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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versão impressa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.38 no.5 Lisboa out. 2022  Epub 31-Out-2022

https://doi.org/10.32385/rpmgf.v38i5.13365 

Relatos de caso

Ninguém nasce com micose

No one is born with mycosis

Ana Cláudia Paiva1 
http://orcid.org/0000-0001-7371-7828

Ana Luísa Silva2 

Maria João Cruz3 

1. USF São João de Sobrado. Sobrado, Portugal.

2. USF Bela Saúde. Ermesinde, Portugal.

3. Hospital de São João, Faculdade de Medicina do Porto. Porto, Portugal.


Resumo

Introdução:

O mau alinhamento congénito ungueal do hálux caracteriza-se pelo desvio lateral do prato ungueal, com consequente hiperqueratose e distrofia ungueal. A sua etiologia não está completamente esclarecida e apresenta-se frequentemente desde o nascimento. Esta condição é frequentemente mal diagnosticada e tratada como onicomicose.

Descrição do caso:

Menina de sete anos, previamente saudável, foi referenciada à consulta de dermatologia pela médica de família por “onicomicose das unhas dos háluxes” refratária a tratamento com antifúngicos tópicos nos últimos 18 meses. Ao exame objetivo apresentava unhas de coloração amarelo-acastanhada e hiperqueratose com distrofia de ambos os háluxes, valgismo bilateral dos primeiros dedos e distrofia ungueal dos segundos dedos dos pés, sem sinais inflamatórios. A menina apresentava alterações ungueais desde o nascimento, sem história de trauma, e o pai apresentava um quadro idêntico, também resistente ao tratamento com antifúngicos, desde há vários anos. Foi assumido o diagnóstico de distrofia ungueal secundária ao mau alinhamento congénito ungueal dos háluxes. Recomendou-se a aplicação de um creme de ureia e raspagem das unhas de acordo com o conforto da criança.

Comentário:

O conhecimento desta entidade permite estabelecer um correto diagnóstico, evitando tratamentos desnecessários e possíveis efeitos adversos. Sublinha-se a importância de uma história clínica cuidada, com destaque para o início do quadro clínico e a existência de quadros semelhantes na família. A aparência ungueal dismórfica desde o nascimento ou primeira infância deverá alertar para uma condição diferente de onicomicose, sendo esta infrequente em idades tão precoces.

Palavras-chave: Mau alinhamento congénito ungueal do hálux; Onicomicose; Anomalias ungueais

Abstract

Introduction:

Congenital malalignment of the great toenail is characterized by the lateral deviation of the nail plate along the longitudinal axis of the distal phalanx, with subsequent nail thickening and dystrophy. Its pathogenesis remains incompletely understood, and, generally, the lateral deviation of the nail plate is present from birth. This condition is often misdiagnosed and treated as onychomycosis.

Case description:

A healthy 7-year-old girl was referred to a dermatology clinic for “onychomycosis of great toenails”. Prior treatments included topical antifungals for the last 18 months, without any improvement. Physical examination revealed both great toenails to have a tan-yellow discoloration and marked thickening of both nail plates, mild valgus deviation of great toes, and minimal nail changes of second toenails, with no signs of inflammation. These findings were presented almost since birth and there was no history of trauma. Her father had identical symptoms, also resistant to antifungal therapy. The patient was diagnosed with nail dystrophy secondary to congenital malalignment of the great toenails. Due to its mild presentation, topical treatment with urea cream was prescribed, with nail filing according to child comfort.

Comment:

The recognition of this entity ables one to achieve a correct diagnosis, avoiding unnecessary treatments and possible adverse effects. It is important a detailed clinical history, namely the beginning of symptoms and the occurrence of identical symptoms in other family members. Nail changes present since birth or first childhood should alert to a condition different from onychomycosis, which is rare in such young patients.

Keywords: Congenital malalignment of the great toenail; Onychomycosis; Nail abnormalities

Introdução

A apresentação do caso clínico foi motivada pelo desconhecimento generalizado em torno do mau alinhamento congénito ungueal do hálux, que é frequentemente mal diagnosticado e tratado como onicomicose.1 O limitado número de publicações referentes a esta condição sugere uma baixa incidência, (2 potenciando o seu anonimato. Assim, este relato de caso tem como objetivo alertar para a existência desta entidade, de forma a permitir estabelecer um correto diagnóstico e, consequentemente, evitar tratamentos desnecessários e possíveis efeitos adversos.

Descrição do caso

Menina de sete anos, previamente saudável, foi referenciada à consulta de dermatologia pela médica de família por “onicomicose das unhas dos háluxes” refratária a tratamento com antifúngicos tópicos nos últimos 18 meses, com agravamento progressivo. Ao exame objetivo apresentava unhas de coloração amarelo-acastanhada e hiperqueratose com distrofia de ambos os háluxes, ligeiro valgismo bilateral dos primeiros dedos e ligeira distrofia ungueal dos segundos dedos dos pés, sem sinais inflamatórios locais. Na anamnese apurou-se que a menina apresentava alterações ungueais quase desde o nascimento, sem história de trauma, e que o pai tinha um quadro idêntico, também refratário ao tratamento com antifúngicos, desde há vários anos. Foi assumido o diagnóstico de distrofia ungueal secundária ao mau alinhamento congénito ungueal dos háluxes. Atendendo à manifestação clínica ligeira foi recomendada a aplicação de um creme de ureia e raspagem das unhas de acordo com o conforto da criança.

Figura 1 Pés da menina demonstrando um mau alinhamento congénito ungueal do hálux bilateral, com consequente hiperqueratose e distrofia ungueal. 

Comentário

O mau alinhamento congénito ungueal do hálux caracteriza-se pelo desvio lateral do prato ungueal em relação ao eixo longitudinal da falange distal, com consequente hiperqueratose e distrofia ungueal. (2 A sua etiologia não está completamente esclarecida, (3 reconhecendo-se causas genéticas3 e fatores extrínsecos, como microtraumatismos recorrentes. (1 Esta condição, pode ocorrer em 1-2% das crianças. (1 Por norma, o desvio da lâmina ungueal está presente desde o nascimento, (1-3 sendo que as alterações ungueais surgem habitualmente nos primeiros anos de vida. Contudo, na maioria dos casos verifica-se apenas um desvio ligeiro que pode passar despercebido até à infância tardia ou puberdade, momento em que ocorrem alterações ungueais marcadas resultantes de stress mecânico. (1,3 O mau alinhamento da unha é frequente causa de perioníquia e onicocriptose. (4 Os casos que cursam sem distrofia significativa ou afetação da qualidade de vida não carecem de intervenção. (2 Nos restantes está indicado o tratamento conservador com formulações tópicas de ureia como tratamento de primeira linha. (1

Neste caso clínico sublinha-se a importância de uma história clínica cuidada, com destaque para o início do quadro clínico e a existência de quadros semelhantes na família. (1 A aparência ungueal dismórfica desde o nascimento ou primeira infância deverá alertar para uma condição diferente de onicomicose, sendo esta infrequente em idades tão precoces. (1 Tendo presentes as características, sinais e sintomas desta entidade clínica, teria sido evitado o atraso diagnóstico e os tratamentos subsequentes (com eventuais efeitos adversos e custos associados), bem como a referenciação hospitalar.

Contributo dos autores

Conceptualização, ACP, ALS e MJC; metodologia, ACP, ALS e MJC; investigação, ACP, ALS e MJC; redação do draft original, ACP, ALS e MJC; redação, revisão e validação do texto final, ACP, ALS e MJC; visualização, ACP, ALS e MJC; supervisão, ACP, ALS e MJC.

Conflito de interesses

Os autores declaram não possuir quaisquer conflitos de interesse.

Referências bibliográficas

1. Perlis CS, Telang GH. Congenital malalignment of the great toenails mimicking onychomycosis. J Pediatr. 2005;146(4):575. [ Links ]

2. Wagner G, Sachse MM. Congenital malalignment of the big toe nail. J Dtsch Dermatol Ges. 2012;10(5):326-30. [ Links ]

3. Catalfo P, Musumeci ML, Lacarrubba F, Dinotta F, Micali G. Congenital malalignment of the great toenails: a review. Skin Appendage Disord. 2018;4(4):230-5. [ Links ]

4. Correia O. As unhas e o desportista: reconhecer, tratar, prevenir (2/2). Rev Med Desp Informa. 2012;3(5):8-12. [ Links ]

Recebido: 17 de Outubro de 2021; Aceito: 16 de Maio de 2022

Endereço para correspondência Ana Cláudia Paiva E-mail: anacla222@hotmail.com

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