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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versión impresa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.32 no.5 Lisboa oct. 2016

 

CLUBE DE LEITURA

Erradicação de Helicobacter pylori: terapêutica sequencial ou standard?

Helicobacter pylori eradication: sequential or standard therapy?

Carla Patrícia Silva, Sofia Faria

Médicas Internas de Medicina Geral e Familiar, USF Lagoa - Unidade Local de Saúde de Matosinhos


 

Nyssen OP, McNicholl AG, Megraud F, Savarino V, Oderda G, Fallone CA, et al. Sequential versus standard triple first-line therapy for Helicobacter pylori eradication. Cochrane Database Syst Rev. 2016;(6):CD009034.

Introdução

A infeção por Helicobacter pylori (Hp) atinge cerca de 50% da população adulta a nível mundial. A terapêutica tripla standard (STT) é a mais utilizada na erradicação do Hp, consistindo na associação de um inibidor da bomba de protões (IBP), amoxicilina e claritromicina, duas vezes por dia, num regime de sete, dez ou catorze dias. Mais recentemente, a terapêutica sequencial (SEQ) - IBP e amoxicilina, duas vezes por dia, durante cinco dias, seguido de IBP, claritromicina e nitroimidazol (metronidazol ou tinidazol), duas vezes por dia, nos cinco dias seguintes - tem sido proposta como uma alternativa à terapêutica STT.

Esta meta-análise da Cochrane compara a eficácia das terapêuticas SEQ e STT na erradicação do Hp, bem como a incidência de efeitos adversos.

Métodos

Foi realizada uma pesquisa bibliográfica nas bases de dados da Cochrane Central Register of Controlled Trials (CENTRAL), Cochrane Library, MEDLINE, EMBASE e CINAHL até abril de 2015. Esta foi complementada com uma pesquisa manual de trabalhos apresentados em conferências, ainda não publicados.

Os critérios de seleção incluíram ensaios clínicos controlados e randomizados (RCT) que compararam as terapêuticas SEQ e STT (com duração de pelo menos sete dias) na erradicação da Hp, em adultos e crianças com o diagnóstico desta infeção e naïves para o tratamento.

Resultados

Foram incluídos 44 RCT com um total de 12.284 participantes. A análise global (intention-to-treat) mostrou que a proporção de erradicação foi superior com a terapêutica SEQ em comparação com a STT (82% vs 75%; diferença de riscos (RD) 0,09; intervalo de confiança (IC) 95% 0,06 a 0,11; p<0,001; evidência de qualidade moderada). Os resultados foram muito heterogéneos (I2=75%) e 20 estudos não encontraram diferenças entre as duas terapêuticas.

A análise por região geográfica mostrou que a diferença entre as terapêuticas SEQ e STT é superior na Europa, comparativamente ao observado na Ásia, África e América do Sul, com uma tendência para uma maior eficácia da SEQ a nível europeu.

A análise por subgrupo, baseada em evidência de elevada qualidade, revelou que as terapêuticas SEQ e STT são equivalentes, quando a duração da STT é de 14 dias.

Ao longo dos anos notou-se uma redução da proporção de erradicação de Hp com os dois regimes terapêuticos com uma maior redução da eficácia da SEQ (-1,72% por ano), relativamente à STT (-0,9% por ano). Nos estudos mais recentes (após 2008), não foi possível detetar superioridade da SEQ em relação à STT, quando esta tem uma duração de 10 dias.

A maior diferença entre as terapêuticas SEQ e STT verifica-se na análise por subgrupo de participantes com resistência à claritromicina, onde a SEQ atinge uma eficácia de 75% versus 43% com a STT (evidência de baixa qualidade).

Relativamente aos efeitos adversos não se verificaram diferenças entre os dois regimes terapêuticos (20,4% na SEQ vs 19,5% na STT; RD 0,00; IC 95% -0,02 a 0,02), sendo estes resultados homogéneos (I2=26%).

Conclusão

Esta meta-análise conclui que a terapêutica SEQ é mais eficaz do que a STT quando esta é administrada durante apenas sete dias. No entanto, a aparente superioridade da SEQ tem decrescido ao longo dos anos e os estudos mais recentes não mostram maior eficácia da SEQ comparativamente à STT com duração de dez dias. Ainda assim, nenhum dos regimes é considerado ideal, uma vez que não alcançam uma taxa de erradicação ótima (≥90%).

COMENTÁRIO

A infeção por Hp é uma causa comum de doença ulcerosa péptica, gastrite crónica e carcinoma gástrico. 1-2 Atualmente, e segundo o IV Consenso de Maastricht, existe uma forte recomendação para o tratamento de erradicação nos doentes com teste de Hp positivo e doença ulcerosa péptica, linfoma MALT gástrico, gastrite atrófica, após resseção de carcinoma gástrico, em familiares de 1º grau de doentes com carcinoma gástrico e em caso de preferência do doente, após discussão com o médico assistente.1

O benefício da erradicação do Hp permanece controverso nos doentes com dispepsia funcional; com doença do refluxo gastroesofágico; com anemia ferropénica; bem como nos doentes medicados com anti-inflamatórios não esteróides (sendo que a toma de AINE e a infeção por Hp são considerados fatores de risco independentes para o desenvolvimento de doença ulcerosa péptica); e nas populações de risco elevado de carcinoma gástrico, embora exista alguma evidência que sugere que a erradicação pode prevenir a progressão de metaplasia intestinal para carcinoma gástrico.2

A erradicação deste patogéneo tem como principal objetivo impedir a progressão de lesões gástricas, potencialmente malignas, mais do que a resolução sintomática.3

Este tratamento tem sido alvo de grande investigação nos últimos anos, tendo sido propostos múltiplos regimes terapêuticos. Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde recomenda a terapêutica tripla como primeira linha nos doentes com teste de Hp positivo, com uma duração de 10 a 14 dias.4

A taxa de sucesso de erradicação com a STT tem vindo a diminuir progressivamente ao longo dos anos e dados recentes revelam uma taxa de cura de apenas 70% dos casos submetidos a este regime terapêutico. Vários fatores têm sido apontados como potenciais causas, nomeadamente a baixa adesão à terapêutica, a elevada acidez gástrica, a alta carga bacteriana e o tipo de estirpe. No entanto, a principal causa é a resistência aos antimicrobianos, particularmente à claritromicina, que tem vindo a aumentar na Europa, atingindo prevalências superiores a 20% na maioria dos países da Europa Central, Ocidental e do Sul.1

A eficácia da STT tem sido inversamente associada à carga bacteriana, com maior taxa de erradicação nos casos de menor carga bacteriana do Hp a nível gástrico. Assim, tem sido proposta a terapêutica SEQ como uma alternativa potencialmente mais eficaz, na medida em que concilia uma primeira fase (cinco dias) de amoxicilina, que atua como uma fase de indução e diminui a carga bacteriana, com uma fase subsequente (mais cinco dias) de claritromicina e nitroimidazol que tem como objetivo a erradicação da população bacteriana residual. Estima-se que cerca de 50% das pessoas atinjam a erradicação do Hp com a primeira fase da SEQ e, além disso, o recurso inicial à amoxicilina parece prevenir a resistência secundária à claritromicina.3

Esta meta-análise vem realçar o benefício da terapêutica SEQ apenas sobre a STT de sete dias de duração. Em estudos mais recentes, que comparam a terapêutica SEQ com a STT administrada por 10 ou 14 dias, esta superioridade da terapêutica SEQ já não se verifica.

De notar que os estudos incluídos apresentam alguma heterogeneidade, comparando a terapêutica SEQ (10 dias) com a STT de diferentes tempos de duração (sete, dez e catorze dias), bem como diferentes doses de antibióticos e diferentes tipos de nitroimidazóis (metronidazol ou tinidazol). Além disso, em ambos os regimes são utilizados diferentes tipos e dosagens de IBP, embora não se verifique diferença na taxa de erradicação com base nos diferentes níveis de inibição da secreção ácida.3

As taxas de erradicação tanto com a SEQ e a STT (82% e 75%, respetivamente) permanecem abaixo da considerada ótima (≥90%) e, além disso, tem-se verificado uma diminuição progressiva ao longo dos anos.3 Portanto, a terapêutica sequencial não pode ser considerada como alternativa adequada de primeira linha e, atualmente, não dispomos de um regime terapêutico ideal para a erradicação do Hp, o que se deve sobretudo à crescente resistência aos antimicrobianos. Por conseguinte, são necessários mais estudos de boa qualidade metodológica que explorem a eficácia de outros tratamentos propostos, como a terapêutica quádrupla concomitante (IBP associado a três antibióticos - amoxicilina, claritromicina e metronidazol), a terapêutica sequencial com duração de 14 dias e a terapêutica modificada com levofloxacina ou tetraciclinas.3,5

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. Malfertheiner P, Megraud F, O’Morain CA, Atherton J, Axon AT, Bazzoli F, et al. Management of Helicobacter pylori infection: the Maastricht IV/ Florence Consensus Report. Gut. 2012;61(5):646-64.         [ Links ]

2. Chey WD, Wong BC, Practice Parameters Committee of the American College of Gastroenterology. American College of Gastroenterology guideline on the management of Helicobacter pylori infection. Am J Gastroenterol. 2007;102(8):1808-25.         [ Links ]

3. Nyssen OP, McNicholl AG, Megraud F, Savarino V, Oderda G, Fallone CA, et al. Sequential versus standard triple first-line therapy for Helicobacter pylori eradication. Cochrane Database Syst Rev. 2016;(6):CD009034.         [ Links ]

4. Direção-Geral da Saúde. Supressão ácida: utilização dos inibidores da bomba de protões e das suas alternativas terapêuticas: norma da DGS nº 036/2011, de 30/09/2011. Lisboa: DGS; 2011.         [ Links ]

5. Silva AA, Macedo R, Fernandes DN, Sousa L, Miranda A. Erradicação do Helicobacter pylori: fim de linha para a terapêutica tripla standard?. Rev Port Med Geral Fam. 2015;31(6):392-400.         [ Links ]

 

Conflitos de interesse

As autoras declaram não ter conflito de interesses

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