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Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online

versão impressa ISSN 2183-8453

RPSO vol.11  Gondomar jun. 2021  Epub 07-Jan-2022

https://doi.org/10.31252/rpso.13.02.2021 

Revisão Bibliográfica

DINAMOMETRIA- SABEMOS O SUFICIENTE PARA A UTILIZAR ADEQUADAMENTE NA SAÚDE OCUPACIONAL?

DYNAMOMETRY- DO WE KNOW ENOUGH TO USE IT IN OCCUPATIONAL HEALTH?

1Licenciada em Medicina; Especialista em Medicina Geral e Familiar; Mestre em Ciências do Desporto; Especialista em Medicina do Trabalho e Doutoranda em Segurança e Saúde Ocupacionais, na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto. Presentemente a exercer nas empresas Medimarco, Higiformed e Medilavoro; Diretora Clínica da empresa Quercia; Diretora da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. Endereços para correspondência: Rua Agostinho Fernando Oliveira Guedes, 42, 4420-009 Gondomar. E-mail: s_monica_santos@hotmail.com

2Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária, com Competência Acrescida em Enfermagem do Trabalho. Doutorado em Enfermagem; Mestre em Enfermagem Avançada; Pós-graduado em Supervisão Clínica e em Sistemas de Informação em Enfermagem; Professor Auxiliar Convidado na Universidade Católica Portuguesa, Instituto da Ciências da Saúde - Escola de Enfermagem (Porto) onde Coordena a Pós-Graduação em Enfermagem do Trabalho; Diretor Adjunto da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 4420-009 Gondomar. E-mail: aalmeida@porto.ucp.pt

3Licenciada em Cardiopneumologia, desde 2006 pela Escola Superior de Saúde do Vale do Ave, com Diploma de Melhor Aluna de Curso. Em 2009, emigrada em Moçambique, integrou o Serviço de Cardiologia do Hospital Central de Maputo e o Gabinete de Investigação da Universidade Eduardo Mondlane. Em 2011 foi gestora da Clínica Privada de Maputo Clinicare. De 2012 a 2020, integrou o serviço de Saúde Ocupacional na AMI Trauma Center, Lda e Clínica Vida Check up Center, onde exercia também a função de Diretora geral. Atualmente, exerce atividade na área de medicina ocupacional, na empresa Medilavoro.


RESUMO

Introdução/enquadramento/objetivos:

O Dinamómetro é um instrumento acessível na aquisição e utilização, pelo que a generalidade das empresas prestadoras de Serviços externos o possui e o utiliza às vezes. Contudo, a bibliogafia sobre este método não é muito abundante. Pretendeu-se com esta revisão resumir os dados mais pertinentes sobre esta técnica, refletir se a mesma está a ser adequadamente utilizada na Saúde Ocupacional e quais as suas potencialidades neste contexto.

Metodologia:

Trata-se de uma Revisão Bibliográfica, iniciada através de uma pesquisa realizada em janeiro de 2021, nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive e MedicLatina”.

Conteúdo:

A avaliação da força de preensão da mão pode ser utilizada para quantificar especificamente as limitações no membro superior, inferir a capacidade de trabalho após acidente/doença/cirurgia e/ou perceber a evolução de um processo de reabilitação.

A quantificação da força pode ser alterada por muitos fatores.

Existem diversos tipos de Dinamómetros: uns fixos, complexos, exigentes, dispendiosos e outros portáteis, simples, económicos e sem exigirem treino especial.

Algumas recomendações protocolares para a correta execução do teste são razoavelmente consensuais.

Estão publicados valores orientadores das quantificações obtidas em alguns países, por idades, sexo e/ou divisão por mão esquerda/direita ou dominante/não dominante, mas que não são aceites como referências absolutas.

Discussão e Conclusões:

Por vezes alguns trabalhadores são avaliados pela Dinamometria; contudo, ainda que seja um procedimento simples a nível técnico, parte dos indivíduos que a executam não apresentam conhecimentos suficientes para atenuar/controlar algumas variáveis que podem enviesar o resultado. Para além disso, não se encontram valores de referência com os quais possamos comparar um valor único obtido, ficando a dúvida se a validade do exame servirá apenas para analisar os diversos valores obtidos num mesmo trabalhador (nas mãos esquerda/direita, dominante/não dominante e/ou ao longo do tempo, em função do envelhecimento ou de circunstâncias médicas que tenham a capacidade de diminuir a força: patologias, acidentes e/ ou respetivas reabilitações). Estão publicadas sugestões de valores encontrados para alguns países que, na falta de valores referência consensualmente aceites, poderão servir como orientação.

O exame bem executado permite perceber a capacidade física de trabalho, de forma a uma melhor gestão dos condicionamentos pelo Médico do Trabalho, atribuição de tarefas da parte da chefia ou até para uma contestação fundamentada em relação a um eventual processo de acidente laboral.

Palavras-chave: dinamometria; dinamómetro; força de preensão da mão; saúde ocupacional e medicina do trabalho

ABSTRACT

Introduction/background/objectives:

The dynamometer is an accessible instrument in the acquisition and use, reason why the majority of companies that provide external services have it and sometimes use it. However, the bibliography on this method is not very abundant. The purpose of this review was to summarize the most pertinent data on this technique and reflect on whether it is being used properly in Occupational Health and what are its potential in this context.

Methodology:

This is a Bibliographic Review, initiated through a research carried out in January 2021, in the databases “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive and MedicLatina”.

Content:

The handgrip strength assessment can be used to specifically quantify the limitations in the upper limb, infer the ability to work after an accident/illness/surgery, and/or perceive the evolution of a rehabilitation process. The quantification of force can be altered by many factors.

There are several types of Dynamometers: some are fixed, complex, demanding, expensive and others are portable, simple, economical and without requiring special training.

There are some consensual protocol recommendations for the correct execution of the test.

Some guiding values for the quantifications obtained in some countries are published, by age, sex and/or division by left/right or dominant/non-dominant hand, but which are not accepted as absolute references.

Discussion and Conclusions:

Sometimes some workers are evaluated by Dynamometry; however, even though it is a simple procedure at a technical level, some of the individuals who perform it do not have enough knowledge to mitigate/control some variables that may skew the result. In addition, there are no reference values with which we can compare a single value obtained, leaving the doubt whether the validity of the exam will only serve to analyze the different values obtained in the same worker (in the left/right, dominant/non-dominant hands and/or over time, depending on aging or medical circumstances that can reduce strength, as pathologies, accidents and/ or respective rehabilitation.

Suggestions of values were found for some countries that, in the absence of consensually accepted reference values, it can serve as a guide.

The well-executed exam allows to perceive the physical capacity of work, to better manage the conditionings by the Occupational Physician, assign tasks or even to a more reasoned contestation in relation to a work accident process.

Keywords: dynamometry; dynamometer; hand grip strength; occupational health and occupational medicine

INTRODUÇÃO

O Dinamómetro é um instrumento acessível na aquisição e utilização, pelo que a generalidade das empresas prestadoras de Serviços externos o possui e o utiliza às vezes. Contudo, a bibliogafia sobre este método não é muito abundante. Pretendeu-se com esta revisão resumir os dados mais pertinentes sobre esta técnica, refletir se a mesma está a ser adequadamente utilizada na Saúde Ocupacional e quais as suas potencialidades neste contexto.

METODOLOGIA

Em função da metodologia PICo, foram considerados:

  • -P (population): trabalhadores nas quais a quantificação da Força de Preensão da Mão (FPM) pode ser relevante.

  • -I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre a técnica de execução da Dinamometria, variáveis com capacidade de enviesar os resultados e particulares dos instrumentos.

  • -C (context): Saúde Ocupacional nas empresas com postos de trabalho em que a FPM é importante.

Assim, a pergunta protocolar será: Como executar corretamente uma Dinamometria e quais as suas potencialidades a nível Ocupacional?

Foi realizada uma pesquisa em janeiro de 2021 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive e MedicLatina”. Contudo, devido ao escasso número de artigos encontrados, utilizou-se o motor de buscar generalista Google, no sentido de encontrar artigos científicos de revistas open access e não incluídas nas bases de dados atrás mencionadas.

No quadro 1 podem ser consultadas as expressões/palavras-chave utilizadas nas bases de dados.

Quadro 1 Pesquisa efetuada 

CONTEÚDO

Relevância para quantificar a força

A avaliação da FPM pode ser utilizada para quantificar especificamente as limitações no membro superior, inferir a capacidade de trabalho (1) após acidente (1) (2)/doença/cirurgia (1), perceber a evolução de um processo de reabilitação (1) (2), treino ou em provas terapêuticas (2). Alguns investigadores realçam especificamente as lesões medulares, osteoartrite e a insuficiência cardíaca. Pode ser ainda relevante avaliar a força existente no aperto de mão em algumas populações, nomeadamente durante o crescimento ou envelhecimento (2) (3). O valor obtido na FPM também pode ajudar a dar uma ideia da força no seu global. Assim, a Dinamometria/Dinamómetro podem ser utilizados para avaliar o estado geral funcional do indivíduo (4) ou a (des)nutrição (devido à destruição de fibras musculares). Por isso, acredita-se que a diminuição da FPM está relacionada com pior estado funcional geral, mais complicações pós-operatório, mais tempo de internamento hospitalar e/ou aumento da mortalidade (5). A nível ocupacional em concreto, avaliar a força da mão poderá permitir que a chefia delegue de forma mais adequada as tarefas laborais (6).

Fatores que modulam a intensidade da força

A produção e/ou quantificação da força podem ser influenciadas por vários fatores, nomeadamente:

  • -aquecimento muscular (3) (a existência de aquecimento antes potencia a força (6))

  • -treino prévio (3)

  • -posição (3) (4) (a posição sentada potencia a qualidade da avaliação (4))

  • -estabilização do indivíduo testado (3)

  • -amplitude do movimento (3)

  • -tempo de descanso entre as séries, sequência dos exercícios (3); ou seja, o intervalo e o número de vezes que se testa (4)

  • -incentivos verbais (3) (instruções orais com mais volume sonoro geralmente originam medições mais elevadas (6))

  • -caraterísticas do instrumento em si (3)

  • -diferentes protocolos de medição (3)

  • -peso (3) (baixo ou em excesso estão associados a menor força, eventualmente devido à menor quantidade de massa muscular (5))

  • -altura (contudo, esta pode estar determinada/enviesada pela etnia); entre o peso e a altura, a segunda parece ser mais relevante a nível de FPM ou ainda índice de massa corporal (IMC) (5)

  • -nível de atividade física (5)

  • -perímetro do braço (que está relacionado com a FPM, uma vez que tal geralmente é proporcional ao desenvolvimento muscular/prática de atividade física (5))

  • -profissão (5)

  • -força da gravidade (3)

  • -idade (4) (5) (6) (a força diminui sensivelmente a partir da quarta década de vida; ou seja, a FPM é máxima entre os 25 e os 35 anos- depois começa a baixar (4), devido à menor massa muscular. Outros investigadores consideram que a força máxima costuma ser atingida no sexo feminino por volta dos 35 anos, diminuindo posteriormente, sobretudo após os 40 anos e aos 50 para os restantes, devido à sarcopenia que ocorre em cerca de 9 e 18% em mulheres e homens com mais de 65 anos. Acredita-se que tal possa justificar-se pelo facto de os mediadores inflamatórios levarem à perda de aminoácidos/proteínas das fibras musculares. Nos menos jovens, para além disto, também podem ocorrer patologias, desnutrição, má dentição, sedentarismo, diminuição da síntese de testosterona, bem como questões socioeconómicas que potenciam a menor qualidade muscular (5).

  • -género (4) (5) (6) (a força é geralmente superior no sexo masculino, para qualquer idade, lado ou profissão; por vezes essa diferença pode ser na ordem dos 30 (4) a 40% (5))

  • -dominância lateral (4) (a mão dominante pode apresentar valores de força 10% (4) (5) ou 11% (6) superiores em média (4)- ainda que tal possa ser modulado pela atividade física (5); está publicado que os indivíduos destros podem oscilar até 13% entre mãos; os restantes apresentam uma diferença muito menor, nomeadamente na ordem dos 0,08% (6); aliás, por vezes, mesmo indivíduos não destros, apresentam força superior à direita, talvez por realizarem algumas funções com essa mão, devido à maioria da população o fazer dessa forma (5))

  • -dimensão da mão (4) (5): trata-se de um fator não consensual (4), mas ainda assim valorizando sobretudo o comprimento (5).

  • -densidade óssea (4)

  • -estado nutricional (4)

  • -patologias/acidentes/cirurgias (6); por exemplo, a imobilização diminuiu a força muscular, tal como a inflamação, hipoxia, alterações hidroeletrolíticas, stress oxidativo, doenças osteoarticulares e/ou neurológicas ou simplesmente a presença de algias (5)

  • -medicação (acredita-se que corticoides e/ou relaxantes musculares podem diminuir a força (5))

  • -estado cognitivo (5) (idosos em pior patamar a este nível apresentam menor FPM (5)) e

  • -motivação (5).

Métodos globais para quantificar a força

O método mais usado no passado para avaliar a FPM incidia nas técnicas manuais; contudo, estas são subjetivas; usam uma escala de cinco pontos e avaliam a força isométrica, adicionando a resistência manual do avaliador. Têm a vantagem de não necessitar de qualquer equipamento (7), mas falta a sensibilidade (7) (8) para detetar pequenas alterações ou variações (7). Ou seja, é rápida e não tem custo adicional, mas apresenta baixa confiabilidade, sobretudo para diminuição de força suave a moderada e baseia-se numa escala ordinal (8). A Dinamometria é superior aos testes manuais de avaliação da força (9) (10) e constitui agora a forma mais frequentemente utilizada para o fazer (9). Esta é confiável e sensível e usa uma escala contínua (8).

Definição de Dinamometria/ Dinamómetro

Dinamómetro é um instrumento que permite realizar a Dinamometria, ou seja, a quantificação da força realizada pela compressão de um objeto, através do movimento da mão (6), no caso da FPM.

Tipos de Dinamómetros

Existem diversos tipos, nomeadamente hidráulicos, pneumáticos, mecânicos e eletrónicos (2) (4) (5); ou seja, diferem a nível de mecanismo, desempenho e abastecimento energético (2).

Os eletrónicos são mais precisos na quantificação de diversos parâmetros musculares. Estes instrumentos proporcionam resistência equivalente à força exercida pelo indivíduo testado, ou seja, possibilitam que a força exercida seja constante; assim, o teste designa-se por isocinético. Desta forma consegue-se produzir a força máxima em toda a amplitude do movimento (o que não é possível com testes isotónicos, ou seja, com carga constante). Os valores de um teste isocinético são mais representativos da capacidade do indivíduo testado (5) (11). Parte dos instrumentos permite que se faça a prova de forma isométrica e isotónica (3). Esta metodologia é usada sobretudo para monitorizar a evolução durante um processo de reabilitação e a nível de investigação (11). Essa resistência pode ir-se alterando em função da amplitude do movimento e velocidade, até ficar equivalente à força que o indivíduo testado está a exercer (5).

Os Dinamómetros eletrónicos ou conetados a um computador são mais vantajosos que os hidráulicos a nível de detetar o índice de fadiga durante uma contração isométrica prolongada e são mais sensíveis à força aplicada; para além disso, as leituras digitais aumentam a confiabilidade e diminuem os erros da leitura normal (1) (6).

Os Dinamómetros fixos (isocinéticos- velocidade constante) são considerados a técnica gold standard (7)(8) (12) (13) (14) (15) (pela confiabilidade e sensibilidade (8)) para a quantificação das forças (13) isométricas e isocinéticas; contudo, o custo (7) (8) (12) (13) (14) (16) (17) e a ausência de portabilidade (7) (12) (13) (14) condicionam a sua utilização (7) (12) (14) (16); são complexos (17) e o avaliador necessidade de treino (14).

A Dinamometria geralmente usada para quantificar a FPM é isométrica (5), económica (4) (5) (6) (7) (8) (12) (13) (14) (15) (16) (17) (18), acessível (7) (8) (18), portátil (7) (12) (13) (14) (16) (18), não invasiva (6) e fácil de usar (4) (6) (12) (13) (14) (16) (18); ou seja, não necessita de treino específico (13). Contudo, há falta de consenso relativamente a protocolos de utilização, nomeadamente a nível de posicionamento do indivíduo testado (12). Esta é uma opção intermédia, uma vez que é mais sensível que as técnicas manuais (7); na realidade a generalidade dos artigos publicados considera que ela é suficientemente confiável e sensível (8). Pode ser especialmente útil nos indivíduos qualificados com 4 e 5 nas técnicas de avaliação manuais de força (19).

As quantificações realizadas para avaliar a FPM podem ser alteradas pela estabilização do instrumento e do indivíduo testado, devido à sua portabilidade (14) (15); por esse motivo foram desenvolvidos sistemas de fixação (à parede ou mesa)- a não estabilização pode subestimar a força (15). Ainda assim, alguns investigadores consideraram que estes dispositivos mecânicos não são práticos. A confiabilidade destes sistemas de fixação também pode ser testada (14). A Dinamometria para FPM deve ser usada quando a forma isocinética fixa não está adequada (15).

O Dinamómetro Jamar (versão hidraúlica) é usado como critério de comparação para validar outros instrumentos, quer hidráulicos, quer eletrónicos (1). É o mais usado para avaliar a força do aperto de mão (80% das escolas de Terapia Ocupacional e Clínicas dos EUA usam-no), sobretudo em contexto de acidente e doença. O aparelho apresenta os resultados quer em "pounds", quer quilogramas (máximo de 200 e 90, respetivamente). Apresenta também um mecanismo que regista e memoriza a leitura/avaliação mais elevada. Este teste é isométrico. O dispositivo apresenta partes ajustáveis a diferentes tamanhos. Apresenta boa confiabilidade interexaminador e teste-reteste. É considerado gold standard (1) (2) (20) pela American Society of Hand Therapists (ASHT) (2) (5), daí o seu uso frequente na prática clínica e investigação. Contudo, poderá apresentar limitações em indivíduos com força muito reduzida, para os quais existem outras versões mais adequadas (2), uma vez que para indivíduos com menos força alguns modelos não são tão sensíveis. Ainda que tenha ótimas validade e confiabilidade para a prática clínica e investigação, apenas quantifica a força instantânea do aperto de mão, ou seja, não é capaz de avaliar a manutenção da força de um cumprimento prolongado. Para além disso, necessita de calibração anual e pode ser um pouco dolorosa a sua utilização (20).

Por vezes são também usadas como unidades o quilograma-força ou o newton (5).

Outros modelos bem-conceituados são o Smedley Hand, Sammons Preston Rolyan Bulb e o Eisenhut; ainda que tenham sido reportadas diferenças estatisticamente significativas em relação ao Jamar, em indivíduos idosos. Uma vez que cada modelo tem tamanho e peso diferentes, tal poderá alterar as medições. Há ainda o Dinamómetro computadorizado E link (Biometrics) que, além de calcular a força máxima, também estima a taxa de fadiga e apresenta concordância com o Jamar Hydraulic Hand (5). Alguns conseguem fazer um registo contínuo e apresentam uma superfície de contato superior, o que diminuiu o desconforto e permitem fazer a transição de dados via USB (20).

Técnica de medição recomendada

A posição pode influenciar o resultado. A ASHT define que o indivíduo a testar deverá estar sentado (4) (6) de forma confortável (6), em cadeira com encosto vertical reto e sem suporte para os membros superiores (5), com ombro abduzido (4) (6) e rodado de forma neutra (4), cotovelo fletido a 90º, antebraço em posição neutra (4) (5) (6) e punho entre 0 e 30º de extensão; contudo, nem todos os investigadores aceitam estas recomendações (6). Ainda que grande parte considere que a melhor posição de avaliação da FPM seja esta, vários investigadores testaram outras possibilidades e para algumas encontraram eficácia semelhante (4).

O ortostatismo pode aumentar a estimativa da FPM. Alguns investigadores experimentaram por isso o decúbito dorsal, leito fletido a 30º, acrescido de cotovelo aí apoiado e não encontram diferenças relevantes entre as duas posições (5). Contudo, ainda assim, alguns posicionamentos podem alterar a quantificação em até 50% (3).

Os tempos de descanso entre quantificações oscilam entre 15 e 60 segundos (não parecem existir provas que claramente favoreçam um determinado tempo) (6). Numa grande parte das investigações efetuam-se três medições (4) (5), com intervalos de 60 segundos, para atenuar a fadiga (5). Podem-se fazer uma medição ou várias repetições ou ainda calcular uma média; é relevante indicar qual a opção utilizada. A existência de protocolos de atuação pretende uniformizar o procedimento, diminuir os erros e aumentar a confiabilidade do resultado (3).

Se se pretenderem fazer várias medições num mesmo indivíduo, para avaliar a evolução, estas devem ser efetuadas à mesma hora. Ao longo do dia, a força é menor no início da manhã e maior entre as 16 e as 20h (6). Para além disso, se quisermos que haja comparação, as medições devem ser feitas sempre com o mesmo instrumento (21) (22).

Ainda que não seja consensual, os Dinamómetros para avaliação da FPM deverão ser calibrados pelo menos de 3/3 meses (1).

Parâmetros de avaliação dos instrumentos

A Dinamometria é sensível (22), confiável (7) (12) (13) (16) (17) (22) (intra e interteste) (13), mesmo se usada por avaliadores inexperientes (12) e apresenta resultados reprodutíveis (9).

Valores de Referência

Não existem valores consensuais quanto a valores de referência, até porque se acredita que estes devem ser em função das características de cada população (3). Não existem valores de referência para os portugueses (5).

Por exemplo, investigações efetuadas em espanhóis, alemães e brasileiros, abarcando indivíduos saudáveis entre os 17 e os 97 anos, estimaram valores médios de força na mão não dominante entre os 22,9 e os 27,0 KgF no sexo feminino e 35,2 e 47.0 nos restantes indivíduos. A quantificação da força como elevada, intermédia ou baixa pode ser feita através de quartis (5).

Nos quadros 2 a 8 (anexo 1) estão registados os valores referência sugeridos para alguns países, por vezes também especificando o tipo de Dinamómetro utilizado e/ou individualizando por sexo, mão direita/esquerda ou dominante/não dominante.

Quadro 2: Valores de Referência para a FPM em Australianos, utilizando o Dinamómetro Grippit 

Idade Nº ♀ Mão Média Nº ♂ Média
18-24 24 D 23 24 44
E 19 42
25-34 35 D 26 35 44
E 24 46
35-44 42 D 24 42 31
E 20 32
45-54 33 D 22 33 41
E 17 41
55-64 26 D 20 26 32
E 18 33
65-74 21 D 15 21 30
E 13 29
≥75 36 D 12 36 24
E 11 14 (4)

Quadro 3: Valores de Referência para a FPM em Australianos, utilizando o Dinamómetro Jamar 

Idade Nº ♂ Mão Média Nº ♀ Média
18-24 25 D 37-67 24 19-39
E 28-66 16-36
25-34 24 D 32-73 35 20-44
E 30-69 18-42
35-44 34 D 32-72 42 19-43
E 31-71 16-40
45-54 37 D 39-63 33 16-42
E 36-63 17-42
55-64 31 D 28-58 26 16-36
E 24-60 15-37
65-74 27 D 36-54 21 11-33
E 23-55 12-32
≥75 17 D 17-49 29 5-34
E 18-48 8-32 (4)

Quadro 4: Valores de Referência para a FPM em Espanhóis, utilizando os Dinamómetros Baseline e Grippit 

Idade Mão dominante (D) e não dominante (ND) Nº ♀ Média de 3 medidas Nº ♂ Média de 3 medidas
30-39 D 108 28.2 43 50.9
ND 23.5 41.2
40-49 D 55 28.8 32 50.2
ND 25.9 41.6
50-59 D 31 24.5 22 46.6
ND 21.6 39.6
60-69 D 24 19.5 41 35.7
ND 17.5 32.5
70-79 D 29 17.0 46 29.5
ND 16.6 26.7
80-84 D 13 16.6 29 24.2
ND 14.5 22.9
≥85 D 27 13.8 16 21.8
ND 11.9 20.3 (4)

Quadro 5: Valores de Referência para a FPM em populações dos EUA, Austrália, Canadá, Ucrânia e Suécia, utilizando o Dinamómetro Jamar 

Idade Nº ♂ Média esquerda Média direita Nº ♀ Média esquerda Média direita
0-24 134 47.4 53.3 133 27.9 30.6
25-29 149 50.0 53.9 142 30.8 33.8
30-34 120 49.2 52.8 141 31.8 33.2
35-39 117 51.6 53.3 142 30.2 32.8
40-44 111 49.8 54.1 133 29.3 33.9
45-49 110 48.7 50.4 116 30.8 30.9
50-54 100 45.2 50.6 123 28.8 29.9
55-59 120 41.0 44.1 132 27.2 25.9
60-69 82 38.7 41.7 118 23.0 25.6
70-74 120 38.2 41.7 166 22.9 24.2
≥75 217 36.2 38.2 361 22.5 18.0 (4)

Quadro 6: Valores de Referência para a FPM para a população Brasileira, utilizando o Dinamómetro Jamar 

Idade Dominante ♂ Não dominante ♂ Dominante ♀ Não dominante ♀
20-24 42.8 40.7 30.0 27.2
25-29 46.3 42.7 32.5 29.6
30-34 45.4 41.6 30.4 27.6
35-39 45.7 41.7 32.9 29.3
40-44 43.1 40.0 32.1 28.3
45-49 44.2 39.6 32.4 29.1
50-54 43.5 39.5 30.5 27.5
55-59 42.9 38.2 31.7 28.9 (4)

Quadro 7: Valores de Referência para diversos países, utilizando o Dinamómetro Jamar 

Valores médios País ♂ dominante ♂ não dominante ♀ dominante ♀ não dominante
20 anos Austrália 41.00 36.00 29.00 24.15
Inglaterra 48.15 43.08 28.33 25.78
Finlândia 47.50 - - -
Alemanha 56.30 54.00 32.40 31.00
Nova Zelândia 58.80 54.90 35.60 32.70
EUA 55.00 47.50 32.00 27.70
45 anos Austrália 44.00 38.00 28.55 21.85
Inglaterra 49.93 48.94 35.30 32.06
Finlândia 50.80 - 30.20 -
Alemanha 51.60 51.00 33.00 30.90
Nova Zelândia 51.60 49.00 35.10 33.20
EUA 50.00 45.80 28.30 25.50 (4)

Quadro 8: Valores de Referência, com média e desvio padrão, para a população Brasileira 

Média esquerda Desvio padrão Média direita Desvio padrão
23.97 0.26 25.26 0.28
40.89 0.31 42.82 0.35
Total 31.57 0.28 33.14 0.31 (4)

DISCUSSÃO/ CONCLUSÃO

Por vezes alguns trabalhadores são avaliados pela Dinamometria; contudo, ainda que seja um procedimento simples a nível técnico, parte dos indivíduos que a executam não apresentam conhecimentos suficientes para atenuar/controlar algumas variáveis que podem enviesar o resultado. Para além disso, não se encontram valores de referência com os quais possamos comparar um valor único obtido, ficando a dúvida se a validade do exame servirá apenas para analisar os diversos valores obtidos num mesmo trabalhador (nas mãos esquerda/direita, dominante/não dominante e/ou ao longo do tempo, em função do envelhecimento ou de circunstâncias médicas que tenham a capacidade de diminuir a força, como patologias, acidentes e respetivas reabilitações). Estão publicadas sugestões de valores encontrados para alguns países, por vezes subdivididos por sexo, idade, mão esquerda/direita ou dominante/não dominante que, na falta de valores referência consensualmente aceites, poderão servir como orientação.

Para além disso, nem sempre os trabalhadores que têm a indicação contratual para fazer este exame em prestação de serviços externos, são aqueles com postos de trabalho onde a FPM é relevante para o desempenho profissional e vice-versa.

O exame bem executado permite perceber a capacidade física de trabalho, de forma a uma melhor gestão dos condicionamentos pelo Médico do Trabalho, atribuição de tarefas da parte da chefia ou até para uma contestação fundamentada em relação a um acidente laboral.

Seria relevante que uma ou mais equipas de Saúde Ocupacional a exercer no nosso país quantificassem a FPM numa amostra razoável de trabalhadores, de forma a se ficar com valores orientadores para a população portuguesa.

AGRADECIMENTOS

Nada a declarar.

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Recebido: 03 de Fevereiro de 2021; Aceito: 13 de Fevereiro de 2021

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Nada a declarar.

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