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Comunicação e Sociedade

versão impressa ISSN 1645-2089versão On-line ISSN 2183-3575

Comunicação e Sociedade vol.30  Braga dez. 2016

https://doi.org/10.17231/comsoc.30(2016).2497 

ARTIGOS TEMÁTICOS

O cidadão enquanto fonte de informação: o caso do Jornal da Tarde, da RTP

 

The citizen as a source of information: a case study on Jornal da Tarde, RTP

 

 

Inês Mendes*; Raquel Martins**

*Departamento de Ciências da Comunicação, Instituto de Ciências da Comunicação, Universidade do Minho, Portugal, inesgmendes27@gmail.com.
**Departamento de Ciências da Comunicação, Instituto de Ciências da Comunicação, Universidade do Minho, Portugal, anaraquelmartins23@gmail.com.

 

 

RESUMO

Essenciais à produção noticiosa, as fontes de informação são complexas e providenciam um caso de análise relevante. Até porque, sem elas, o trabalho dos jornalistas seria quase impossível de desempenhar, tendo em conta que as fontes são capazes de reforçar e atribuir credibilidade à peça noticiosa. Num quadro de crescente valorização da participação do cidadão nos serviços públicos audiovisuais, e refletindo sobre a importância das fontes de informação, este trabalho procura perceber que tipo de representação e destaque é dado ao cidadão no serviço público televisivo português. Para além de procurar perceber qual a presença do cidadão no Jornal da Tarde, da RTP, pretende-se fazer uma ponte entre o papel do serviço público de televisão português e a necessidade, ou não, de recorrer a vozes não oficiais para suportar a credibilidade e até veracidade do tema em questão. Que temas recorrem, mais vezes, à voz do cidadão e que testemunhos são mais procurados pela RTP são alguns dos pontos investigados. Para isso, foi feita uma análise de conteúdo a 21 emissões do Jornal da Tarde da RTP, de forma a identificar as peças que continham a voz do cidadão e encontrar respostas para as questões apresentadas.

Palavras-chave: Cidadão; serviço público; fontes de informação; género.

 

ABSTRACT

Indispensable to news production, sources of information are complex and provide an interesting case review. Without them a journalist's work would be next to impossible to perform since those sources are able to reinforce and give credibility to the news. In a time when the citizen's participation in public service media is gaining more and more importance, this study aims to understand the kind of representation and prominence given to the citizen in the Portuguese television Public Service. In addition to understanding the presence of the citizen in Jornal da Tarde, RTP (Radio and Television of Portugal) the goal is to make a connection between the role of the Portuguese television Public Service and the need, or not, to call upon non-official voices to support the credibility and even the veracity of the topic in hand. In which topics the citizen's voice is more present and which testimonials are more sought after by RTP are some of the topics under discussion. In order to do that – identify the news in which the citizen's voice was used and to find answers to the given question – a content analysis of 21 broadcasts of Jornal da Tarde was performed.

Keywords: Citizen; public service; sources of information; gender.

 

 

Introdução

Refletindo sobre a importância do cidadão no exercício do trabalho jornalístico e reconhecendo a necessidade de analisar a sua presença nos espaços de informação televisivos, pretende-se, neste estudo, perceber que papel tem o cidadão na informação do serviço público. Cruzando as perspectivas das fontes de informação com o papel do serviço público, quer-se compreender até que ponto é o cidadão preponderante na informação jornalística e que tipo de mais-valias traz para a perceção de um determinado assunto.

As fontes de informação são um trunfo para os jornalistas, tendo em conta que não se faz jornalismo sem fontes. Elas dão, acima de tudo, informação, independentemente do tipo de testemunho que prestam. Os cidadãos são espectadores dos noticiários, mas vão-se assumindo, também, como fontes de informação, tendo em conta que, quase sempre, são eles as testemunhas oculares ou protagonistas em determinados acontecimentos. Fica clara, portanto, a importância enquanto fontes. Mas os cidadãos são, também, o centro da democracia. Eles são os principais destinatários das políticas públicas, e a sua participação é uma das tónicas dos regimes democráticos. Esta tónica torna-se ainda mais importante num momento em que é necessário voltar a aproximar as pessoas da democracia, a legitimar este regime político, tendo em conta o afastamento progressivo que se tem vindo a verificar, por exemplo, com as elevadas abstenções nas eleições dos últimos anos. Ao mesmo tempo, as obrigações de pluralidade e cidadania do serviço público vêm levantar questões sobre a necessidade, ou não, de recorrer aos cidadãos. Enquanto canal de serviço público, tem a RTP o dever de dar ‘alta voz' aos cidadãos?

Assim sendo, reconhecendo a importância do cidadão no contexto noticioso, pretende perceber-se como estão presentes e, ao mesmo tempo, o que fazem os cidadãos na informação televisiva. Portanto, a questão de partida que se coloca e que este estudo tem por objetivo esclarecer é: “Qual a dimensão da presença do cidadão no Jornal da Tarde da RTP e qual o papel que lhe é atribuído?”

Posto isto, fez-se uma análise ao Jornal da Tarde, da RTP, durante três semanas distintas, prestando atenção ao cidadão e, sobretudo, à forma como ele aparece enquanto fonte de informação. Quem é, qual o seu papel e o que diz são pontos sobre os quais se vai refletir.

Fontes de informação

São um tópico muito estudado na área do Jornalismo, e indispensável ao desempenho da profissão, ajudando a credibilizar o trabalho que o jornalista desenvolve. Mas, afinal, quem são as fontes de informação?

As fontes são pessoas, são grupos, são instituições sociais ou são vestígios – falas, documentos, dados – por aqueles preparados, construídos, deixados. As fontes remetem para posições e relações sociais, para interesses e pontos de vista, para quadros espácio-temporalmente situados. Em suma, as fontes a que os jornalistas recorrem ou que procuram os jornalistas são entidades interessadas, quer dizer, estão implicadas e desenvolvem a sua actividade a partir de estratégias e com tácticas bem determinadas. (Pinto, 2000, p. 278)

Cruciais na prática jornalística, as fontes de informação são os trunfos do jornalista no momento de divulgar informação. São, afinal, “uma instância incontornável do processo informativo que impõe quotidianamente aos jornalistas renovados obstáculos” (Lopes, 2000, p. 340). A relação entre os jornalistas e as fontes é, sobretudo, uma relação negociada entre ambas as partes. Berkowitz afirma que os jornalistas e as fontes “esperam atingir os seus objetivos e manter o seu status organizacional e social” (Berkowitz, 2009, p. 103).

Para os jornalistas, as fontes de informação representam, antes de mais, o cerne da informação. Querem informação inédita, confirmações ou desmentidos, esclarecimentos, ideias, debates, recomendações e, acima de tudo, credibilidade e legitimidade (Pinto, 2000).

Face a este interesse nas fontes de informação e reconhecida a sua extrema importância no exercício da atividade jornalística, os profissionais têm, inclusive, salvaguardado o direito de recorrer a elas. No estatuto do jornalista, artigo 6º, alínea b), é assegurada a liberdade ao jornalista de acesso às fontes de informação.

Os órgãos da Administração Pública e as empresas que, de alguma forma, prossigam interesse público salvaguardam este direito de acesso às fontes de informação aos jornalistas. Se for recusada por estes o acesso às fontes, “podem ser utilizados os meios administrativos ou contenciosos” contra eles (ponto 4 do artigo 8º do Estatuto do Jornalista).

Ainda assim, ao mesmo tempo que são reconhecidos direitos aos jornalistas, são-lhes impostas algumas obrigações:

Tratar todos os intervenientes dos acontecimentos de igual forma, não procurar informações com o objectivo de devassar gratuitamente a vida privada em nome de um sensacionalismo cada vez mais em voga, identificar sempre quem nos fornece informação, respeitar o princípio do contraditório. (Lopes, 2000, p. 340)

Além disso, embora o jornalista possa optar por não identificar as suas fontes, tendo em conta o direito ao segredo profissional, está previsto na lei que um juiz possa obrigar a essa revelação se se concluir a “ilegitimidade da escusa” (ponto 2 do artigo 135.º do Código de Processo Penal).

Existem várias categorizações das fontes. Aldo Schmitz fala em fontes oficiais, empresarial, institucional, individual, testemunhal, especializada e de referência. No entanto, aquela que aqui vamos querer explorar é a que considera o comum cidadão enquanto fonte noticiosa. Segundo este autor, “a fonte individual representa a si mesma. Pode ser uma pessoa comum, uma personalidade política, cultural, artística ou um profissional liberal, desde que não fale por uma organização ou grupo social” (Schmitz, 2011, p. 10). Chaparro (citado em Schmitz, 2011) vê estas fontes como informais, uma vez que atribuem mais humanidade à peça noticiosa.

“A fonte individual aparece notadamente como vítima, cidadão reivindicador ou testemunha” (Charaudeu citado em Schmitz, 2011, p. 10). Este tipo de fontes acaba por também ser utilizado com o objetivo de “contextualizar uma informação na vida quotidiana” (Schmitz, 2011, p. 11).

O cidadão no serviço público de televisão

A presença do público é fundamental para que o serviço público de televisão respeite os seus próprios princípios. Manuel Pinto argumenta que “constitui um contra-senso a existência de um serviço público sem a participação ativa do público” (Pinto, 2005, p. 49).

Assente nos princípios do serviço público, a RTP está sujeita a uma série de cláusulas que regulam o seu exercício e garantem o seu bom funcionamento. Estas cláusulas comprometem a estação com o público, tendo em conta as obrigações e deveres que são conferidas à RTP, e privilegiam a cultura portuguesa.

E é no contrato de concessão do serviço público de rádio e televisão, que define aspetos relacionados com os princípios, finalidades, obrigações e objetivos do serviço público, que encontramos essas cláusulas. Lançando um olhar mais atento aos pontos que incidem sobre o cidadão e o abordam enquanto fonte de informação, pode perceber-se que há, aparentemente, uma preocupação em integrar o público na informação noticiosa. Acima de tudo, porque há, desde logo, a necessidade de “assegurar a expressão e confronto das diversas correntes de opinião”:

O serviço público deve constituir uma referência para a população e assentar numa oferta que garanta o acesso universal, constituindo-se como fator de coesão e integração de todos os indivíduos, grupos e comunidades sociais, devendo garantir a imparcialidade e independência da informação e comentário, disseminar conteúdos audiovisuais inovadores e diversificados, de acordo com padrões éticos e qualitativos elevados, e assumir-se como um fórum de discussão plural e meio de promover a participação democrática alargada dos cidadãos, bem como de contribuir para a criação e produção audiovisual, assegurando a divulgação da diversidade da herança cultural e europeia. (Alínea BB do Contrato de Concessão, s/p)

A participação do cidadão deve, segundo Manuel Pinto, ser intrínseca ao serviço público, “pelo que este serviço só se justifica inteiramente quando e na medida em que conte com eles [cidadãos] em todas as etapas e dimensões” (Pinto, 2005, p. 53).

A cobertura de eventos culturais e de manifestações com interesse nacional é, também, requisito obrigatório e demonstra a preocupação em abranger todos os interesses dos portugueses e em, ainda que de forma indireta, incluí-los nas peças informativas. “Promover o acesso do público às manifestações culturais portuguesas e garantir a sua cobertura informativa adequada” e “proporcionar uma informação isenta, rigorosa, contextualizada, plural e aberta ao contraditório, que garanta a cobertura noticiosa dos principais acontecimentos nacionais e internacionais”, são, portanto, algumas das obrigações do serviço público português (alíneas b e c, do ponto 2, da Clausula 6ª do Contrato de Concessão).

Na realidade, a utilização dos testemunhos dos cidadãos e a participação do público nos programas televisivos são trunfos utilizados pelos meios de comunicação para garantir audiências (Moreno citado em Lopes, Ribeiro & Neto, 2014, p.121), o que acaba por evidenciar a importância que o comum cidadão tem na informação noticiosa e no seu tratamento.

Efetivamente, a presença dos cidadãos na cobertura noticiosa televisiva tem aumentado. Desde 2003 que “não é anormal ver cinco, seis, ou mais membros do público numa peça” (Pantti & Husslage, 2009, p. 88).

Esta presença do cidadão na informação noticiosa poderá ser interpretada como um desenvolvimento democratizante, indicando que o jornalismo quer, agora, mostrar a opinião do cidadão e promover o seu envolvimento na sociedade (McNair & Gans citados em Pantti & Husslage, 2009, p. 78). Uma ideia reforçada por Correia que, parafraseando Pauly, salienta:

A primeira tarefa do jornalismo, pela qual pode sobreviver como uma instituição viável na arena pública, é tomar a responsabilidade de estimular o diálogo público em assuntos que sejam objecto de uma preocupação comum no que diz respeito a um público democrático. (Correia, 2012, p. 61)

E a importância destes cidadãos na informação noticiosa parece ter vindo a ser percebida. Estes que são chamados a falar moldam a forma como as questões abordadas são percebidas e mostram, ao mesmo tempo, que tipo de opiniões existe na sociedade (Ross citado em Pantti & Husslage, 2009). João Carlos Correia adianta, ainda, que “os cidadãos são chamados a constituírem-se como tal quando os problemas são reconhecidos no nível da vida quotidiana” (Correia, 2012, p. 56). Os cidadãos ocupam, assim, uma posição central no que se refere a fontes de informação importantes para jornalistas (De Keyser, Raymaeckers & Paulussen, 2011)[1].

No entanto, os cidadãos, no seu acesso ao espaço noticioso, podem enquadrar-se naquilo a que Traquina (2002, p. 113) chama de “acesso disruptivo”, ou seja, daqueles que fazem parte das notícias quando acontece algo fora do comum e que os envolve. “Os pouco poderosos perturbam o mundo social para alterar as formas habituais de produção de acontecimentos (…) Essas actividades constituem, de certa forma, acontecimentos ‘anti-rotina'” (Molotch & Lester citados em Traquina, 2002, p. 113). Assim, a presença do comum cidadão no processo noticioso é apresentada como algo irregular e não rotineiro.

Enquanto as fontes institucionais são utilizadas para dar informações especializadas sobre um determinado assunto, as palavras do cidadão dão conta das suas experiências, percepções e reações (Carpentier, Leurdijk & Zelizer citados em Pantti & Husslage, 2009, p. 79). E é aqui que se nota a riqueza dos seus testemunhos e a sua preponderância para atribuir credibilidade e legitimidade a uma notícia: percebe-se a alegria, a insatisfação, a revolta ou outra qualquer emoção acerca de um certo acontecimento. É precisamente por causa disto que assumimos a importância de perceber que papéis têm os cidadãos no noticiário nacional.

Na mesma linha de pensamento, afigurou-se pertinente analisar a representação de homens e mulheres, mais concretamente o tipo de visibilidade atribuído a ambos os géneros quando a fonte de informação considerada é o “cidadão comum”. Estudos como o de Lopes (2006) mostram que existe preferência pelo género masculino no que toca a fontes de informação, pelo que se evidenciou como relevante esta análise dentro da presença do “cidadão comum” como fonte de informação, no canal de serviço público português.

Fazendo referência ao jornalismo, Herbert Gans (2011) diz que, apesar dos padrões de imparcialidade das notícias terem melhorado, tem-se registado uma maior sensibilidade para com os preconceitos de género, religiosos, em relação à raça e, também, à classe. A desigualdade de género é, portanto, uma questão ainda premente no meio noticioso.

O homem tende a ter mais visibilidade na informação televisiva em relação à mulher. “Na última década do século XX os principais programas de informação semanal dos canais generalistas portugueses deram sinais claros de uma forte e bem implantada reprodução social do poder masculino” (Lopes, 2006, p. 2). Na informação, os homens são preferidos enquanto fontes. Daniel Berkowitz refere um estudo de Armstrong em que este autor concluiu que “fontes masculinas recebiam mais alusões e eram colocadas de forma mais proeminente” na cobertura noticiosa (Berkowitz, 2009, p. 110). Eles discutem ideias, ao contrário das mulheres que são preferidas quando se fala de emoções, o que acaba por mostrar uma sociedade representada pelo sexo masculino (Lopes, 2006).

De forma geral, de acordo com aquilo que se aqui se foi dizendo, até há bem pouco tempo os homens representavam uma fatia muito maior das fontes de informação cidadãs. Até porque “em televisão os homens falam de questões públicas e as mulheres de assuntos privados” (Lopes, 2006, p. 8).

Metodologia

Procedeu-se, neste estudo, a uma análise de conteúdo ao noticiário Jornal da Tarde, da RTP, com o intuito de observar a presença de os cidadãos enquanto fontes de informação. Neste caso, as edições do Jornal da Tarde são documentos audiovisuais. Desta forma, a análise de conteúdo foi o método escolhido pela natureza do objeto de estudo e porque, segundo Quivy e Campenhoudt, “os dados recolhidos nos documentos” (Quivy & Campenhoudt, 2008, p. 204) servem para diversas formas de análise, incluindo a análise de conteúdo.

As semanas selecionadas para analisar as emissões do Jornal da Tarde foram as últimas dos meses de abril, maio e junho. Assim sendo, as emissões do Jornal da Tarde a analisar estão compreendidas entre os seguintes dias: 27 de abril e 3 de maio; 25 e 31 de maio; 29 de junho e 5 de julho de 2015. Esta análise foi feita através do site da RTP (RTP Play), tendo em conta que são lá disponibilizados todos os episódios dos vários programas da estação.

A duração total, o número de peças e os principais destaques foram os aspetos salientados em cada edição do Jornal da Tarde.

As peças de noticiário televisivo analisadas neste estudo são aquelas em que o ‘cidadão comum' surge enquanto fonte de informação. Convém, no entanto, salientar que houve preocupação em analisar apenas temas de âmbito nacional, deixando de fora as peças sobre temas internacionais. Ainda assim, temas nacionais tratados em território estrangeiro foram considerados nesta análise.

De forma a melhor proceder à análise proposta, foram elaboradas duas tabelas. A primeira tabela tem como propósito estudar aspetos gerais das peças. Nesta, destacou-se a duração da peça, o assunto tratado, a localidade do acontecimento e a sua importância no noticiário – classificando entre primeiro destaque, segundo destaque, peças que surgem ainda na primeira meia hora, peças da segunda meia hora, e as que surgem na segunda parte, ou seja, após o intervalo do Jornal da Tarde.

A segunda tabela estuda, mais em concreto, a presença das fontes. Refere-se, aqui, o número de testemunhos total de cidadãos na peça – diferenciando, depois, entre homens e mulheres –, o papel que as fontes desempenham e, ainda, de que é que elas falam.

Para este último tópico de análise, procurou descrever-se, de forma sintetizada, os testemunhos prestados pelos cidadãos nas várias peças noticiosas. Assim sendo, enquadrámos as várias declarações em pontos-chave, que permitirão perceber, de forma geral, do que falam os cidadãos portugueses quando são interpelados pelos jornalistas.

Ao percebermos os papéis desempenhados pelos cidadãos no noticiário, houve necessidade de ter em atenção que, numa mesma peça, ao existir mais do que um testemunho, há a possibilidade de haver mais do que um papel assumido por essas fontes. Decidimos utilizar este método porque se entendeu ser mais útil para aquilo que se quer perceber: em que casos é que o cidadão é chamado a falar. Num caso de vox-pop, por exemplo, o número de “transeuntes” seria normalmente grande, mas isso não significa que os “transeuntes” (enquanto categoria atribuída por nós) sejam mais solicitados (num maior número de peças) a falar do que outro cidadão (até porque, normalmente, falam menos tempo).

Para esta análise, procedeu-se a várias considerações sobre quem são, neste sentido, os “cidadãos”:

• são aqueles que se relacionam com o espaço geográfico português;

• são aqueles que se relacionam de forma individual com o espaço, isto é, aqueles que falam em nome próprio e não em representação de uma empresa, entidade ou coletividade.

Descrição dos resultados

De forma a perceber que tipo de destaque é dado às notícias que integram o cidadão, distinguiu-se entre os temas que aparecem em primeiro destaque, em segundo destaque, fazendo, também, referência, aqueles que aparecem ainda na primeira meia hora do noticiário. As peças que aparecem na segunda meia hora e, depois, na segunda parte, ou seja, após o intervalo, são outras categorias utilizadas para classificar a importância atribuída a um determinado assunto.

 

Total

Número de peças analisadas

657

Número de peças com cidadão

91

Número de cidadãos chamados a falar

279 (126 homens; 153 mulheres)

Número de peças com cidadão em primeiro destaque

9

Número de peças com cidadão em segundo destaque

1

Número de peças com cidadão ainda na primeira meia hora

31

Número de peças com cidadão na segunda meia hora

20

Número de peças com cidadão na segunda parte

30

 

Tabela 1: Resultados globais da análise às 21 emissões do Jornal da Tarde, da RTP

 

- Primeira semana (de 27 abril a 3 maio)

Depois do visionamento do conteúdo em análise, verificou-se que, das 212 peças que constituíram as sete edições do Jornal da Tarde, 32 integravam o cidadão enquanto fonte informativa. O tempo que cada peça ocupa nos noticiários variou entre 1:22min, o mínimo, e 4:42min, o máximo, sendo a duração média 2:15min. Quanto aos noticiários, o mínimo de tempo ocupado foi de 52:37min e o máximo de 68:33min. Um dos temas mais destacados durante toda a semana foi a greve dos pilotos da TAP.

Estas 32 peças apresentam posições diferenciadas quanto à sua importância no Jornal da Tarde. Verificou-se que oito das peças pertencem a temas de primeiro destaque e apenas uma pertence ao segundo destaque. Aparecem, ainda na primeira meia hora (mas não sendo temas de destaque), 13 peças que integram o cidadão enquanto fonte. Na segunda meia hora do noticiário existem quatro peças com testemunhos de cidadãos. Por fim, na segunda parte do noticiário são seis as notícias que se encaixam na análise realizada.

As fontes individuais – o “cidadão comum” – aparecem como fontes de informação, de forma genérica, em temas como greves, manifestações, iniciativas culturais, crimes, desporto, acidentes, saúde, peregrinações e economia. É, no entanto, em manifestações e greves que mais se nota a participação do cidadão. Há 11 peças sobre greves e cinco de manifestações. As localizações dos acontecimentos cujas notícias incorporam o testemunho do cidadão focam-se, sobretudo, em Lisboa e na região norte do país, especialmente nos distritos do Porto e de Braga.

No global das 32 peças, 95 cidadãos foram chamados a falar, servindo, portanto, como fonte jornalística. Destes testemunhos, notou-se que 40 pertenciam ao sexo masculino e 55 ao sexo feminino. Dos 95 cidadãos totais, integrantes dos noticiários analisados, três eram crianças.

Na análise realizada, foi possível identificar que tipos de papéis assumem estas fontes individuais nas peças do Jornal da Tarde. Aqui, os mais representados são aqueles que se assumem clientes de um produto ou serviço, tendo em conta que aparecem em 11 peças, das 32 consideradas (clientes da TAP, normalmente). Em seis peças são retratados manifestantes de diversas causas. Vemos, assim, que, em mais de metade das peças nas quais são incluídos “cidadãos comuns”, estes surgem enquanto clientes ou manifestantes. Dentro dos papéis identificados, participantes numa determinada atividade, beneficiários de uma qualquer ação e familiares são dos que apresentam menos expressividade, cada um surgindo em apenas uma peça.

Chamados a falar, os cidadãos falam normalmente sobre as suas experiências, impressões e situações por eles vivenciadas. Além disso, a presença do cidadão nas notícias analisadas é desejada para que ele dê a conhecer o que pensa sobre determinado assunto, do qual tem conhecimento de causa, e expressar a sua vontade sobre questões que o envolvem e afetam. Tendo em conta que grande parte das peças analisadas são sobre greves e manifestações, muitos dos testemunhos dão conta da revolta e insatisfação sobre um determinado acontecimento ou assunto.

- Segunda semana (de 25 a 31 de maio)

Na segunda semana analisada, a última do mês de maio, foram identificadas 29 peças noticiosas que incorporavam a presença do cidadão, entre o total de 223 que constituíram as sete edições do Jornal da Tarde. A duração das peças variou entre 1:06min e 3:05min, fazendo uma média de 2:10min. Relativamente ao tempo dos noticiários, a duração mínima foi de 51:57min e o máximo foi de 62:30min. Apesar da grande diversidade de temas em destaque ao longo da semana, aquele que se repetiu envolveu o caso de corrupção na FIFA e as eleições neste mesmo organismo.

As 29 peças que incluem o cidadão enquanto fonte de informação apresentam um posicionamento diferente no que diz respeito à sua importância. Apenas uma peça pertence à categoria primeiro destaque, não havendo nenhuma de segundo destaque. Verificou-se que 10 peças se enquadram ainda na primeira meia hora do noticiário, e cinco na segunda meia hora. Por fim, na segunda parte do Jornal da Tarde são 13 as peças em o cidadão surge como fonte de informação.

De modo geral, os cidadãos surgem em temas como emprego, saúde, desporto, protestos/greves, acidentes, eventos, educação, crime, voluntariado, cultura e sociedade. Mas é a categoria eventos que mais se destaca, com um total de sete peças. Desporto e saúde integram – cada uma – quatro peças noticiosas com fontes individuais.

Porto, Lisboa e Braga são as localizações em que decorrem a maioria dos acontecimentos nos quais os cidadãos aparecem enquanto fontes de informação. Destaca-se ainda que seis das peças noticiosas não mencionavam qualquer localização e apenas uma decorre no estrangeiro, neste caso concreto em Paris.

Foram 88 os cidadãos que marcaram presença nas 29 peças consideradas nesta análise. Deste somatório, 40 testemunhos eram do sexo masculino – dos quais duas crianças – e 48 do sexo feminino – com uma criança.

Durante esta segunda semana de análise, constatou-se que o papel mais assumido pelas fontes individuais no Jornal da Tarde foi o de público e de comerciantes/empresários, aparecendo cada uma das categorias em quatro peças noticiosas. Cada uma das categorias família/amigos, utentes e adeptos aparecem em três peças. Isto dá um total de 17 peças das 29 identificadas.

Durante esta segunda semana de análise, os cidadãos, enquanto fontes de informação, falaram sobre problemas que os afetam, ou a pessoas próximas; o impacto de uma nova oportunidade nas suas vidas – por exemplo, um novo emprego – e de emoções relacionadas com eventos desportivos. Além destes tópicos, são latentes a indignação e o descontentamento, bem como preocupações diversas. Os cidadãos são, ainda, chamados a pronunciarem-se sobre as suas experiências, dão conta das suas opiniões e das suas motivações para experimentar atividades diferenciadas.

- Terceira semana (de 29 junho a 5 julho)

Na terceira semana em análise, que compreendeu os últimos dias de junho e o início do mês de julho, foram transmitidas no Jornal da Tarde 30 peças que incluíam a presença de cidadãos, entre as 222 que compuseram as sete edições deste noticiário. O tempo das peças consideradas variou entre 1:14min e 5:01min, sendo a média de 2:14. Quanto aos noticiários mais em concreto, a duração mínima foi de 52:63min e a máxima de 63:59min. A variedade de temas abordados em peças que incluem fontes individuais foi grande, sendo que um dos poucos temas que se repetiu tinha que ver com festas de verão. O grande destaque da semana foi o impasse/crise na Grécia, que não recorreu ao testemunho do “cidadão comum” português.

Em termos de posicionamento das peças consideradas, verificou-se, nesta terceira semana de análise, que nenhuma se enquadrava nos destaques, ou seja, não houve peças de primeiro e segundo destaques. Ainda na primeira meia-hora surgem oito peças. Já na segunda meia-hora enquadram-se 11 peças, o mesmo número de peças que surge na segunda parte dos noticiários.

Os temas em que os cidadãos surgem nesta semana, de forma mais genérica, são desporto, eventos, emprego, saúde, cultura, protestos/greves, crimes, sociedade, meteorologia e incêndios. No entanto, e apesar da abrangência das categorias, é sociedade, com nove peças, e eventos, com seis peças, que mais se destacam quanto à participação do cidadão enquanto fonte de informação. Tanto desporto como protestos/greves apresentam três peças cada.

Quanto a localizações, mais uma vez são os distritos de Porto e Lisboa que se destacam, o primeiro com oito peças, e o segundo com cinco. De referir, ainda, que cinco peças não apresentam localização concreta e uma decorre no estrangeiro, em Praga.

Dos 96 cidadãos que protagonizam as peças em análise, 46 são homens – dos quais dois meninos –, e 50 são mulheres – integrando duas meninas. Ainda de referir que no total de homens existem duas fontes anónimas – um menino e um homem, e no total de mulheres são também duas as fontes anónimas que intervêm – uma menina e uma mulher.

Quanto aos papéis desempenhados pelos cidadãos nas peças consideradas, público/participantes e trabalhador/ex-trabalhador são das que mais se destacam, com oito e seis peças, respetivamente. Também com relevância apresentam-se as categorias de vítimas e amigos/familiares, com quatro cada uma. Já os comerciantes/empresários, durante esta semana, estão presentes em apenas três peças, assim como os transeuntes. E de que falam, nesta semana, os cidadãos quando são chamados a intervir? Constatou-se que se referem às suas emoções e experiências de vida, em relação ao tema abordado, e também às suas opiniões. Além disso, tal como nas semanas anteriores, é latente o descontentamento das fontes e a preocupação com problemas que os afetam.

Discussão dos resultados

De acordo com os resultados acima apresentados e descritos verificou-se que apenas cerca de 14% do total de peças que constituíram as vinte e uma edições do noticiário em análise contavam com a presença do cidadão enquanto fonte de informação. Ou seja, apenas uma minoria das notícias transmitidas durante todos os noticiários televisivos recorre ao ‘cidadão comum' para ilustrar e/ou enriquecer o seu conteúdo. Isto pode ser justificado pelo facto de o contributo do cidadão não ser pertinente pelo género de abordagem utilizado em muitas notícias, que procuram perspetivas mais institucionalizadas. Aliás, durante todos os telejornais, várias foram as vezes em que se recorreu a figuras oficias ou a personalidades com algum tipo de cargo numa qualquer associação. Estes são dados que vão ao encontro do que já foi referido por vários estudos científicos sobre as relações entre os jornalistas e as fontes, e que referem uma predominância das fontes oficiais e institucionais (Berkowitz, 2009; Gans 2008).

O tempo ocupado pelas notícias analisadas enquadra-se naquilo que é usual observar-se nas notícias televisivas: rondam os 2:18min. Não há, portanto, uma diferença entre as peças com ou sem cidadãos. Ainda assim, há um aspeto que merece destaque. Quarenta e uma peças, cerca de 45% das 91 que recorrem ao cidadão, estão incluídas na primeira meia hora do Jornal da Tarde (incluindo, já, primeiro e segundo destaque). Tendo em conta que o noticiário tem, normalmente, pouco mais de uma hora, estes valores mostram que menos de metade das peças que integram o cidadão é inserida na primeira meia hora. Na segunda metade do noticiário, cabe, portanto, cerca de 55% das peças com cidadãos enquanto fonte de informação.

No entanto, é importante frisar que, durante a primeira semana em que foi feita a análise (27 de abril a 3 de maio), houve greve dos pilotos da TAP que fez com que houvesse muito diretos dos aeroportos portugueses. Houve, nestes casos, uma procura pelos cidadãos para que fossem mostrados os transtornos causados ou as opiniões sobre este caso. Sendo este um tema de destaque durante quase toda a semana, notou-se uma presença assídua dos cidadãos. Se retirar esta semana da análise, percebe-se que apenas 19% das peças com cidadão (11 de 59 peças) se enquadram na primeira meia hora do Jornal da Tarde.

Outro aspeto relevante desta investigação é perceber em que tipo de situações é dada voz ao cidadão, quando é que ele tem “tempo de antena” no noticiário de serviço público. Assim sendo, verificou-se que o “cidadão comum” fala, especialmente, quando é rosto ou protagonista da situação que dá origem à notícia, como é caso das manifestações, ou quando a sua vida é afetada de forma preponderante pelo acontecimento em causa, como, por exemplo, no caso dos clientes da TAP que se viram condicionados pela greve dos pilotos. Isto, possivelmente, porque são situações com as quais outros cidadãos se podem identificar e podem, de alguma forma, elucidar sobre uma situação que afeta, em grande ou pequena escala, a situação do país.

Além disso, na maioria das peças identificadas, os testemunhos dos cidadãos são por demais relevantes para se compreender a situação em causa, o que se está a passar, ou o que já passou. Mais uma vez se nota que os testemunhos dos cidadãos servem para, antes de mais, contar uma experiência que pode ter afetado muita da audiência do noticiário. Aliás, o facto de haver várias peças sobre manifestações e greves com testemunhos dos cidadãos, sobretudo na primeira semana de análise, vem demonstrar esta realidade.

Em casos como festas populares ou assuntos “leves”, o cidadão é interpelado para dar a sua opinião, muitas vezes em género vox-pop, não sendo dado muito tempo de antena a este tipo de testemunhos. Uma situação que, normalmente, faz aumentar o número de intervenientes numa mesma peça. Público ou participante é, portanto, outro grande papel atribuído ao cidadão-fonte. Foi a categoria que mais se destacou nas duas últimas semanas de análise – já sem a cobertura da tão mediática greve dos pilotos da TAP.

Olhando para as localizações onde mais se nota a presença do cidadão, destaca-se um aspeto: Lisboa, Porto e Braga (embora este último em muito menor escala) são os distritos em que mais se recorre à voz das pessoas e onde há mais peças com cidadãos a falar. São regiões litorais e bem povoadas, e também geograficamente mais próximas das redações da RTP, que se localizam em Lisboa e no Porto. Aqui se nota, mais uma vez, a preferência que os meios de comunicação têm pelas regiões mais centralizadas, deixando de lado regiões mais despovoadas. Na realidade, não sabemos se existem, nestas zonas, peças que não recorram ao cidadão (tendo em conta que os nossos dados não nos permitem essa análise). Mas podemos apontar que não se recorre frequentemente ao cidadão de lá. Em casos em que é necessária opinião do cidadão (em género de vox-pop), normalmente não a é procurada nestas regiões.

Outro aspeto curioso tem que ver com o número de homens e mulheres que testemunham no noticiário da RTP. As mulheres estão em maior número, o que parece evidenciar uma reviravolta no que, até há pouco, se registava nas investigações científicas. Parece caminhar-se para a igualdade, não havendo uma grande discrepância entre o número de testemunhos femininos e masculinos. Até porque, aparentemente, não há nenhuma razão que possa justificar esta situação: não há peças que necessitem única e exclusivamente de testemunhos femininos. Mas ainda assim, é curioso notar que, efetivamente, quando se procuram emoções, as mulheres são mais procuradas.

Nas peças que incluíam os cidadãos como fontes de informação, percebe-se que, normalmente, as opiniões são partilhadas por quase todos. A insatisfação é, frequentemente, o sentimento de ordem, muito por causa do tipo de peças em que os cidadãos são chamados. Por isso, e sobretudo nas greves e manifestações, nota-se uma opinião generalizada, normalmente de revolta, que pretende dar conta dos prejuízos causados ou do que se reivindica. Em casos como festas populares ou eventos, o cidadão assume sobretudo o papel de público ou participante, cabendo-lhe um testemunho mais opinativo. Afinal, tendo em conta que não são protagonistas da história, podemos dizer que estes cidadãos se assumem como ‘especialistas' de temas leves e mais descontraídos. Nestes casos em particular, a opinião tende a ser positiva.

Conclusão

Com uma análise que incidiu em três semanas diferentes, percebemos que a presença do cidadão e o papel assumido são inconstantes e que dependem claramente do tipo de acontecimentos reportados. Se olharmos para a primeira semana de análise, notamos que o cidadão foi muito mais preponderante e ocupou uma posição de destaque. O mesmo não aconteceu nas outras duas semanas analisadas.

Manifestantes ou clientes de um serviço (sobretudo no caso da TAP) são papéis em que se veem reencarnadas as fontes individuais que são utilizadas no Jornal da Tarde da RTP. São fontes que dão, quase sempre, conta da sua experiência pessoal sobre um determinado assunto e que mostram emoções, quase sempre de insatisfação, sobre esse mesmo tema. Isto significa que, normalmente, quando há greves e manifestações, o cidadão é chamado a falar.

Por outro lado, em festas ou eventos, o cidadão, enquanto público e participante, é também frequentemente fonte de informação, dando a sua perspetiva, normalmente de contentamento e satisfação, sobre o assunto. No entanto, e excetuando este tipo de casos, o cidadão é normalmente chamado a falar sobre temas mais negativos (crimes, manifestações, incêndios, acidente, …).

As mulheres parecem ser o género mais requisitado, contrariando aquilo que parecia ser padrão até há poucos anos. No entanto, a verdade é que as mulheres sempre se revelaram fontes prioritárias quando se pretende falar de emoções. Nesse sentido, fica corroborada a ideia de que os testemunhos femininos são mais requisitados no momento de se mostrar alegrias, tristezas ou revoltas.

As grandes cidades continuam a estar no centro do trabalho jornalístico, ficando, por isso, restringida a possibilidade de participar nos média àqueles que não frequentem aquelas regiões.

Portanto, e retomando a questão que serviu de base ao nosso estudo (Qual a dimensão da presença do cidadão no Jornal da Tarde da RTP e qual o papel que lhe é atribuído?), podemos concluir que o cidadão ainda não tem uma presença muito vincada enquanto fonte de informação, tendo em conta que apenas apareceu pelo menos uma vez em 14% das peças do Jornal da Tarde nas edições analisadas. Para além disso, quando aparece, é sempre por se ver envolvido numa determinada situação, voluntária ou involuntariamente. A sua opinião sobre outro tipo de temas, que são igualmente estruturantes do debate no espaço público (como matérias de natureza política, questões relacionadas com Educação, Saúde ou Justiça), não tende a ser procurada.

Assim sendo, pode-se concluir que o cidadão assume um papel de “ilustrador” da notícia, não sendo normalmente protagonista da situação a que dá voz, apesar de estar, ainda assim, envolvido nela. Não é o elemento chave ou central da peça, nem é por ele que as peças são iniciadas. As situações em que estão envolvidos acabam por determinar a preponderância que assumem na peça e são, verdadeiramente, as razões pelas quais os jornalistas “saem à rua”. Assim, e tendo em conta que o fator da participação é essencial na definição do que deve ser serviço público e na sua missão para com a sociedade, o cidadão no espaço informativo televisivo continua a ser uma peça secundária, a quem é reconhecida pouca centralidade no processo de produção noticiosa.

 

Referências bibliográficas

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Outras referências

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Nota biográfica

Inês Mendes tem um Mestrado em Ciências da Comunicação, ramo de Informação e Jornalismo, pela Universidade do Minho, e é licenciada em Ciências da Comunicação pela mesma instituição académica. Colaborou como redatora, durante o percurso académico, com o jornal de alunos ComUM.

E-mail: inesgmendes27@gmail.com

Departamento de Ciência da Comunicação - ICS

Universidade do Minho

Campus de Gualtar

4710-057 Braga, Portugal

Raquel Martins tem um Mestrado em Ciências da Comunicação, ramo de Informação e Jornalismo, pela Universidade do Minho, e é licenciada em Ciências da Comunicação pela mesma instituição académica. Colaborou, durante o percurso académico, com o jornal de alunos ComUM, tendo sido sua diretora.

E-mail: anaraquelmartins23@gmail.com

Departamento de Ciência da Comunicação - ICS

Universidade do Minho

Campus de Gualtar

4710-057 Braga, Portugal

 

* Submetido: 13-03-2016

* Aceite: 14-04-2016

 

 

Notas

[1] Os autores questionaram jornalistas belgas para a sua pesquisa. De Keyser, Raymaeckers e Paulussen (2011) verificaram que 45,1% dos jornalistas afirmaram que os cidadãos eram fontes de informação importantes ou muito importantes.

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