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CIDADES, Comunidades e Territórios

versão On-line ISSN 2182-3030

CIDADES vol.au22  Lisboa out. 2022  Epub 26-Out-2022

https://doi.org/10.15847/cct.28059 

ENTREVISTA

Entrevista ao projeto Mulheres em Construção

Project Mulheres em Construção: Interview

Patrícia Santos Pedrosa1  2 
http://orcid.org/0000-0001-9524-1437

Natália Fávero3 
http://orcid.org/0000-0002-3044-6025

1CIEG/ISCSP, Universidade de Lisboa

22Faculdade de Engenharia da Beira Interior, Portugal, patrícia.santos.pedrosa@ubi.pt

3 Universidade de Lisboa, Portugal, natalia.fernandes.favero@gmail.com


Neste número especial da revista CIDADES, Comunidades e Territórios, dedicado ao tema “Feminismos e a Espacialização das Resistências”, considerou-se pertinente entrevistar a equipa do projeto Mulheres em Construção (MemC) enquanto exemplo de prática feminista e emancipadora feito a partir do direito aos espaços qualificados .

Mulheres em Construção é promovido pela associação Mulheres na Arquitectura (MA) e desenvolve-se no âmbito do programa português Bairros Saudáveis (BS). O projeto consiste na capacitação de mulheres em vulnerabilidade socio-laboral, residentes no Bairro de Santiago, em Aveiro, e na formação em construção civil. O projeto teve a duração de doze meses.

A equipa do Mulheres em Construção é composta por cinco arquitetas e arquitetas urbanistas: as coordenadoras Gabriela Cavalcanti (1994, Brasília, Brasil) e Patrícia Robalo (1982, Lisboa, Portugal), e as voluntárias Elena Parnasi (1992, Milão, Itália), Isabella Rusconi (1972, Santos, Brasil) e Lia Gil Antunes (1988, Covilhã, Portugal).

1) Como é que surge e o que é o Mulheres em Construção?

Lia Antunes: O projeto Mulheres em Construção nasceu em Lisboa, numa reunião com coletivos e com mulheres que vivem em situação de precariedade habitacional. Foi na semana do 8 de Março, ou numa preparação do 8 de Março, em 2019. A Isabella e eu estávamos lá e demos conta que, muitas vezes, estas mulheres tinham problemas e dificuldades em fazer pequenos arranjos nas suas próprias casas ou não tinham como fazê-lo. Não tinham nem recursos, nem a quem recorrer. A Isabella lembrou-se, fazendo a ponte com outros projetos que já conhecíamos do Brasil, que seria bom pensar neste problema. A primeira ideia nem foi uma formação, foi mais a montagem de um banco de materiais que elas pudessem usar e, de forma autónoma, suprimir algumas carências básicas dentro das suas casas. Começou assim, esta foi a primeira ideia. Pensámos "um dia fazemos essa proposta a outros coletivos ou fazemos uma candidatura." Quando entrámos na pandemia Covid-19 surgiu este programa dos Bairros Saudáveis. Entendemo-lo como uma oportunidade para avançar e fez-se uma candidatura que ficou muito bem desenhada (modéstia à parte para nós todas!), e que ganhou o 18.º a nível nacional. Logo aí se percebeu que tinha potencial.

Gabriela Cavalcanti

Figura 1 Exercício de noções espaciais com desenho de planta 

2) Quais os objetivos do projeto, do geral para o particular?

Patrícia Robalo: O objetivo geral é transformar a vida de mulheres em vulnerabilidade social ou laboral, dando-lhes formação na área da construção civil para elas conseguirem arranjar emprego ou então constituírem o seu próprio emprego. Esse é o objetivo geral. Depois, há objetivos específicos: o projeto prova que as profissões não têm género e contraria a ideia e as vivências de um setor económico ainda muito masculino e machista. Outros objetivos específicos são o empoderamento das mulheres, o desenvolvimento comunitário e a realização de um trabalho situado, neste caso, no Bairro de Santiago. Por fim, o projeto também contempla o fechar de ciclo, tentando que as formandas consigam de facto encontrar emprego, ou criar o seu próprio emprego ao fim deste ano de trabalho.

Gabriela Cavalcanti

Figura 2 Montagem de um sistema elétrico para lâmpada 

3) Quais foram, ou quais são, as entidades envolvidas no projeto?

Isabella Rusconi: Bom, começa com a promoção das Mulheres na Arquitetura. Depois, nós procurámos no bairro uma associação, uma IPSS1 que se chama de Florinhas do Vouga, que atua no bairro há mais de 40 anos. E uma outra, a Associação Mon Na Mon, associação de Filhos e Amigos da Guiné-Bissau, mas que, na verdade, atende e ajuda todos os estudantes e a comunidade dos PALOP2 que residem no bairro. A Junta de Freguesia da União das Freguesias de Glória e Vera Cruz (UFGVC) aceitou igualmente ser parceira e a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género (CIG) também.

Patrícia Robalo: As empresas de construção também foram parceiras iniciais.

Isabella Rusconi: Então, temos parcerias em vários âmbitos do modelo de inovação social (quadrupla hélice): Governo (BS, CIG, IEFP3, UFGVC), academia (DECivil da Universidade de Aveiro), empresas de construção (SAVECOL, CIVILRIA e CIMAVE), organizações da sociedade civil, sendo três entidades de classe relacionadas à arquitetura (MA, APRUPP4 e OA5), as já referidas organizações com forte atuação social no território (Florinhas do Vouga e Mon Na Mon) e a Cooperativa Chave de Habitação. Além dos apoiantes e doadores como, entre outros, Leroy Merlin, Revigrés, Entrajuda.

Patrícia Robalo: A questão é que começamos com a rede inicial, como a Isabella explicou, que tinha então as entidades locais, as empresas que poderiam dar não só formação, mas também permitir-nos alcançar o emprego pós-projeto. E tínhamos também algumas entidades, quer da área académica em que nos movemos, como a APRUPP, quer também da área da construção civil, que fariam oficinas complementares. Ou seja, sempre existiu uma estrutura entre parceiras, que foi muito importante para o projeto e se calhar foi e é uma das coisas que mais reforçou a candidatura. Mas essa estrutura cresceu enormemente depois do arranque do projeto, ou seja, várias outras entidades começaram a juntar-se e, portanto, a rede de parcerias é numerosa e bastante diversa. Todas as organizações têm funções bastante diferentes e complementam-se no projeto. Há umas que têm a função de acompanhamento, outras doam materiais de construção ou espaços para o desenvolvimento do projeto e outras criaram as suas próprias oficinas formativas. Como a Isabella estava a explicar, a rede de parcerias, ainda que torne muito exigente o trabalho da nossa equipa, funcionou muito bem.

Elena Parnisari

Figura 3 Aplicação de massa em parede 

4) Como é que vocês caracterizam o território do projeto? Ou quais foram os critérios de escolha?

Isabella Rusconi: Então, nós tínhamos pensado o projeto, inicialmente, para Lisboa. Então, pensamos apresentar para um concurso Bip-Zip, e depois pensámos também em apresentar para a candidatura da Desenvolvimento Local de Base Comunitária (DLBC). Foi então quando a gente teve a notícia da abertura dos Bairros Saudáveis. Acho até que foi a Patrícia que sugeriu, não lembro, para a gente fazer em Aveiro, sair do circuito Porto/Lisboa. E a escolha do bairro foi porque algumas de nós já havia participado do Lab Cívico Santiago, assim como de várias atividades no bairro. Já tínhamos contato com o pessoal da Florinhas do Vouga, o pessoal da Mon Na Mon... Então, a gente já conhecia um pouco a realidade do bairro e foi perguntar para elas se elas achavam que fazia sentido fazer esse tipo de formação ali. E pronto, tivemos uma resposta positiva e aí seguimos com isso.

Patrícia Robalo: O Bairro de Santiago é o maior bairro de habitação social de Aveiro e surgiu na década de 70 do século XX. Hoje, tem habitação pública, habitação cooperativa e habitação privada dada a sua inclusão na política de alienação de fogos habitacionais públicos. O processo de privatização da habitação gerou graves problemas de gestão dos edifícios, associados a carências existentes e a uma significativa segregação urbana, hoje mais diluída. Desde a construção inicial, o bairro vivenciou a deriva das políticas de habitação e desinvestimento no parque habitacional público, o que contribuiu para a degradação do edificado e a ausência de obras de manutenção e melhoria. Algumas deficiências construtivas iniciais estão agora a ser colmatadas através de intervenções nos edifícios de propriedade municipal e o Bairro de Santiago tem visto os seus limites urbanos serem esbatidos, sobretudo após a construção do campus universitário. Portanto, há um caminho de integração que tem sido feito progressivamente e que é importante galvanizar com a criação de redes comunitárias, reforço do comércio local e atenção ao espaço público, o que leva a discussões interessantes como o que se considera dentro e fora do bairro. Ou seja, em Santiago é fácil encontrar prioridades que cruzam o urbanismo, a arquitetura, as políticas de habitação e também a igualdade de género e o desenvolvimento comunitário, fundamentais para o bem-estar da população. Isso também reforçou a pertinência do projeto. Ou seja, o projeto insere-se muito bem no triângulo entre o desenvolvimento comunitário, a igualdade de género e fortalecimento das mulheres do bairro e a questão territorial, arquitetónica e habitacional.

Elena Parnisari

Figura 4 Aplicação de azulejos 

5) O que é que era ou o que foi a vossa metodologia no sentido do processo e da cronologia e das etapas do projeto. Como é que vocês podem definir dessa forma?

Elena Parnasi: Eu acho que quanto à metodologia podemos dizer que se dividiu em três fases fundamentais. Numa fase mais introdutória, com a divulgação do projeto na comunidade e também na constituição do grupo de formandas. Ou seja, achar as mulheres que queriam fazer parte deste projeto. Então, tivemos uma primeira fase de divulgação do projeto com as sessões dos Café Conversa, que foram sessões para convidar as mulheres, principalmente do Bairro de Santiago, a conhecerem o MemC. Onde explicámos como o projeto se iria desenvolver ao longo dos meses. Tentámos também agilizar um ponto de confluência com as mulheres que queriam fazer parte deste projeto a nível de horários, disponibilidade, trabalhos e várias coisas. Junto com essa primeira parte de divulgação, tivemos também a sessão de apresentação pública. Depois disso, formámos o grupo definitivo de formandas, que inicialmente era constituído por 16 mulheres. Em seguida, começou a segunda fase, que foi a fase das formações. Começámos, nas instalações da Cooperativa Chave, toda a parte de formação teórica e as formações em Igualdade de Género. Esse foi o primeiro bloco das formações. Em seguida, começaram as outras formações práticas, com uma primeira parte de introdução teórica. Quando começaram as partes práticas das formações, migrámos para as instalações do IEFP, outro parceiro do projeto, onde tínhamos oficinas adequadas para toda a parte da formação de pintura de paredes, de canalização, de eletricidade, de alvenaria, etc. Estas foram sempre acompanhadas pelas formações da MA, que eram formações com uma abordagem mais arquitetónica, paisagista e urbanista, com uma perspetiva feminista, para dar, no fundo, suporte e apoio ao que as mulheres iam aprendendo durante as formações práticas. Acho que as formações da MA iam ajudando as mulheres formandas a ver como aplicar as técnicas e as noções que iam aprendendo nas suas casas ou num futuro trabalho. Uma parte importante das formações da MA resultaram também das parcerias. Como exemplo, as atividades ou formações que envolveram o Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro ou a APRUPP, assim como as empresas de construção parceiras, com visitas a obras. Eu acho que as formações da MA foram um complemento e um aglutinante de todas as outras formações. Depois, a terceira fase do projeto, é a parte mais prática, ou seja, pôr em ação todo o conhecimento que foi adquirido nos meses anteriores, a partir da obra do Banco Comunitário de Materiais e Ferramentas. Então, a parte da realização da obra serve para consolidar todas as competências e os conhecimentos adquiridos. As formandas passam a ser formadas e a pôr realmente a mão na massa, num projeto que no fundo ficará para elas e para a comunidade do Bairro de Santiago.

Lia Antunes: Acrescentaria apenas que, além das formações mais técnicas de carpintaria, eletricidade e outras, o IEFP ministrou também a formação em Igualdade de Género.

Elena Parnasi: Esqueci-me de dizer que a formação em Igualdade de Género foi a primeira formação que tivemos lecionada por parte do IEFP. Acho que foi bom também ter logo no começo essa formação, porque foi também agregadora dentro do projeto. Também achamos importante ter essa formação dentro do projeto porque estamos a trabalhar com mulheres. Além disso, tivemos também a formação em Higiene, Saúde e Segurança no Trabalho, que também foi uma parte importante por incluir os direitos dos trabalhadores a nível das leis e das normas.

Lia Antunes: Inicialmente, o IEFP propôs ainda que, para completar e fechar este bloco, poderia existir a formação em Literacia Digital. No fim, não correndo exatamente como nós queríamos, pareceu-nos que era uma boa matéria, uma boa prática a incluir.

Isabella Rusconi: E elas chegaram até a desenvolver um blogue sobre a literacia digital que seria lindíssimo, se seguisse adiante. Eu queria só pôr uma nota que talvez essa formação da Igualdade de Género, eu vejo que ela entra um pouco como no primeiro módulo que é o conhecer, o compor o grupo, porque essa formação de Igualdade de Género ela funcionou para vincular. Ela foi ótima para vincular o grupo. Quando a formação acabou, nós dissemos "Ok, temos um grupo", sabe? E o grupo estava ali unido e a formadora foi uma surpresa. E foi até necessário chamá-la num outro momento, porque durante o percurso o grupo foi-se fragmentando de novo. Nós tivemos que trazer a formadora de Igualdade de Género de volta para fazer uma atividade para tentar reconstruir esse vínculo.

Elena Parnasi: Sim, eu acho que, no fundo, esta formação foi o que fez a diferença entre as outras formações, porque é graças a ela que conseguimos criar vínculos entre o grupo. Porque no fundo, queríamos também transmitir que esta forma de trabalho é um trabalho coletivo, não é? Ou seja, arquitetura, seja através do desenho, como também através da prática, é um trabalho coletivo.

Gabriela Cavalcanti

Figura 5 Obra de remodelação do espaço para o Banco Comunitário de Materiais e Ferramentas 

6) Quais são os projetos que vocês tiveram como referência ou inspiração para fazer o Mulheres em Construção? De que forma é que esses projetos diferem deste?

Isabella Rusconi: Um deles foi, talvez a principal referência, a Arquitetura na Periferia, do Brasil, que partiu do trabalho de mestrado de uma arquiteta, também, que é a Carina Guedes, e depois ganhou corpo e ganhou vida. Depois disso, já tem acho que dez ou sete anos, uma coisa assim. E pronto, o projeto consiste em capacitar mulheres para a autoconstrução e para reforma das suas casas. Tudo é um contexto completamente diferente desse, porque nesse, as mulheres, elas moram em casas razoavelmente dignas. E lá, o projeto era capacitado mesmo para a autoconstrução. Então, elas realizam mutirões com todas as mulheres, com as mulheres todas de um bairro, para construir a casa de uma, para ampliar a casa de outra, e pedem o material pontualmente, muito focado naquilo que vão executar. Também trabalham com microcréditos. A Arquitetura na Periferia também funciona como entidade de apoio que faz microcréditos para essas mulheres. Também trabalham muito com a questão da gestão econômica, ensinam as mulheres a gerir os dinheiros. É um contexto completamente diferente do que a gente tem. Depois, a gente descobriu que em Águeda6 existem os mesmos problemas que têm no Brasil, com o agravante de que é ilegal a gente ajudar essas mulheres para a autoconstrução. Pronto, a gente ia-se colocar numa posição... Se fosse um projeto parecido com a Arquitetura da Periferia, em Águeda, nós teríamos sérios problemas legais, até. Mas nós tentamos aplicar um pouquinho lá também. Depois, bom, acho que é isso. Aqui, no Mulheres em Construção, a gente tem que focar no empoderamento para pequenas melhorias na própria casa e capacitação para o emprego mesmo, no setor.

Patrícia Robalo: Temos também como referência os projetos Mujeres a la Obra e Women Can Build. Ou seja, existem, alguns projetos que são ligeiramente diferentes, mas que no fundo trabalham com as mesmas questões, que é a aproximação entre as mulheres e o setor da construção civil. Uma das coisas que nos surpreendeu quando começamos o projeto foi a enorme recetividade, que descobrimos estar relacionada com uma contradição que o MemC tornava mais evidente, entre a persistência simultânea da falta de mão de obra no setor da construção civil em Portugal e das dificuldades das mulheres em trabalharem neste sector. Ou seja, as mulheres precisam de emprego, há áreas da construção civil que lhes interessam, em que poderiam trabalhar, em que falta mão de obra, mas, por uma questão de preconceito e de discriminação, elas nunca são vistas como potenciais trabalhadoras. E falamos de uma área económica que pode ser muito alargada, que vai do imobiliário, à gestão de condomínios, passando pela administração de empresas de construção e pela produção e comercialização de materiais. E claro que falamos também de trabalhar com a mão na massa, através de uma panóplia de áreas e ofícios, desde a área da reabilitação e restauro arquitetónico, à carpintaria, à eletricidade, etc. Portanto, é incrível como as mulheres continuam afastadas de um mundo laboral quando não existem razões, que não sejam as motivadas pelo preconceito, para isso acontecer. Todos estes paradoxos são muito evidentes. As próprias pessoas que tinham conhecimento do MemC começaram a contactar-nos dizendo que é importante chamar a atenção para o facto de existir falta de mão de obra e de como o MemC pode contribuir para suprir essa carência. No fundo, questionamos porque é que mais mulheres não são canalizadoras, eletricistas ou empresárias na área da construção civil.

Isabella Rusconi: Acho importante mencionar também que, no começo, nós recebemos algumas críticas, até da área da academia mesmo. Algumas pessoas falaram "Vocês estão tão malucas! Como vocês vão se meter nesse mundo? Não! Vão ferir as suscetibilidades dos homens do bairro!" Há vários comentários desse género. “Mulheres não podem trabalhar nesse setor.” O que está ali consolidado.

Patrícia Robalo: Fizemos uns cartazes iniciais que eram um bocadinho humorísticos ou provocatórios. Tinham frases com alguma piada. Não só estávamos a trazer um projeto que virava as coisas um pouco do avesso, como ainda por cima fazíamos questão de afirmar que ele estava a decorrer e a arrancar naquele bairro questionando explicitamente as lógicas patriarcais. Também penso que há questões sobre as quais precisaremos de refletir mais à frente. Por exemplo, foi interessante perceber que o facto de termos associado o projeto às carências sociais, ou seja, trabalharmos para o empoderamento das mulheres que têm dificuldades adicionais em ter voz, não era qualquer coisa esperada. Isto revela que o empoderamento da mulher é normalmente visto como qualquer coisa mais próxima das pessoas que têm acesso a mais informação, tempo, recursos, um percurso escolar mais longo. E que, assim, têm maior facilidade em percecionar as desigualdades e conseguir formular e expressar os seus contornos. Nós, no fundo, estamos a inverter um pouco o que é o status quo e a facilitar a capacidade de autoconhecimento, autoavaliação e de superação destas mulheres que não tinham, se calhar, nem o tempo nem as condições para pararem um pouco e pensarem, por exemplo, se como mulheres são pessoas mais afetadas pela precariedade habitacional ou pelas desigualdades territoriais? Ou noutro sentido, por exemplo, porque é que aquele bairro era mais afastado do centro, ou não tinha a atenção devida na manutenção dos espaços públicos? Rapidamente, também começámos a explicar que a formação tanto tinha um perfil técnico como um perfil cívico, promovendo formas de emancipação pessoal e coletiva. Temos sempre presente a ideia de criação de trabalho coletivo, de redes de solidariedade, que nós pensamos poderem ultrapassar o tempo do MemC. Ou seja, que eventualmente, se elas procurarem emprego e pensarem em formas de associação coletiva ou cooperação poderão ter mais facilidade numa fase inicial em, por exemplo, terem uma empresa para criarem emprego próprio.

7) Qual a relevância de terem alguém na equipa, neste caso a Gabriela Cavalcanti, a fazer uma dissertação de mestrado sobre o projeto e o processo? Ou seja, qual é a relevância da articulação entre o ativismo, sociedade civil e a academia?

Gabriela Cavalcanti: Acredito que tanto é importante conceber o projeto como realizá-lo e avaliá-lo pelo que corre bem, pelo que corre mal, pelo que é necessário adaptar. Foram necessárias adaptações e eu acredito que um trabalho académico permite reflexões mais profundas para perceber pistas/melhorias para outros projetos que possam vir nesse mesmo sentido. É questionar se esse formato é o ideal a fim de que esse projeto possa ser replicado com as devidas adaptações a diferentes contextos sociais e territoriais.

Isabella Rusconi: É um presente ter a Gabriela fazendo o mestrado sobre o projeto, para a gente é super importante. É um presente que ela tenha mudado o tema do mestrado dela. Mas, como ela falou, é uma oportunidade importante de avaliação para compreender qual é o impacto que o projeto tem, qual o potencial que o projeto tem, até de impactar políticas públicas direcionadas para mulheres, tanto no setor da construção civil, como na metodologia de trabalho, também, que pode vir a contribuir para outros projetos relacionados a inovação social. Mesmo dentro do programa Bairros Saudáveis.

Patrícia Robalo: Nós fomos falando sobre isto durante o desenvolvimento do projeto. Escrevemos diversos artigos, incluindo uma peça para o Le Monde Diplomatique7 e outras para o jornal do Bairros Saudáveis. Foram igualmente feitas várias reportagens sobre o projeto8. Ou seja, o projeto foi muito agraciado, desde o início, com uma boa divulgação pública genérica. Mas também nós fizemos esse esforço de redigir artigos de caráter científico para que o projeto não ficasse encapsulado só em determinado âmbito de discussão. E eu acho que na base dessa preocupação está o espírito ativista. Não sei se vocês concordam, mas penso que temos sempre presente um questionamento sobre a profissão e sobre as questões de género que nos levaram à MA, e que exige uma voz ativa, para que o projeto não fique fechado sobre a sua execução entre as formandas e a rede de parcerias. Importa-nos que transborde e que inunde as várias esferas em que nós atuamos. E sobre essa dimensão, o crescimento da rede de parcerias foi muito importante. Como o diálogo entre organizações foi muito ativo, por exemplo com a Universidade de Aveiro e com o IEFP, estas entidades transportam também para a sua organização, as preocupações que o projeto trabalha. Promovendo o debate e a difusão adicional das questões que estamos aqui a tentar discutir. E, assim, havendo uma presença reivindicativa das mulheres, quer como formandas, formadoras, professoras e técnicas se solidarizam e ajudam, por vezes de forma simples, como as engenheiras que nos recebem nas visitas a estaleiros de obras das empresas de construção civil. Ou seja, vai havendo um envolvimento cada vez maior e alguma naturalidade na presença das mulheres e da discussão do papel das mulheres nestas várias áreas, da academia à construção civil.

8) Qual tem sido ou qual foi o feedback? Das participantes, das entidades envolvidas, das formadoras? É possível avaliar “resultados e impacto” ou concluir alguma coisa com o que foi feito até agora?

Gabriela Cavalcanti: Um dos resultados que surgiu foi a participação delas, num encontro entre o projeto Mulheres em Construção e Entre o Chão e o Telhado, que também é promovido no âmbito dos Bairros Saudáveis, pela associação Bela Vista Centro de Educação Integrada, em Águeda. O encontro dos projetos consistiu em ações com as formandas do Mulheres em Construção: elas foram para os bairros que são alvo do projeto realizado em Águeda (Entre o Chão e o Telhado), para ensinar mulheres de lá, que estão em precariedade habitacional, a fazerem intervenções em suas casas. Então, isso é um resultado gratificante, revela que, quando há capacitação e empoderamento para um grupo, isto pode ser multiplicado, com as devidas pontes feitas entre associações. Outro resultado recente foi uma das formandas do Mulheres em Construção, habitante do Bairro de Santiago, ter solicitado tintas que estavam disponíveis no Banco Comunitário de Materiais e Ferramentas para pintar o apartamento, que estava a receber intervenções da Câmara. O facto de saber que existem materiais disponíveis também incentiva o fazer, emancipa para melhorias. Foram-lhe entregues as latas necessárias de tinta e estamos à espera que nos envie fotos para vermos o resultado e para divulgarmos, como ficou combinado. O importante é que elas já têm confiança para fazer a intervenção na própria casa e isso é muito desejável. É um dos objetivos que já se cumpre.

Lia Antunes: Gostava de deixar coisa que também temos falado entre nós, que não está completamente fechado, mas que nos parece que foi um dos papéis fundamentais da MA neste processo. Porque é que este projeto não pode ser aplicado noutro contexto, sem a MA estar presente? Além das nossas formações, da parte técnica, tem que ver com a questão do cuidado. Falamos primeiro de pessoas, tanto de pessoas dentro de uma equipa como de pessoas formandas, de mulheres formandas. Houve sempre, de facto, cuidados. Houve sempre muito tempo dedicado ao cuidar de cada uma e das necessidades de cada uma e de ir ao encontro das especificidades da vida de cada formanda. Esta foi uma questão que esteve presente desde o início e que nos pareceu fundamental estar do início até ao fim: no que tem que ver com os horários que elas têm disponíveis, a gestão do tempo pessoal, a gestão de filhos, a gestão da casa. Ou seja, tudo isto entra para esta formação e para este projeto de alguma maneira e de formas muito concretas. Os horários de trabalho estão relacionados com isso. O facto, também, de o projeto nunca ter saído do bairro, mesmo andando em espaços distintos de formação, de obra, é sintomático deste cuidado. É tudo uma questão de bairro, que também nos pareceu fundamental. Por um lado, logo ao início, quando este projeto foi muito divulgado, aconteceu um fenómeno muito curioso que nós não estávamos à espera: muitas mulheres, arquitetas e não arquitetas, escreveram-nos muito entusiasmadas a oferecerem do seu tempo e conhecimentos para serem voluntárias. Com pena, foi uma das coisas que nós nunca tivemos capacidade de dar resposta. Foi sempre tudo muito intenso - os tempos do programa financiador não ajudaram - e nunca conseguimos integrar outras pessoas. Sempre houve muita procura e, sobretudo, procura de mulheres que consideraram o projeto valioso de alguma forma e decidiram que gostariam de participar. Por outro lado, também outras mulheres, arquitetas ou não, comentavam "eu também gostava de fazer essa formação! Pensem como é que isso pode ser feito depois porque eu também gostava de conseguir fazer pequenos arranjos na minha casa." Ou seja, não é só uma questão de mulheres de bairros municipais ou de bairros precários. Claro que elas têm menos acesso a recursos, mas parece-nos que é algo mais transversal e que há a procura de outros grupos de mulheres.

9) A pergunta seguinte é sobre o vosso feedback. O que é que vocês acharam que foi o mais difícil e o que acharam que foi mais fácil do que estavam à espera, inicialmente?

Elena Parnasi: Eu acho que uma das coisas mais difíceis, e acho que quase todas podemos concordar, foi o que a Lia já mencionou agora. Ou seja, conseguir gerir tudo durante o projeto ao mesmo tempo. As coisas aconteceram de uma forma tão rápida e com tantas incógnitas, sobretudo no começo, porque estivemos a dúvida de quando iam começar as formações, assim como a situação do distanciamento social, as regras Covid-19. O sucesso que o projeto teve, de repente, e ter que gerir muitas coisas ao mesmo tempo, procurando não perder o foco. Eu acho que isso, se calhar, foi sempre o maior desafio: querer fazer tudo, mas também não querer perder o foco do objetivo principal. Então, saber que temos aquele objetivo que no fundo é a formação e o projeto com as formandas, mas também a não querer deixar ninguém ou nada de lado e tentar chegar também em outras coisas. Ou pensar também em outras coisas paralelas que nem sempre foi possível abranger, até porque também estivemos como parceiras em outros dois projetos do Bairros Saudáveis9. Então, acho que foi um pouco difícil gerir isso, gerir o projeto em si e todas as outras oportunidades que foram surgindo. Algumas conseguimos obviamente incluí-las no projeto e outras ficaram na linha, se calhar, para ser pensadas melhor numa segunda edição ou, no fundo, como um feedback interno. Tipo, o que é que poderíamos melhorar depois desta experiência? Mas eu senti que isso foi sempre um pouco o maior desafio do grupo, em cada reunião tentávamos chegar a todo o lado.

Isabella Rusconi: Obrigada por terem feito essa pergunta. Era uma coisa que a gente devia ter feito entre a gente e não fez. Para mim, o mais difícil foram, primeiro, as questões burocráticas do projeto que a organização dos Bairros Saudáveis, que atrasou muito. O atraso no arranque do projeto fez com que nós tivéssemos que procurar a vida de outras maneiras. E isso interferiu, tanto em termos de composição de equipe, de tempo disponível e etc. E continua, e os problemas com os atrasos deles continuam a impactar bastante a nossa organização.

Gabriela Cavalcanti: E acho que aí também entra a gestão do tempo com outras entidades. É algo que percebemos claramente ao longo desse processo. Por exemplo, precisávamos começar a obra em julho, não conseguimos. Era uma gestão que não dependia só de nós. A MA precisa de um tempo, que é o do Programa Público Bairros Saudáveis, contudo, as outras entidades envolvidas não funcionam nesse tempo, no prazo do projeto. Então, isso é desafiador, exige adaptações constantes e agora temos um mês para fazer uma obra de renovação. Há que ter cuidado para não afetar a credibilidade do projeto aos olhos das formandas que, por fim, também têm de reajustar agendas e compromissos para continuarem a frequentar as atividades.

Patrícia Robalo: Pegando um pouco no que a Gabriela disse, penso que nós próprias chamámos as dificuldades, não é? O facto de a MA ser precisamente esta organização central do projeto faz com que também, depois, seja na equipa que trabalha no projeto que são acomodadas todas as dificuldades, precisamente para que as parceiras entre si não sintam as fricções e os contratempos. Ou seja, nós servimos para filtrar e fazer o melhor que é possível para que o projeto corra da forma regular e previsível. E, ainda assim, penso que o único percalço com impacto no calendário do projeto foi, de facto, o local da obra. Não foi fácil encontrarmos um espaço para fazer a obra. E depois trabalhámos numa possibilidade que não correu bem e que teve de ser repensada. E ainda bem, porque agora temos uma ótima situação. De resto, tudo correu de acordo com o calendário, ainda que a tensão de ser um projeto que tem de ser executado durante um ano esteja sempre presente, principalmente sendo este um projeto bastante exigente: com muitas parcerias, fases bastante distintas, em que intervêm diferentes organizações com objetivos específicos. Mas essa complexidade fomos nós que a criamos porque achamos que assim as formandas conseguem ter um plano formativo rico que as prepara bem e com horizontes muito mais alargados do que a preparação dada somente pela frequência da formação técnica certificada. Este plano coloca sobre nós uma exigência de tempo e dedicação que é maior e que tem sempre, lá está, esta tensão do projeto que tem que acabar ao fim de um ano. Esta questão que a Isabella estava a focar, eu acho que foi também a maior dificuldade que nós tivemos, sendo a primeira edição do programa Bairros Saudáveis, há algumas coisas que estão a ser testadas pela primeira vez e que por vezes não correm bem. O programa teve uma enorme aderência e muitos projetos candidatos o que gerou uma dinâmica incrível, que também tencionou bastante as capacidades de resposta e a gestão do calendário do próprio programa. Ou seja, houve atrasos muito grandes e hesitações repetidas que tiveram implicações muito sérias no decorrer dos projetos em si e exigências que à partida não estávamos à espera e que foram colocadas após a candidatura e para as quais eventualmente não estando à espera, não estávamos capacitadas. Mas acho que soubemos sempre dar resposta aos problemas que surgiram, incluindo os orçamentais, pois o orçamento que temos está longe de ser o ideal. Portanto, a equipa também está sempre a fazer o máximo possível para conseguir dar a melhor resposta, mas obviamente que muitas vezes com grande sofrimento e com grande cansaço. E, portanto, isso introduz dificuldades adicionais porque as condições de trabalho (remuneratórias e volume de trabalho) não são as melhores.

Isabella Rusconi: Eu queria fazer uma observação sobre esse último que a Patrícia colocou. A verdade é que a nossa proposta, ela foi uma proposta muito ambiciosa. A gente fez muito com muito pouco e isso era, talvez, um projeto para mais tempo, sem dúvida, e para o triplo do financiamento, né? Nós fizemos um esforço brutal, todas nós. Não é que as pessoas vão dizer que nós conseguimos fazer esse tipo de projeto em um ano e só com 50 000€. Não, o resto, tudo nos saiu do couro, assim, literalmente. A gente conseguiu hiper-capitalizar o projeto com doações ou com parcerias e o investimento das parcerias, mas isso saiu de um esforço brutal nosso. Também foi uma aprendizagem que um projeto, enquanto nós vemos os outros projetos que parecem editais culturais pequeninos, a gente fez uma proposta de um projeto que é um projeto piloto que facilmente se enquadra em um projeto de políticas públicas, sabe? Nós fizemos todo esse trabalho, a gente pode dizer que, de graça. Agora, então, talvez isso também não tenha sido um problema do programa, mas das expectativas que nós mesmas colocamos nesse projeto. Claro que o programa foi muito também exigente e que eles não cumpriram com toda essa parte, que eles não cumprem, nos penaliza e penaliza muito. Mas a gente também tem que reconhecer que a gente foi um pouco ambiciosa com o projeto.

Lia Antunes: Eu acho que esta pergunta era "O que é que foi mais difícil?" e "O que foi mais fácil?" Enfim, eu diria que foi muito exigente como disseram, mas também considero que correu bem. O que foi mais fácil, de facto, é que nós acreditámos muito, sempre, que este projeto valia a pena. E acho que acreditámos imenso neste projeto logo desde o início. E por isso é que ele correu bem até agora e vai fechar a correr bem, de certeza. E eu acho que essa é a parte mais fácil: quando acreditamos mesmo que algo vale a pena, então merece algum esforço e dedicação, apesar de todas as dificuldades, claro.

Isabella Rusconi: As dificuldades foram aprendizados também.

Patrícia Robalo: Penso que devemos ser bastante diretas. Ou seja, nós quisemos sempre criar as melhores condições para o desenvolvimento do projeto. Mas a maior parte da equipa está a trabalhar em voluntariado, sobretudo porque existe uma vontade e motivação, que tem génese numa inquietação comum, pela igualdade de direitos das mulheres. Mas os projetos de desenvolvimento comunitário ou inseridos em políticas públicas não deviam ser feitos com esta base. Ou seja, devia-se avaliar seriamente as implicações de um financiamento curto, porque existe de facto um reconhecimento da qualidade ou do alcance que os projetos podem ter, na adequabilidade do financiamento. Eu concordo com Isabella. Eu acho que fomos bastante ambiciosas, até porque, como já referimos, temos dois outros projetos em que não somos promotoras, somos parceiras. Os três projetos estão a realizar-se ao mesmo tempo e interligam-se pontualmente, mas todos eles precisam de uma atenção muito específica. Por outro lado, também nos faz pensar que condições é que devem ser dadas para que projetos de desenvolvimento comunitário e de desenvolvimento social sejam elaborados da melhor forma. E as questões dos recursos humanos e dos recursos técnicos, são muito importantes, porque muitas vezes as organizações que se candidatam a estes programas não são organizações completamente autónomas ou capacitadas do ponto de vista contabilístico e jurídico, portanto, não estão preparadas para respostas muito complexas nesses campos. E, portanto, há aqui uma especificidade que devia ser compreendida, e que o Bairros Saudáveis tentou compreender, mas que não deve significar a desvalorização dos projetos e de quem participa neles.

10) Existe algum plano de continuidade de continuar ou de replicar este projeto em outros bairros?

Lia Antunes: Neste momento não há planos. Não quer dizer que eles não existam um dia. Mas, neste momento, não. A equipa está muito cansada e com outras vidas para além disto. Neste momento não há planos para continuar.

Isabella Rusconi: Não há por isso. Porque temos agora outros compromissos.

Patrícia Robalo: O projeto tem um alcance de política pública, mas tem objetivos de desenvolvimento comunitário. Ou seja, é um projeto que questiona as políticas e as instituições de que não faz parte, nas áreas em que procura trabalhar. Contrapondo as políticas mais universalistas, uniformizadoras e abstratas, por exemplo, como são grande parte das políticas da formação, emprego e habitação do IEFP e do IHRU, com trabalho debruçado sobre um território concreto, centrado no mesmo grupo de pessoas e atendendo a cada uma delas e às suas necessidades e potencial. E, portanto, acabamos por nos enquadrar na área do desenvolvimento comunitário, mas agitando o nível macro. E isso faz com que uma segunda edição deste projeto tenha também essa procura por um território específico, por relações comunitárias ou de proximidade, existentes ou que se vão cultivando. Nós não queremos que seja um projeto replicável, mas assumimos a pertinência da matriz programática que criámos. Uma segunda edição tem de fazer sentido, quer para as pessoas, quer para as organizações, quer para o próprio território. E precisa de financiamento.

Isabella Rusconi: Muito, muito mais do que o financiamento que tivemos.

Patrícia Robalo: Se formos avaliar os financiamentos que existem e em que o projeto se pode enquadrar, são precisamente financiamentos com esta escala, dos 50 000€ para um ano de execução, que não é suficiente. E todos exigem estas dimensões: um território, uma rede de parcerias, uma calendarização e uma programação do próprio projeto. Mas, o que eventualmente fez sentido no Bairro de Santiago não fará sentido noutro bairro. Portanto, não é uma coisa que se deva replicar de forma cega, mas deve haver uma avaliação prévia para o reimaginar.

Financiamento

A realização desta entrevista teve financiamento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), através do projeto PTDC/ART-DAQ/32388/2017.

Referências

Antunes, L., Cavalcanti, G., Parnisari, E., Robalo, P., Rusconi, I. (2022). Mulheres em Construção! Um projecto ecofeminista em Aveiro. Le Monde Diplomatique (ed. portuguesa). https://pt.mondediplo.com/2022/05/um-projecto-ecofeminista-em-aveiro.htmlLinks ]

Santana, M.J. (2022). Mulheres de um bairro de Aveiro vão deixar de “chamar um homem” para as reparações lá em casa. P3 - Público. https://jornal.bairrossaudaveis.gov.pt/noticias/00000173,00000009/index.htm?elas-querem-abrir-portas-mas-tambem-repara-lasLinks ]

1 Instituição Particular de Solidariedade Social.

2Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa.

3Instituto do Emprego e Formação Profissional.

4Associação Portuguesa para a Reabilitação Urbana e Proteção do Património.

5Ordem dos Arquitectos.

6Projeto “Entre o chão e o telhado” promovido pelo Bela Vista - Centro Educação Integrada, em que MA é parceira.

8Como se pode ver, por exemplo, em Santana (2022).

9O já referido “Entre o chão e o telhado” nos bairros do Gravanço e de Vale Domingos de Águeda, e o “Saudinha”, no Bairro Social do Cabeço, em Tortosendo, na Covilhã, coordenado pela CooLabora.

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