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Revista Internacional em Língua Portuguesa

versão impressa ISSN 2182-4452versão On-line ISSN 2184-2043

RILP vol.42  Lisboa dez. 2022  Epub 30-Ago-2022

https://doi.org/10.31492/2184-2043.rilp2022.42/pp.13-26 

Artigo Original

Conhecimento, atitudes e práticas de estudantes universitários angolanos sobre o VIH/SIDA

Isabel Sobral1 

Alfredo Bastos2 

Marli Stela Santana3 

1 Instituto Superior de Ciências da Saúde da Universidade Católica de Angola.

2 Centro Interdisciplinar de Estudos e Pesquisas da Universidade Católica de Angola.

3 Programa de Iniciação Científica da Universidade Católica de Angola.


Resumo

O conhecimento equivocado sobre a transmissão do VIH, tratamento e conduta diante da seropositividade gera comportamentos de risco capazes de reforçar o aumento de casos de SIDA. O estudo teve como objetivo principal descrever o conhecimento, as atitudes e práticas dos estudantes da Universidade Católica de Angola, em relação ao risco de transmissão do VIH/SIDA. A pesquisa foi realizada com 275 estudantes. Observou-se quanto maior o nível de escolaridade, aumenta a possibilidade da realização do teste do VIH (p= 0,001), com aumento da possibilidade de aceitar conviver com alguém seropositivo (p=0,01), mas diminui a possibilidade de o indivíduo aceitar ter um parceiro VIH positivo (p=0,02). Assim, a maioria dos estudantes demonstrou ter um conhecimento adequado sobre a transmissão do VIH, mas há atitudes e práticas do cotidiano, capazes de influenciar comportamentos de risco na manutenção da propagação do VIH/SIDA.

Palavras-chaves: conhecimento; atitudes; práticas; VIH/SIDA; estudantes universitários; Angola

Abstract

The mistaken knowledge about HIV transmission, treatment and conduct in the face of HIV-positive status generates risky behaviors capable of reinforcing the increase in AIDS cases. The main objective of the study was to describe the knowledge, attitudes and practices of students at the Catholic University of Angola, regarding the risk of HIV/AIDS transmission. The research was carried out with 275 students. It was observed that the higher the level of education, the possibility of HIV testing increases (p = 0,001), with an increase in the possibility of accepting living with someone who is HIV-positive (p = 0,01), but the possibility of the individual decreasing having an HIV positive partner (p = 0,02). Thus, most students demonstrated to have an adequate knowledge about the transmission of HIV, but there are daily attitudes and practices, capable of influencing risk behaviors in the maintenance of the spread of HIV/AIDS.

Keywords: knowledge; attitudes; practices; HIV/AIDS; university students; Angola

Introdução

A Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (SIDA) surgiu no cenário epidemiológico em Junho de 1981, em um contexto clínico que sugeria uma abrupta queda na normal condição imunológica, quando em 1983, isolou-se um retrovírus T-linfotrófico, denominado por Vírus da Imunodeficiência Humana (VIH) (Duro, 2016).

A identificação do VIH constitui um desafio para a comunidade científica global, pois sua transmissão tem corroborado para um problema de saúde pública, de grande magnitude e caráter endémico, que envolve diversos atores, atingindo os indivíduos sem distinção social, económica, racial, cultural ou política (Dantas, Abrão, Costa & Oliveira, 2015).

A transmissão do VIH continua a ser um grande problema de saúde global, pois já causou a morte de mais de 35 milhões de pessoas, desde a sua descoberta até os dias atuais (Bonfim, 2020), constituindo um dos principais desafios em saúde pública da região africana (OMS, 2018). Atualmente, os dados do VIH/SIDA em Angola vêm do Inquérito de Indicadores Múltiplos e de Saúde de 2016, com indicação de que cerca de 223.350 adultos e 29.103 crianças vivem com o VIH/SIDA em Angola, cuja prevalência do VIH/SIDA em homens adultos (dos 15 aos 49 anos) é estimada em 1,2% e em mulheres, 2,6% (Instituto Nacional de Luta Contra a SIDA/INLS, 2018).

Cerca de 8% da população da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) é seropositiva. A prevalência em adultos (15-49 anos) é mais alta em Moçambique, onde mais de 10% da população adulta vivem com o VIH. A Guiné-Equatorial e a Guiné-Bissau têm uma prevalência de VIH superior a 3%, enquanto a prevalência em adultos de Angola é estimada em cerca de 2%. Os demais países possuem valores de prevalência inferiores a 1% na população geral (Programa Conjunto das Nações Unidas Sobre o VIH/SIDA/ONUSIDA & Comunidade dos Países de Língua Portuguesa/CPLP, 2018).

Dados epidemiológicos sobre o VIH no Brasil revelam que, ao longo dos anos, o número de pessoas atingidas pelo vírus continua aumentando. Estima-se que havia aproximadamente 900 mil pessoas com VIH no país em 2018 (Oliveira, Santos, Silva, Araújo, Braga & Melo, 2021). Em 2020, Portugal notificou 778 novos casos de infeção por VIH (Direção-Geral da Saúde/Instituto Nacional de Saúde, 2020).

Moçambique vive um ambiente de severa epidemia do VIH/SIDA. Estima-se que 1,8 milhão de pessoas vivam com o VIH no país, dos quais 36% são homens e 53% são mulheres maiores de 15 anos. A epidemia de VIH na Guiné-Bissau é considerada generalizada, compreende cerca de 36 mil pessoas infetadas (Programa Conjunto das Nações Unidas Sobre o VIH/SIDA/ONUSIDA & Comunidade dos Países de Língua Portuguesa/CPLP, 2018).

Segundo Mateus (2014), em Angola, os principais fatores de disseminação do VIH/SIDA são as precárias condições socioeconómicas da população, assim como práticas sexuais de risco, com início precoce das relações sexuais, práticas sexuais transacionais, coocorrentes e intergerações, multiplicidade de parceiros, barreiras culturais e religiosas.

Neste cenário, os jovens estão especialmente vulneráveis, pelo envolvimento em comportamentos de risco, tais como sexo sem proteção, consumo de drogas e álcool, violência baseada no género, sobretudo a praticada contra adolescentes e mulheres, a incluir, nomeadamente, incesto, abuso sexual, casamento precoce, violência do parceiro íntimo, violação conjugal, exploração sexual e tráfico, os quais elevam os riscos de infeção pelo VIH (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental/CEDEAO, 2020).

Assim, diante da pertinência do presente tema para a comunidade jovem angolana, verifica-se escassez de dados na literatura sobre os fatores que podem estar na base do risco de transmissão do VIH/SIDA na população universitária de Angola, o que motivou a realização desse estudo, com o objetivo principal de descrever o conhecimento, as atitudes e práticas dos estudantes da Universidade Católica de Angola, em relação ao risco de transmissão do VIH/SIDA.

Metodologia

Foi realizado um estudo do tipo transversal e descritivo, com a população de estudantes da Universidade Católica de Angola. A amostra foi extraída de uma população de 2.650 estudantes, com N-amostral de 275 indivíduos, matriculados nos cursos de licenciatura e pós-graduação, num intervalo de confiança de 95% (IC), com a probabilidade de erro de 5% e uma frequência esperada de 27,57% (Alwafi et al., 2018). A seleção dos indivíduos foi não probabilística, intencional, pela abordagem direta dos investigadores aos inquiridos. O projeto foi aprovado pelo Comité de Ética em Investigação em Seres Humanos da Universidade Católica de Angola, sob o protocolo n.18, aos 02 de junho de 2019, tendo a recolha dos dados sido realizada nos meses de junho e julho de 2019, através da aplicação de um questionário. A participação na pesquisa foi voluntária, após a assinatura de um termo de consentimento livre e esclarecido, como sinal de aceitação.

Resultados

No presente trabalho, a idade dos participantes variou de 17 a 66 anos, resultando em maior número de participantes das idades dos 17 aos 26 anos, representando 84,36% da amostra, com predominância de estudantes do sexo feminino (57,45%), com participação de 50 estudantes de cada Faculdade, nomeadamente a Faculdade de Direito, de Economia e Gestão, de Ciências Humanas, de Engenharia, do Instituto Superior de Ciências da Saúde, e de 25 estudantes da Faculdade de Teologia pelo facto da mesma conter um número reduzido de estudantes, estando a maioria dos inquiridos a frequentar o terceiro (3º) ano académico (26,90%) (Tabela 1).

Tabela 1 Dados sociodemográficos dos participantes do estudo 

Variáveis Frequência (%)
Idade
17 aos 26 232 84,36
27 aos 36 29 1054
37 aos 66 14 5,09
Sexo
Masculino 116 42,18
Feminino 159 57,82
Curso de Graduação
Direito 50 18,18
Economia e Gestão 50 18,18
Ciências Humanas 50 18,18
Engenharia 50 18,18
Instituto de Saúde 50 18,18
Teologia 25 9,09
Ano Curricular
1.º 35 12,72
2.º 60 21,81
3.º 74 26,9
4.º 54 19,63
5.º 52 18,9

Acerca do conhecimento da transmissão do VIH/SIDA, com base na menor tendência de respostas, a minoria dos estudantes afirmou que o VIH é a doença e a SIDA é o vírus (3,27%), que vírus pode ser transmitido pelo beijo (4%), que não há transmissão quanto a transmissão do VIH da mãe infetada para feto ou recém- nascido (12,36%), que há transmissão pela picada do mosquito (0,72%), que se transmite pela partilha de talheres (2,18%), que não há transmissão nas relações sexuais sem uso de preservativo (4%), não acreditam que haja transmissão pela partilha de objetos cortantes (11,64%), que a transfusão sanguínea não transmite o vírus (8,73%), que se transmite pelo abraço (0,36%), que pode haver transmissão no uso de casas de banho (1,45%), que a mordida de animais de estimação pode transmitir o vírus (4,36%), que tosse/espirro podem transmitir (1,09%) e que o vírus pode ser transmitido por feitiço (0,36%) (Tabela 2).

Tabela 2 Conhecimento sobre a transmissão do VIH/SIDA 

Variável Frequência (%)
O que é correto afirmar:
VIH é o virus e a SIDA é a doença 266 92,00
VIH é a doença e a SIDA é o virus 9 3,27
Como se transmite o VIH?
Pelo beijo?
Sim 11 4
Não 264 96
Da mãe infetada para o feto/recém-nascido?
Sim 241 87,64
Não 34 12,36
Pela picada de mosquito?
Sim 2 0,73
Não 273 99,27
Pela partilha de talheres?
Sim 6 2,18
Não 269 97,82
Sexo sem preservativo?
Sim 264 96
Não 11 4
Partilha de objetos cortantes?
Sim 243 88,36
Não 32 11,64
Transfusão Sanguínea?
Sim 251 91,27
Não 24 8,73
Abraço?
Sim 1 0,36
Não 274 99,64
Uso do mesmo banheiro?
Sim 4 1,45
Não 271 98,55
Por mordida de animais de estimação?
Sim 12 4,36
Não 263 95,64
Por tosse/espirro?
Sim 3 1,09
Não 272 98,91
Por feitiço?
Sim 1 0,36
Não 274 99,64

Quanto às atitudes dos estudantes, 153 (55,64%) já haviam feito a testagem para o VIH, 198 (72%) não aceitariam ter um parceiro seropositivo; se diante de uma testagem positiva contariam a alguém, 244 (88,73%) responderam que sim, 31 (11,27%) guardariam para si, 11 (4%) pensariam em suicídio e 264 (96%) responderam que a vida seguiria seu curso normal; caso testassem positividade para o VIH, 34 (12,36%) dos inquiridos buscariam a cura por uso de medicamentos, 10 (3,64%) buscariam a cura por práticas religiosas, 4 (1,45%) procurariam a cura por uso de medicamentos e por práticas religiosas e 1 (0,36%) buscaria a cura por outra prática; 258 (93,82%) disseram que a atividade sexual homossexual pode transmitir o VIH, 271 (98,55%) responderam que ter mais de um parceiro aumenta o risco de transmissão; 242 (88%) ainda disseram que entrariam em uma piscina com um seropositivo e 116 (42,18%) responderam que não aceitariam viver com um seropositivo no mesmo espaço (Tabela 3).

Tabela 3 Atitudes dos participantes do estudo sobre o VIH/SIDA 

Variáveis Frequência (%)
Já alguma vez fez o teste do VIH?
Sim 153 55,64
Não 122 44,36
Se testasses VIH positivo, o que faria?
Contarias a alguém? 244 88,73
Guardarias para si? 31 11,27
Pensarias que há solução após esse resultado 264 96,00
Pensarias em suicídio? 11 4,00
Se testasses VIH positivo, buscarias cura por algum meio?
Uso de medicamento 34 12,36
Práticas religiosas 10 3,64
Ambas as opções 4 1,45
Outra 1 0,36
Não há cura 226 82,18
Aceitarias ter um parceiro seropositivo?
Sim 77 28
Não 198 72
Ter mais de um parceiro aumenta o risco de contrair o VIH?
Sim 271 98,55
Não 4 1,45
Relações sexuais com pessoas do mesmo sexo podem transmitir o VIH?
Sim 258 93,82
Não 17 6,18
Entrarias na mesma piscina de um seropositivo?
Sim 242 88
Não 33 12
Aceitarias conviver com alguém seropositivo?
Sim 159 57,82
Não 116 42,18

Em relação às práticas dos estudantes, 16 (5,82%) relataram ter sofrido abuso sexual, 1 (0,36%) estudante admitiu que faz o uso de drogas ilícitas, 71 (25,82%) disseram cuidar das unhas em locais onde os instrumentos não são esterilizados e 10 (3,64%) relataram frequentar casas de prostituição (Tabela 4).

Tabela 4 Práticas de risco para contrair o VIH, dos participantes do estudo 

Variáveis Frequência (%)
Já sofreu abuso sexual?
Sim 16 5,82
Não 259 94,18
Faz uso de drogas injetáveis?
Sim 1 0,36
Não 274 99,64
Já tratou as unhas em pedicures ou manicures ambulantes, com instrumentos não esterilizados?
Sim 71 25,82
Não 204 74,18
Já frequentou casa de prostituição?
Sim 10 3,64
Não 265 96,36

Houve associação estatística significativa entre o nível de escolaridade e as variáveis ‘‘fez o teste de VIH’’ (p=0,001), ‘‘convive com alguém com VIH/SIDA’’ (p=0,01) e ‘‘não aceitaria ter um parceiro VIH positivo’’ (p=0,02) (Tabela 5).

Tabela 5 Associação estatística entre o nível de escolaridade e outras variáveis 

Variáveis r p*
Já alguma vez fez o teste do VIH 0,12 0,001
Aceitaria conviver com alguém com VIH/SIDA 0,02 0,01
Não aceitaria ter um parceiro seropositivo 0,02 0,02

* Nível de significância p ≤ 0,05

Discussão

No presente estudo, a maioria dos participantes era do sexo feminino, mostrando o mesmo perfil com estudos realizados ao norte do Malawi e no sudoeste da Nigéria, onde foram encontrados resultados semelhantes, pelo fato das mulheres estarem mais dispostas a falar sobre seus desafios no âmbito da saúde (Farotimi, Nwozichi & Ojediran, 2015; Mwale & Muula, 2018).

A maioria demonstrou ter conhecimento dos fatores que levam à transmissão do VIH, que combinam a transmissão sanguínea, via uso de drogas injetáveis ou transfusão sanguínea; a transmissão sexual; e a transmissão vertical, via gestação, parto ou amamentação (Oliveira, 2021). Todavia, 4% deles afirmaram ser possível a transmissão por meio do beijo, fato não restrito somente ao nível do conhecimento dos jovens angolanos, mas demonstrado em outros continentes, por exemplo, entre jovens portugueses, em que 31,7% dos entrevistados acreditavam nessa via de transmissão (Cunha, 2010).

Em outro estudo, acerca do conhecimento sobre as formas de transmissão do VIH/SIDA, 34,2% dos participantes responderam opções incorretas de transmissão do VIH através do mosquito e beijo na boca (Silva, Rocha, Pereira, Martins, Cardoso & Guisande, 2020). No que diz respeito à prevenção da transmissão vertical de mãe para filho, 52% das mulheres e 50% dos homens sabem que o VIH pode ser transmitido de mãe para filho (Matola, 2021).

O maior número de participantes acreditava que o VIH é transmitido pelo beijo (29,1%) enquanto um terço dos participantes acreditava na sua propagação por espirros/ tosse pertencia ao primeiro ano (31,5%). Além disso, mais da metade dos participantes sabia que existia diferença entre VIH e a SIDA, igualmente representada por ambos os grupos (60,4%) (Betra, Momon, Ochani, Awan, Bhimani, Siddiqui, Mohiuddin & Farooqi, 2020).

Também não constitui um fato isolado, a afirmação de 2 estudantes, de que a picada do mosquito pode transmitir o VIH, enquanto nos Emirados Árabes há estudantes que também partilham da mesma crença (Haroun, Saleh, Wood, Mechli & Marzouqi, 2016). Também não surpreende um respondedor do estudo acreditar no feitiço como meio de transmissão, como parte do arcabouço de crenças e vivências socioculturais muito característicos em África (Maloa, 2014), por ocasião do estudo identificado em Angola, em que a doença pode estar associada à culpa, pela alegação de ter sido provocada por alguém. No caso do VIH-SIDA, transgredir uma lei social, que seria, por exemplo, o doente ter cometido um adultério e, como tal, teria originado a infeção, ou porque houve um feitiço, feito por alguém, e, por isso, o indivíduo se infetou com o vírus.

Dos entrevistados, 70,1% sabiam que o VIH/SIDA não pode ser transmitido pela picada de mosquito, 73,8% sabiam que o VIH/SIDA não pode ser transmitido por feitiçaria, enquanto que 60,5% sabiam que não pode ser transmitido usando o mesmo banheiro. Notavelmente, apenas uma pequena maioria (59,2%) sabia que o VIH/SIDA não tem cura (Dzah, Tarkang & Lutala, 2019). Ainda quanto à cura da SIDA, verificou-se que pouco mais da metade dos participantes acreditava que não havia cura para a doença (58%) (Wozniak et al. 2020). Em outro estudo 87,2% dos participantes discordaram da ideia de que se pode contrair o HIV por feitiçaria (Estifanos, Hui, Tesafi, Teklu, Ghebrehiwet, Embaye & Andegiorgish, 2021).

Tendo em conta as atitudes, um total de 56,36% estudantes já fizeram o rastreio preventivo do VIH, frequência superior à da população de Angola, em que 47% das mulheres e 32% dos homens alguma vez fizeram um teste diagnóstico de VIH (Instituto Nacional de Estatística, 2017). Caso fosse confirmada seropositividade, 11,27% não contariam a alguém e 4% pensariam em suicídio, demonstrando em ambos os dados a necessidade do acompanhamento psicológico, não somente ao receber o diagnóstico, mas também ajudar na rede de apoio junto da partilha do diagnóstico com algum familiar, assim como na construção de relações afetivas no futuro. Um total de 51,1% dos participantes relatou ter feito o teste de VIH em algum momento antes da pesquisa e foram incluídos em nossa análise (Mugabe, Bhatt, Carlucci, Gudo, Sidat & Moon, 2019).

Em um estudo feito em Portugal, a maioria dos participantes reportou alguma vez ter realizado o teste ao VIH (57,9%) (Martins, Chaves, Carvalho & Pereira, 2018). Estudo de Alhasawi et al. (2019) demonstrou que 52,6% acham que uma pessoa infetada pelo VIH não precisa de isolamento em um hospital e pode ficar fora do mesmo.

O diagnóstico positivo de VIH também induziria 3,64% dos inquiridos a buscar cura por práticas religiosas, demonstrando a importância dos processos clínicos não negligenciarem o contexto social em que os indivíduos estão inseridos, através da cooperação entre profissionais de saúde e líderes religiosos, no enfrentamento à SIDA, para que haja maior adesão ao tratamento oficial preconizado pelas autoridades sanitárias do país.

Em Angola, o acesso à terapia antirretroviral (TARV) é universal, e todo o esforço tem sido realizado para que o tratamento inicie desde o diagnóstico da doença, sem interrupção, ao esclarecer os benefícios e riscos, respeitando-se a autonomia do indivíduo, cuja assistência ao paciente seropositivo encontra-se integrado aos diferentes serviços de saúde (Ministério da Saúde/MINSA, 2015).

Em relação às atitudes, 12% dos participantes não entrariam na mesma piscina que um indivíduo seropositivo, e outros 42,18% não aceitariam conviver com um seropositivo, demonstrando a necessidade de ampliar a discussão a respeito de viver a seropositividade, como medida educativa, pois dados recolhidos na população angolana demonstram que a redução do preconceito é duas vezes mais baixo entre indivíduos com nível secundário ou superior (52%), em relação a indivíduos sem escolaridade (21%) (Instituto Nacional de Estatística/INE, 2017).

Tendo em conta as respostas dos estudantes, quanto ao conhecimento sobre a transmissão do vírus e atitudes, verificou-se que não garantem que os jovens tenham comportamentos seguros, conforme expresso por Dzah, Tarkang e Lutala, (2019), pois as respostas destes, em relação às práticas, podem confluir para a transmissão do VIH, como é o caso de 74,18% dos estudantes que relataram ter cuidado das unhas em serviços ambulantes, com instrumentos não esterilizados, por serem de menor custo, mas com risco de contrair doenças de veiculação sanguínea, incluindo a SIDA.

Finalmente, verificou-se que quanto maior o nível de escolaridade, maior é a probabilidade do indivíduo fazer o teste do VIH (p=0,001), ser mais tolerante para aceitar conviver com alguém seropositivo (p=0,01), mas que não aceita ter um parceiro seropositivo (p=0,02). Esta última associação não poderia ser analisada isoladamente, apenas como um fator relacionado à escolaridade, mas sugere-se a realização de outros estudos futuros, a fim de analisar a questão sob outros aspetos, nomeadamente, os sociológicos e psicológicos, dentre outros, na compreensão da rejeição ao parceiro seropositivo.

Conclusão

Neste estudo, observou-se que a maioria dos estudantes demonstrou ter um conhecimento adequado sobre a transmissão do VIH/SIDA, mas que há atitudes e práticas do cotidiano, as quais podem induzir comportamentos de risco, ou constituírem desafios para o controle e tratamento da doença. Que ter o conhecimento aceitável sobre a transmissão do VIH/SIDA não é determinante para garantir atitudes e práticas seguras, havendo necessidade da realização de outros estudos capazes de identificar fatores com potencial de sobrepor-se ao conhecimento adquirido, especialmente concernente aos fatores socioculturais.

Agradecimentos

Ao Programa de Iniciação Científica da Universidade Católica de Angola e ao Centro Interdisciplinar de Estudos e Investigação, pelo apoio incondicional no desenvolvimento do estudo.

À Aurora Luiz, pelo apoio na organização dos dados.

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Contribuições dos autores: Isabel Sobral Cabaça e Alfredo Bastos contribuíram na recolha de dados, na análise dos dados e na elaboração do manuscrito. Marli Stela Santana supervisionou o estudo e na participou da elaboração do manuscrito.

Financiamento: O estudo não recebeu financiamento.

Disponibilidade de dados e materiais: Os conjuntos de dados utilizados e / ou analisados ​durante o estudo atual disponíveis com o autor correspondente Marli Santana, mediante solicitação razoável.

Aprovação ética e consentimento em participar: Comité de Ética em Investigação em Seres Humanos da Universidade Católica de Angola, e aprovado sob o protocolo n.18, aos 02 de Junho de 2019. O consentimento informado, por escrito, foi obtido de cada participante. As informações obtidas serão mantidas em total sigilo.

Consentimento para publicação: Os autores autorizam a publicação dos resultados.

Conflitos de interesse: Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Recebido: 17 de Maio de 2021; Aceito: 26 de Julho de 2021

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