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Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online

versão impressa ISSN 2183-8453

RPSO vol.12  Gondomar dez. 2021  Epub 25-Mar-2022

https://doi.org/10.31252/rpso.16.10.202 

Artigo de Revisão

PARTICULARIDADES DA SAÚDE OCUPACIONAL APLICADA A MIGRANTES

PARTICULARITIES OF OCCUPATIONAL HEALTH APPLIED TO MIGRANTS

M Santos1 
http://orcid.org/0000-0003-2516-7758

A Almeida2 

C Lopes3 

1Licenciada em Medicina; Especialista em Medicina Geral e Familiar; Mestre em Ciências do Desporto; Especialista em Medicina do Trabalho; Doutoranda em Segurança e Saúde Ocupacionais e a frequentar o Curso Superior de Segurança no Trabalho. Presentemente a exercer nas empresas Medimarco e Higiformed; Diretora Clínica da empresa Quercia; Diretora da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. Endereços para correspondência: Rua Agostinho Fernando Oliveira Guedes, 42, 4420-009 Gondomar

2Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária, com Competência Acrescida em Enfermagem do Trabalho. Doutorado em Enfermagem; Mestre em Enfermagem Avançada; Pós-graduado em Supervisão Clínica e em Sistemas de Informação em Enfermagem; Professor Auxiliar Convidado na Universidade Católica Portuguesa, Instituto da Ciências da Saúde - Escola de Enfermagem (Porto) onde Coordena a Pós-Graduação em Enfermagem do Trabalho; Diretor Adjunto da Revista Portuguesa de Saúde Ocupacional online. 4420-009 Gondomar

3Licenciada em Enfermagem, desde 2010, pela Escola Superior de Saúde Vale do Ave. A exercer funções na área da Saúde Ocupacional desde 2011 como Enfermeira do trabalho autorizada pela Direção Geral de Saúde, tendo sido a responsável pela gestão do departamento de Saúde Ocupacional de uma empresa prestadora de serviços externos durante sete anos. Atualmente acumula funções como Enfermeira de Saúde Ocupacional e exerce como Enfermeira Generalista na SNS24. Encontra-se a frequentar o curso Técnico Superior de Segurança do Trabalho. 4715-028. Braga


RESUMO

Introdução/enquadramento/objetivos

Por vezes prestam-se serviços de Saúde Ocupacional a empregadores que contratam mão de obra migrante, em alguns casos de regiões muito distantes, geográfica e culturalmente. As circunstâncias de vida destes trabalhadores e caraterísticas socio/económico/culturais serão certamente muito diferentes da generalidade dos funcionários portugueses, pelo que surgiu a necessidade de pesquisar o tema. Pretende-se com esta revisão resumir o que mais relevante se publicou neste contexto.

Metodologia

Trata-se de uma Revisão Bibliográfica, iniciada através de uma pesquisa realizada em setembro de 2021, nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP.

Conteúdo

Na generalidade, os migrantes ficam com os empregos "3-D": "dirty, demanding e dangerous" e/ou até “degrading”. Ou seja, com piores condições de trabalho; normalmente são postos que exigem menos habilitações e têm mais fatores de risco. Por norma não exercem nos setores da educação ou administração, mas sim agricultura, construção e indústria. Contudo, trabalhadores Migrantes também apresentam geralmente maiores riscos ocupacionais, devido a comportamentos inseguros, nomeadamente associados à utilização de Equipamentos de Proteção Individual, sobretudo em empresas de pequena e média dimensão; devido ao menor nível cultural, geralmente os migrantes tem menor perceção de risco e piores comportamentos de segurança. O tempo que o migrante está na instituição não parece influenciar a perceção de risco; por sua vez, o tempo de permanência no país já o consegue fazer. Ela também é modulada pelo clima de segurança, liderança, carga de trabalho, conhecimentos e formação em segurança; bem como personalidade, atitude e experiência prévia (acidentes, morbilidade).

É possível que a pandemia por COVID19 permita que os empregadores e instituições fiscalizadoras fiquem mais atentos à melhoria de alguns parâmetros nas condições de trabalho.

O sexo masculino parece estar menos disponível para participar em atividades de educação e promoção para a saúde, ter piores conhecimentos a esse nível e maior aceitação do risco. Contudo, migrantes do sexo feminino parecem necessitar mais de cuidados médicos, mas têm menor acesso, mesmo com patologia crónica.

Indivíduos com problemas de comunicação frequentam menos os serviços de saúde e apresentam menor adesão às terapêuticas propostas. A presença de um intérprete ajuda muito, mas nem sempre é possível.

Discussão e Conclusões

O desenvolvimento de um serviço de Saúde Ocupacional que consiga adaptar-se às particularidades dos migrantes avaliados terá maior probabilidade de ter uma melhor eficiência e desempenho, trazendo vantagens para os trabalhadores, chefias e empregadores. Para além disso, generalizando, estes indivíduos geralmente aceitam com mais facilidade piores condições de trabalho, tarefas com riscos mais elevados e sentem menos necessidade e/ou capacidade para exigir os seus direitos laborais, pelo que os acidentes laborais e doenças profissionais também serão mais prevalentes e/ou graves.

Seria relevante estimar o número de migrantes a exercer em Portugal, qual a sua origem e outras caraterísticas sociodemográficas, bem como eventuais correlações com diversos parâmetros da Saúde Ocupacional.

Palavras-chave: migrantes; saúde ocupacional; segurança no trabalho e medicina do trabalho

ABSTRACT

Introduction/framework/objectives

Occupational Health services are sometimes provided to employers who hire migrant labor, in some cases from very distant regions, geographically and culturally. The life circumstances of these workers and socio/economic/cultural characteristics will certainly be very different from the generality of Portuguese employees. The aim of this review is to summarize what was most relevant was published in this context.

Methodology

This is a Bibliographic Review, initiated through a research carried out in September 2021, in the databases “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina and RCAAP”.

Contents

In general, migrants are left with "3-D" jobs: "dirty, demanding and dangerous" and/or even "degrading"- that is, with worse working conditions; they have usually jobs that require fewer qualifications and have more risk factors. As a rule, they do not work in the education or administration sectors, but rather in agriculture, construction and industry. However, Migrant workers also generally present greater occupational risks, due to unsafe behavior, namely associated with the use of Personal Protective Equipment, especially in small and medium-sized companies; due to the lower cultural level, migrants generally have a lower perception of risk and worse security behaviors. The time that the migrant has been with the institution does not seem to influence the perception of risk; in turn, the length of stay in the country is already able to do so. It is also modulated by safety climate, leadership, workload, safety knowledge and training; as well as personality, attitude and previous experience (accidents, morbidity).

It is possible that the COVID19 pandemic will allow employers and supervisory institutions to be more attentive to the improvement of some parameters in working conditions.

Males seem to be less available to participate in health education and promotion activities, have worse knowledge at this level and greater acceptance of risk. However, female migrants seem to need more medical care but have less access, even with chronic pathology.

Individuals with communication problems attend health services less often and have lower adherence to proposed therapies. The presence of an interpreter helps a lot, but it is not always possible.

Discussion and Conclusions

The development of an Occupational Health service that can adapt to the particularities of the assessed migrants will be more likely to have better efficiency and performance, bringing benefits to workers, managers and employers. In addition, these individuals generally accept worse working conditions more easily, tasks with higher risks and feel less need and/or capacity to demand their labor rights, so occupational accidents and occupational diseases will also be more prevalent and/or serious.

It would be relevant to estimate the number of migrants to work in Portugal, their origin and other sociodemographic characteristics, as well as possible correlations with various parameters of Occupational Health.

Keywords: migrants; occupational health; occupational safety and occupational medicine

INTRODUÇÃO

Por vezes prestam-se serviços de Saúde Ocupacional a empregadores que contratam mão de obra migrante, em alguns casos de regiões muito distantes, geográfica e culturalmente. As circunstâncias de vida destes trabalhadores e caraterísticas socio/económico/culturais serão certamente muito diferentes da generalidade dos funcionários portugueses, pelo que surgiu a necessidade de pesquisar o tema. Pretende-se com esta revisão resumir o que mais relevante se publicou neste contexto.

METODOLOGIA

Em função da metodologia PIC o, foram considerados:

-P (population): trabalhadores a exercer num país diferente daquele em que nasceram

-I (interest): reunir conhecimentos relevantes sobre as eventuais particularidades da Saúde Ocupacional destes indivíduos

-C (context): saúde ocupacional nas empresas com postos de trabalho ocupados por migrantes

Assim, a pergunta protocolar será: Que particularidades poderão existir nos parâmetros relevantes da Saúde Ocupacional em trabalhadores estrangeiros?

Foi realizada uma pesquisa em setembro de 2021 nas bases de dados “CINALH plus with full text, Medline with full text, Database of Abstracts of Reviews of Effects, Cochrane Central Register of Controlled Trials, Cochrane Database of Systematic Reviews, Cochrane Methodology Register, Nursing and Allied Health Collection: comprehensive, MedicLatina e RCAAP”.

No quadro 1 podem ser consultadas as palavras-chave utilizadas nas bases de dados.

Quadro 1 Pesquisa efetuada 

INTRODUÇÃO

Os migrantes geralmente contribuem para o desenvolvimento económico do país onde trabalham (1). Aliás, algumas zonas/setores profissionais estão dependentes do trabalho proporcionado pelos migrantes (2-7); ainda que os postos, por vezes, possam ser sazonais (3).

Países mais pobres dependem das receitas enviadas pelos migrantes (como é o caso do Nepal, Libéria, Haiti e o Tajiquistão), por vezes gerando quantias superiores às utilizadas por Organizações Não Governamentais nesses mesmos países (8).

Estatísticas associados aos Trabalhadores Migrantes

Um artigo publicado em 2017 estimou que existiam cerca de 232 milhões de migrantes a nível mundial (8). Em 2019, esse número subiu para cerca de 272 milhões, ou seja, quase 11% da população mundial (9). Simultaneamente, há estimativas de que aproximadamente 1/7 da população mundial vive noutro sítio diferente daquele onde nasceu e esse valor continua a aumentar, ou seja, 173 milhões em 2000 e 258 milhões em 2017 (10), segundo outros autores.

A ILO (International Labour Organization), por sua vez, divulgou que existiam cerca de 164 milhões de trabalhadores migrantes no mundo (com quase 96 milhões pertencentes ao sexo masculino), podendo estes constituir cerca de 10% da população em quase 53% dos países (como é o caso de Itália e Espanha) (11). Noutro artigo mencionou-se que essa mesma organização quantificou a existência de cerca de 150 milhões de migrantes, a maioria deles a exercer na América do Norte e Europa; é de realçar que neste último continente o número de migrantes aumentou cerca de 50% na última década, estimando-se que também constituam, aproximadamente, 10% da população europeia (12).

Em 2016, cerca de 71% ficou no setor dos serviços (incluindo 8% atividades domésticas), 18% na indústria e construção e 11% na agricultura (8).

Em determinados contextos, 10% dos migrantes são menores não acompanhados, cujo apoio social se torna ainda mais rudimentar e poderá tornar a experiência ainda mais stressante (13).

Condições gerais de Trabalho

Na generalidade, os migrantes ficam com os empregos "3-D": "dirty, demanding e dangerous" (8) (11) (14) e/ou “degrading” (11). Ou seja, com piores condições de trabalho (5) (9) (12) (15) (16); normalmente são postos que exigem menos habilitações, têm mais fatores de risco e ainda são alvo de alguma discriminação no local de trabalho (11). Por norma não exercem nos setores da educação ou administração, mas sim agricultura, construção e indústria (15). Por vezes, o sexo feminino fica em situação ainda pior (9) (17), devido aos setores a que se dedicam com maior prevalência, nomeadamente serviços domésticos e como cuidadoras (9) (limpeza de casas/hotéis e apoio a crianças) ou até na “indústria” do sexo (15). Para além de os postos serem genericamente mais complicados (14) (17), geralmente são também mais inseguros em relação ao vínculo e continuidade (14). Os postos são também mais instáveis, com menores salários, com lacunas na formação, pior acesso a cuidados médicos e piores condições de segurança (17). Por vezes, não há vínculo laboral e/ou a duração das tarefas é por pouco tempo ou até são pagos ao dia (2).

Contudo, trabalhadores Migrantes também apresentam geralmente maiores riscos ocupacionais, devido a comportamentos inseguros, nomeadamente associados à utilização de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual), sobretudo em empresas de pequena e média dimensão; devido ao menor nível cultural, geralmente têm menor perceção de risco e piores comportamentos de segurança (2) (18). O tempo que o migrante está na instituição não parece influenciar a perceção de risco; por sua vez, o tempo de permanência no país já o consegue fazer. Ela também é modulada pelo clima de segurança, liderança, carga de trabalho, conhecimentos e formação em segurança; bem como personalidade, atitude e experiência prévia (acidentes, morbilidade) (19).

A grande maioria não tem consulta de Saúde Ocupacional, nem reporta acidentes laborais, devido ao receio de perder o emprego (9).

Para além disso, por vezes, as habitações onde residem não têm condições e, em alguns casos, podem ser alvo de maus-tratos físicos (8).

O facto de não falarem o idioma do país onde trabalham e/ou não estarem em situação legalizada poderá alterar o acesso a alguns postos de trabalho, mantendo-se disponíveis outros, com piores condições (2). Para além disso, não conhecendo o idioma do país onde trabalha, algumas mensagens escritas relativas à segurança poderão não ser assimiladas; por vezes, quando são utilizados pictogramas/símbolos, também se poderá perder parte da informação, até devido a diferenças culturais e educacionais, idade e/ou da experiência de vida; pelo que a redefinição dos desenhos talvez devesse ser analisada (20).

Ainda assim, é possível que a pandemia por COVID19 permita que os empregadores e instituições fiscalizadoras fiquem mais atentos à melhoria de alguns parâmetros nas condições de trabalho (2).

Por vezes os filhos menores dos migrantes também executam tarefas laborais ou ficam na proximidade dos pais, mesmo em setores com elevada sinistralidade ou até fatalidade (21).

Alguns investigadores avaliaram se a participação nos rituais do Ramadão (ou seja, comer e beber apenas entre o pôr e o nascer do sol, estando em jejum durante o dia) poderiam alterar alguns aspetos da Saúde e Segurança Ocupacionais em migrantes islâmicos, mas concluiu-se que não existiram relações estatisticamente significativas. De acrescentar que, em alguns países, as datas podem coincidir com os dias mais longos do ano e/ou mais quentes, ou seja, conjuga o jejum com a desidratação, podendo prejudicar a tomada de decisão e potenciar o erro (22).

Sinistralidade laboral

A taxa de acidentes é geralmente maior nos migrantes (20) (23) e o risco de morte é 20% superior (19). Ou seja, a sinistralidade laboral fatal e não fatal é superior nos migrantes (7). Contudo, quando esta taxa é elevada no país de origem, poderá ocorrer que, emigrando, o risco de acidente na realidade fique atenuado (24), por comparação. Aliás, os postos de trabalho ocupados por trabalhadores migrantes apresentam por si maior sinistralidade (22).

Acesso a cuidados Médicos

Geralmente os migrantes não costumam ter acesso facilitado aos cuidados de saúde do país onde trabalham (8) (25); aliás, se não estiverem legais, não têm qualquer acesso (8); tal pode incentivar a automedicação e à dependência do empregador (2). Se se melhorarem as condições de trabalho, também melhorará o nível de saúde dos migrantes. Ainda que o objetivo seja obter um melhor patamar económico, poderá acontecer que tal não seja atingido, acrescentando-se problemas físicos, emocionais e sociais (8) (9). A semiologia mais frequente poderá incidir no stress, depressão, alterações do sono, mialgias, cefaleias e gastralgias (9); apresentam, também, maiores prevalências de síndroma depressivo, ansiedade, dependência, alterações do sono e burnout (14). Está descrito que os principais problemas médicos são as patologias músculo-esqueléticas; contudo, eventualmente, alguns investigadores mencionam que os problemas de saúde mental podem ser sub-reportados (mais frequentes com determinados estados civis, rigidez do empregador, residência com más condições e preocupações legais) (26).

Por vezes, o local onde estão alojados não apresenta condições adequadas de salubridade e/ou a alimentação também não é adequada.

Apesar de as patologias serem razoavelmente frequentes, a procura por cuidados médicos é baixa, eventualmente devido a barreiras linguísticas. Por vezes, tal também se relaciona com o facto de não terem acesso a seguros, sobretudo em países com sistema de saúde mais privatizado ou sem sistema de saúde nacional e tendencialmente gratuito (4). Ainda assim, a procura destes serviços e o nível geral de saúde em migrantes é superior entre os que estão acompanhados pela família (23) e nos que têm mais idade (25).

O sexo masculino parece estar menos disponível para participar em atividades de educação e promoção para a saúde, por isso tem piores conhecimentos a esse nível e maior aceitação do risco (21). Contudo, migrantes do sexo feminino parecem necessitar mais de cuidados médicos, mas têm menos acesso, mesmo com patologia crónica (25).

Indivíduos com problemas de comunicação frequentam menos os serviços de saúde e apresentam menor adesão às terapêuticas propostas. A presença de um intérprete ajuda muito, mas nem sempre é possível; com maior probabilidade sentem-se discriminados quando existem barreiras linguísticas (25).

Principais barreiras para a melhoria das condições

O facto de estarem ilegais, pode impossibilitar o acesso a serviços médicos e aos direitos laborais básicos; pode também existir medo de ser despedido, ficar sem salário e/ou ser deportado. Outra barreira, como já se mencionou, poderá ser o idioma (6) (13). Esta pode ser significativa em contexto de saúde e segurança; pois a linguagem não só ajuda a socializar, como a criar laços e facilita a argumentação; logo, tal irá perturbar muito a comunicação a nível de questões laborais, necessidades e desejos (27). Devido às barreiras linguísticas e culturais (11) (14), geralmente ocupam postos manuais, menos qualificados, precários e pior pagos, recusados na maioria das vezes pelos trabalhadores nacionais (11); tendo em conta essas caraterísticas, fica pior a questão da sinistralidade e doenças físicas e emocionais (14) (28); situação essa eventualmente agravada pela mobilidade constante (28).

Poderão também existir ausência de formação/treino profissional, pouca valorização da segurança, pobreza e isolamento cultural. Tal irá perturbar o desenvolvimento do trabalhador e aumentar a probabilidade de lesão, baixos salários, doença, abuso e violência (13).

A não validação das habilitações também poderá fazer com que tenham acesso a postos de trabalho mais complicados (com mais riscos) e, com maior probabilidade, serão alvo de discriminação/bulling (12) (14).

Redes organizadas de Trabalho Migrante

Por vezes, existem redes organizadas para a exploração dos migrantes (3). Tráfico laboral ou trabalho forçado poderá ser considerado como uma forma moderna de escravatura, na qual o indivíduo é colocado a exercer tarefas, através da força, fraude, coerção ou algum tipo de chantagem/ameaça (29). Por vezes, algumas redes de recrutamento exigem o pagamento de quantias avultadas para ter acesso ao posto de trabalho, valor esse obtido pelos migrantes através de um empréstimo no seu país ou ficando a dever à própria rede/empregador, por vezes demorando anos a conseguir liquidar, o que obviamente pode originar ansiedade (5).

DISCUSSÃO/ CONCLUSÃO

O desenvolvimento de um serviço de Saúde Ocupacional que consiga se adaptar às particularidades dos migrantes avaliados terá maior probabilidade de ter uma melhor eficiência e desempenho, trazendo vantagens para os trabalhadores, chefias e empregadores. Para além disso, generalizando, estes indivíduos aceitam com mais facilidade piores condições de trabalho, tarefas com riscos mais elevados e sentem menos necessidade e/ou capacidade para exigir os seus direitos laborais, pelo que os acidentes laborais e doenças profissionais também serão mais prevalentes e/ou graves.

Seria relevante estimar o número de migrantes a exercer em Portugal, qual a sua origem e outras caraterísticas sociodemográficas, bem como eventuais correlações com diversos parâmetros da Saúde Ocupacional.

AGRADECIMENTOS

Nada a declarar.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Recebido: 10 de Outubro de 2021; Aceito: 14 de Outubro de 2021; Publicado: 16 de Outubro de 2021

CONFLITOS DE INTERESSE, QUESTÕES ÉTICAS E/OU LEGAIS

Nada a declarar.

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