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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versión impresa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.36 no.6 Lisboa dic. 2020  Epub 01-Dic-2020

https://doi.org/10.32385/rpmgf.v36i6.12608 

Artigo breve

Vacina contra o herpes zoster em Portugal

Herpes zoster vaccine in portugal

Margarida Gil Conde1 
http://orcid.org/0000-0001-9367-5899

Raquel Carmona Ramos1 

1Médicas Internas de Medicina Geral e Familiar. USF Vasco da Gama, ACeS Lisboa Central. Portugal.


Resumo

Herpes zoster (HZ), também conhecido por zona, é uma doença causada pela reativação do vírus varicella zoster (VZ). O aumento da idade pode ser um fator de risco para HZ e as suas maiores complicações são a nevralgia pós-herpética (NPH) e o herpes zoster ophtalmicus (HZO). A vacinação para HZ é um método eficaz e seguro para a prevenção da doença em doentes imunocompetentes e são vários os estudos e revisões que suportam a indicação para vacinação da população a partir dos 60 anos. Embora existam duas vacinas disponíveis no mercado norte americano, em Portugal apenas se encontra aprovada a vacina viva atenuada (VVA) - Zostavax®.

Apesar de ainda não existirem muitos estudos, os já realizados parecem mostrar superioridade no custo-eficácia da vacina recombinante (VR), Shingrix®, quando comparada com a VVA.

Estima-se que 10-30% da população portuguesa seja afetada pela reativação do vírus pelo que urge a importância de se avaliar o real impacto de HZ na população e, caso este se verifique relevante, estudar a necessidade de recomendar a vacinação a todos os doentes com idade superior a 60 anos e aprovar a nova VR.

Palavras-chave: Vacina do herpes zoster; Neuralgia pós-herpética.

Abstract

Herpes zoster (HZ), also known as shingles, is a disease caused by the reactivation of the varicella-zoster (VZ) virus. Increasing age can be a risk factor for the development of HZ, which has, as main complications, postherpetic neuralgia (PHN) and herpes zoster ophtalmicus (HZO). Vaccination against VZ is an effective and safe method for prevention in immunocompetent patients and it is recommended, according to many studies, for patients over 60 years old. Although there are two vaccines available in the United States of America, in Portugal only the live-attenuated vaccine (LAV), Zostavax®, was approved.

Despite the lack of studies, the ones that were conducted seem to demonstrate the cost-effectiveness superiority of the recombinant vaccine (RV), Shingrix®, when compared to the LAV.

It is estimated that 10-30% of the Portuguese population is affected by the reactivation of the virus, which demonstrates the need to evaluate the real impact of the disease on our population. It is also necessary to study the benefits of recommending vaccination to every immunocompetent patient above 60 years old and of approving the new RV.

Keywords: Herpes zoster vaccine; Postherpetic neuralgia.

A doença e a vacinação

Herpes zoster (HZ), também conhecido por zona, é uma doença causada pela reativação do vírus varicella zoster (VZ).1 O vírus é adquirido habitualmente na infância e manifesta-se sob a forma de varicela.2 Após a apresentação inicial, o vírus permanece latente nos gânglios da raiz dorsal ou nos nervos cranianos, podendo reativar-se sob certas circunstâncias.3 O sistema imunitário impede primariamente esta reativação. O aumento da idade pode ser um fator de risco para HZ, assim como flutuações na imunidade celular que podem ocorrer em determinados estados patológicos, comorbilidades, medicamentos e outros fatores, que também originam esta reativação.2,4-5 As complicações major do HZ, que afetam cerca de 10 a 20% dos doentes, são a nevralgia pós-herpética (NPH) e o herpes zoster ophtalmicus (HZO).

A NPH é definida como dor, debilitante e difícil de controlar, que persiste mais de três meses após o desaparecimento das lesões cutâneas e cuja incidência aumenta exponencialmente com o avançar da idade. Até à data não existe nenhuma intervenção que alivie eficazmente a dor da NPH. O HZO ocorre quando o HZ se apresenta na divisão oftálmica do quinto par craniano, estimando-se que haja envolvimento ocular em cerca de 50% dos doentes quando não são utilizados antivirais.1,6-7

Cerca de 25% da população está em risco de desenvolver HZ e, na Europa, é estimado que a incidência de HZ seja entre 2,0 e 4,6 casos por 1.000 pessoas-ano.7-9

Nesse sentido, releva-se a importância de estratégias preventivas que estão já a ser utilizadas noutros países. A vacinação dos adultos mais velhos está recomendada em países como os Estados Unidos da América (EUA), Canadá, França, Reino Unido e estudos de custo-eficácia apoiam programas de vacinação noutros países.9-13 A vacinação para HZ é um método eficaz e seguro para a prevenção da doença em doentes imunocompetentes; contudo, vários estudos estão em curso para verificar a segurança e eficácia em doentes imunocomprometidos.14-20

Vários estudos e revisões suportam a indicação para vacinação da população a partir dos 60 anos. Existe alguma referência na literatura ao potencial benefício de introduzir a vacinação mais cedo, nomeadamente a partir dos 50 anos, mas os ganhos na diminuição da incidência de HZ e comorbilidades não parecem justificar o investimento.20

Apesar de haver duas vacinas disponíveis no mercado norte americano, em Portugal apenas a vacina viva atenuada (VVA), Zostavax®, se encontra aprovada.

Vacinação contra HZ em Portugal

No ano de 2015, a VVA foi aprovada pelo INFARMED21 para comercialização em Portugal, com a indicação de prevenir a reativação do vírus na forma de herpes zoster e as comorbilidades referidas anteriormente. Trata-se de uma vacina viva, atenuada, que pode ser administrada por via subcutânea ou intramuscular, preferencialmente na região deltoide, numa única dose.

De momento a vacina encontra-se indicada para vacinação de doentes com idade igual ou superior a 50 anos, numa base de decisão individual e tem um preço de venda ao público de aproximadamente 142,58 euros, dos quais são comparticipados 74,08 euros, mediante prescrição médica.

Apesar desta indicação, a vacina encontra-se apenas mencionada no Programa Nacional de Vacinação (PNV)22 pelo facto de se tratar de uma vacina viva, omitindo-se as suas indicações.

Em Portugal, os dados relativos à reativação do VVZ são limitados, provavelmente porque varicela e zona não são doenças de declaração obrigatória sendo, por esse motivo, mais difíceis de categorizar quanto à incidência. Contudo, estima-se que 10-30% da população seja afetada pela reativação do vírus.23 Relativamente a internamentos hospitalares com herpes zoster como diagnóstico principal, um estudo realizado em Portugal verificou a ocorrência de 1.706 internamentos hospitalares, entre os anos de 2000 e 2010, por esta patologia. A duração média dos internamentos relatados foi de 9,3 dias e verificou-se uma letalidade intra-hospitalar de 1%.24

Nova vacina

A vacina recombinante (VR) Shingrix® foi aprovada para a prevenção de herpes zoster na União Europeia (UE), Estados Unidos da América (EUA), Japão, Canadá e Austrália e, para prevenção de NPH, na UE e Austrália em pessoas com idade igual ou superior a 50 anos.17 Esta vacina contém o antigénio da glicoproteína E, que é o antigénio mais abundante em células infetadas pelo vírus, e o sistema adjuvante AS01.21,25 Consiste na administração de duas doses intramusculares com espaçamento de dois a seis meses entre elas. Não está indicada para a prevenção primária da varicela.17 Em Portugal não foi ainda aprovada a sua comercialização.

Um estudo comparou o impacto da introdução das duas vacinas na população alemã com idade superior ou igual a 50 anos e concluiu que o número necessário tratar (NNT) da vacina recombinante comparativamente com a VVA era muito inferior: oito a onze casos versus vinte a cinquenta casos, respetivamente.25

São vários os estudos de custo eficácia comparando a VVA versus a não vacinação em diferentes idades de administração.26-31 Estudos com a VR são em menor quantidade, uma vez que se trata de uma vacina aprovada pela Food and Drug Administration (FDA) apenas em outubro de 2017 e pela Comissão Europeia em abril de 2018, e ainda não se encontra comercializada em vários países.

Um estudo realizado na população americana com mais de 60 anos demonstrou que a VR é custo-efetiva quando comparada com a não administração da vacina e que há uma redução de custos quando comparada com a vacina atenuada.31

Um outro estudo, desenvolvido em dezoito países diferentes da Europa, América do Norte, América Latina, Ásia e Austrália, demonstrou uma eficácia de 97,2% da VR quando comparada com placebo na redução de HZ em indivíduos com idade superior ou igual a 50 anos, sem diferenças na eficácia com variação da idade. Já a VVA, em outros estudos, teve menor eficácia em participantes com idade igual ou superior a 70 anos (37,6%) e naqueles entre os 50-59 anos (69,8%).32

O centro de controlo de doenças e prevenção dos EUA mostrou que na maioria a vacinação com VR evitou mais doença com custos gerais mais baixos do que a vacinação com VVA.13

Na sua generalidade, os estudos comparativos entre as duas vacinas demonstram uma superioridade na eficácia da VR, tanto a nível da infeção do herpes vírus como na NPH.

Discussão e conclusão

As revisões mais recentes sobre o tema são concordantes relativamente à indicação para vacinação da população a partir dos 60 anos.

A vacinação em doentes mais novos parece ser supérflua e não trazer diminuição significativa da incidência de HZ e comorbilidades que validem a sua inclusão nas recomendações.

Contudo, é necessário ter em mente que as recomendações existem para países nos quais foram elaborados estudos custo-eficácia tendo em conta a prevalência da doença nessas regiões, bem como a morbilidade e gastos associados às suas complicações.

Os sistemas de saúde Beveridgianos, como é o caso do SNS, requerem uma análise extensa e detalhada antes da implementação e comparticipação de programas vacinais e das vacinas selecionadas, dependendo da idade dos doentes e de outros fatores.

Destaca-se, por isso, a superioridade demonstrada da VR quer na prevenção de HZ como na longevidade da proteção que confere comparativamente à VVA.

Analisando o preço de venda ao público da vacina disponível verifica-se que não é uma opção viável para a maioria dos Portugueses, pelo que a introdução de uma nova vacina que competisse com a atual poderia não só trazer competitividade ao mercado como oferecer uma proteção superior.

Este artigo pretende levantar a necessidade de avaliar o real impacto de HZ na população Portuguesa e, caso este se verifique relevante, estudar a necessidade de recomendar a vacinação a todos os doentes com idade superior a 60 anos.

Agradecimentos

As autoras agradecem o contributo do Dr. Filipe Serrano.

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Endereço para correspondência Margarida Gil Conde E-mail: margarida.gil.conde@gmail.com

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