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Revista Crítica de Ciências Sociais

versão On-line ISSN 2182-7435

Revista Crítica de Ciências Sociais  no.129 Coimbra dez. 2022  Epub 31-Dez-2022

https://doi.org/10.4000/rccs.14048 

Dossier

O professor do ensino superior e os novos desafios da docência no contexto das tecnologias digitais: uma abordagem sociocognitiva

The Higher Education Teacher and the New Challenges of Teaching in the Context of Digital Technologies: A Socio-Cognitive Approach

Le professeur de l’enseignement supérieur face aux nouveaux enjeux de l’enseignement dans le contexte des technologies numériques : une approche socio-cognitive

José Genival Bezerra Ferreira1 
http://orcid.org/0000-0002-5419-7449

1 Universidad de Santiago de Chile, Santiago, Chile, genival.ferreira@hotmail.com


Resumo

O presente artigo pretende analisar os significados metafóricos que os professores do ensino superior têm atribuído às tecnologias digitais no âmbito pandêmico da COVID-19. Para o efeito, desenvolvemos uma investigação fenomenológica, um dos tipos de pesquisa qualitativa, tendo como instrumento para a geração de dados relatos produzidos na plataforma Google Forms por docentes de nove universidades públicas do Norte e do Nordeste do Brasil. O estudo assume uma visão sociocognitiva da linguagem, focada no aporte teórico da Linguística Cognitiva, com uma abordagem da metáfora conceptual direcionada ao corpus e ao discurso. Utilizando o método do domínio-alvo para a identificação da metáfora no corpus, destacam-se, com mais frequência, aquelas de cunho negativo, como a exclusão e o desespero.

Palavras-chave: Brasil; docência; educação universitária; ensino superior; metáfora; tecnologias digitais

Abstract

This article aims to analyze the metaphorical meanings that higher education teachers have attributed to digital technologies in the context of the COVID-19 pandemic. Our qualitative research is a phenomenological study using reports produced by faculty members from nine public universities in the North/Northeast of Brazil on the Google Forms platform as an instrument for the generation of data. The study assumes a socio-cognitive view of language, focused on the theoretical contribution of Cognitive Linguistics, with a conceptual metaphor approach, directed at corpus and discourse. Using the target-domain method to identify metaphors based on the corpus, those with a negative nature, such as exclusion and despair, stand out more frequently.

Keywords: Brazil; digital technologies; higher education; metaphor; teaching; university education

Résumé

Cet article se propose d’analyser les significations métaphoriques que les professeurs de l’enseignement supérieur ont attribuées aux technologies numériques dans le contexte de la pandémie de COVID-19. À cette fin, nous avons développé une enquête phénoménologique, l’un des types de recherche qualitative, ayant pour outil de génération de données des récits produits sur la plateforme Google Forms par des professeurs de neuf universités publiques des régions Nord et Nord-Est du Brésil. L’étude assume une vision socio-cognitive du langage, centrée sur l’apport théorique de la Linguistique Cognitive, avec une approche métaphorique conceptuelle dirigée vers le corpus et le discours. En utilisant la méthode du domaine cible pour identifier les métaphores dans le corpus, celles qui se démarquent plus fréquemment sont à caractère négatif, telles que l’exclusion et le désespoir.

Mots-clés: Brésil; éducation universitaire; enseignement; enseignement supérieur; métaphore; technologies numériques

Introdução

A pandemia da COVID-19, que ainda assola o mundo atualmente, causou impactos institucionais e comportamentais em larga escala em várias áreas da atividade humana, incluindo a educação. O efeito sobre os alunos não tem precedentes: a 9 de abril de 2020 havia mais de 1,5 bilhão de alunos em todo o mundo, do ensino primário ao superior, que não puderam frequentar as instituições de ensino.1 Devido a fechamentos maciços e inesperados de espaços escolares e acadêmicos, as comunidades e os países foram obrigados a buscar soluções rápidas em diferentes plataformas de aprendizagem digital (Jandrić, 2020). Os professores transferiram o trabalho de sala de aula para plataformas digitais da noite para o dia. Essa rápida transição revelou lacunas e deficiências na forma como o ensino on-line foi ou não adotado nas instituições de ensino.

As instituições de ensino superior, em particular as da América Latina, enfrentaram ainda dois momentos diferenciados, mas com características comuns. Por um lado, procurou-se continuar e concluir os processos acadêmicos abertos antes das primeiras fases da pandemia ou durante as mesmas (completar períodos letivos, realizar avaliações finais, abrir processos de admissão, entre outros). Por outro lado, buscou-se desenhar, organizar e colocar em prática novos procedimentos de ensino, de fazer pesquisa e de atividades de extensão, que, genericamente, foram denominados “transição para a nova normalidade”.2 Assim, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e o Instituto Internacional de la UNESCO para la Educación Superior en América Latina y el Caribe (IESALC) emitiram um conjunto de princípios orientadores para planejar a saída da crise da COVID-19 no ensino superior.3

A partir dessas questões, as seguintes inquietações nortearam nossa investigação: como tem ocorrido o ensino nas universidades e quais são as percepções e dificuldades enfrentadas em relação ao uso das tecnologias digitais no contexto da pandemia? Desta forma, empreendemos um estudo fenomenológico com docentes de nove universidades públicas localizadas no Norte e no Nordeste do Brasil que, assim como todo o território brasileiro, enfrentam momentos turbulentos desde março de 2020, quando professores e estudantes foram obrigados a se adequar a uma nova modalidade de ensino que até então não tinha sido explorada pela grande maioria deles.

Nesse sentido, este artigo busca entender, por meio de uma visão sociocognitiva da linguagem e com uma abordagem da metáfora conceptual direcionada ao corpus e ao discurso, os sentidos e desafios da docência no contexto digital/tecnológico. O estudo da metáfora conceptual nesse âmbito ainda não foi empreendido, de modo que esta investigação pode contribuir para entender os processos de adaptabilidade e flexibilidade concernentes aos novos métodos de ensino e ao uso de ferramentas digitais tecnológicas.

Assim, o estudo que ora se apresenta está organizado em várias seções, além da Introdução. Inicialmente discutiremos as bases teóricas que conduziram a pesquisa, dialogando com as perspectivas dos estudos da Linguística Cognitiva (LC) - em especial da metáfora conceptual direcionada ao corpus e ao discurso -, bem como os desafios da docência no contexto das tecnologias digitais em época de pandemia. Em seguida abordaremos os procedimentos metodológicos empreendidos para o desenvolvimento da investigação. Posteriormente apresentaremos os resultados e analisaremos os dados gerados a partir dos discursos dos professores das universidades no âmbito do ensino remoto. Por último, teceremos nossas reflexões finais.

1. Fundamentação teórica

Uma das áreas mais prolíficas da LC é a metáfora conceptual. Trata-se de um campo científico amplo que inclui uma variedade de objetos de estudo, de abordagens e de metodologias, unificados pelos princípios de que as nossas habilidades linguísticas estão enraizadas em nossas habilidades cognitivas gerais. Analisar a linguagem a partir dessa perspectiva é estudar os padrões de conceptualização, pois fornece perspectivas sobre a natureza, a estrutura e a organização de pensamentos e ideias (Dabrowska e Divjak, 2015; Geeraerts e Cuyckens, 2007; Ibarretxe-Antuñano e Valenzuela, 2012; Silva, 1997, 2006).

Nesse sentido, argumenta-se que a metáfora é parte fundamental do nosso sistema conceptual e desempenha um papel não apenas na linguagem, mas também no raciocínio e nas atitudes (Lakoff e Johnson, 1980). Tal abordagem se desenvolveu notavelmente em pesquisas de vários campos das ciências sociais (como a psicologia, a educação, a política e a antropologia, para nomear alguns), a fim de entender o comportamento humano em dado contexto social (Gibbs, 2008; Landau et al., 2014).

O conceito de metáfora conceptual, contudo, vai de encontro à visão clássica da metáfora, que, conforme Kövecses (2010), é assim entendida: a) como propriedade das palavras, ou seja, é um fenômeno linguístico; b) é usada para fins artísticos ou retóricos; c) baseia-se na semelhança entre duas entidades que são comparadas; d) é uma figura de linguagem criada deliberadamente para fins artísticos. Em discordância com tal perspectiva, Lakoff e Johnson (1980), Grady (2007), Soriano (2012) e Ibarretxe-Antuñano (2013) desafiam essas características e postulam que: a) a metáfora conceptual é propriedade dos conceitos, e não das palavras; b) a função da metáfora é compreender melhor certos conceitos, e não ser utilizada apenas para fins artísticos ou estéticos; c) a metáfora não se baseia na semelhança; d) a metáfora é usada, sem muito esforço, no cotidiano das pessoas comuns, e não apenas no das “pessoas talentosas”; e d) a metáfora, longe de ser um embelezamento linguístico supérfluo, é um processo inevitável do pensamento e do raciocínio humanos.

Nessa perspectiva, Silva (1997, 2006) complementa que o estudo da metáfora conceptual não pode se desvincular do contexto sociocultural nem da interação discursiva, o que vai de encontro à versão padrão da Teoria da Metáfora Conceptual, que tende para uma abordagem universalista e descontextualizada da metáfora e acrescenta que os estudos mais recentes mostram como a metáfora é inteiramente contextualizada, seja sociocultural ou discursivamente construída.

Ainda nesse seguimento, Kövecses (2010) assinala que o analista das metáforas conceptuais deve incorporar ancoragens sociais (e culturais) dos processos de categorização e conceptualização, o que consiste em um ato contínuo de rever, ampliar e conciliar a ontologia com as quais se compromete para poder entender o sistema conceptual, a partir do qual pensamos e agimos (Musolff e Zinken, 2009; Semino, 2008). Na perspectiva sociocognitiva, Gibbs (2014) afirma que embora os conceitos metafóricos sejam essenciais para certos aspectos do pensamento abstrato, eles normalmente emergem em contextos específicos nos quais as pessoas procuram coordenar melhor as próprias ações e as suas interações com os outros. Segundo Hart (2010, 2014), essa perspectiva é muito mais que fomentar o diálogo entre a cognição e o social - é criar um debate sobre a integração da abordagem cognitivista como instrumento analítico complementar para a análise discursivo-textual.

Ainda nessa conjuntura, para Raffaelli e Katunar (2016) o contexto social pode ser extremamente variável, envolvendo qualquer aspecto da vida cotidiana - desde as relações sociais que se estabelecem entre os participantes do discurso, passando pelos seus papéis de gênero, até aos vários contextos sociais em que o mesmo ocorre. Em decorrência dessa questão, é preciso entender as inter-relações entre as noções de metáfora e discurso, visto que o contexto desempenha um papel crucial, como já apontado, na compreensão da razão para o uso de certas metáforas quando produzimos discurso (Kövecses, 2010). Assim, a análise do discurso, atrelada a uma perspectiva sociocognitiva, visa entender como as metáforas são empregadas em consonância com o conhecimento sobre certa atividade humana e como são usadas para transmitir o conhecimento, comunicando determinada atividade humana em dado contexto social.

Dessa maneira, por meio da análise da metáfora conceptual, é possível compreender a cognição docente no contexto da pandemia ao se fazer uso das tecnologias digitais. Percebemos que compreender as crenças dos professores do ensino superior é essencial para entender o desempenho profissional (Freeman, 2002). Nesse sentido, a cognição é uma crença, uma proposição que se mantém consciente ou inconscientemente, e é avaliativa - no sentido de que é aceita como verdadeira - e gera comprometimento afetivo; além disso, serve como guia de pensamento e comportamento (Gibbs, 2014). Essa forma de definir as crenças, na LC, é entendida como uma conceptualização que engloba não só uma forma de compreender a realidade, mas também uma carga emocional e avaliativa. Logo, como se pretende na LC, as pessoas, ao se expressarem por meio de discursos (as metáforas), revelam as formas como entendem as suas experiências, de modo que a análise das metáforas permite o acesso às conceptualizações dos sujeitos que as emitem.

Em 2020, a Organização Mundial da Saúde declarou que o surto do novo coronavírus SARS-CoV-2 (responsável pela doença COVID-19) se tinha tornado uma pandemia global (Cucinotta e Vanelli, 2020). Com efeito, a realidade imposta pelo isolamento social e pelas medidas de controle sanitário trouxe expressivas consequências às relações de trabalho na educação. As salas de aula foram concentradas e compactadas em aparelhos como computadores e celulares, e o ambiente de casa passou a ser multifacetado (Marinoni et al., 2020). Os atores que compõem esse cenário - estudantes e acadêmicos -, bem como outros setores da sociedade que interagem com as universidades, tiveram de enfrentar, com rapidez e criatividade, o desafio de reorganizar as suas atividades para dar continuidade ao exercício de suas funções enquanto continuavam a enfrentar os desafios e problemas trazidos pela pandemia (Marshall et al., 2020).

No Brasil, assim como em outras partes do mundo, a pandemia afetou o sistema educacional. Os professores foram obrigados a se preparar para as necessidades educacionais emergenciais, com vista a atender às expectativas do momento, a exemplo de formações de última hora para ministrar aulas on-line fazendo uso das tecnologias digitais. Isto ocasionou uma mudança profunda no modo de ensinar e de encarar as tecnologias digitais até então utilizadas esporadicamente pelos docentes (ou nunca usadas de todo). Em consequência disso, o processo de ensino e aprendizagem presencial teve de ser modificado para acomodar o ambiente de e-learning. As atividades de ensino foram realizadas em plataformas virtuais, como Google Classroom, Moodle, Zoom, entre outras (Queiroz et al., 2022).

Desde o curto período de transição do ensino regular para o ensino à distância (síncrono ou assíncrono), houve uma necessidade urgente de profissionalização docente em termos de digitalização. A adaptação e/ou a aprendizagem da tecnologia tornaram-se um objetivo para as instituições de ensino. Muitos professores não estavam preparados para incorporar técnicas de ensino digital em seus currículos e planos de aula, e estavam sobrecarregados porque nem sempre têm as habilidades socioemocionais para lidar com tais situações; ademais, há docentes que resistem aos avanços tecnológicos (Cerqueira, 2020).

Hodges et al. (2020) afirmam que a falta de preparo de um número significativo de professores em implementar o ensino à distância, usando as diversas tecnologias disponíveis num período de transição curto, teve um grande impacto no funcionamento do processo de ensino-aprendizagem. De acordo com Lloyd (2020), o docente, para se envolver plenamente com a tecnologia da informação e comunicação/educação rica, deve adotar uma atitude de aprendizagem ao longo da vida. Em resumo, as percepções e os desafios do professor perpassaram, em especial, por algumas questões que incluem: 1) a disponibilidade de acesso à tecnologia; 2) as dificuldades de ensinar on-line; 3) a capacidade de adaptação dos professores durante o ensino on-line; e 4) as experiências de ensino com o uso de tecnologia por parte dos docentes.

Quanto a trabalhos científicos sob a luz da metáfora conceptual, destacamos alguns que tratam da identidade profissional dos professores em sala de aula e em formação continuada (Saban, 2004, 2006, 2010; Saban et al., 2007); pesquisas que abordam a evolução dessas crenças de acordo com os anos de experiência de trabalho (Thomas e Beauchamp, 2011); e investigações sobre a incidência de fatores contextuais na configuração da identidade profissional (Ben-Peretz et al., 2003; Leavy et al., 2007). Deve-se mencionar, no entanto, que não foram encontrados estudos sobre metáforas conceptuais relacionadas ao uso das tecnologias digitais por professores do ensino superior durante a pandemia da COVID-19.

2. Procedimento metodológico

Esta pesquisa foi concebida como um padrão fenomenológico, um dos tipos de pesquisa qualitativa, pois permitiu aos professores expressarem as suas opiniões sobre os novos sentidos/desafios da docência no contexto das tecnologias digitais durante a pandemia da COVID-19. Caracteriza-se como um estudo de caso de abordagem qualitativa e de caráter exploratório, uma base para a busca do fenômeno do qual estamos cientes, mas que não conseguimos entender completamente (Fren et al., 2014). Para Minayo (2001: 14), o investigador, nesse modelo de pesquisa, coletará os dados que o auxiliarão na construção do conhecimento acerca do tema que pesquisará, para posteriores explicação e discussão, e trabalhará aspectos da realidade, centrando-se na compreensão da dinâmica das relações sociais.

Dito isso, o formulário foi gerado no Google Forms e enviado para e-mails de docentes da área de Humanas (Letras, Geografia, Psicologia, Economia, Administração e História) de nove universidades públicas do Norte/Nordeste do Brasil - as maiores em número de alunos matriculados na graduação -, nos meses de março e abril de 2021. Do total de 35 professores inquiridos, 18 são do sexo masculino e 17 do sexo feminino, as idades variam entre os 34 e os 68 anos e todos têm doutoramento na área em que atuam. Pedimos aos docentes que redigissem um pequeno texto/relato de até 10 linhas refletindo sobre a seguinte temática: “Discorra como é ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19”. Obtivemos um total de 439 expressões linguísticas que geraram nove categorias de metáforas conceptuais, a saber: paciência, exclusão, incerteza, desespero, dramatização, guerra, esperança, inutilidade e oportunidade - que foram posteriormente agrupadas em tabelas.

Os dados foram interpretados em consonância com Pitcher (2013), para quem a própria intuição do pesquisador pode ser usada para analisar e identificar as metáforas nos relatos/textos redigidos pelos professores. Dessa forma, foram examinados os tipos de metáforas e suas implicações para entender as emoções e os sentimentos dos participantes em situações de ensino com as novas tecnologias digitais. A discussão e a análise dos dados apoiaram-se teoricamente na metáfora conceptual que estrutura os conceitos humanos, pois nos ajuda a inferir atitudes e crenças que usamos para descrever as nossas experiências pessoais. Ao analisarmos os relatos dos professores, utilizamos o domínio fonte (o texto produzido pelos professores) - no qual encontramos expressões linguísticas como “Estamos vivendo algo passageiro...” - para entendermos o exemplo de domínio-alvo Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é ter paciência. A metáfora conceptual é, neste caso, paciência, pois o “algo passageiro” sugere que em breve vai passar, sendo, portanto, preciso esperar, ter paciência...

Na análise das tabelas, o domínio conceptual ou metáforas linguísticas estão entre aspas por serem expressões dos docentes retiradas dos relatos e, posteriormente, as metáforas conceptuais são analisadas por nós. Por uma questão de limitação, apenas as três expressões linguísticas com mais incidências foram analisadas para cada categoria.

3. Resultados e análise

Como mencionamos, foram coletadas 439 expressões linguísticas, agrupadas em nove metáforas conceptuais tendo como base os relatos/textos produzidos pelos docentes acerca da seguinte temática: “Discorra como é ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19”. Para isso, cada metáfora produzida pelos professores foi analisada pelos seguintes critérios: 1) o assunto da metáfora; 2) a fonte da metáfora; e 3) a relação entre o sujeito e a fonte da metáfora. As metáforas conceptuais são agrupadas em quadro e analisadas pela ordem que se segue: 1. paciência; 2. exclusão; 3. incerteza; 4. desespero; 5. dramatização; 6. guerra; 7. esperança; 8. inutilidade; 9. oportunidade.

Na Categoria 1, “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é ter paciência”, foram expressas 18 metáforas linguísticas, realizadas em oito referências ou alusões ao domínio-alvo paciência (ver Tabela 1).

Tabela 1 Categoria PACIÊNCIA 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “algo passageiro” 5
2 “engolir sapo” 4
3 “tudo dará certo” 3
4 “sentir na pele” 2
5 “aguentar o tranco” 1
6 “ir com calma” 1
7 “é sofrer na própria carne” 1
8 “paciência de Jó” 1
Total 18

Notas: “N.º” indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

Algumas das razões pelas quais os professores formularam as metáforas da paciência são as seguintes:

  • “Algo passageiro” [RTW-16]:4 a docência com o uso das novas tecnologias em época de pandemia é vista como algo passageiro, ocasional e que logo voltará à normalidade (as aulas convencionais). É preciso, portanto, ter paciência.

  • “Engolir sapo” [JPA-6]: expressão muito comum que significa ter que aturar calado, sem reação alguma, contrariedades da vida, sem agressões ou argumentações, pois entende-se que vai passar logo, e para isso é necessário ter paciência. Depreende-se que neste contexto os “sapos” são as tecnologias digitais da educação.

  • “Tudo dará certo” [SRN-4]: a expressão, na esteira da autoajuda, remete à ideia de que não podemos desistir dos empecilhos que aparecem na vida. Não seria a falta de conhecimento no manuseio com as novas tecnologias que vai fazer o professor desistir. No final tudo dará certo com paciência.

Na Categoria 2, “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é exclusão” foram expressos 23 tipos de metáforas linguísticas, realizadas em 10 referências ou alusões a esse domínio-alvo (ver Tabela 2).

Tabela 2 Categoria EXCLUSÃO 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “abandono” 6
2 “sentir-se um órfão” 5
3 “estar num deserto” 3
4 “confinamento” 2
5 “ausência” 2
6 “quarto escuro” 1
7 “falta palavras” 1
8 “chorar sozinho” 1
9 “engolir a seco” 1
10 “no silêncio da noite” 1
Total 23

Notas: “N.º” indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

Entre as razões pelas quais os professores formularam as metáforas da exclusão, podemos abordar as seguintes:

  • “Abandono” [MVT-22]: a palavra já em si transmite a ideia de exclusão. Os professores, ao fazerem uso dessa metáfora linguística, estão se referindo à falta de políticas educacionais públicas do governo brasileiro para minimizar o impacto da pandemia no ensino superior. Fazem também alusão à questão da falta de treinamento para lidarem com as tecnologias digitais, fazendo com que o professor se sinta abandonado.

  • “Sentir-se um órfão” [JCV-25]: assim como pessoa sem pai ou mãe (ou ambos), os professores universitários se sentem órfãos de um governo que não cuida deles; é como se não tivessem a quem recorrer em um momento tão difícil, já que as universidades em que trabalham são públicas.

  • “Estar num deserto” [ESS-12]: no contexto bíblico, um dos sentidos mais frequentes de “estar no deserto” é quando o assunto se trata de uma provação ou um período de profunda reflexão, de dúvidas, ou ainda de espera de uma confirmação por parte de um ser superior para tomar alguma decisão. Os docentes universitários, no contexto brasileiro, sentem-se dessa forma, porque ainda esperam por políticas públicas consistentes que tragam resultados concretos e, enquanto isso não acontece, sentem-se excluídos.

Em relação à Categoria 3, “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é incerteza”, foram mencionadas 45 metáforas linguísticas, realizadas em 16 referências ou alusões a esse domínio-alvo (ver Tabela 3).

Tabela 3 Categoria INCERTEZA 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “com os nervos à flor da pele” 9
2 “labirinto” 8
3 “com uma pulga atrás da orelha” 7
4 “tiro no escuro” 3
5 “poço sem fundo” 3
6 “viagem ao desconhecido” 2
7 “filme de aventura” 2
8 “jogo de computador” 2
9 “estar a esmo” 2
10 “nadar em mar desconhecido” 1
11 “não entender patavina” 1
12 “quebra-cabeça” 1
13 “jogo de xadrez” 1
14 “ficar com a cara de tacho” 1
15 “campo minado” 1
16 “andar no escuro” 1
Total 45

Notas: “N.º” indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

Os motivos pelos quais os docentes formularam as metáforas da incerteza são os seguintes:

  • “Com os nervos à flor da pele” [RSA-9]: expressão muito comum que significa estar nervoso ou ansioso, um tipo de incerteza gerada pelo momento. É como se se questionassem o que vai acontecer com eles com essa pandemia, diante das muitas coisas que têm que aprender, como o uso das tecnologias. O retorno gradual das aulas presenciais já está acontecendo, contudo, sendo o Brasil um dos países que menos investiu em educação durante a pandemia, como consequência aumentou o número de alunos que desistiram por falta de acesso à tecnologia para acompanharem as aulas desde suas casas.

  • “Labirinto” [JCA-11]: literalmente por ser uma estrutura que funciona como forma de punição ou provação, o labirinto confunde a mente das pessoas para deixá-las perdidas, sem terem por onde sair ou sem saberem para onde ir - assim ficaram os professores universitários brasileiros frente às tecnologias digitais na pandemia.

  • “Com uma pulga atrás da orelha” [ACSS-2]: expressão popular bastante corrente que significa estar com grande desconfiança ou preocupação; ter suspeitas de algo ou de alguém. Se o que se entende por “incerteza” equivaler a “duvidar/desconfiar” de algo ou de alguém, o sentido é adequado. Diríamos assim que a maior preocupação com o uso das tecnologias digitais durante a pandemia é não saber manuseá-las ou fazê-lo de forma incipiente.

Na Categoria 4, “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é desespero”, foram encontradas 25 metáforas linguísticas realizadas em 11 referências ou alusões a esse domínio-alvo (ver Tabela 4).

Tabela 4 Categoria DESESPERO 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “um peixe fora d’água” 5
2 “banho de água fria” 4
3 “nadar contra a correnteza” 3
4 “ter um nó na garganta” 3
5 “angústia no coração” 2
6 “uma bola de neves” 2
7 “cair do cavalo” 2
8 “bater com a porta na cara” 1
9 “perto no coração” 1
10 “coração acelerado” 1
11 “um estranho na frente” 1
Total 25

Notas: “N.º” indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

Os docentes formularam as metáforas do desespero pelos seguintes motivos:

  • “Um peixe fora d’água” [AGS-10]: o professor não se sentiu confortável em um lugar, normalmente estranho ou desagradável; esse lugar é estar em frente a um computador diante de plataformas digitais que não domina.

  • “Banho de água fria” [PGB-21]: expressão popular que significa, entre outras coisas, decepção, desilusão. O professor estava entusiasmado, mas levou um banho de água fria ao se deparar com as tecnologias ou falta delas para seu uso cotidiano durante a pandemia.

  • “Nadar contra a correnteza” [QAE-3]: por mais que tente, talvez não consiga eficiência pela falta de recurso público ou habilidade. O professor encontra-se desesperado sem saber o que fazer, que direção tomar, pois até então só lecionava usando meios convencionais e de uma hora para outra se depara com tecnologias digitais desconhecidas.

No que à Categoria 5 “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é dramatização” diz respeito, foram expressas 62 metáforas linguísticas, realizadas em 16 referências ou alusões ao domínio-alvo desespero (ver Tabela 5).

Tabela 5 Categoria DRAMATIZAÇÃO 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “espetáculo” 9
2 “roteiro de filme” 8
3 “palhaço” 7
4 “plateia” 5
5 “farsa” 5
6 show 4
7 “ser invisível” 3
8 “encenação” 3
9 “teatro” 3
10 “circo dos horrores” 3
11 “acrobata na corda” 3
12 “representação” 2
13 “artista” 2
14 “comédia” 2
15 “cantando no palco” 2
16 “fantasia” 1
Total 62

Notas: “N.º” indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

Os fundamentos pelos quais os docentes formularam as metáforas da dramatização são:

  • “Espetáculo” [KFS-19]: como sabemos, um espetáculo é uma apresentação pública que tem como objetivo o entretenimento, podendo ser uma apresentação teatral, musical, cinematográfica, circense, uma exibição de trabalhos artísticos, etc. Nessa perspectiva, o docente sente-se um ator a fazer uma dramatização com muitos percalços para os alunos frente a uma câmera, dado que o professor não tem domínio suficiente das ferramentas digitais que foi obrigado a utilizar devido à pandemia.

  • “Roteiro de filme” [LMN-17]: A vida de alguns professores está se parecendo ao argumento de um filme ao se depararem com as tecnologias digitais no âmbito da pandemia. No entanto, muitas vezes, este roteiro - que seria um argumento com cenas e diálogos (os passos da aula a serem seguidos) - não funciona, pois sempre aparecem imprevistos e os professores passam a aula completa tentando voltar à “normalidade” sem sucesso.

  • “Palhaço” [MF-23]: porque, muitas vezes, o professor se sente como um profissional do circo que faz rir (o palhaço) frente a uma câmera, sem saber manusear as ferramentas da plataforma. Alguns alunos ensinam com boa vontade; outros riem da forma incipiente da forma como os docentes lidam com essas tecnologias.

Na Categoria 6, “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é guerra”, foram expressas 84 metáforas linguísticas, realizadas em 18 referências ou alusões a esse domínio-alvo (ver Tabela 6).

Tabela 6 Categoria GUERRA 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “desafio” 13
2 “combate” 10
3 “luta” 9
4 “mexer em casa de marimbondo” 6
5 “oponente” 6
6 “colocar a mão na massa” 5
7 “enfrentamento” 5
8 “suar a camisa” 4
9 “arregaçar as mangas” 4
10 “batalha” 4
11 “confronto” 4
12 “conflito” 3
13 “matar um leão” 3
14 “risco” 2
15 “disputa” 2
16 “pegar uma bomba todo dia” 2
17 “dar duro” 1
18 “peleja” 1
Total 84

Notas: “N.º” - indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” - indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

Relativamente às metáforas da guerra, os professores apontaram os seguintes motivos:

  • “Desafio” [HLS-8]: entendemos que é a ocasião ou o grande obstáculo que deve ser ultrapassado, ou seja, enfrentar o ensino com a utilização das tecnologias digitais foi o maior desafio para os docentes universitários. É comum usar esse vocábulo nos domínios de jogo, de competição ou, inclusive, de guerra. O professor entrou na disputa com as tecnologias e quer sair como vencedor do desafio, por exemplo.

  • “Combate” [VID-20]: é uma luta contra obstáculos de qualquer natureza; a vida é um eterno combate, também oriundo do campo semântico da guerra. No contexto dos professores, este vocábulo se refere à luta contra as tecnologias digitais, já que as encaram como opositoras.

  • “Luta” [GV-1]: pode ser considerado sinônimo de combate mas, para alguns dicionaristas, a luta é caracterizada como esporte, uma forma ressignificada pela sociedade contemporânea para o entretenimento, propondo regras para as modalidades.

Na Categoria 7, “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é esperança”, foram expressas 43 metáforas linguísticas, realizadas em oito referências ou alusões a esse domínio-alvo (ver Tabela 7).

Tabela 7 Categoria ESPERANÇA 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “espírito jovem” 10
2 “confiar no taco” 8
3 “farol” 7
4 “ter pulso firme” 5
5 “nunca é tarde” 4
6 “perspectiva” 4
7 “fé em Deus” 3
8 “sonho” 2
Total 43

Notas: “N.º” - indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” - indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

As razões pelas quais os docentes formularam as metáforas da esperança são as seguintes:

  • “Espírito jovem” [TSD-26]: de um ponto de vista positivo, os professores que trabalham com as tecnologias em tempo de pandemia acreditam que para manter uma mentalidade jovem é preciso tentar coisas novas (aprender a usar as tecnologias digitais) e encontrar novas maneiras de permanecer ativo, o que contribui para manter uma visão juvenil da vida, mesmo que se tenha 68 anos e já tenha chegado à altura de se aposentar, como é o caso de alguns docentes.

  • “Confiar no taco” [MJS-24]: alguns docentes disseram que “confiam no seu taco”, ou seja, são confiantes e acreditam em si mesmos e nas suas capacidades em diferentes aspectos na vida, inclusive em aventurar-se nas novas tecnologias digitais para o ensino. Sentem firmeza nas suas competências e qualidades e depositam esperança em suas capacidades.

  • “Farol” [WAS-15]: o farol leva ao porto com segurança, pelo que é símbolo de esperança. Consiste numa iluminação, uma luz, uma direção a seguir, neste caso, o caminho que guia o docente do ensino superior para novas aprendizagens como a utilização das novas tecnologias digitais no contexto da COVID-19.

Na Categoria 8, “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é inutilidade”, foram expressas 69 metáforas linguísticas, realizadas em 12 referências ou alusões a esse domínio-alvo (ver Tabela 8).

Tabela 8 Categoria INUTILIDADE 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “pregar no deserto” 11
2 “falar com uma porta” 10
3 “jogar conversa fora” 9
4 “perda de tempo” 8
5 “encher o saco” 5
6 “impotência” 5
7 “debilidade” 5
8 “deixar a desejar” 5
9 “levar gato por lebre” 4
10 “figura decorativa” 3
11 “bode expiatório” 3
12 “coisa em vão” 1
Total 69

Notas: “N.º” - indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” - indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

Quanto às metáforas da inutilidade, os docentes mencionaram os seguintes motivos:

  • “Pregar no deserto” [NXZ-27]: os docentes partem da ideia de que ensinar por meio das tecnologias digitais é discursar ou tentar divulgar as suas ideias em vão, sem serem ouvidos porque os alunos não estão interessados.

  • “Falar com uma porta” [UHF-18]: no mesmo sentido que a expressão anterior, parte da ideia de que se fala em vão. É falar, esforçar-se para dar uma aula em frente a uma câmera, em uma plataforma digital, para alunos que não estão interessados e que possivelmente não valem esse esforço, nem os alunos nem o governo que não deu a assistência necessária.

  • “Jogar conversa fora” [POU-14]: a expressão significa falar/conversar sobre qualquer coisa não muito significativa. Para muitos docentes, o empreendimento de entender o manuseio das tecnologias para dar uma aula em plena pandemia é inútil, pois o alunado não está interessado.

Na Categoria 9, “Ensinar fazendo uso das novas tecnologias digitais em tempos de pandemia da COVID-19 é oportunidade”, foram expressas 70 metáforas linguísticas, realizadas em 12 referências ou alusões a esse domínio-alvo (ver Tabela 9).

Tabela 9 Categoria OPORTUNIDADE 

N.º Metáforas linguísticas Q
1 “nunca é tarde” 11
2 “um novo mundo” 10
3 “é como andar de bicicleta” 9
4 “abrir-se ao novo” 8
5 “novas tecnologias” 8
6 “crescimento profissional” 6
7 “janela aberta” 5
8 “dar uma colher de chá” 4
9 “cair do céu” 4
10 “viagem ao desconhecido” 2
11 “um raiar de sol” 2
12 “abrir portas” 1
Total 70

Notas: “N.º” - indica a ordem em que as expressões são apresentadas na categoria; “Q” - indica a quantidade de expressões metafóricas da categoria. Fonte: Elaboração do autor.

Os motivos pelos quais os professores formularam as metáforas da oportunidade são os seguintes:

  • “Nunca é tarde” [FDS-7]: expressão muito usada que significa que mesmo que o docente esteja desatualizado ou já esteja com mais idade, pode continuar aprendendo seja lá o que for, inclusive, a manusear a “linguagem dos jovens”, a “linguagem da tecnologia”.

  • “Um novo mundo” [RAQ-5]: foi uma expressão criada pelos europeus para designar o continente americano e que teve seu uso difundido nesse período. Nesse sentido, significa que tal como os europeus naquela época, podemos sempre “descobrir” algo novo, buscar novas coisas - como usar as tecnologias digitais em época de pandemia.

  • “É como andar de bicicleta” [FDE-13]: andar de bicicleta não é uma daquelas tarefas que exigem um raciocínio complexo para ser executada, pois quem já conseguiu andar de bicicleta alguma vez, nunca o vai esquecer. Ou seja, se uma pessoa já usa o controle remoto da televisão, ou usa o computador para fazer uma tarefa básica, aprender o uso de novas tecnologias digitais na educação também não será difícil.

Analisando agora as metáforas preferidas/escolhidas pelos docentes neste contexto de pandemia, detetou-se que as mesmas têm geralmente uma conotação negativa. De acordo com essa constatação, pode-se dizer que os docentes brasileiros têm uma percepção maioritariamente negativa do uso das tecnologias digitais no contexto da pandemia da COVID-19. Essa verificação ocorre, nitidamente, nas categorias exclusão, incerteza, desespero, dramatização, guerra e inutilidade. As expressões metafóricas relacionadas a tais categorias revelam que os professores têm estado em constante incerteza, sentem-se inúteis e suas esperanças para o futuro estão se esgotando; ademais, apresentam sinais de pessimismo e encontram muita dificuldade para exercer a profissão, sentindo-se impotentes no contexto em questão dado a falta de apoio das entidades competentes, como o governo. O desenvolvimento acelerado de novas tecnologias significa que os professores não estão (nem são) preparados para elas, e que há uma rejeição das novas ferramentas tecnológicas na sua prática pedagógica. Evidencia-se também a insatisfação dos docentes no que concerne à ausência de políticas públicas - já que as universidades dependem de verbas estatais -, e há ainda aqueles que explicitam que não houve treinamento para o uso de novos recursos, nem um plano contundente de reabertura de suas universidades.

Por outro lado, há que considerar as categorias de metáforas que refletem alguns aspectos positivos, como a “paciência”, a “esperança” e a “oportunidade”, que denotam que muitos docentes estão enfrentando a situação com um certo entusiasmo, apesar das dificuldades ou obstáculos no processo das novas aprendizagens. Esta questão leva os professores a refletir sobre o uso e a importância das novas tecnologias na educação atual, atendendo à necessidade de uma nova visão no processo de ensino-aprendizagem.

Depreendemos, ainda, que muitos docentes se encontram inseridos em um mundo de práticas pedagógicas tradicionais, não facilitando a mudança no processo de normalização das novas tecnologias na educação. Além do ensino e da pesquisa, podemos mencionar que, com a pandemia, os docentes tiveram que lidar com os problemas sociais e psicológicos que a COVID-19 trouxe (Doucet et al., 2020).

Também nesse contexto podemos depreender que as práticas de educação à distância, por meio das tecnologias de comunicação e informação aplicadas neste período, não substituem a educação presencial, persistindo muitos problemas para professores e alunos.5 Todos estavam mal preparados para enfrentar as mudanças na educação durante o período pandêmico (Cerqueira, 2020).

A análise das construções metafóricas de profissionais do ensino na educação universitária revelou, de maneira notável, uma tensão entre as avaliações negativas e positivas das metáforas conceptuais. Pode-se afirmar que a análise da metáfora para conceber a ideia de um professor lidando com a tecnologia durante a pandemia foi útil, pois explorou os significados que os professores dão às suas práticas. É assim um caminho possível para avançar na construção do conhecimento sobre a realidade do que significa ser professor universitário nas unidades acadêmicas do sistema público na área de Humanas no Brasil.

Considerações (por ora) finais

Este estudo constatou que muitas metáforas estão presentes no discurso dos professores do ensino superior no Brasil, ao emitirem suas impressões sobre as tecnologias digitais no contexto da pandemia como ferramenta no processo de ensino-aprendizagem. Revelou-se que as metáforas são parte intrínseca do discurso docente, bem como elementos constituintes do discurso pedagógico e quase indispensáveis ao mesmo. A maioria das metáforas usadas são negativas, mas há outras positivas.

A prevalência das metáforas negativas pode ser explicada pela natureza complexa do conceito de novas tecnologias digitais na educação pública, por meio da associação principal aos seguintes domínios-fontes: exclusão, incerteza, desespero, dramatização, guerra e inutilidade. Podemos destacar sobremaneira que a ocorrência se deve à situação atual das políticas adotadas pelo Estado brasileiro, à falta de formação continuada dos docentes e à resistência destes diante dos novos modos de ensinar.

No entanto, as metáforas positivas como a da esperança, na qual são referidos o “espírito jovem” e o “farol”, sugerem um novo rumo, a fim de conceber que nunca é tarde para buscar o conhecimento. Pensar em como a tecnologia pode se encaixar nessa luz permite conceptualizações criativas das relações entre as novas tecnologias e a educação. Ao empregar essa e outras metáforas positivas, se criam ideias mais flexíveis que promovem benefícios para o processo de ensino-aprendizagem.

Os resultados da pesquisa comprovaram a importância de metáforas cognitivas na esfera educacional, mais especificamente, no ensino superior. Forneceram-nos, assim, evidências para o fato de que o domínio-alvo das metáforas em questão é importante para a cobertura de diversos temas direta ou indiretamente relacionados às novas tecnologias da educação no ensino superior. Isso pode ser explicado pela drástica influência global da pandemia na esfera educacional.

Nesse contexto, fica evidente a importância da LC em geral, e da metáfora conceptual em particular, nos últimos anos. O desenvolvimento desse mecanismo conceptual nos ajuda não apenas a compreender a linguagem, mas também a categorizar e conceptualizar o mundo, o que justifica o grande número de estudiosos que dedicam seus esforços ao estudo desse fenômeno. Neste estudo, especificamente, a metáfora se mostrou uma poderosa e eficiente estratégia conceptual e discursiva usada pelos docentes universitários para dar sentido às novas formas de ensinar, por meio das tecnologias digitais, e às suas implicações no processo de ensino-aprendizagem.

Para futuros estudos, como proposta de sugestão, a temática poderia ser reinvestigada com uma amostragem mais ampla, incluindo os professores de outras regiões do Brasil, bem como de outros níveis educacionais. Isso poderia gerar outras informações pertinentes para entender o fenômeno e ampliar a perspectiva sobre a experiência, o comportamento e as práticas de como lidar com essa questão, tão pertinente e necessária aos tempos atuais.

Revisto por Alina Timóteo

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1UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (2020), “COVID-19 Educational Disruption and Response”, 24 de março (última atualização a 21 de abril de 2022). Consultado a 22.04.2022, em https://www.unesco.org/en/articles/covid-19-educational-disruption-and-response.

2IESALC - Instituto Internacional de la UNESCO para la Educación Superior en América Latina y el Caribe (2020), “¿Cómo prepararse para la reapertura? Estas son las recomendaciones del IESALC para planificar la transición hacia la nueva normalidad”, 13 de maio. Consultado a 20.04.2022, em http://www.iesalc.unesco.org/2020/06/18/como-prepararse-para-la-reapertura-estas-son-las-recomendaciones-del-iesalc-para-planificar-la-transicion-hacia-la-nueva-normalidad.

3IESALC (2020), “COVID-19 y educación superior: de los efectos inmediatos al día después. Análisis de impactos, respuestas políticas y recomendaciones”. Consultado a 15.05.2022, em http://www.iesalc.unesco.org/wp-content/uploads/2020/05/COVID-19-ES-130520.pdf.

4As letras indicam as iniciais dos nomes reais dos professores, e o número indica a ordem do relato que foi coletado/recebido via Google Forms, nas quais nos baseamos para explicar a utilização dessas metáforas específicas.

5Harwell, Drew (2020), “Mass School Closures in the Wake of the Coronavirus Are Driving a New Wave of Student Surveillance”, The Washington Post, 1 de abril. Consultado a 02.03.2022, em https://www.washingtonpost.com/technology/2020/04/01/online-proctoring-college-exams-coronavirus/.

Recebido: 06 de Junho de 2022; Aceito: 12 de Outubro de 2022

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