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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versão impressa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.30 no.1 Lisboa fev. 2014

 

CARTA À DIRECTORA

A RPMGF e os seus leitores colaterais

RPMGF and its collateral readers

José Agostinho Santos*

*Assistente de Medicina Geral e Familiar, USF Dunas, ULS - Matosinhos

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

Como membro da equipa editorial, poderá parecer suspeito o realce que darei ao elevado impacto que as publicações da RPMGF têm na qualidade de cuidados ao paciente. Porém, salientarei este aspecto como mero leitor e como médico de família.

O conteúdo dos artigos espelha as competências da Medicina Geral e Familiar (MGF). Os trabalhos de revisão abordam temas da prática clínica diária relacionados com a gestão dos cuidados de saúde primários, os trabalhos de investigação produzem sobretudo patient-oriented-outcomes, enquanto que os relatos de caso projectam uma modelação holística, fazendo-se emergir da simplicidade do gabinete onde somente existem o médico de família, o paciente e a relação que os une.

O lado mais poderoso destes artigos é descortinado quando estes se transformam em ferramentas ou plataformas fornecedoras de conhecimento, promotoras da reflexão clínica e indutoras de segurança. Estes artigos são lidos, relidos, rasurados, consultados, acedidos e partilhados. Este é, de facto, o seu mais conhecido modo de uso: o acesso para actualização científica e discussão interpares. Porém, existe outro modo de utilização destas ferramentas que é menos executado, retendo uma gigante potencialidade na consulta: a sua partilha de médico para paciente.

Ao longo dos anos, a RPMGF tem publicado artigos de linguagem clara, com respostas directas para perguntas dos nossos pacientes (no alinhamento de uma evidence that matters), que poderá ter vindo a coleccionar leitores não-ligados à área clínica, mas profundamente interessados nesta temática ou nas suas questões de saúde.

Escrevo com alguma experiência prática quer na recepção de e-mails de leitores não-profissionais de saúde sobre artigos em que fui autor, quer na partilha de textos com alguns dos meus pacientes, de acordo com seus padrões socioculturais. Por exemplo, o artigo «Atestados para carta de condução - visão crítica do Decreto-Lei n.o 138/2012» tem tido um destaque notório.1 A redacção dos ditos atestados tem edificado um conjunto de questões entre médico de família e paciente desde a saída do Decreto-Lei 138/2012. No remate da consulta em que ambos (eu e paciente) elencámos as nossas próprias inquietações, tenho vindo a partilhar este artigo para que o paciente mais curioso conheça as restantes inquietações que se estendem a outros médicos e a outras relações médico-paciente.

Partindo de uma angústia mais intrusiva, também tenho vindo a partilhar o editorial «Listas de 1900 utentes: a quantidade questiona a qualidade», um texto que retém todas as dúvidas que assaltam o médico de família actual e que o paciente deverá igualmente conhecer, porque interfere directamente com os seus cuidados de saúde.2

Destacaria ainda artigos que vão completando, com todo detalhe, os aconselhamentos feitos no gabinete e que, para alguns pacientes, serão mais úteis que um panfleto. São artigos como «Desparasitação intestinal sistemática em idade pediátrica» e «Suplementação de iodo na pré-concepção, gravidez e amamentação: a recomendação e a Medicina baseada na inferência».3,4 Ambos envolvem temas polémicos, sobre os quais os pacientes mais atentos vão captando diferentes respostas entre clínicos e contradições no seio dos media. Para esses pacientes que nos questionam com entusiasmo sobre que há de mais concreto no seio dessas temáticas, a partilha destes artigos poderá consolidar a relação médico-doente. Tal não quererá dizer que os artigos seguem uma via de validação dos aconselhamentos médicos. Somente validam o interesse e a atitude de busca do paciente, algo que, em última instância, poderá ser favorecedor de um maior empowerment. Daí a relação terapêutica sair reforçada.

Finalmente, como na medicina tantas vezes não há preto nem branco, fará sentido guiar o paciente pelas diferentes tonalidades cinzentas do conhecimento médico. Em vez de se pensar que tal irá induzir insegurança, a abertura aos pacientes destes recintos de incertezas que dominam as nossas práticas poderá, paradoxalmente, apagar parte das incertezas desses mesmos.

Creio que a RPMGF re(abre), assim, mais um ciclo de procura pelas melhores respostas às questões relacionadas com o paciente (mais do que com a doença). Desse ciclo resultaram, portanto, publicações com leitores colaterais (colaterais no bom sentido): os próprios pacientes. Existe esta potencialidade a ser reconhecida pelos editores da revista e pelos médicos de família. É que os artigos poderão ter um impacto directo, para alguns pacientes, na busca de um melhor bem-estar biopsicossocial, pelo que a sua partilha, mesmo numa linguagem médica, poderá acrescentar-se a uma abordagem holística. Trata-se de algo que, mais do que curioso, será uma via de actuação da MGF sobre a comunidade, aqui representada pela sua revista.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Granja M. Atestados para carta de condução: visão crítica do Decreto-Lei n.º 138/2012. Rev Port Med Geral Fam 2013 Mai-Jun; 29 (3):191-9.         [ Links ]

2. Braga R. Listas de 1900 utentes: a quantidade questiona a qualidade. Rev Port Med Geral Fam 2012 Set-Out; 28 (5): 331-2.         [ Links ]

3. Xavier V, Domingues B, Marcos T. Desparasitação intestinal sistemática em idade pediátrica: uma revisão baseada na evidência. Rev Port Med Geral Fam 2012 Mai-Jun; 28 (3): 178-86.         [ Links ]

4. Silva F, Santos JA. Suplementação de iodo na pré-concepção, gravidez e amamentação: a recomendação e a Medicina baseada na inferência. Rev Port Med Geral Fam 2013 Nov-Dez; 29 (6):403-8.         [ Links ]

 

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

José Agostinho Santos

Rua da Cruz, 603, 4455-116 Lavra

zeagostinho@hotmail.com

 

Conflito de interesses

O autor declara um conflito de interesses: é editor - Clube de Leitura da RPMGF

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