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Comunicação e Sociedade

versión impresa ISSN 1645-2089versión On-line ISSN 2183-3575

Comunicação e Sociedade vol.44  Braga dic. 2023  Epub 31-Dic-2023

https://doi.org/10.17231/comsoc.44(2023).5231 

Leituras

Comunicação, Solidariedade e Cooperação na Era Digital

Víctor M. Marí Sáez1 
http://orcid.org/0000-0003-4939-3776

1 Departamento de Marketing y Comunicación, Universidad de Cádiz, Cádis, Espanha


O trabalho colaborativo apresentado neste livro compreende várias ideias fundamentais impulsionadas pela equipa de pesquisa do projeto Digicom20301, que incluiu contribuições de uma ampla gama de especialistas de contextos espanhóis e latino-americanos. Entre as ideias principais, há uma que abrange o que poderia ser definido como uma perspetiva sociocêntrica dos processos tecnopolíticos (Marí Sáez, 2004; McQuail, 1983/1991), em que o foco da intervenção social está nos processos sociais emancipatórios, dentro dos quais os usos e apropriações de tecnologias digitais estão inseridos. Esta perspetiva sociocêntrica distancia-se da perspetiva tecnocêntrica, que sugere, do ponto de vista do determinismo tecnológico, que a tecnologia está no centro dos processos de mudança social. O tecnocentrismo é tão sedutor quanto inoperante no objetivo de gerar processos de mudança estrutural e tem sido descrito, a partir de perspetivas complementares, pelo termo solucionismo tecnológico (Morozov, 2013).

Conforme proposto no subtítulo deste trabalho, o livro contém três secções principais. A primeira desenvolve o quadro teórico fundamental orientado para a compreensão da comunicação solidária digital, incorporando novas contribuições que surgiram neste campo nos últimos anos. A segunda reflete sobre as metodologias que contribuem (ou não) para a intervenção académica e dos cidadãos no sentido de uma investigação social mais rigorosa e mais atenta às inovações que advêm da vertente digital. E a última inclui um segmento de estudos de caso que abordam as práticas digitais dos cidadãos no contexto da pandemia de COVID-19, bem como a análise de duas organizações não governamentais para o desenvolvimento (ONGD) numa perspetiva comunicacional.

Mais detalhadamente, o livro está dividido em sete capítulos. O primeiro, “Comunicación, Redes Sociales y Emancipación Social en el Capitalismo Digital” (Comunicação, Redes Sociais e Emancipação Social no Capitalismo Digital; Víctor M. Marí Sáez), apresenta uma análise global das ONGD e suas práticas comunicativas, servindo de porta de entrada para todo o trabalho. Este capítulo começa por rever a diversidade de abordagens teóricas a partir das quais a comunicação solidária tem sido analisada no contexto espanhol nos últimos anos. Discute temas como “comunicação para a solidariedade e a cooperação” (Erro Sala & Burgui, 2010), “empoderamento e comunicação ecossocial” (Chaparro Escudero, 2009) ou “comunicação transgressiva para a mudança social” (Nos Aldás et al., 2019). Esta pluralidade de questões tem uma interpretação ambivalente, indicando ao mesmo tempo a riqueza de nuances do campo e certas fragilidades epistemológicas (Marí Sáez, 2021). O capítulo reinterpreta a comunicação solidária espanhola ao longo dos últimos 40 anos para identificar uma dupla tendência reducionista, na era das redes sociais: a ênfase numa perspetiva de comunicação centrada na transmissão de informação e a predominância da perspetiva tecnocêntrica mencionada anteriormente.

O segundo capítulo, “Las Precarias Relaciones Entre Comunicación, Cooperación y Cultura. Una Mirada Panorámica Desde los Informes del Estado de la Cultura en España (2011-2021)” (As Relações Precárias Entre Comunicação, Cooperação e Cultura. Uma Visão Panorâmica a Partir dos Relatórios Estatais da Cultura em Espanha [2011-2021]; Patricia Corredor Lanas), analisa, a partir de uma perspetiva cultural, a participação da sociedade civil nos domínios da comunicação e da cultura. A autora conclui que se passou uma década perdida em termos de apoio institucional e estatal à criação cultural em Espanha. O mesmo se pode dizer relativamente à igualdade de género em questões culturais, onde existem telhados de vidro significativos.

O terceiro capítulo, “Imaginarios Decoloniales de la Comunicación y Transiciones Ecosociales y Feministas en la Era Digital” (Imaginários Decoloniais da Comunicação e Transições Ecossociais e Feministas na Era Digital; Manuel Chaparro Escudero e Susana de Andrés del Campo), reflete, a partir de uma perspetiva alternativa, sobre os discursos antropocêntricos, androcêntricos e eurocêntricos dos média de massas. Os autores propõem outros sentidos de comunicação que favoreçam uma transição ecossocial e feminista. O capítulo tem em conta várias tendências que ganharam importância no campo da comunicação alternativa nos últimos anos, como as abordagens decrescentistas (Latouche, 2022) ou a viragem decolonial (Maldonado-Torres & Cavooris, 2017).

O quarto capítulo, intitulado “Coolture, Periodismos Mutantes y Soberanía Comunicacional” (Coolture, Jornalismos Mutantes e Soberania Comunicacional; Omar Rincón), propõe a fusão entre o digital, novas éticas (coolture), a revolução digital e um novo tipo de jornalismo (descrito como mutante) que não seja limitado pela lógica dos média hegemónicos, mas antes procure uma comunicação que apele às emoções, aos discursos e intervenções populares.

O quinto capítulo, “¿Cómo Se Investigan, Desde la Academia, las Prácticas Comunicativas de las Oenegés? Tendencias y Confluencias en la Era Digital” (Como Se Investiga na Academia as Práticas Comunicativas das ONG? Tendências e Confluências na Era Digital; Miguel Vicente Mariño e Eva Campos Domínguez), aborda, da perspetiva das metodologias de investigação, as tensões e desafios da comunicação solidária digital no contexto de fenómenos atuais como o big data. Os autores reconhecem que a investigação no setor da solidariedade está a enfrentar o desafio de incorporar com grande intensidade novas metodologias focadas na análise da comunicação digital.

O sexto capítulo, intitulado “Análisis Crítico del Discurso Solidario y Marcos Gubernamentales. Estudio de Caso de Oxfam Intermón y de la Cruz Roja” (Análise Crítica do Discurso Solidário e Enquadramentos Governamentais. Estudos de Caso do Oxfam Intermón e da Cruz Vermelha; Gérard Fernández Smith e Hanae Trola Skalli), analisa as mensagens de ONGD e a sua comunicação para o desenvolvimento e a mudança social. Neste propósito, os autores implementam uma metodologia relevante proposta por van Dijk (2003). Deste modo, o trabalho de campo realizado permite a identificação de discursos de solidariedade, categorias ideológicas e enquadramentos governamentais de duas das mais proeminentes e impactantes ONGD nos níveis nacional e internacional a partir de uma perspetiva qualitativa.

O sétimo e último capítulo, com o título “La Pandemia del Coronavirus en China y España y el Edu-Entretenimiento Como Estrategia Comunicativa Frente a la Desinformación” (A Pandemia do Coronavírus na China e na Espanha e o Edu-Entretenimento Como Estratégia Comunicativa Contra a Desinformação; Yiheng Wang, Clara Martins do Nascimento, Víctor Mari e José Berenguel Fernández), foca nas iniciativas comunicativas dos cidadãos durante a pandemia da COVID-19 através de um caso de estudo. A perspetiva de análise é interessante, na medida em que, nos primeiros meses de confinamento (em 2020), os limites do discurso institucional e governamental para promover medidas de saúde para a população foram suplementados e complementados por iniciativas edu-comunicativas de cuidados de saúde lançadas pelos cidadãos criadas fora de qualquer organização social ou instituição pública.

Em cada capítulo e em todo o livro, as análises são complementadas por propostas suscetíveis de ação alternativa, que podem ser sumariadas em três pontos (pp. 24-30). Primeiro, há uma necessidade de pensar mais e melhor sobre a crítica comunicacional ao capitalismo digital por parte de organizações sociais e da academia. O ativismo frenético, a priorização do urgente sobre o importante, ou a excessiva burocratização são aspetos que refreiam a construção de pensamento e ação com suficiente profundidade transformativa. Em segundo lugar, a excessiva fragmentação da ONG-ização da solidariedade (Álvarez, 2009; Petras, 1999) impede a necessária e desejada articulação social e política da ação transformativa. Finalmente, em relação ao avanço colonizador da mercantilização da comunicação, pensar a comunicação como commons é uma alternativa urgente a ser promovida. Trabalhar nesta lógica dos bens públicos globais permite, não por acaso, um retorno a um dos significados originais que o mundo da comunicação tinha tido - o communis latino - que tem sido distorcido, desfocado ou mesmo perdido ao longo dos anos.

Agradecimentos

Agencia Estatal de Investigación de España (PID2019-106632GB-I00/AEI/10.13039/501100011033). IP: Víctor Manuel Marí Sáez and Unión Europea-Next Generation/Ministerio de Universidades de España (RD 289/2021 y UNI/551/2021), Universidad de Cádiz (UCA/ R155REC/2021).

REFERÊNCIAS

Álvarez, S. (2009). Beyond NGO-ization? Reflections from Latin America. Development, 52(2), 175-184. https://doi.org/10.1057/dev.2009.23 [ Links ]

Chaparro Escudero, M. (2009). Comunicación para el empoderamiento y comunicación social. La necesaria creación de nuevos imaginarios. Perspectivas de la Comunicación, 2(1), 146-158. [ Links ]

Erro Sala, J., & Burgui, T. (Eds.). (2010). Comunicando para la solidaridad y la cooperación. Cómo salir de la encrucijada. Foro de Comunicación, Educación y Ciudadanía. [ Links ]

Latouche, S. (2022). La décroissance. Humensis. [ Links ]

Maldonado-Torres, N., & Cavooris, R. (2017). The decolonial turn. In J. Poblete (Ed.), New approaches to Latin American studies (pp. 111-127). Routledge. [ Links ]

Marí Sáez, V. (Ed.). (2004). La red es de todos: Cuando los movimientos sociales se apropian de la red. Editorial Popular. [ Links ]

Marí Sáez, V. (2021). Pensar la comunicación para el cambio social en español aquí y ahora. Arbor, 197(801), Article a615. https://doi.org/10.3989/arbor.2021.801005 [ Links ]

McQuail, D. (1991). Introducción a la teoría de la comunicación de masas (P. Ducher, Trans.). Paidós. (Original work published 1983) [ Links ]

Morozov, E. (2013). To save everything, click here. The folly of technological solutionism. Public Affairs. [ Links ]

Nos Aldás, E., Farné, A., & Al-Najjar, T. (2019). Justicia social, culturas de paz y competencias digitales: Comunicación para una ciudadanía crítica global en la educación superior. Revista Internacional de Educación para la Justicia Social, 8(1), 43-62. https://doi.org/10.15366/riejs2019.8.1.003 [ Links ]

Petras, J. (1999). NGOs: In the service of imperialism. Journal of Contemporary Asia, 29(4), 429-440. https://doi.org/10.1080/00472339980000221 [ Links ]

van Dijk, T. (2003). Ideología y discurso. Una introducción multidisciplinaria. Ariel. [ Links ]

1Digicom2030 é o acrónimo do projeto de investigação da Agência Estatal de Investigação de Espanha PID2019-106632GBIOO, intitulado Comunicação Solidária Digital. Análise dos Imaginários, dos Discursos e das Práticas Comunicativas das ONGD no Horizonte da Agenda 2030. Para mais informação: https://digicom2030.uca.es/.

Recebido: 01 de Agosto de 2023; Aceito: 19 de Outubro de 2023

Tradução: Madalena Oliveira

Víctor Marí Sáez é professor titular da Universidade de Cádis, em Espanha. É licenciado em Ciências da Informação pela Universidade Complutense de Madrid (Espanha) e doutorado em Jornalismo pela Universidade de Sevilha (Espanha). É líder do grupo de investigação Comunicación y Ciudadanía Digital e o investigador principal do projeto Comunicação Solidária Digital. Análise dos Imaginários, dos Discursos e das Práticas Comunicativas das ONGD no Horizonte da Agenda 2030 (2020-2024), PID2019-106632GB-IOO. Email: victor.mari@uca.es Morada: Universidad de Cádiz, Facultad de Ciencias Sociales y de la Comunicación, Campus de Jerez, Avenida de la Universidad nº 4, 11406 Jerez de la Frontera, Cádiz (España)

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