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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

Print version ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.30 no.5 Lisboa Oct. 2014

 

CARTA À DIRECTORA

Impacto do envelhecimento da população na dimensão da lista de utentes dos médicos de família

Impact of ageing of the population on the list size of family physicians

Daniel Pinto*

*Departamento de Medicina Geral e Familiar, NOVA Medical School/Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Nova de Lisboa

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence


 

Nas últimas décadas tem-se observado um envelhecimento progressivo da população na maioria dos países desenvolvidos, incluindo Portugal.1 Este envelhecimento deve-se, por um lado, ao aumento da esperança média de vida e, por outro, à diminuição da natalidade. No caso português acresce ainda o aumento da emigração. Em Portugal, a esperança de vida à nascença era de 80,0 anos para os nascidos em 2012, 76,9 anos nos homens e 82,8 anos nas mulheres.2 Em 1990, a esperança de vida à nascença era de 74,1 anos e em 1970 de 67,1 anos. Já os nascimentos passaram de cerca de 181 mil em 1970, quando a população era de 8,7 milhões de habitantes, para 116 mil em 1990 (10,0 milhões de habitantes) e 90 mil em 2012 (10,5 milhões de habitantes).2 Assim, o índice de envelhecimento (quociente entre o número de pessoas com 65 ou mais anos e o número de pessoas até 14 anos) da população portuguesa passou de 34,0 em 1970 para 68,1 em 1990 e 131,1 em 2012.2 Como é natural, a carga de doença aumenta com a progressão da idade, assim como as necessidades de cuidados de saúde.

Em 2007, com a publicação do Decreto-Lei n.o 298/2007, sobre a organização de parte das equipas de cuidados primários em Unidades de Saúde Familiar, foi introduzido o conceito de unidades ponderadas.3 Com as unidades ponderadas assume-se que nem todas as pessoas têm a mesma necessidade de utilizar os serviços de saúde e que essa necessidade depende da sua idade. A idade é utilizada como um marcador de vulnerabilidade e morbilidade. O “peso” relativo de cada pessoa na lista de utentes de um médico de família passou a ser determinado da seguinte forma: cada criança até aos 6 anos passou a contar como 1,5 unidades ponderadas, as pessoas entre os 65 e 74 anos como duas unidades, as pessoas com 75 ou mais anos como 2,5 unidades e as restantes como uma unidade.

Definiu-se, neste Decreto-Lei, que cada médico de família deveria ter uma lista de utentes com pelo menos 1.917 unidades ponderadas, a que corresponderiam aproximadamente 1.550 utentes. No entanto, se considerarmos a distribuição etária da população portuguesa, em 2007 isso já não era verdade, correspondendo, em média, 1.917 unidades ponderadas a 1.529 utentes (figura 1).2 O cálculo definido pela legislação parece ter sido feito com base na estrutura etária da população portuguesa em 2001 (data do Censo anterior), quando 1.917 unidades ponderadas correspondiam a 1.549 utentes. Em 2013 já só eram necessários 1.499 utentes para atingir 1.917 unidades ponderadas e a projecção do Instituto Nacional de Estatística indica que, em 2035, este número será atingido com apenas 1.306 utentes.4

 

 

Da mesma forma, o Decreto-Lei n.o 266-D/2012, que regula as novas carreiras médicas, definiu que para o regime de 40 horas de trabalho semanal os médicos de família deveriam ter listas com um máximo de 1.900 utentes, que seriam correspondentes a 2.358 unidades ponderadas.5 Contudo, nesse mesmo ano de 2011, a estrutura da população portuguesa indicava que, em média, seriam necessários apenas 1.857 utentes para obter as 2.358 unidades ponderadas definidas na lei.2 Em 2035 serão suficientes 1.607 utentes para atingir este número de unidades ponderadas.3

O envelhecimento da população acontece de forma heterogénea, variando o índice de envelhecimento em 2013 entre 34,8% na Ribeira Grande e 788,4% em Vila Velha de Rodão,2 pelo que os números indicados acima terão de ser ajustados localmente.

Se considerarmos as unidades ponderadas como um factor adequado para ajustamento da carga de trabalho do médico de família e as dimensões das listas de utentes em unidades ponderadas previstas na legislação como adequadas, então é clara a necessidade de adaptar o número de utentes por médico de família ao envelhecimento da população. Caso contrário, a carga de trabalho irá aumentar progressivamente pela maior morbilidade associada a listas de utentes mais envelhecidas e a incapacidade dos médicos de família para responder às necessidades dos seus utentes será notória. A adaptação do número de utentes por lista implica que serão necessários mais médicos de família para que sejam geridas listas mais pequenas; ou que parte das tarefas dos médicos de família seja delegada noutros profissionais de saúde, libertando os médicos para actividades que apenas estes profissionais podem realizar. Qualquer que seja o caminho a seguir, o planeamento dos recursos futuros por parte do Ministério da Saúde e das suas Administrações Regionais deve começar de imediato para que as necessidades da população não sejam comprometidas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Instituto Nacional de Estatística. População residente em Portugal com tendência para diminuição e envelhecimento. Lisboa: INE; 2014 (cited 2014 Aug 18). Available from: http://www.ine.pt/ngt_server/attachfileu.jsp?look_parentBoui=218948085&att_display=n&att_download=y .         [ Links ] Portuguese

2. Instituto Nacional de Estatística. Base de dados: estimativas anuais da população residente. Lisboa: INE; 2011 (cited 2014 Aug 18). Available from: www.ine.pt.         [ Links ] Portuguese

3. Decreto-Lei nº 298/2007, de 22 de Agosto. Diário da República. 1ª série(161).

4. Instituto Nacional de Estatística. Projeções de população residente 2012-2060. Lisboa: INE; 2014 (cited 2014 Aug 18). Available from: http://www.ine.pt/ngt_server/attachfileu.jsp?look_parentBoui=215593684&att_display=n&att_download=y .         [ Links ] Portuguese

5. Decreto-Lei nº 266-D/2012, de 31 de Dezembro. Diário da República. 1ª série(252).

 

Endereço para correspondência | Dirección para correspondencia | Correspondence

Daniel Pinto

Departamento de Medicina Geral e Familiar

Faculdade de Ciências Médicas

Campo dos Mártires da Pátria, 130

1169-056 Lisboa

E-mail: daniel.pinto@fcm.unl.pt

 

Conflito de interesses

O autor declara não ter conflitos de interesses.

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