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Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

versão impressa ISSN 2182-5173

Rev Port Med Geral Fam vol.38 no.5 Lisboa out. 2022  Epub 31-Out-2022

https://doi.org/10.32385/rpmgf.v38i5.13594 

Carta ao editor

Prescrição de atividade física nos cuidados de saúde primários

Prescribing physical activity in primary health care

Rita Cancela Nogueira1 
http://orcid.org/0000-0002-8111-2391

Diana Brigas2 

1. Médica Interna de Medicina Geral e Familiar. USF Fiães. Santa Maria da Feira, Portugal.

2. Assistente Graduada de Medicina Geral e Familiar. USF Fiães. Santa Maria da Feira, Portugal.


Os médicos de família têm um papel privilegiado na promoção da atividade física regular. Se, por um lado, grande parte das consultas são dedicadas à promoção de hábitos de vida saudáveis, por outro, os médicos de família conhecem as comunidades em que estão inseridos e os recursos disponíveis. A atividade física é fundamental no tratamento e prevenção da maioria das patologias abordadas nos cuidados de saúde primários (patologia cardiovascular, osteoarticular e mental). Para além da atividade física, a maioria destas patologias beneficia em incluir o exercício físico como parte do plano terapêutico. (1

A promoção de atividade física nos cuidados de saúde primários é uma estratégia eficaz e custo-efetiva, sendo que existe evidência a suportar a aplicação de modelos de aconselhamento breve para a atividade física. (2 Em 2017 foram implementadas ferramentas digitais para avaliação breve dos níveis de atividade física e aconselhamento breve para a atividade física, disponíveis no SClínico - Cuidados de Saúde Primários e na Prescrição Eletrónica Médica. Em 2019 iniciou-se um projeto piloto de consulta de atividade física, que foi suspenso devido à pandemia COVID-19.3

No entanto, continua a haver pouca formação dos médicos de família nesta área, especialmente para a prescrição de exercício adequado a cada utente. E, para além disso, não é possível fazer um encaminhamento para prescrição de exercício para a maioria dos utentes que beneficiam para entidades do Serviço Nacional de Saúde ou com acordo com o mesmo. A alternativa é o recurso aos serviços da comunidade, com custos suportados pelos utentes, reforçando as desigualdades do acesso a cuidados por parte das pessoas com menor capacidade económica. Níveis socioeconómicos mais baixos são um entrave à prática regular de atividade física. (4)-(5 Além desta questão, ficam também evidentes as desigualdades de acesso nas diferentes áreas do país, quer por ausência de uma boa rede de transportes públicos quer mesmo pela parca oferta de exercício físico acompanhado em algumas localidades.

As autoras aplaudem as atividades desenvolvidas pelo Programa Nacional da Promoção da Atividade Física; no entanto, é fundamental capacitar os profissionais para um aconselhamento mais adequado. É também importante a redução dos custos e o aumento de acessibilidade à prática de exercício físico, especialmente quando este integra uma estratégia de tratamento.

Referências bibliográficas

1. Pedersen BK, Saltin B. Exercise as medicine: evidence for prescribing exercise as therapy in 26 different chronic diseases. Scand J Med Sci Sports. 2015;25 Suppl 3:1-72. [ Links ]

2. Milton K, Cavill N, Chalkley A, Foster C, Gomersall S, Hagstromer M, et al. Eight investments that work for physical activity. J Phys Act Health. 2021;18(6):625-30. [ Links ]

3. Direção-Geral da Saúde. Programa nacional para a promoção de atividade física. Lisboa: DGS; 2021. [ Links ]

4. Rawal LB, Smith BJ, Quach H, Renzaho AM. Physical activity among adults with low socioeconomic status living in industrialized countries: a meta-ethnographic approach to understanding socioecological complexities. J Environ Public Health. 2020;2020:4283027. [ Links ]

5. Martins LC, Lopes MV, Diniz CM, Guedes NG. The factors related to a sedentary lifestyle: a meta-analysis review. J Adv Nurs. 2021;77(3):1188-205. [ Links ]

Recebido: 19 de Setembro de 2022; Aceito: 17 de Outubro de 2022

Endereço para correspondência Rita Cancela Nogueira E-mail: a.ritanogueira@hotmail.com


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Resposta do editor

Paulo Santos

Esta carta levanta uma questão muito importante sobre a acessibilidade dos cidadãos em Portugal a uma prática saudável e medicamente adequada de atividade física, que é praticamente nula. Este é um problema fundamental nos cuidados de saúde primários, onde a prevenção da doença e a proteção da saúde são preocupações reais e quotidianas no exercício médico.

Reconhecemos formalmente a importância das medidas higieno-dietéticas na prevenção e tratamento das doenças, mas desvalorizamo-las na prática pela incapacidade de as gerir e integrar no modelo de decisão clínica. É mais fácil prescrever um fármaco para a hipertensão, dislipidemia ou diabetes do que mudar comportamentos pela educação e treino das pessoas, eventualmente evitando a sua estruturação clínica.

Com razão, os autores apontam as causas. Por um lado, a necessidade de integrar na saúde estruturas de promoção da atividade física e de combate ao sedentarismo, com profissionais competentes e capazes de uma visão holística sobre a pessoa e as suas necessidades de saúde, sem serem obrigatoriamente profissionais de saúde. Esta pode ser uma área a explorar na ligação que se pretende cada vez mais estreita entre a saúde e os municípios, partilhando soluções e promovendo de facto a criação de ambientes salutogénicos. Por outro lado, e provavelmente mais importante do nosso ponto de vista, a necessidade de formação nesta área.

A promoção da saúde não pode continuar a ser um parente pobre do ensino médico, arcaicamente hospitalocêntrico, nem da assistência clínica, marcadamente orientada para a doença. A centralidade estabelecida nos órgãos, sistemas e patologias tem de mudar para as pessoas e para o seu funcionamento real. A medicina preventiva nas vertentes de proteção da saúde e de prevenção da doença é uma área fundamental do exercício médico orientado para a saúde e não apenas para o diagnóstico e tratamento das doenças. Urge colocar de facto a prevenção na ordem do dia, não como o chavão que todos repetem, mas como uma realidade palpável, baseada na melhor evidência e transladada para o conhecimento público, com mudança de atitudes e de aptidões e promovendo comportamentos saudáveis, desde as opções primordiais das escolhas alimentares, atividade física, comportamentos sexuais, evicção de hábitos potencialmente nocivos e gestão do stress, até à otimização da utilização dos serviços de saúde e dos recursos disponíveis, dando ao médico o que é do médico e à sociedade o que lhe deve pertencer, numa perspetiva complementar de partilha de responsabilidades.

Foi agora criada uma Secretaria de Estado da Promoção da Saúde e este é o momento para ser diferente e para termos um Ministério de facto da Saúde, em vez de um pelouro governamental para a gestão das doenças.

Paulo Santos

Editor-chefe da Revista Portuguesa de Medicina Geral e Familia

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