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Cadernos do Arquivo Municipal

On-line version ISSN 2183-3176

Cadernos do Arquivo Municipal vol.ser2 no.12 Lisboa Dec. 2019

 

ARTIGO

Entre o Desterro e Arroios. O desenvolvimento urbanístico dos bairros do primeiro troço da Avenida Almirante Reis (Avenida dos Anjos)

From Desterro to Arroios. The urban development of the neighbourhoods around the first section of Almirante Reis Avenue

Tiago Borges Lourenço*

*Tiago Filipe Borges Lourenço, IHA - Instituto de História da Arte, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade NOVA de Lisboa, 1069-061 Lisboa.tborgeslourenco@gmail.com

 

 

Para o meu filho Martim, nascido ao mesmo tempo que este artigo.

 

 

RESUMO

Estendendo-se entre o Desterro e Arroios, o primeiro troço da Avenida Almirante Reis corresponde à concretização do projeto de 1877 para a abertura da Avenida dos Anjos. Entre 1889 e 1928, surgiram nas suas orlas quatro novos bairros (Andrade, Castelinhos, Braz Simões ou Inglaterra e Colónias) com diferentes características que refletem o tempo em que foram desenvolvidos. É justamente o estudo do modo como a avenida foi crescendo e da génese destes bairros que o presente artigo pretende fazer.

 

PALAVRAS-CHAVE

Bairros / Avenida Almirante Reis / Lisboa / Urbanismo

 

ABSTRACT

Built between Desterro and Arroios, the first section of the Almirante Reis Avenue materialized the 1877 Avenida dos Anjos project. Between 1889 and 1928 four neighbourhoods (Andrade, Castelinhos, Braz Simões or Inglaterra and Colónias) took shape around it, with different features that reflect the moments they were built. This article attempts to trace the development of the Almirante Reis Avenue and these four neighborhoods.

 

KEYWORDS

Neighbourhoods / Almirante Reis Avenue / Lisbon / Urbanism

"O «espírito miúdo» de Lisboa rapidamente assimil[ou] estes bairros de acessos confusos e de dimensões restritas onde os emblemas de civilização não eram nem ostensivos nem destruidores das vivências tradicionais que permaneciam quase intactas sob a tímida modernização."

Raquel Henriques da Silva

 

 

NOTA PRÉVIA1

No presente estudo pretende-se traçar o processo de evolução urbanística da Avenida Almirante Reis e estudar a génese e desenvolvimento dos bairros em torno do seu primeiro troço2.

Com cerca de quilómetro e meio de comprimento, entre o extremo norte da Rua da Palma (ao Intendente) e a Praça do Chile (onde originalmente cruzava com a Estrada da Circunvalação, atual Rua Morais Soares), esta primeira fase corresponde integralmente à Avenida dos Anjos, idealizada em 1877 e projetada quinze anos mais tarde. Rebatizada Avenida Dona Amélia e posteriormente Avenida Almirante Reis, esta via cresceu em direção a Norte a partir do final da década de 1920. Por essa altura, a lógica de desenvolvimento dos bairros circundantes aos novos troços era já completamente diferente da do primeiro, sendo então concebidos, não como uma iniciativa privada desregrada, com pouca ou nenhuma preocupação com a sua integração na malha urbana circundante, mas como parte de planos gerais de urbanização delineados pelos serviços camarários. Trata-se, portanto, de uma avenida ampliada em várias etapas, que refletem a forma como o pensamento urbanístico evoluiu nas cerca de quatro décadas que durou o seu desenvolvimento.

Em estudos urbanos, o conceito de Bairro é um dos menos estabilizados, variando, conforme o autor, o contexto e as disciplinas que o estudam. Ao longo do tempo, os que sobre ele têm procurado refletir concluem invariavelmente não haver uma “definição unívoca e sistemática de bairro”3, devido à complexa realidade geográfica e sociológica do conceito. Ao incidir unicamente num determinado momento, limitado no tempo, de cada um dos objetos de estudo (a sua génese), no presente estudo não se pretende dissertar sobre o conceito de bairro, nem explorar a sua dimensão de espaço que reflete “mecanismos de diferenciação morfológica, económica e social”4. O termo será, assim, utilizado como maioritariamente era entendido e aplicado nos novos bairros surgidos na época e área em estudo: uma mera operação de urbanização e loteamento de determinada propriedade. Conceito desadequado na atualidade e de óbvia limitação, mas que, como adiante ser verá, levanta questões complexas que resultam do facto de nem todos os bairros terem estado contidos numa única propriedade e de nem todas as propriedades loteadas terem sido consideradas bairros.

 

 

 

 

 

BREVES APONTAMENTOS SOBRE OS NOVOS BAIRROS CONSTRUÍDOS EM LISBOA A PARTIR DE FINAIS DO SÉCULO XIX

Na segunda metade do século XIX, Lisboa experienciou um crescimento até então sem precedentes. Não só o justifica o importante aumento populacional que deveria ser acompanhado por um acréscimo do número de habitações, mas, principalmente, a forma como a supressão das casas religiosas5 propiciou a mais favorável conjuntura para uma renovação e expansão urbanística na cidade desde 1755. Se o grande terramoto foi uma necessidade transformada em oportunidade, neste caso deu-se a desocupação massiva de imponentes edifícios circundados por grandes cercas que, rapidamente, se tornaram nos principais terrenos urbanizáveis em áreas centrais da cidade. Derrubados os muros e profanadas as cercas, a cidade rasgou os antigos espaços conventuais, neles planeando e concretizando planos urbanísticos de diferentes escalas. Procurando evitar longos e custosos processos de expropriação6, era ali que se desenhava a cidade.

Esta prática teve especial relevância no contexto da ação da Repartição Técnica da Câmara Municipal de Lisboa (CML) que entendeu as cercas conventuais como peças fundamentais do esboço de uma Lisboa que se queria moderna. Os seus grandes obreiros foram Pierre-Joseph Pezerat (1801-1872) e, principalmente, Frederico Ressano Garcia (1847-1911) que, admitido como engenheiro camarário em 1874, encontrou uma cidade em lento desenvolvimento, “bairros novos nenhuns, e só prolongamentos ou ligações através de terras agrárias de «parcelares»7, improvisados que a circunvalação estava longe de fazer assimilar urbanisticamente”8. É neste contexto que surgiu um conjunto de diferentes formas de apropriação dos antigos terrenos religiosos para traçar um novo desenho urbano9, desde pontuais operações de regularização de traçados e antigos arruamentos, a grandes planos para novas urbanizações e ao rasgamento de avenidas que visavam essencialmente duplicar algumas das antigas vias de saída da cidade já muito congestionadas.

Estas novas avenidas tardo-oitocentistas tornaram-se polos de expansão viária, territorial e habitacional, legitimando um conjunto de novas construções que iam ao encontro das necessidades demográficas de Lisboa. Nas suas envolventes, onde outrora existiram quintas e terrenos de cultivo, projetaram-se muitos dos novos bairros de iniciativa pública/camarária e/ou de iniciativa privada10. Os empreendimentos privados, mais de duas dezenas na transição para o século XX, constituíram-se como um fenómeno tributário de uma empírica forma de fazer cidade que vinha desde o período medieval (altura em que os conventos mais abastados fizeram sucessivos loteamentos e aforamentos de parte dos seus terrenos) e que teve particular expressão nos anos imediatamente a seguir ao terramoto de 1755. Em muitos dos que foram sendo desenvolvidos a partir do final do século XIX, o emprego fácil do termo Bairro não exigia qualquer ideal identitário (social, arquitetónico ou vivencial), vinculando-se logo na fase de projeto ou de abertura de ruas com um mero significado de operação de arruamento e loteamento de uma determinada propriedade, antes sequer de ser edificado ou habitado - um bairro era-o antes de o ser. Refletindo a forma como estas iniciativas eram altamente individualizadas na figura do seu promotor, geralmente uma entidade individual11, até à década de 1930 foram cunhadas pelos seus apelidos. Assim surgiram os bairros Andrade (à Almirante Reis), Barata Salgueiro (à Avenida da Liberdade), Brandão (à Calçada da Estrela), Braz Simões (à Almirante Reis), Catarino (à Estefânia), Ermida (a Sapadores), Garrido (ao Alto do Pina), Grandela e Herédia (ambos à Estrada de Benfica), Lamosa (à Penha de França), Linhares (à Estefânia), Neves Piedade (ao Campo Pequeno), Santos (ao Rego), Serzedelo (a Campolide), Soares (a Algés) ou Tavares (ao Beato), entre outros12.

Apesar de carecerem de aprovação camarária, a forma rápida e pouco ordeira como os primeiros projetos se foram desenrolando colocaram à cidade desafios nem sempre bem resolvidos. Desde logo, pela manifesta falta de cultura urbanística evidenciada pelos promotores, que tendencialmente se limitavam a delinear e a abrir as novas ruas particulares, não demonstrando qualquer preocupação em coser os seus empreendimentos com a cidade envolvente. Era frequente encontrar vias que terminavam abruptamente nos muros das propriedades vizinhas e assim ficavam durante várias décadas, à espera de que, do outro lado, diferente promotor retomasse o critério urbano interrompido. Embora legitimados e absorvidos pela cidade, estes bairros eram muitas vezes ilhas, dela apartados e precariamente vinculados. Por esse motivo, mais de um século depois, continua a ser relativamente fácil reconhecer os seus limites na malha urbana lisboeta. Após um importante decréscimo das iniciativas deste género ao longo da I República, a partir do final da década de 1920, assistiu-se ao seu ressurgimento, muitas vezes inseridas e enquadradas em grandes planos urbanísticos de traço camarário que lhe conferiam uma regularidade de desenho nunca evidenciada pelos bairros mais antigos.

A par das iniciativas privadas, com a implantação da República, concretizar-se-iam também ambições das políticas sociais de habitação, visando resolver o grave problema do alojamento da população que chegava a Lisboa. Em bom rigor, encontravam-se já em equação desde os derradeiros anos da Monarquia, altura em que foram

discutid[as] por diversas ocasiões no parlamento sem que se tenha passado do papel à prática13. Estas discussões foram muito importantes para densificar o problema da habitação em Portugal […]. Na I República, foram criadas as primeiras políticas de habitação que reflectiam o debate entre a promoção directa e indirecta, que vinha de Oitocentos. […] [No entanto, o] caos institucional em que a I República estava mergulhada […] impossibilitou a estabilidade necessária para colocar em prática qualquer medida […]. Depois do período de transição da Ditadura Militar, foi apenas no Estado Novo que o nosso país viria a conhecer uma «política de habitação» minimamente concertada14.

 

 

 

 

Neste contexto, até à segunda década do século XX assistira-se quase em exclusivo à proliferação de pátios (que “de forma semi-espontânea […], ocupa[ram] de modo excedentário o tecido urbano consolidado”15) e vilas operárias (“edificadas em terrenos desvalorizados […] [e baseadas] na edificação de habitações pelo valor mais reduzido de acordo com os mínimos legislativos”16). Assiste-se depois a uma importante alteração de modelo, baseado na construção de bairros operários e de casas económicas, que inicialmente se constituíram como meros loteamentos de propriedades17 e, posteriormente, evoluíram para células auto-suficientes com um desenho urbanístico cuidado, acompanhado de uma conceção arquitetónica de um ou vários modelos-tipo de casas e da dotação de equipamentos sociais18. Na I República são pontuais as promoções feitas por privados (Bairro Garrido) e pelo próprio Estado (casos dos bairros do Arco do Cego e da Boa-Hora), invariavelmente concretizados ou concluídos aquando da e/ou pela Ditadura Nacional ou pelo Estado Novo. É justamente a partir de 1926 que se efetiva o papel do Estado neste particular. Até à década de 1960, o número de novos bairros de casas económicas construídos em Lisboa acompanha o dos novos empreendimentos para classes mais abastadas, refletindo uma inflexão nas lógicas habitacionais da cidade19.

 

UMA LINHA URBANA DE PRIMEIRA CATEGORIA20: DA AVENIDA DOS ANJOS À ALMIRANTE REIS

O projeto (e abertura) da Avenida dos Anjos e ruas adjacentes

É no contexto anteriormente descrito que é projetada a Avenida Almirante Reis, ainda como Avenida dos Anjos21. Desenvolvida entre duas antigas casas religiosas (Mosteiro de Nossa Senhora do Desterro e do Convento de Nossa Senhora da Luz a Arroios) cujas cercas propunha rasgar, esta via concretiza uma intenção iniciada mais de três séculos antes que visava a duplicação do eixo Rua das Portas da Mouraria – Rua do Benformoso – Rua Direita dos Anjos/Arroios – Estrada de Sacavém, uma das principais saídas em direção a Norte. Em traços gerais, corresponde a uma ampliação em linha reta da Rua Nova da Palma, aberta em 1554 e estendida até ao Largo do Intendente em 1859/6022. Não estando, em nenhum destes momentos, previsto o prolongamento que se constituiria na Avenida Almirante Reis, este acaba por seguir a lógica de duplicação de antigas vias de saída da cidade sobre a qual assentava o rasgamento de novas avenidas23. Apesar dos “constrangimentos da topografia, mais interferentes do que acontecia no planalto relativamente estável a norte das Picoas […] [terem obrigado à adoção de soluções] mais empíricas e bastante tradicionais”24, o facto de o traçado da nova avenida ter sido desenhado quase integralmente em terrenos de cultivo evitou os habituais constrangimentos provocados pelas pré-existências viárias, que por isso se mantiveram intactas.

Depois de projetos iniciais (nunca concretizados) para regularização do traçado da Rua Direita de Arroios, o Anteprojeto da Avenida dos Anjos e Ruas Adjacentes é aprovado a 9 de março de 1877. Pressupunha a construção de três ruas longitudinais, ligando a Rua dos Anjos (ao Intendente) à estrada da Circunvalação (atual Rua Morais Soares),

separadas entre si d’eixo a eixo por 80.50m, tendo a central 25,0m de largura, e as laterais 16.00m, e oito ruas transversais de 16.00m de largo que se ligam pelo lado oriental com a calçada do Forno do Tijolo e Monte da Penha de França, e pelo lado ocidental com a rua direita dos Anjos, Largo de Santa Bárbara, rua direita de Arroios e estrada de Sacavém25.

Percebe-se o nexo de plano integrado em que, a propósito da abertura de uma nova avenida, era também projetado um pequeno conjunto de arruamentos para fazer a ligação com as pré-existências viárias e permitir o crescimento das áreas residenciais. O montante global do custo do projeto ascendia a 360 contos de réis, já depois da dedução do valor da venda dos terrenos nas franjas dos novos arruamentos. Aproveitando grande parte destas considerações, o projeto da Avenida dos Anjos foi apresentado em 1892 e engrandecido em 1895. Comparativamente com o ante-projeto, acrescentava a ligação direta da nova avenida à Rua Direita da Palma26, a construção de uma nova praça em substituição do Largo do Intendente (nunca concretizada) e o abandono da via nascente paralela à nova avenida27. Afirmava também a intenção de um futuro prolongamento “em 665.0m com uma rampa uniforme de 0.02 a encontrar o trajecto da estrada de Sacavém ao Areeiro dando o comprimento total de 2:466.60m”28, desembocando numa zona ligeiramente a sul da atual Praça João do Rio.

A área em torno do eixo Rua Direita dos Anjos/Arroios – Estrada de Sacavém havia sofrido um acentuado desenvolvimento habitacional no decorrer das últimas décadas do século XIX. Na encosta nascente do vale dos Anjos, fizeram-se loteamentos à Cruz do Tabuado, junto ao novo Hospital da Estefânia, uma zona que sendo relativamente periférica em relação ao dito eixo, o utilizava como principal acesso à Baixa. O projeto da nova avenida contemplou ligações diretas com estas novas áreas habitacionais, via Rua Pascoal de Melo29, o que implicou a construção de um novo viaduto sobre a antiga Rua Direita de Arroios. Surge, assim, um singular ciclo vicioso: os primeiros bairros mais periféricos concorreram fortemente para a abertura da nova avenida, e, por sua vez, esta contribuiu para a criação de novos bairros nas suas imediações30.

Assim, conforme o século XIX se foi aproximando do seu final e o projeto da nova avenida foi sendo concretizado, nas suas orlas um conjunto de antigas propriedades de grandes dimensões começou a ser adquirido e rentabilizado. Com a complacência da autarquia que, por questões orçamentais, se viu impedida de aqui tomar para si a concretização de uma operação de expropriação e urbanização semelhante à que, contemporaneamente, empreendia nas Avenidas Novas. Estas operações reduziam-se a iniciativas puramente capitalistas de venda de terrenos integralmente divididos em talhões de diferentes dimensões e formatos, invariavelmente mais pequenos (e baratos) do que os que então se alienavam nas Avenidas Novas. Aliado ao rasgamento de ruas pouco largas (com 12 ou menos metros), este facto condicionou a priori as características construtivas, direcionando a compra dos lotes para um pequena burguesia e a habitação para a classe média. Assim, um conjunto de proprietários e comerciantes31 foi adquirindo os talhões com intuitos meramente especulativos, contratando empreiteiros para os edificar, com vista ao arrendamento dos apartamentos ou à venda dos edifícios. Mais raramente, a aquisição era feita para construir habitação própria, como sucedeu nos bairros dos Castelinhos e Bairro Braz Simões onde, a partir de meados do século XX, estes edifícios foram maioritariamente demolidos ou descaracterizados por sucessivas ampliações.

 

 

 

 

 

OS PRIMEIROS BAIRROS. BAIRROS ANDRADE E DOS CASTELINHOS (1889-1897).

Ainda no século XIX e com a Avenida dos Anjos em projeto, começaram a surgir novos bairros que constituíram as primeiras experiências habitacionais de média dimensão na zona. Numa história que corre em simultâneo com a do próprio processo de abertura da avenida, foram construídos os bairros Andrade e dos Castelinhos32, próximos do Largo do Intendente e do extinto Mosteiro de Nossa Senhora do Desterro, por essa altura já com função hospitalar.

Desenvolvido a partir de 1889, o Bairro Andrade resultou do loteamento que Manuel Gonçalves Pereira d’Andrade fez em duas grandes propriedades (Quinta da Romeira e Horta das Velhas) que adquirira entre 1879 e 1882 nas margens da Calçada do Forno do Tijolo e da Rua Direita dos Anjos. A escolha do momento para concretizar estas aquisições parece indiciar que Andrade, sabendo que estava a ser desenvolvido um projeto de uma nova avenida nos terrenos contíguos, o fez com o intuito de obter uma valorização futura33. Esperou, pois, pelo momento certo para iniciar o empreendimento, antes de qualquer outro nas imediações, em vésperas da apresentação do aludido projeto. Depois de em julho de 1889 ter dado conhecimento à autarquia de que pretendia dividir a sua propriedade “em talhões por meio de ruas [de 12 metros de largura], e n’elle edificar”34, em dezembro seguinte pediu “licença para abrir cavoucos para varias construcções e para venda de terrenos, respeitando o alinhamento da rua projectada pela camara [Avenida dos Anjos], sem prescindir dos seus direitos e posse sobre os terrenos da mesma rua; bem assim licença para abrir serventias provisorias no muro da dita propriedade para […] tres vias publicas”35.

A rapidez da venda (60 dos 90 lotes foram alienados entre 17 e 30 de junho de 1890) e o avultado valor por metro quadrado36 que concorreu para um elevado montante global arrecadado com a operação (cerca de 87,5 contos de réis) demonstram cabalmente a visão e o poder negocial do proprietário, bem como o elevado interesse manifestado por uma parte da sociedade lisboeta num período social e económico profundamente conturbado. A construção iniciou-se pouco depois, estando grande parte concluída até ao final do século. Os novos edifícios, todos de habitação plurifamiliar, patenteavam uma qualidade desigual entre si, oscilando entre prédios modestos e exemplares de requinte construtivo e decorativo superior ao da maioria dos que se estavam a construir na própria Almirante Reis, embora nenhum seja assinado por arquiteto.

 

 

 

 

Por requerimento de 5 de julho de 1890, Andrade propôs à CML “doar o terreno das […] ruas [do seu bairro] ao municipio, tomando este á sua conta o mandal-as canalisar, calçar e illuminar, para para o que offerece a quantia de dez contos de réis”37, valor considerado escasso pela autarquia, que estimou os custos da operação em mais de quarenta e um contos de réis. No entanto, dado a construção do bairro concorrer para a salvaguarda dos interesses camarários (devido à recolha de impostos e taxas), optou por reduzir o valor da transação para trinta contos de réis38. Aceite a cifra por Andrade, a municipalização do bairro efetivou-se na sessão camarária de 25 de setembro, comprometendo-se a CML a cumprir a instalação da canalização e da iluminação dos arruamentos até 25 de março de 1892.

Por se implantar num terreno parcialmente plano, foi possível traçar um desenho ortogonal em parte do empreendimento, não se observando nele o cariz quase anárquico de outros bairros seus contemporâneos. Andrade morreria em 1894, antes de ver todos os lotes do seu bairro vendidos e construídos, cabendo esse ónus aos seus herdeiros, que alienaram as derradeiras parcelas apenas em 1905, a um ritmo bastante mais lento e por valores inferiores aos da primeira fase. No entanto, parece inegável que o enorme sucesso desta operação terá influenciado o surgimento de outras nos anos seguintes.

Fronteiro ao anterior, o Bairro dos Castelinhos nasceria em 1897, já com as obras da avenida em curso. Foi desenvolvido por uma sociedade particular criada para o efeito, a Empreza Promotora do Bairro dos Castelinhos, constituída por seis sócios, para urbanizar um prédio urbano e rústico designado por Horta do Castelo ou Quinta dos Castelinhos39, originalmente foreiro ao Convento de Santa Clara de Lisboa. Entre 1893 e 1894, os sócios da empresa adquiriram as três parcelas de terreno da quinta, tendo sido concebido em 1895 um primeiro estudo do bairro, contendo planta, orçamento e mapa de expropriações40. Originalmente, a intenção era construir o bairro faseadamente, começando pela “rua [com 12 metros de largura] de communicação entre o largo do Intendente, e a calçada do Conde Pombeiro”41 (atual Rua Antero de Quental), para cujo rasgamento pediram autorização camarária em junho de 1896.

A empresa tinha como finalidade a

explora[ção] [d]o referido predio [urbano], fazendo e consentindo que n’elle se constitua um bairro […] similhante ao «Bairro Andrade» para o que offerecerão á Camara Municipal ou a quaesquer entidades ou particulares os terrenos necessários para abertura de [quatro] ruas42 consoante um plano já entre si combinado e reduzido a planta já approvada pela Camara Municipal43.

 

 

 

 

E assim o fizeram. Refletindo a atratividade da operação, a venda dos 60 talhões ocorreu de forma rápida e sequencial, a primeira das quais a 27 de dezembro de 1897, numa altura em que as ruas estariam apenas delineadas. A 25 de julho do ano seguinte é assinado o contrato de cedência dos arruamentos à autarquia, que apresenta algumas especificidades relativamente ao assinado para o Bairro Andrade, por envolver a cedência e permuta de parcelas de terreno entre as duas entidades e devido ao facto de a empresa se ter comprometido a abrir as ruas44. Nesse sentido, apenas a 23 de janeiro de 1899, a Empresa Promotora do Bairro dos Castellinhos assinou com o pedreiro José dos Santos um contrato para a empreitada de construção de pavimentos das ruas do bairro, compreendendo

o fornecimento da mão d’obra e de todos os materiais e utensilios necessarios para a sua execução. […] [Nele é definido que] a largura das ruas é de 10,0m e por isso teem os passeios 1,70m de largura cada um, incluindo as bordaduras e terão a inclinação de 3% para o lado das valetas [que] terão de largura 0,70m incluindo a linha d’agua. A faxa de rodagem, em macadam, terá portanto a largura de 5,20m, e a sua secção transversal será uma curva com o seu ponto culminante d’altura da linha exterior dos passeios, junto dos predios […] [, devendo] os trabalhos […] ficar completamente acabados no praso de noventa dias45.

As novas construções foram edificadas por mais de duas dezenas de construtores, maioritariamente entre 1898 e 1902. Contrariamente ao que se havia verificado no Bairro Andrade (onde uma área de implantação superior e uma maior largura das ruas permitiu a construção de edifícios mais altos e com dois fogos por piso), a maioria dos prédios construídos nos Castelinhos era de modestas dimensões, invariavelmente entre um e três andares e apenas com um fogo por piso46, existindo também algumas construções unifamiliares. Por todo o bairro assiste-se a um muito interessante fenómeno de ampliação em altura, sendo frequente a transição de tipologia unifamiliar para plurifamiliar poucos anos depois da data de construção original.

 

 

 

 

No espaço e tempo em análise, merece também referência o loteamento iniciado em 1891, por João Marques da Silva, na antiga Quinta da Imagem47 (ao Caracol da Penha de França), cuja parte rústica foi rasgada pelo projeto da nova avenida. Desta operação resultou a venda de 29 lotes entre fevereiro de 1892 e janeiro de 1897, voltados à Avenida Almirante Reis e às ruas Direita de Arroios, Marques da Silva48 e Francisco Sanches, esta última parcialmente aberta no contexto do loteamento. Possivelmente pela exiguidade da área loteada e por se implantar maioritariamente em ruas pré-existentes ou previstas no projeto da Avenida dos Anjos e ruas adjacentes, este empreendimento nunca foi considerado ou apelidado de bairro, tendo desde cedo sido absorvido pela malha urbana envolvente49.

Nos três empreendimentos ocorreram impasses viários. No loteamento de Marques da Silva, o intenso debate provocado pela forma abrupta como terminava a Rua Francisco Sanches obrigou à reformulação parcial do próprio projeto da Avenida dos Anjos, que assim ganhou uma inesperada versão final em 1895, contemplando o prolongamento da mencionada via até à Rua Morais Soares50 e o rasgamento de uma nova artéria (Rua Cavaleiro de Oliveira). No caso do Bairro dos Castelinhos, a sua ligação com a Rua da Bempostinha foi resolvida com a compra e demolição de edifícios nela existentes, permitindo o prolongamento da Rua Rafael de Andrade. Por seu turno, foram necessárias quatro décadas para concluir todas as ruas do Bairro Andrade. Por ter sido construído antes da abertura da Avenida Almirante Reis, as suas ligações com a restante cidade foram inicialmente feitas pelo estreito e tortuoso Caminho do Forno do Tijolo e pela Rua Direita dos Anjos. Ultrapassada esta dificuldade, ficaram a faltar as ligações a norte, apenas colmatadas com a urbanização da vizinha Quinta da Charca, na qual foram construídos os bairros Braz Simões (ou de Inglaterra)51 e das Colónias, cujo desenvolvimento se abordará adiante.

Como referido na nota prévia, embora simplista, a aplicação do conceito de bairro para indicar uma operação de urbanização não é isenta de problemática. A atual noção dos limites do Bairro Andrade extrapola a área e a iniciativa do loteamento de Manuel Pereira Gonçalves d’Andrade, composta por cinco ruas, às quais o promotor atribuiu o nome das que lhe eram próximas52. Na senda da sua iniciativa, logo a partir de 1893 desenvolveram-se outras duas operações de loteamento privadas53 em terrenos contíguos que prolongaram para Norte o espaço edificado da Rua Palmira e lhe acrescentaram dois novos arruamentos (ruas Álvaro Coutinho e Luís Pinto Moitinho), abertas em torno do quarteirão onde se implantou a nova Igreja dos Anjos. Por seu turno, no Bairro dos Castelinhos verifica-se a situação contrária: tendo a Quinta dos Castelinhos sido rasgada pela Avenida Almirante Reis, uma parcela do loteamento ficou separada do resto do bairro. Voltados à avenida e à Rua dos Anjos, os edifícios construídos em mais de uma dezena de lotes nunca foram entendidos como parte integrante do bairro. Conforme a cidade se foi consolidando, os limites destes bairros foram muitas vezes estendidos ou encurtados, mostrando a profunda desadequação do entendimento de bairro enquanto mero loteamento.

 

TEMPOS DE CONSOLIDAÇÃO. O BAIRRO BRAZ SIMÕES OU DE INGLATERRA (1903-1913)

A 20 de julho de 190354 é finalmente inaugurada a nova via de ligação da Rua da Palma à antiga Estrada da Circunvalação, que, poucos dias antes, havia sido rebatizada de Avenida Dona Amélia. À distância de mais de um século, parece de difícil compreensão o conceito de inauguração de uma via ainda incompleta. Devido à dificuldade em celebrar um acordo de cedência de uma parcela de terreno do Hospital do Desterro que incluía um bloco de enfermarias, o arranque da avenida a Sul (com 120 metros de extensão) continuava por concluir, obrigando a que parte do trajeto se fizesse pelo Largo do Intendente. Tão pouco se tinha resolvido eficazmente o cruzamento com a Rua Direita dos Anjos (figura 7) ou, sequer, dado início ao prolongamento da avenida para norte da Circunvalação.

 

 

 

 

Desse mesmo ano data o Plano Geral de Melhoramentos da Cidade, documento elaborado por Frederico Ressano Garcia, que idealizava a abertura de um conjunto de avenidas na zona norte da cidade. Embora não englobasse a área onde a Avenida Almirante Reis estava a ser rasgada, previa implicitamente o seu prolongamento para Norte, até ao sítio da Portela de Sacavém. Disso mesmo dá conta o estudo para construir uma das novas vias, descrita como

uma extensa avenida de 25,00m2 de largura e 4544m,66 de comprido, ligando a Luz com a Charneca […] [que] atravessa[ria] a avenida designada sob o nº 3 [do plano] ao sul do Paço do Lumiar […], devendo seguir, pela Portella […] [onde] deverá communicar com a [então] avenida D. Amelia, que é prolongada até esta povoação55.

Assim, enquanto se inaugurava o primeiro troço da Avenida Almirante Reis até à Estrada da Circunvalação, traçavam-se já novos planos para a prolongar mais três quilómetros para Norte, sempre ao correr da Estrada de Sacavém. Ainda que na prática não existisse qualquer vestígio de que, a curto prazo, a via se pudesse efetivamente estender para lá da antiga Circunvalação.

 

 

 

 

O levantamento cartográfico da cidade de Lisboa executado por Silva Pinto nos primeiros anos do século XX permite observar a ocupação de grande parte dos lotes em ambas as frentes da avenida. No entanto, a poente desta, demarca-se uma grande mancha vazia correspondente à área da Quinta da Charca (figura 9), uma propriedade a meia encosta que havia sido rasgada pela avenida mas que ainda mantinha o seu edifício principal e grande parte do terreno incólume56. No final do século XIX havia sido dividida por diversos proprietários, de entre os quais José António Barbosa de Araújo Simões, que ficou com a parte norte. Depois da sua morte em 1895, a viúva Maria Libânia iniciou um processo de divisão e alienação da sua propriedade. Em março de 1903 vendeu o edifício da quinta a Manuel Joaquim Marques57, celebrando também escrituras de venda de terrenos com José Braz Simões de Sousa, a 18 de fevereiro de 1905, 15 de maio de 1905 e 15 de abril de 190758. Ainda antes da última, a 2 de abril de 1907 Braz Simões submeteu à aprovação da CML um projeto “de um arruamento particular com a largura de dez metros, que pretend[ia] abrir n[este] terreno[,] situado na avenida Dona Amelia entre os numeros de policia setenta e seis e setenta e oito e a estrada da Penha de França numero cento vinte e nove, o qual e[ra] destinado á construcção de casas para habitação”59. A aprovação na sessão camarária de 25 de julho seguinte (e oficialização por escritura de 5 de agosto) permitiu a Braz Simões a abertura de um arruamento para o qual, contudo, a autarquia deixou claro “não conceder licença alguma para a construcção de predios […] em quanto não estive[sse] complet[o] com o pavimento e a competente canalisação de esgoto ligada com o cano municipal”60. O que terá ocorrido pouco depois, visto o primeiro dos mais de 70 lotes do empreendimento ter sido vendido a 6 de novembro seguinte.

 

 

 

 

A elevada pendente do bairro e a sua área relativamente reduzida (3,6 hectares) obrigaram a que esta rua particular tivesse sido projetada e rasgada com a mesma “ondulação antiurbana”61 com que Raquel Henriques da Silva categorizou o vizinho Caracol da Penha de França62. A 18 de julho de 1913 e já depois de ter vendido mais de 50 talhões, o promotor é autorizado a “completar duas ruas já parcialmente construídas”63 que aproveitavam parte do traçado serpenteante do arruamento primitivo para consolidar as ligações a Norte (com a Rua da Penha de França) e a Sul (com a Avenida Almirante Reis). Esta operação modifica por completo o traçado e a lógica urbana do bairro, ao fragmentar em cinco arruamentos a rua particular aberta seis anos antes.

Braz Simões procurou replicar o que Andrade havia feito no seu bairro duas décadas antes, atribuindo às suas ruas nomes de familiares. No entanto, em plena I Guerra Mundial, por deliberação camarária, a designação do seu bairro foi alterada para Bairro de Inglaterra e as ruas José de Sousa, Maria Gouveia, Aurora, Margarida e Isabel Leal foram respetivamente renomeadas Cidade de Liverpool, Cidade de Cardiff, Newton (depois do chumbo da proposta inicial para que se chamasse Lord Byron), Cidade de Manchester e Poeta Milton64.

 

 

 

 

De novembro de 1907 a agosto de 1910, apenas 16 talhões foram vendidos, sendo os restantes alienados até 1916 a uma cadência inferior a uma dezena por ano. Comparativamente com a realidade dos Bairros Andrade e dos Castelinhos, é notório o abrupto decréscimo da procura, forte motivo para justificar a quase total inexistência de empreendimentos deste tipo nos primeiros anos da República. Também a identidade do comprador se alterou, sendo já raros os pequenos capitalistas. A maioria é comprada por mestres de obra com o intuito de construir edifícios para depois os vender, uma tendência cada vez mais vincada ao longo das décadas seguintes nos novos bairros da cidade. O levantamento das operações de venda destas propriedades revela a total ausência de um padrão na avaliação dos lotes vendidos (variando entre os 537 e os 4000 escudos por metro quadrado), dado pouco habitual em operações do género.

É possível dividir o bairro em duas áreas distintas, conforme a tipologia dos edifícios. Na maioria dos talhões foram construídos edifícios de habitação plurifamiliar com três ou quatro andares, demarcando-se por oposição uma pequena área junto da entrada sul do bairro onde foi edificado um conjunto de moradias, algumas encomendadas pelo próprio Braz Simões. Embora sejam edifícios de modestas dimensões, apresentam uma elevada erudição de planta e desenho das fachadas, alguns de assumida inspiração Arte Nova. Destaca-se o número 16 da Rua de Liverpool (já demolido), da autoria do desenhador Rafael Duarte de Melo, galardoado em 1914 com uma menção honrosa do Prémio Valmor65.

É também neste período que são edificados os terrenos nas orlas das ruas Francisco Sanches, Heróis de Quionga e José Falcão, entretanto abertas a noroeste da avenida, tornando cada vez mais notória a existência de uma cidade a dois ritmos simbolicamente destrinçados pela antiga Circunvalação, a norte da qual a Lisboa das quintas e azinhagas permanecia cristalizada.

 

 

 

 

 

FORA DE TEMPO. O BAIRRO DAS COLÓNIAS (1928-1931)

O processo de prolongamento da Avenida Almirante Reis para norte da antiga Circunvalação foi, como visto, particularmente moroso. Mesmo sem um projeto formal para o terceiro troço, a intenção de a estender até à Estrada de Sacavém continuava a esbarrar no muro do antigo Convento de Nossa Senhora da Luz a Arroios. Apesar de ter ficado definido desde 1890 que a autarquia apossar-se-ia do terreno necessário para o prolongamento da avenida66, este processo apenas ficou concluído em 1916. No entanto, numa primeira fase de pouco serviu visto a autarquia só ter conseguido chegar a acordo com o último dos proprietários das três quintas contíguas aos terrenos do hospital em 1932. Esta demora acabaria por permitir aos serviços camarários integrar os projetos para os novos troços da avenida num plano mais abrangente, articulado com o novo Bairro do Arco do Cego, com o Instituto Superior Técnico e com a urbanização da área que a norte da antiga Circunvalação se equaciona. Trinta e cinco anos depois do projeto da Avenida dos Anjos, o eixo e os novos bairros deixavam de ser entendidos como elementos urbanos isolados. Assim surgiu o chamado Bairro dos Atores67, a acompanhar a face nascente dos novos troços.

Mais a Sul, em torno do primeiro troço da avenida, a partir de 1928 começaram a ser desbloqueados diversos empreendimentos. Terrenos que se urbanizaram e pontas soltas que no complexo novelo da avenida foram finalmente atadas, nomeadamente o alargamento da Rua da Palma, que passou a contar com a mesma largura que a Avenida Almirante Reis. Sacrificando para o efeito os jardins do Palácio do Conde de Soure68, surgiu uma nova frente de rua com a construção de mais de uma dezena de edifícios, de entre os quais se destaca o da Garagem Liz.

Também em 1928 são tomadas as primeiras providências para o loteamento do remanescente do terreno da Quinta da Charca, num empreendimento urbanística e arquitetonicamente alinhado com os princípios vigentes em torno dos novos troços da avenida69. Com uma área de construção de mais de 9 hectares, o Bairro das Colónias foi o maior e o último dos bairros a ser construído em torno da primitiva Avenida dos Anjos. Implantado na área mais a sul da Quinta da Charca, entre os bairros Andrade e de Inglaterra, era formado por nove ruas e uma praça que, a meia encosta, foram desenhadas com o intuito de unirem os arruamentos interrompidos dos dois bairros. Desde o início da década de 1890, habitantes e transeuntes do Bairro Andrade esperavam pela conclusão das ruas Palmira e Maria que desembocavam provisoriamente no antigo, estreito e sinuoso Caminho do Forno do Tijolo. Por seu turno, no Bairro de Inglaterra as ruas Newton e Poeta Milton terminavam nos muros dos terrenos particulares contíguos. Assim, o Bairro das Colónias é o único de entre os objetos de estudo deste artigo cujo traçado é integralmente desenhado com a preocupação de consolidação urbanística da envolvente. Apesar de partilhar com o Bairro de Inglaterra os constrangimentos provocados pela grande pendente do terreno, consegue resolver os problemas daí advindos de forma mais eficaz, através de uma melhor ligação com a maioria dos arruamentos pré-existentes, nomeadamente a avenida70 e o secular Caminho do Forno do Tijolo (atual Rua do Forno do Tijolo), cujo traçado foi, então, parcialmente redesenhado.

No contexto da presente investigação não foi possível aferir a forma como surgiu a iniciativa da criação deste novo bairro nem como foi definido o momento para o seu desenvolvimento.71 No entanto, salienta-se a coincidência cronológica do seu planeamento com o dos projetos de alargamento da Rua da Palma e de prolongamento da Avenida Almirante Reis. Coincide também com um período propício para o desenvolvimento de iniciativas do género, capitalizado no surgimento de novos bairros e pequenos loteamentos em diferentes áreas da cidade, a um ritmo que não se assistia na cidade desde os primeiros anos do século. Até meados da década de 1930 estariam em desenvolvimento os bairros dos Aliados (Sociedade Bairro dos Aliados, na antiga Quinta do Bacalhau, ao Alto do Pina), Azul (por Bernardino Lopes e Abílio Nunes Santos, à Palhavã), Lamosa (por Francisco Lamosa, na antiga Quinta do Ferrugento, à Estrada da Penha de França), Neves Piedade (na Quinta dos Conventos de Baixo, ao Campo Pequeno), Santos (por Joaquim José dos Santos, ao Rego), e as urbanizações em torno do segundo troço da Avenida Almirante Reis, do Alto Varejão e das quintas do Alperche (ao Alto do Pina), das Galveias (de iniciativa da firma Simões & Simões, ao Campo Pequeno) e dos Peixinhos (ao Monte Pedral).

O novo Bairro das Colónias implantou-se nos terrenos de três proprietários, João Duarte, Cecília Mendes Fernandes Brum da Silveira e Luzindra Fernandes Lamas. O início do desenvolvimento efetivo do bairro ocorre em 1928, quando o primeiro solicita

[à Câmara Municipal de Lisboa a elaboração de um projeto de delineamento de um bairro nos seus terrenos] […] da Quinta da Mineira72 […], referente a um plano de arruamentos, atravez daquela propriedade73. […] [Propunha-se] aproveita[r] os terrenos ainda livres das Quintas da Mineira e da Charca, os quais, pela sua situação a dois passos do coração da cidade, se prestam magnificamente para neles se edificarem casas, dando assim alojamento a muitas centenas de familias74.

 

 

 

 

Datado de fevereiro de 1929 e da autoria do engenheiro camarário António Emídio Abrantes75, o Projecto de Arruamentos ligando o Bairro Andrade com o Bairro de Inglaterra (Figura 12) marca uma profunda inflexão no entendimento e conceção das urbanizações nesta zona, desde logo pela forma como os serviços camarários tomaram para si o ónus de o delinear. A distância cronológica para os bairros vizinhos acabou também por se refletir no cuidado com aspetos não prioritários na passagem do século:

Não deixámos também de aproveitar a parte mais acidentáda, junto ao muro da cêrca do antigo Palacio do Conde de Soure, á Rua da Penha de França [onde atualmente se implanta a Escola Secundária de Dona Luísa de Gusmão], para projectarmos um jardim, do qual se póssa disfructar a mágnifica perspectiva que se gósa daquele local e com este intuito igualmente projectámos duas placas ajardinádas, em “tapis-vert” […] e tambem indicámos uma serie de construções isoládas na parte superior da Rua –D- [eixo formado pelas atuais Ruas Ilha do Príncipe e de Cabo Verde], permitindo-se assim que esse local ficásse desafrontádo de construções que pudessem impedir a vista de quem quizésse observar o panorama daquela parte da cidade76.

A concretização seria menos ambiciosa, limitando-se apenas a uma encosta ajardinada, coroada por um pequeno jardim-miradouro com uma entrada por intermédio de uma escadaria junto do número 7 da Rua Ilha do Príncipe e outra, exterior ao bairro, pela Rua Heliodoro Salgado.

O projeto camarário de 1929 desenvolve um bairro com o “traçádo […] [que] mais racionalmente se podia fazer, dádas as ruas já existentes e a configuração topografica do terreno”77. Previa apenas dois perfis de ruas, com 12 e 15 metros de largura, embora deixasse uma nota de preocupação com a transição destas com os arruamentos dos bairros contíguos, que apresentavam diferentes dimensões (10 metros no Bairro de Inglaterra e 12 no Bairro Andrade). São também, desde logo, propostos os nomes do bairro e das ruas, contrariando a prática comum de ser o promotor a fazê-lo.

Seja-nos permitido lembrar um nome a dar a este conjunto de arruamentos e que esse nome sirva para recordar o vasto império colonial que possuímos, e que até agora não tem sido devidamente lembrado nos vários bairros existentes em Lisboa. Havendo Bairro de Inglaterra, […] da Bélgica, […] etc, justo é que haja um Bairro das Colónias, onde cada rua tivésse o nome de uma cidade de cada colónia portuguêsa78.

Entre meados de 1929 e o início de 1930, a CML assinou com os proprietários dos terrenos contratos de expropriação para poder abrir os novos arruamentos79. Não é claro o papel das irmãs Luzindra e Cecília em todo o processo. Embora seja inequívoco que, desde cedo, teriam tido conhecimento do projeto em curso nas suas propriedades, nenhum documento explicita o seu envolvimento ou intenção numa futura promoção imobilária dos seus terrenos. Acabariam ambas por, em diferente fases do processo, vender as suas propriedades, às firmas Neves & Ribeiro, Lda. (10/10/1929)80 e Roxo & Companhia, Lda. (04/03/1931)81, que pouco depois iniciaram a venda de lotes.

Este processo é detalhadamente explicado num artigo do Diário de Notícias de 1933, citado por Francisco Santana:

Termina-se [o artigo] com passagens de entrevista feita pelo jornalista ao engenheiro Pinto de Oliveira sócio da Havaneza do Socorro, Lda., promotora da venda dos terrenos: – Ora, diga-me V. Exa.: de quem partiu a ideia da construção do Bairro das Colónias? Para lhe falar com a maior franqueza, não sei ao certo; mas presumo que tão esplêndido empreendimento partiu do sr. João Duarte, um dos proprietários da antiga quinta da Mineira, ou Charca, no que foi desde logo secundado pelas importantes firmas Roxo & Cª. e Neves & Ribeiro, que, numa colaboração digna de todos os elogios, conseguiram construir, rapidamente, os arruamentos, passeios e esgotos, de modo a permitir a construção das inúmeras casas que já compõem o Bairro82”.

O Bairro das Colónias é o maior na envolvente do primeiro troço da avenida, com uma área quase três vezes superior à da dos bairros de Inglaterra ou Castelinhos. Cerca de 60% do espaço de construção do bairro localizava-se nos terrenos de João Duarte, cabendo o restante (em partes iguais) às duas firmas, com exceção de dois pequenos talhões junto ao Caminho de Forno do Tijolo, propriedade da CML. A venda dos mais de 100 lotes é feita quase em simultâneo pelos três empreendedores, iniciando-se nos primeiros dias do verão de 1931 a preços entre os 30 e 40 escudos o metro quadrado. No final de 1935, quase todos se encontravam alienados, a maioria a proprietários ou comerciantes, o que revela uma procura significativa. A sua ocupação ter-se-á dado pouco depois das primeiras aquisições, registando-se uma atividade construtiva muito significativa, logo em 1932. Apesar disso, diversas áreas do bairro permaneceram por edificar até ao final da década seguinte, nomeadamente a face sul da Rua do Forno do Tijolo que se encontrava a poente da Rua Maria e toda a orla norte do eixo formado pelas ruas da Ilha do Príncipe e de Cabo Verde.

Por ter sido construído algumas décadas depois da maioria das demais construções da avenida e envolventes, o edificado do Bairro das Colónias impõe-se com particular dissonância. Unidos os pontos deixados nas margens dos terrenos dos bairros Andrade e de Inglaterra, os limites das propriedades de cada bairro distinguem-se sobretudo pela transição das suas arquiteturas.

O Bairro das Colónias apresenta-se como um conjunto modernista, em plena conformidade com o tempo em que a sua arquitetura foi desenhada e construída, heterogénea na qualidade e complexidade do seu desenho e na dimensão dos seus edifícios83. Todos os lotes foram ocupados por prédios de 3 a 5 andares (diferindo radicalmente no número de vãos conforme as ruas onde são edificados), à exceção da face norte do eixo formado pelas ruas Ilha do Príncipe e Cabo Verde, para o qual próprio projeto do bairro pressupunha “uma série de construções isoládas”84, que apenas foram construídas na primeira85. No conjunto arquitetónico do bairro, merece especial destaque a encomenda, feita em 1936, por João Salvador, de cinco edifícios projetados como um plano único, embora com diferentes desenhos (figuras 13 e 14). A qualidade e o arrojo do seu risco tornam-no numa das referências da arquitetura modernista na cidade. Embora seja assinado pelo engenheiro civil Luís Cabeça Dutra, a um deles é atribuída a autoria de Cassiano Branco (Rua Palmira, 33), ficando por esclarecer o envolvimento do arquiteto nos restantes86.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

NOTAS FINAIS. UMA MÁQUINA DO TEMPO EM FORMA DE AVENIDA

João Guilherme Appleton define a Avenida Almirante Reis como uma

«Máquina do tempo» da construção do prédio de rendimento lisboeta da primeira metade do século XX, [que] […] permite contar uma história do planeamento e das construções urbanas da capital ao longo de mais de cinquenta anos. […] [considerando que] as metamorfoses que a Avenida […] sofre no seu desenvolvimento e na sua construção na refletem apenas, de forma orgânica, o “espírito do tempo” ou o “espírito do lugar87.

Como em qualquer outra cidade, a história do urbanismo de Lisboa fez-se de planos nunca concretizados ou cronicamente adiados. No entanto, nunca como na Avenida Almirante Reis se assistiu a uma via planeada e construída em etapas que, não obstante terem produzido um coerente eixo viário, produziram também um heterogéneo parque habitacional. De Sul para Norte, percorrer os seus mais de dois quilómetros e penetrar nas ruas contíguas é quase como caminhar ao longo de uma tabela cronológica da evolução da cidade de Ressano Garcia em direção à de Duarte Pacheco, que neste texto ficou por explorar. Da Lisboa que se queria moderna, mas que era incapaz de reger o urbanismo dos novos bairros que grassavam em qualquer propriedade com dimensão para tal, para uma Lisboa regida a régua e esquadro, escudada por serviços camarários que para si tomavam o desenvolvimento dos novos espaços, cosendo projetos públicos e privados, numa malha reticular indistinta.

Os bairros, os não-bairros e os quase-bairros da Almirante Reis são assim reflexo (dos tempos) da Lisboa em que foram construídos.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FONTES

MANUSCRITAS

Arquivo Municipal de Lisboa

[Arruamentos no bairro Andrade], 1891-1903, PT/AMLSB/CMLSBAH/PURB/002/00588.

Augusto de Jesus Fernandes, Bairro do Arco do Cego. Rua Fernando Pedroso, 1967, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJF/003007.

Augusto de Jesus Fernandes, Rua Cidade de Liverpool, 1964, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/AJF/001400.

Estado das ruas no Bairro dos Castelinhos em maio de 1904, 1895-1900, PT/AMLSB/CMLSBAH/PURB/002/00663, p. 3.

Joshua Benoliel, Avenida Almirante Reis, n.os 22 e 34, lado nascente, PT/AMLSB/CMLSBAH/PCSP/004/JBN/001265.

Lisboa 1900. Planta mostrando o traçado completo da Avenida dos Anjos […], PT/AMLSB/CMLSBAH/GEGE/030/000717.

Livros de Escrituras nº 7A, 10A, 16A, 21, 59 e 81.

Obra N.º 35023, proc. N.º 5703/1.ªREP/PG/1912, p. 3.

Obra N.º 50702, processo N.º 7902/DAG/PG/1936, tomo 1, p. 8.

Plano Geral de Melhoramentos da Capital, PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/10/434.

Planta do Bairro Braz Simões. Guilherme dos Santos, 19-, PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/11/481.

Planta Topográfica de Lisboa, 11 I e J, 12 I e J. Silva Pinto, PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/05/03/79, PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/05/03/80, PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/05/03/91, PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/05/03/92.

[Projeto da avenida dos Anjos e ruas adjacentes], 1891-1892, PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/13/01108.

[Projeto de arruamentos para ligar o bairro Andrade com o bairro de Inglaterra], p. 5, PT/AMLSB/CMLSBAH/PURB/002/03848.

 

Arquivo Nacional da Torre do Tombo

4º Cartório Notarial de Lisboa, Livro de Notas nº 108.

9º Cartório Notarial de Lisboa, Livros de Notas n.os 59A, 354, 385 e 389.

11º Cartório Notarial de Lisboa – Ofício B, Livros de Notas nº 423 e nº 429.

12º Cartório Notarial de Lisboa – Ofício A, Livro de Notas nº 165.

 

ESTUDOS

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APPLETON, João Guilherme – A Avenida Almirante Reis: uma história construída do prédio de rendimento em Lisboa. Lisboa: [s.n.], 2018. Tese de doutoramento em Arquitetura, apresentada à Universidade de Lisboa.         [ Links ]

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Submissão/submission: 04/11/2019

Aceitação/approval: 06/12/2019

 

 

NOTAS

1 O presente artigo resulta do estudo, ainda em desenvolvimento, realizado no âmbito do projeto de doutoramento intitulado “Entre circular e habitar. Do projeto da Avenida dos Anjos e ruas adjacentes à abertura da Avenida Almirante Reis”, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (refª SFRH/BD/110343/2015).

2 No contexto da presente investigação foram consultados os processos de obra de todos os edifícios dos quatro bairros em estudo. No entanto, por questões relacionadas com a dimensão do texto, será apenas feita uma caracterização genérica da arquitetura de cada bairro.

3 CONCEIÇÃO, Margarida Tavares da – A polissemia da palavra bairro. Estudo Prévio [Em linha]. Nº 4 (inverno 2013). [Consult. 12/8/2019]. Disponível na Internet: www.estudoprevio.net.

4 FERREIRA, Carlos Henriques – Projectar a cidade entre bairros: Lisboa, um projecto de cidade em mudança. In MENDES, Maria Manuela [et al.], coord. – A cidade entre bairros. Lisboa: Caleidoscópio, 2012. p. 49.

5 As casas religiosas masculinas foram suprimidas a partir do final de 1833, e as femininas na sequência da morte da última freira, o que, no caso de Lisboa, ocorreu entre 1864 e 1909.

6 Ainda que nem sempre o processo de cedência dos terrenos por parte da Fazenda Nacional fosse fácil ou rápido.

7 Embora as obras feitas na cidade ao longo das décadas anteriores tivessem sido pontuais, houve algumas importantes que importa destacar: o Aterro, as praças da Patriarcal Queimada (atual Príncipe Real) e do Camões e o aformoseamento do Passeio Público.

8 FRANÇA, José-Augusto – Preâmbulo. In SILVA, Raquel Henriques, dir. – Lisboa de Frederico Ressano Garcia 1874-1909. Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa, 1989. p. 13.

9 LOURENÇO, Tiago Borges; MÉGRE, Rita; SILVA, Hélia – A Lisboa dos conventos: permanências e metamorfoses. In SEIXAS, João, coord. – Projecções de Lisboa: utopias e estratégias para uma cidade em movimento perpétuo. Lisboa: Caleidoscópio, 2018. p. 86-111.

A este propósito importa naturalmente referir que nem todas as operações urbanas de carácter público se desenvolveram em terrenos anteriormente ocupados por conventos ou posses religiosas, caso do processo de rasgamento da Avenida da Liberdade.

10 Pela dimensão, centralidade e importância no novo desenho da cidade merecem especial menção os bairros de Campo de Ourique (Silva Lopes e Companhia Lda., a partir de 1878) e Camões (Sociedade das Terras de Santa Marta, 1878/1880).

11 Esta tendência inverteu-se nas primeiras décadas do século XX, altura em que se impuseram as empresas de promoção imobiliária.

12 Simultaneamente grassaram também os bairros cujos nomes têm relação direta com territórios, caso dos bairros América (a Sapadores), da Bélgica (ao Rego), Europa (ao Campo Grande, nunca construído), Londres (à Avenida de Berna), de Residências França (antecessor do Bairro Azul, nunca construído), de Inglaterra ou das Colónias (ambos à Almirante Reis), maioritariamente surgindo ou sendo renomeados no rescaldo da I Guerra Mundial, que também se encontrava intrínsecamente ligada à escolha do nome do Bairro dos Aliados (ao Alto do Pina). Mais raramente encontram-se bairros cujos nomes têm ligação direta com os antigos proprietários dos terrenos onde são construídos, como os bairros Daupiás (ao Calvário), Barbadinhos (a Santa Apolónia) e dos Castelinhos (à Almirante Reis).

13 Neste período existem naturalmente casos de sucesso, nomeadamente o Bairro dos Barbadinhos (desenvolvido a partir de 1891 pela Companhia Central Construtora).

14 ANTUNES, Gonçalo – Políticas sociais de habitação (1820-2015): espaço e tempo no Concelho de Lisboa. Lisboa: [s.n.], 2017. p. 403. Tese de doutoramento em Geografia e Planeamento Territorial, apresentada à Universidade Nova de Lisboa.

15 ANTUNES, Gonçalo, op. cit., p. 56.

16 Idem, p. 60.

17 Caso do Casal de Sete Rios e dos bairros do Casal Vistoso e da Quinta do Calado (à Penha de França), de entre os quais apenas o último foi construído.

18 Posteriormente surge também o modelo de bairros de casas desmontáveis.

19 Esta questão é profundamente abordada por ANTUNES, Gonçalo, op. cit..

20 “É uma linha urbana de primeira categoria, sem história, que começou a rasgar-se timidamente no final do século passado. Obedeceu a um plano, e por esta circunstância oferece o esplendoroso aspecto citadino que se lhe nota. Assim fôsse sempre em Lisboa” ARAÚJO, Norberto de – Peregrinações em Lisboa. Lisboa: Vega, 1992. vol. IV, p. 73.

21 Este nome manteve-se desde o anteprojeto de 1877 até 1903, altura em que foi rebatizada Avenida Dona Amélia. Em 1910 é definitivamente renomeada Avenida Almirante Reis (em homenagem ao recém-falecido Cândido dos Reis), nomenclatura utilizada ao longo do presente texto.

22 LOURENÇO, Tiago Borges – A Mouraria da velha Rua da Palma. Quatro séculos no ciclo de vida de um arruamento (1554-1959). Cadernos do Arquivo Municipal. 2ª Série Nº 9 (janeiro-junho 2018), p. 15-41.

23 Assentam neste pressuposto os planos das avenidas da Liberdade, António Augusto de Aguiar e Columbano Bordalo Pinheiro (este último já do final da década de 1920) que, a pouca distância, duplicam o traçado do secular eixo iniciado nas Portas de Santo Antão e que segue para norte, via Santa Marta, São Sebastião da Pedreira e antiga Estrada de Benfica (atual Rua Professor Lima Basto).

24 SILVA, Raquel Henriques da – Os últimos anos da Monarquia: desenvolvimento urbanístico: os novos bairros. In MOITA, Irisalva, coord. – O livro de Lisboa. Lisboa: Livros Horizonte, 1994. p. 418.

25 Arquivo Municipal de Lisboa (AML), [Projeto da avenida dos Anjos e ruas adjacentes], PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/13/01108, f. 76-77.

26 O ante-projeto previa o início da nova avenida apenas no local da antiga Igreja dos Anjos (demolida para o efeito), devendo a ligação com a Rua Nova da Palma ser feita através do Largo do Intendente.

27 Provavelmente por colidir com o projeto do Bairro Andrade, cujas ruas já se encontravam rasgadas em 1892 e se encontrava parcialmente construído.

28 AML, [Projeto da avenida dos Anjos…], f. 78.

29 Correspondendo parcialmente à regularização da Travessa do Abarracamento da Cruz do Tabuado, numa primeira fase a Rua Pascoal de Melo foi a mais eficaz e importante via de ligação da Avenida dos Anjos com as Avenidas Novas e áreas contíguas.

30 Segundo a memória descritiva do projeto da Avenida dos Anjos e ruas adjacentes (1892), “torna[va]-se urgente substituir quanto antes a Calçada e rua dos Anjos por uma Avenida e rua de fácil tracção para dar serventia aos populosos bairros de Estefânia, Santa Bárbara e ultimamente o de Andrade [então] em construção, além das comunicações ao norte que tend[ia]m a aumentar o movimento tanto de peões como de veículos, o que se torna[va] quase impossível […], dando motivo a interrupções contínuas ao mais pequeno veículo” (AML, [Projeto da avenida dos Anjos…], f. 79).

31 Embora também houvesse aquisições de lotes de terreno por parte de construtores e mestres de obras, que construíam para depois vender os edifícios.

32 A história do desenvolvimento urbanístico destes dois bairros foi mais aprofundada em LOURENÇO, Tiago Borges – Habitar à Almirante Reis: os bairros Andrade e dos Castelinhos. In Atlas da Almirante Reis. Lisboa: Universidade Autónoma. No prelo.

33 Embora se desconheça se, por essa altura, já coagitaria a possibilidade de neles construir um bairro.

34 LISBOA. Câmara Municipal – Actas da sessão da Comissão Executivo da Câmara Municipal de Lisboa do anno de 1889. Lisboa: Imprensa Democrática, 1889. p. 261.

35 LISBOA. Câmara Municipal – Op. Cit. , p. 442.

36 Entre 2000$00 e os 5850$00, muito superior ao verificado em qualquer outro empreendimento na área.

37 LISBOA. Câmara Municipal – Actas das sessões da Câmara Municipal de Lisboa no Anno de 1890. Lisboa: Imprensa Democrática, 1890. p. 370.

38 LISBOA. Câmara Municipal – Actas das sessões da Comissão Administrativa do Município de Lisboa no Anno de 1891. Lisboa: Imprensa Democrática, 1891. p. 206-208.

39 Deve o nome ao seu antigo proprietário Lucas da Silva Azevedo Coutinho Cardoso Castelo.

40 AML, [Abertura de ruas no Bairro dos Castelinhos], 1895-1900, PT/AMLSB/CMLSBAH/PURB/002/00662.

41 LISBOA. Câmara Municipal – Actas das sessões da Câmara Municipal de Lisboa no Anno de 1896, Lisboa: Imprensa de Libanio da Silva, 1896. p. 231.

42 Antero de Quental, Capitão Renato Baptista, Rafael de Andrade e dos Castelinhos.

43 Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), 11º Cartório Notarial de Lisboa - Ofício B, Livro de Notas 423, Cx. 74.

44 Algo que já havia ocorrido em 1892, no Bairro Linhares.

45 ANTT, 11º Cartório Notarial de Lisboa – Ofício B, Livros de Notas (Lv. 429, Cx. 75).

46 Com exceção para a Rua Antero de Quental, na qual os edifícios apresentavam características mais próximas às do Bairro Andrade.

47 Adquirida a 24 de agosto de 1887 a João Dolbeth (ANTT, 12º Cartório Notarial de Lisboa – Ofício A, Livro de Notas nº 165, f. 17)

48 Ainda antes do início da venda dos lotes (edital de 5 de outubro de 1891), a Câmara Municipal de Lisboa deliberou renomear a Rua do Caracol da Penha em Rua Marques da Silva, caso único na zona de um proprietário a quem foi dado o nome a um arruamento pré-existente.

49 Contemporaneamente, em 1892, à Estefânia é iniciada a construção do Bairro Linhares (hoje conhecido como Bairro Açores), iniciativa do Conde de Linhares e Theotónio de Ornellas Bruges.

50 As ruas Pascoal de Melo e José Falcão foram também prolongadas para terrenos a poente da Avenida Almirante Reis.

51 Por uma questão de atualização e uniformização da nomenclatura, no presente texto o bairro será sempre chamado de Bairro de Inglaterra.

52 “Maria Antónia”, “Maria Andrade” (a esposa), “Maria” e “Palmira” (as duas filhas). À principal via do bairro, de ligação da Calçada do Forno de Tijolo à Rua Direita dos Anjos e à futura Avenida Almirante Reis deu o nome de “Andrade”.

53 Desenvolvidas por Manuel de Castro Guimarães e Francisco Lourenço da Silva Almeida.

54 A Inauguração da Avenida Dona Amélia. O Século. (21 de julho de 1903), p. 1.

55 AML, Plano Geral de Melhoramentos da Capital. PT/AMLSB/CMLSB/UROB-PU/10/434.

56 A Norte, os seus limites eram estrabelecidos pelo casario da rua Marques da Silva, a Sul pelo Bairro Andrade, a Poente pela Estrada da Penha de França e propriedades do Conde de Soure e a Nascente pela Avenida Almirante Reis.

57 ANTT, 9º Cartório Notarial de Lisboa, Livro de Notas nº 354, f. 21.

58 ANTT, 9º Cartório Notarial de Lisboa, Livros de Notas nº 385, f. 55v e nº 389, f. 48.

59 AML, Livro de Escrituras nº 59, f. 133-133v.

60 AML, Livro de Escrituras nº 59, f. 133v.

61 SILVA, Raquel Henriques da – Os últimos anos da Monarquia: desenvolvimento urbanístico: os novos bairros. In MOITA, Irisalva, coord. – O livro de Lisboa. Lisboa: Livros Horizonte, 1994. p. 418.

62 Arruamento secular rasgado na cerca do Convento de Nossa Senhora da Penha de França e que deu origem à Rua Marques da Silva.

63 AML, Livro de Escrituras nº 81, f. 99. Na prática, esta operação permitiu concretizar os troços superiores das atuais ruas de Liverpool e de Manchester, que terminam ambos em escadaria (Figuras 8 e 10).

64 Edital de 29 de agosto de 1916.

65 Trata-se do único edifício implantado num dos bairros da Avenida Almirante Reis que foi galardoado.

66 No contexto do processo de supressão do convento e consequente refuncionalização do seu edifício em hospital.

67 Na verdade, o chamado Bairro dos Atores não foi desenhado enquanto tal, mas tão simplesmente como um conjunto de ruas que se desenvolveram nas orlas da Avenida Almirante Reis, sem qualquer intenção identitária.

68 Onde haviam estado instalados o Coliseu da Rua da Palma e o Paraíso de Lisboa.

69 Também em consequência da regularização de traçados antigos, grande parte do edificado do Largo de Santa Bárbara foi demolido na década de 1930, no contexto de um projeto de requalificação urbanística que pressupunha a concretização do projeto tardo-oitocentista de alargamento da Rua de Santa Bárbara, de modo a providenciar um acesso mais direto entre os largos de Santa Bárbara e do Conde de Pombeiro/Bairro dos Castelinhos.

70 Tal como no Bairro de Inglaterra, existe apenas uma ligação com a Avenida Almirante Reis, através da Rua de Angola. No entanto, a forma como a maioria das artérias do bairro foram planeadas para desembocar neste novo arruamento permite uma rápida ligação a partir de qualquer ponto do bairro.

71 O seu principal promotor, João Duarte, tornou-se proprietário do maioria do terreno em que o bairro se implantou logo em 1916. Tal como no caso do Bairro Andrade, parece ter esperado por um momento mais favorável para iniciar a urbanização.

72 Ao longo da presente investigação não foi possível compreender a forma como os nomes da(s) quinta(s) eram à época utilizados. Apesar de habitualmente o grande terreno onde se implantaram os bairros de Inglaterra e das Colónias ser designado como Quinta da Charca, por vezes o termo Quinta da Mineira surge como nome alternativo ou como designação para parte do terreno (na planta do projeto de 1929, os terrenos de João Duarte são designados por Quinta da Mineira e os restante como Quinta da Charca).

73 Existe menção à existência de estudos prévios para o novo bairro, desconhecendo-se no entanto a atual existência ou localização dos mesmos. Conhece-se apenas a indicação de contemplarem escadarias, à semelhança do que por exemplo ocorreu nos vizinhos bairros de Inglaterra (Rua de Manchester) e Lamosa (Rua do Triângulo Vermelho): “apesar do acidentádo do terreno, conseguimos evitar lanços de escadarias, como apresentavam todos os estudos anteriormente feitos para este local.” AML, [Projeto de arruamentos para ligar o bairro Andrade com o bairro de Inglaterra, PT/AMLSB/CMLSBAH/PURB/002/03848], p. 5.

74 AML, [Projeto de arruamentos…], p. 2 e 4.

75 Auxiliado pelo auxiliar de agente técnico Júlio da Silva Costa e pelo desenhador de 2ª classe João António de Aguiar. Com apenas 22 anos, foi um dos primeiros trabalhos deste último, que viria a ser um dos principais arquitetos a projetar para as antigas colónias portuguesas durante o Estado Novo.

76 AML, [Projeto de arruamentos…], p. 4.

77 AML, [Projeto de arruamentos…], p. 4.

78 AML, [Projeto de arruamentos…], p. 4-5. A ideia original seria parcialmente abandonada, no que concerne à atribuição de nomes de cidade. Pelo Edital de 18 de julho de 1933, às novas ruas foram atribuídos o nomes de Angola, Cabo Verde, Guiné, Ilha do Príncipe, Macau, Moçambique, São Tomé e Zaire. A única praça do bairro foi designada de Praça das Colónias (atual Praça das Novas Nações).

79 AML, Livros de Escrituras 7A, f. 91v-99v, 10A, f. 42v-52 e 16A, f. 115-124v.

80 ANTT, 9º Cartório Notarial de Lisboa, Livro de Notas nº 59ª, f. 85-88.

81 ANTT, 4º Cartório Notarial de Lisboa, Livro de Notas nº 108, f. 42-45.

82 Apud SANTANA, Francisco – Bairro das Colónias. Inforanjos. Ano 20, nº 2 (maio-agosto 2002).

83 O que se justifica sobretudo com as diferentes características dos lotes. Em geral, os terrenos vendidos por João Duarte tinham frentes de rua mais largas, o que se refletiu em construções de maiores dimensões e tendencialmente de melhor qualidade (assinadas sobretudo por engenheiros), a norte da Rua de Angola e nos troços finais das ruas Palmira e Caminho do Forno do Tijolo. Por seu turno, as frentes das ruas de Moçambique e Timor foram divididas em lotes mais estreitos, nos quais foram construídos prédios de desenho mais simplificado e apenas três vãos, maioritariamente edificados por mestres de obra.

84 AML, [Projeto de arruamentos…], p. 4.

85 Nesse ponto do bairro, o projeto foi modificado, tendo sido construída entre ambas as ruas, no topo da Praça das Novas Nações, uma escola primária.

86 “A obra de Cassiano Branco confunde-se com a dos engenheiros, sobretudo no caso dos prédios de rendimento que, dado o sistema construtivo em betão, muitas vezes eram concebidos na íntegra por estes especialistas. Em bastantes casos de prédios de rendimento que Cassiano Branco elaborou, aparece, não a sua assinatura como técnico responsável, mas a dos engenheiros, […] [entre as quais a de] Luís Cabeça Dutra.” PINTO, Paulo Tormenta – Cassiano Branco (1897-1970). Casal de Câmbra: Caleidoscópio, 2015. p. 179. No caso do número 33 da Rua Palmira, a assinatura de Cassiano surge num desenho de alterações, sendo-lhe por isso comummente atribuída a autoria. No entanto, visto resultar de uma encomenda concertada é possível que o mesmo tenha acontecido nos dois edifícios contíguos. Mais dificil parece ser o caso do número 73 da Rua do Forno do Tijolo, que resulta de uma alteração ao plano inicial, sendo já assinado em data posterior por outro engenheiro (Paulo de Almeida Freitas).

87 APPLETON, João Guilherme – A Avenida Almirante Reis: uma história construída do prédio de rendimento em Lisboa. Lisboa: [s.n.], 2018. p. 144-145. Tese de doutoramento em Arquitetura, apresentada à Universidade de Lisboa.

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