, 2001, p.1143) e das décadas seguintes, embora com menor intensidade.

Conclusão

As redes e as práticas translocais caracterizaram as trajectórias migratórias dos migrantes internos e internacionais focadas neste estudo, que mantiveram uma forte ligação ao lugar de partida durante o seu percurso biográfico. O contacto à distância, o retorno circular pontual, mormente em agosto, a compra ou recuperação de uma casa e a participação e apoio à organização da Festa de Santo António foram as formas encontradas de manutenção dos laços que os ligavam ao lugar.

A saúde, a família e a localização do património familiar herdado, construído, reconstruído, ou adquirido durante a trajectória migratória foram factores que permitiram ter um leque mais ou menos alargado de escolha em relação às práticas migratórias. Como pudemos observar, o retorno é encarado de forma diferente pelas mulheres e pelos homens, por isso, os estudos em torno das migrações deverão ter isso em consideração no processo de selecção da amostra, como teve este estudo ao procurar algum equilíbrio ao nível do sexo na escolha dos participantes. Uma investigação sobre o papel do género na tomada de decisão em relação ao retorno depois da reforma para Espanha e Turquia, demonstra o que verificámos também no terreno no que diz respeito à permanente negociação, por vezes difícil, no seio da família:

“Spanish and Turkish retirement migrants negotiate their post-retirement migratory pattern within the household setting - between the husband and wife and within the broader family. This process can be conflict laden because of contradictory preferences of the husband and wife and/or close family members” (Bocker & Gehring, 2015, p.94).

Para uma maior compreensão das práticas migratórias serão necessários mais estudos qualitativos a partir de lugares de partida, com uma perspectiva diacrónica que permita conhecer melhor os processos migratórios, tendo em conta as diferentes trajectórias, mais estudos que cruzem as práticas dos migrantes internos e internacionais. Algumas iniciativas nacionais e locais de dinamização cultural, e de divulgação e atracção de novos moradores e visitantes, levadas a cabo recentemente, cuja análise não cabe neste artigo, podem ter algum impacto ao nível do lugar, mas se não procurarem envolver na organização, gestão e desenvolvimento as instituições e os moradores de cada lugar, estas iniciativas correm o risco de criar alguma resistência e cepticismo por parte das populações locais e poderão ter apenas efeitos de curto prazo2. Ao nível das políticas públicas seria importante ouvir mais o que as pessoas que ainda residem nestas aldeias têm a dizer sobre o desenvolvimento destas regiões, sobre a atracção de investimento, que tipo de investimento será necessário para reter os que a certa altura da sua trajectória migratória decidem retornar, que tipo de serviços seria necessário implementar para que as pessoas que residem nestas aldeias não sintam a necessidade de voltar a migrar, o que está a resultar e a falhar nas estratégias implementadas, isto é, dever-se-ia incluí-las mais nos processos de decisão e definição das políticas públicas de gestão de uma vasta extensão do território nacional e de apoio ao retorno e fixação de migrantes. A recomendação de uma maior participação dos beneficiários destas políticas na sua definição e formas de implementação também é feita pela Organização Internacional para as Migrações em relação a fluxos migratórios mais recentes (2015, 2019).

Podemos concluir que este ciclo migratório, já muito estudado por diferentes áreas das ciências sociais, continua em movimento, que as fronteiras que dividem as diferentes fases dos ciclos migratórios e as migrações internas das internacionais são porosas e que as práticas migratórias oscilam entre a fluidez e rigidez, pelo que devem continuar a ser analisadas em processo, tendo em conta um tempo longo.

Financiamento

Esta investigação foi realizada com o apoio institucional da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, através da concessão de uma bolsa de doutoramento (PD/BD/113554/2015), financiada por fundos nacionais do MEC e com a duração de quarenta e oito meses no âmbito do Programa de Doutoramento em Migrações (DeMig), no ICS-ULisboa e beneficiou da ligação institucional ao grupo de investigação deste centro, Identidades, Culturas e Vulnerabilidades, da pertença ao grupo de investigação Economia e Sociedade do Instituto de História Contemporânea NOVA FCSH, como membro associado e da participação nos seminários da Linha Temática do mesmo Instituto, Usos do Passado: Memória e Património Cultural e da pertença ao Observatório da Emigração como investigador associado.

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1 Entre 1957 e 1974 um milhão e meio da população portuguesa emigrou maioritariamente com direção à Europa. Dos destinos migratórios escolhidos durante este período a França destaca-se, contando com a emigração de 900 000 portugueses, dos quais 550 000 fizeram-no de forma clandestina (Pereira, 2014: 26).

2Dois projectos governamentais como o “Programa regressar” dirigido aos emigrantes para incentivar o seu retorno, e o “Emprego Interior MAIS” para atrair pessoas residentes no litoral para trabalharem e residirem no interior do país; o concurso da televisão pública portuguesa, RTP, “7 Maravilhas de Portugal - Aldeias”, em que a aldeia de Montesinho participou, na categoria “aldeias autênticas”; e dois projectos locais como o festival Música na Paisagem, organizado pelo Teatro Municipal de Bragança que já conta com três edições (2019, 2020, 2021), que decorre na aldeia de Montesinho após uma residência artística de músicos na aldeia e o projecto “Bragança - liberdade para recomeçar”, dinamizado pela Câmara Municipal de Bragança, que para tentar atrair população para o concelho, apoiou quatro famílias para residirem durante um mês em aldeias do concelho, sendo Montesinho uma das quatro aldeias que acolheu pessoas que experimentaram trabalhar de forma remota (esta iniciativa decorreu durante o mês de Maio de 2021, altura em que vigoravam em vários concelhos medidas de confinamento, decorrentes da pandemia Covid-19).

Recebido: 05 de Setembro de 2021; Aceito: 16 de Março de 2022

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