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Media & Jornalismo

versão impressa ISSN 1645-5681versão On-line ISSN 2183-5462

Media & Jornalismo vol.18 no.32 Lisboa abr. 2018

 

RECENSÃO

 

Recensão de Ward, S. (2015). Radical Media Ethics: a global approach. Chichester: Wiley-Blackwell

 

Recensão de Ward, S. (2015). Radical Media Ethics: a global approach. Chichester: Wiley-Blackwell

 

Recensão de Ward, S. (2015). Radical Media Ethics: a global approach. Chichester: Wiley-Blackwell

 

 

Dairan PaulI

I Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão. Florianópolis, Santa Catarina 97105-340. Brasil. E-mail: dairanpaul@gmail.com

 

 


 

 

A entrada de novos atores no ecossistema midiático para além dos jornalistas profissionais é um dos impasses que desafia não apenas as teorias do jornalismo, mas também aquelas que se detêm sobre a especificidade de uma ética jornalística. Velhas questões vêm à tona: é possível dizer que não-jornalistas praticam jornalismo? Estes cidadãos são guiados por valores morais semelhantes aos deontológicos da área? Seria possível pensarmos em uma ética que envolva jornalistas e não-jornalistas?

Estas questões difusas são pertinentes não apenas por conta das transformações tecnológicas que sempre acompanharam o jornalismo e que, nas últimas décadas, permitiram com maior ênfase a participação via blogs ou redes sociais de não-jornalistas que produzem informações. São importantes, também, porque a despeito de uma trajetória de profissionalização relativamente sedimentada, com estatuto próprio e reconhecimento perante o público, a questão da identidade profissional do jornalista ainda é uma discussão aberta, de contornos fluidos e ambíguos. É neste sentido que a definição do que é o próprio jornalismo recai menos em quem o pratica – se profissional ou não –, e mais no processo em si da prática, posição defendida por Joaquim Fidalgo (2009), por exemplo.

É a partir desta mesma concepção ampla de jornalismo que o pesquisador norte-americano Stephen Ward discute as possibilidades de implementar uma ética radical de mídia – “radical” em um sentido filosófico, no pressuposto de que é necessário alterar os fundamentos que alicerçam a ética jornalística atual. Em Radical Media Ethics (2015), Ward argumenta que ainda guardamos resquícios de uma ética “pré-digital”, ou seja, com debates a respeito das práticas jornalísticas confinados apenas às redações e aos profissionais. É preciso abrir a “caixa preta” do jornalismo, defende o autor, tornar seu processo produtivo mais transparente e ouvir o público. É preciso, também, reconhecer a necessidade de discutir padrões éticos não apenas para jornalistas, mas para todo e qualquer cidadão que pratique “atos de jornalismo” e dissemine informações.

Ainda que preocupado em alargar a discussão ética do jornalismo para além do âmbito profissional, Ward previne-se para não cair em um excessivo relativismo. Ou seja, nem todos os “atos de jornalismo”, sejam eles praticados por jornalistas ou por não-jornalistas, são moralmente aceitáveis. Como critério normativo, o pesquisador norte-americano estabelece que um ato somente será um ato “de jornalismo” se contribuir para a democracia. O argumento é amplo e abre-se para mais discussões, porém serve como um denominador mínimo que rejeita práticas supostamente jornalísticas, mas antidemocráticas – a saber, grupos ativistas pró-racismo, por exemplo.

Além de destacar a tarefa de promover uma democracia dialógica, aberta para diversas formas de jornalismo, Ward sustenta que uma ética radical de mídia também deve ser global, aspecto que já discutia em trabalhos anteriores (Ward, 2013; Ward e Wasserman, 2010). Neste sentido, o jornalista firma um contrato multissociedade, não restrito a um público específico, mas ao globo. Esse novo escopo para o jornalismo traduz-se em pautas que discutem a própria sobrevivência humana – um deslocamento semelhante àquele identificado pelo filósofo Hans Jonas, que desenvolve uma teoria da responsabilidade orientada para o futuro da sociedade. No jornalismo, este esforço projeta assuntos como mudanças climáticas, segurança internacional e privacidade, dentre outros.

No último capítulo de Radical Media Ethics, Ward sinaliza para o objetivo final de sua teoria ética: a promoção do florescimento humano. Embora não faça referência à ética das virtudes ao longo de sua obra, há, aqui, uma clara inspiração aristotélica nos ideais da eudaimonia, ou seja, a felicidade suprema.

Para atingir este fim, Ward propõe um programa específico para o jornalismo na promoção de quatro bens primários relativos à dignidade humana –bens sociais, individuais, éticos e políticos. Vinculados à prática jornalística, estes se traduzem no monitoramento de instituições, abertura da participação cidadã nos espaços públicos do jornalismo e estímulo de uma leitura crítica da mídia, dentre outras recomendações do autor.

É possível tecer críticas à Ward em relação a uma certa vagueza no conceito de florescimento como finalidade-última para o jornalismo, ou mesmo por ser algo demasiadamente exigente a uma prática social. No entanto, isto não invalida a teoria desenvolvida até então pelo autor. É certo que muitas das ideias esboçadas pelo autor podem ser tidas como utópicas, em termos práticos, especialmente no que tange ao escopo global de sua ética. Do ponto de vista teórico, no entanto, é difícil não reconhecer o esforço de Ward em reconstruir as bases filosóficas para uma ética jornalística em constante transformação. Neste sentido, a contribuição de Radical Media Ethics é valiosa, seja pelo seu rigor metodológico, seja pelos insights que devem pautar futuras discussões entre os pesquisadores da área.

 

 

Referências Bibliográficas

Fidalgo, J. (2009). Journalism: new media, new actors - new ethics? Journalism Research in the Public Interest: 12-21.

Ward, S.; Wasserman, H. (eds) (2010). Media Ethics Beyond Borders: a global perspective. New York/London: Routledge,         [ Links ] 2010.

Ward, S. (2015). Radical Media Ethics: a global approach. Chichester: Wiley-Blackwell.         [ Links ]

Ward, S (ed). (2013). Global Media Ethics: problems and perspectives. Chichester: Wiley-Blackwell.         [ Links ]

 

 

Recebido / Received / Recibido: 16/09/2017
Aceite /Accepted /Aceptación: 10/01/2018

 

 

Dairan Mathias Paul - Mestre em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina, no Programa de Pós-Graduação em Jornalismo (UFSC/POSJOR). Integra o Observatório da Ética Jornalística - objETHOS (objethos.wordpress.com). Graduado em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).

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