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Revista Internacional CONSINTER de Direito - Publicação Oficial do Conselho Internacional de Estudos Contemporâneos em Pós-Graduação

Print version ISSN 2183-6396On-line version ISSN 2183-9522

Revista Internacional CONSINTER de Direito  no.16 Vila Nova de Gaia June 2023  Epub Dec 01, 2023

https://doi.org/10.19135/revista.consinter.00016.20 

Articles

ODR’S EM CONFLITOS DE CONSUMO: O CONSUMIDOR.GOV.BR PRECISA DE UM NUDGE?

ODR’S FOR CONSUMERS CONFLICTS: DOES CONSUMIDOR.GOV.BR NEED A NUDGE?

Antônio César Bochenek1a 
http://orcid.org/0000-0001-6173-9368

Salomão Akhnaton Zoroastro Spencer Elesbon2b 
http://orcid.org/0000-0002-0496-3168

a Universidade de Coimbra, Coimbra, Portugal

b Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM, Brazil


Resumo:

Este artigo objetiva estudar o “Consumidor.gov.br”, plataforma pública on-line de resolução de disputas (ODR), e o seu potencial como instrumento preventivo das lides de consumo. Parte-se da hipótese de que a expansão do serviço no Brasil ainda não cumpriu o desiderato de refrear a judicialização excessiva e de que ajustes são necessários para ultimar esse escopo. São examinados os dados de utilização da plataforma, em contraste com as informações sobre distribuição processual. À luz da doutrina sobre vieses, heurísticas e “nudges”, propõe-se a utilização de estímulos comportamentais não cogentes para maximizar a adoção da plataforma e a sua eficácia resolutiva. Alternativamente, examinam-se possíveis interações entre as plataformas de ODR e o processo judicial, que poderiam servir ao mesmo objetivo dissuasório da judicialização exacerbada.

Palavras-chave: Consumidor.gov.br; resolução de disputas on-line; nudges.

Abstract:

This article aims to study “Consumidor.gov.br”, a public online dispute resolution (ODR) platform, and its potential as a preventive instrument for consumer disputes. It starts from the hypothesis that the expansion of the service in Brazil has not yet fulfilled the desideratum of restraining excessive judicialization and that adjustments are necessary to achieve this scope. Platform usage data is examined, in contrast to information on procedural distribution. In the light of the doctrine on biases, heuristics and nudges, it is proposed to use non-cogent behavioral stimuli to maximize the adoption of the platform and its resolute effectiveness. Alternatively, possible interactions between ODR platforms and the judicial process are examined, which could serve the same deterrent objective on exacerbated judicialization.

Keywords: Consumidor.gov.br; on-line dispute resolution; nudges.

Sumário: 1. Introdução; 2. Online Dispute Resolution (ODR) - noções gerais; 3. Consumidor.gov.br; 4. Vieses e nudges; 5. Desenho de nudges visando o incentivo à autocomposição; 6. Considerações finais. 7. Referências.

Summary: 1. Introduction; 2. Online Dispute Resolution (ODR) - general notions; 3. Consumidor.gov.br; 4. Biases and nudges; 5. Designing nudges to encourage self-composition; 6. Final considerations. 7. References.

1 INTRODUÇÃO

Os meios alternativos e autocompositivos de resolução de disputas (ADRs) são frequentemente referidos como instrumentos necessários para reduzir o volume de processos ajuizados e, por consequência, em tramitação no Poder Judiciário brasileiro. Em função disso, tem recebido na última década especial atenção do Conselho Nacional de Justiça, que formulou a política nacional de solução adequada de conflitos e estabeleceu a autocomposição e prevenção de demandas como macrodesafio do Poder Judiciário (Conselho Nacional de Justiça, 2020).

Concomitantemente, a utilização de soluções tecnológicas para facilitar a comunicação, prevenir e solucionar conflitos no ambiente virtual desperta como ponto de alavancagem3 para a superação de problemas sistêmicos de litigiosidade, dada a rapidez, conveniência e custos mais atraentes. No tocante às demandas consumeristas, que representam parcela considerável do acervo processual4, alternativa nacional exaltada pelo Poder Público e pelos estudiosos do tema é o “Consumidor.gov.br”, mantido pela Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor - SENACON.

O objetivo deste artigo consiste em estudar o “Consumidor.gov.br”, como plataforma on-line de resolução de disputas (ODR), e as estratégias que poderiam ser adotadas para fomentar a utilização dessa e de outras plataformas autocompositivas, com o escopo de prevenir o ajuizamento excessivo de demandas.

Parte-se da hipótese de que a plataforma, embora se encontre em franca expansão, ainda não realizou inteiramente o seu potencial preventivo da judicialização consumerista, o que poderia ser auxiliado pela utilização de mecanismos não cogentes de indução de comportamentos.

A metodologia da pesquisa envolveu a consulta aos bancos de dados, painéis estatísticos e publicações de pesquisas empíricas sobre o objeto de estudo, os quais foram analisados à luz do conceito de “nudge”, conforme propugnado pelos trabalhos de economia comportamental de Richard Thaler, Cass Sunstein e outros.

São propostas, ao fim, adequações na plataforma “Consumidor.gov.br”, nos portais institucionais dos Tribunais de Justiça e nos serviços de atendimento ao consumidor, e sugeridas mudanças no modo como o processo judicial e as plataformas de ODR interagem, com o fito de otimizar a adoção das vias extrajudiciais, alternativamente à judicialização dos litígios.

2 ONLINE DISPUTE RESOLUTION (ODR) - NOÇÕES GERAIS

O campo da resolução alternativa de disputas (ADR)5 abrange, dentre outros, os “processos de negociação, de mediação e de arbitragem fora do âmbito do sistema oficial de resolução de disputas que são os tribunais” (Bacellar, 2020, p. 206). Os meios adequados de solução de conflitos, a que se referem a sigla ADR, podem ou não envolver a participação de terceiros neutros, como igualmente desenrolar-se de modo consensual (negociação, mediação e conciliação) ou adversarial (arbitragem). A qualidade de “alternativas ao sistema oficial” advém exatamente da circunstância de que surgiram para serem aplicadas idealmente fora dos juízos, considerados estes em seu sentido amplo (Ibidem, p. 205).

Katsh e Rule (2016, p. 329) conceituam a Online Dispute Resolution (ODR) como “a aplicação da tecnologia da informação e da comunicação na prevenção, no gerenciamento e na resolução de disputas”. A origem desses instrumentos está historicamente associada à ascensão do comércio eletrônico e à necessidade de proporcionar respostas rápidas às querelas surgidas no bojo das milhões de transações comerciais concretizadas via internet6.

Becker e Feigelson (2020) relatam que as ODRs foram inicialmente desenhadas de modo a mimetizar no ambiente online as características das ADRs7, remontando suas origens aos trabalhos seminais de Ethan Katsh e Janet Rifkin, durante a década de 1990. No entanto, a noção de ODR não se cinge mais a reproduzir no ambiente informatizado as técnicas usuais de resolução alternativa de disputas8.

Os avanços tecnológicos permitiram transcender os limites das ADRs preexistentes e isso já tem impactado sobre os princípios que tradicionalmente as norteiam. Ponto notável de divergência entre os modelos tradicionais de ADR e as modernas ODRs diz respeito à confidencialidade9. Embora o teor preciso de cada negociação possa ficar restrito ao domínio dos negociantes, fato é que os dados das ODRs tendem cada vez mais a serem coletados, consolidados e examinados, produzindo-se estatísticas e modelos preditivos capazes de orientar o comportamento dos envolvidos em negociações ulteriores. A tal ponto que, mais recentemente, a inteligência artificial e outros mecanismos de tratamento de dados em massa, vem assomando como alternativa à própria participação dos terceiros neutros (Vasconcelos, Carnaúba, 2020). A tecnologia, nesse novo cenário, passa a atuar como “quarta parte”, auxiliando ou substituindo o terceiro humano10. Trata-se, talvez, de uma de suas maiores potencialidades11.

Os dados associados aos conflitos nas principais plataformas de e-commerce são o testemunho do seu gigantismo e da imprescindibilidade dos novos canais de resolução de litígios. Colin Rule (2017, p. 354) relata os impressionantes números alcançados pelo e-Bay, em sua iniciativa pioneira, que lidava em 2017 com cerca de 60 milhões de disputas por ano. Estima-se que de 3% a 5% de todas as transações de comércio eletrônico ocasionam disputas, número que pode ser ainda maior nos sites que não apresentam sistemas de reputação. Isso representaria algo em torno de 700 milhões a 1 bilhão de disputas anuais, por volta de 2017 (KATSH, RULE, 2016, p. 333-334).

O primeiro desafio para gerir o volume colossal de disputas no eBay, foi a necessidade de automatização. Segundo Rule (2017, p. 356-357), nem mesmo uma equipe com mais de mil habilidosos mediadores on-line seria capaz de administrar as dezenas de milhões de casos! Para tanto, utilizando o conceito da tecnologia como “quarta parte”, o sistema foi desenhado para auxiliar as partes na resolução de disputas, de modo a que os terceiros neutros atuassem apenas de modo excepcional.

Guardadas as devidas proporções, números similares foram divulgados no cenário nacional pelo Mercado Livre12, suscitando grande otimismo em relação ao potencial preventivo dessas plataformas.

Cueva (2021) registra o potencial das ODRs para a consecução de dois grandes desafios: “enfrentar a crescente judicialização dos conflitos de todo tipo e, ao mesmo tempo, reduzir os obstáculos ao acesso à justiça”, de modo a “ampliar o acesso a soluções justas e céleres”. E Bochenek (2013, p. 508) ressalta que o estímulo a outros meios adequados de resolução de conflitos, mitigando o monopólio estatal da jurisdição, é um dos aspectos primordiais da nova roupagem do acesso à justiça e aos direitos.

São comumente apontadas como vantagens das ODRs a desburocratização, redução de custos, celeridade e eficiência13. Mas também são destacadas desvantagens, tal como ficarem ainda restritas a controvérsias mais simples e a parâmetros pré-definidos (BECKER, FEIGELSON, 2020). Dentre todos esses aspectos, porém, a conveniência e a celeridade sobressaem.

O eBay analisou o comportamento de centenas de milhares de usuários que passaram por resolução de disputas na plataforma, mensurando sua satisfação a partir do valor das transações realizadas nos três meses anteriores e posteriores à experiência com ODR. O estudo confirmou a hipótese de que os que se sagraram vencedores na disputa aumentariam sua atividade na plataforma. No entanto, de forma contraintuitiva, o mesmo se passou com os perdedores. Conforme relatam Katsh e Rule (2016, p. 334-335), a grande descoberta foi que os únicos compradores que reduziram sua atividade após deflagrarem sua primeira disputa, foram aqueles cujo processo demorou mais tempo, acima de seis semanas14. A celeridade na resolução da disputa foi, portanto, o principal indutor do comportamento dos usuários, superando a percepção da “justiça” da decisão.

A rigor, com a extensão das ODRs para os espaços públicos de resolução de conflitos, a própria definição dessas plataformas deve ser ampliada, para abranger as cortes digitais (SURIANI, 2020). Nesse sentido, Vasconcelos e Carnaúba (2020) ressaltam que:

(...) a utilização da ODR, entendida como técnica de resolução de conflitos, é útil a todas as portas do sistema multiportas: processo judicial, arbitragem, mediação, conciliação, jury trials, ombudsmen etc. E isso, justamente, porque todos os meios de solução de controvérsias devem objetivar a consecução da tutela jurisdicional mais adequada possível, que só será alcançada se houver algum grau de flexibilidade procedimental que permita sua adaptabilidade ao conflito que pretende resolver.

Não se trata, portanto, de simplesmente transportar para o mundo digital o que já se desenvolvera no ambiente “off-line”, mas de criar um novo paradigma15.

3 CONSUMIDOR.GOV.BR

No Brasil, o “Consumidor.gov.br” surge de iniciativa da Secretaria Nacional de Defesa do Consumidor, do Ministério da Justiça. Trata-se de plataforma on-line de negociação não assistida, assíncrona, cujos dados possibilitam organizar um ranking, observando-se o comportamento dos fornecedores. Os consumidores podem, ao final do período dedicado à negociação, classificar a questão como resolvida ou não resolvida e atribuir nota de satisfação16. Os painéis estatísticos informam os respectivos percentuais de resolução, além do tempo médio despendido, grau de satisfação, dentre outros parâmetros (ELESBON, 2022, p. 182).

Não se cuida propriamente de procedimento administrativo, já que não há intervenção de agentes públicos, e não se exclui a possibilidade de o consumidor acessar outros órgãos do sistema de proteção, a exemplo dos Procons e dos Juizados Especiais (Costa, Francisco, 2020). Com informa o próprio site: “A principal inovação do Consumidor.gov.br está em possibilitar um contato direto entre consumidores e empresas, em um ambiente totalmente público e transparente17.

Os dados divulgados pelo portal “Consumidor.gov.br” demonstram a rápida expansão do serviço, desde o seu lançamento. O painel estatístico da plataforma informava 609.644 reclamações finalizadas no ano de 2018, com índice médio de solução de 81,03% em 6 dias. Em 2019, foram 780.179 queixas, com 80,71% de solução e tempo médio de resposta de 7 dias. 2020 apresentou crescimento substancial, para 1.196.625 reclamações finalizadas, no tempo médio de 9 dias e com 78,34% de resolutividade. Os dados de 2021 relacionavam 1.434.101 reclamações finalizadas, com 78,49% de solução em 7 dias. No total, até a data pesquisada, de 05/01/2022, mais de cinco milhões de reclamações já haviam sido finalizadas no “Consumidor.gov.br” desde a sua implantação18.

Feita a intersecção entre os dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ, 2018) e do “Consumidor.gov.br”, fica claro que os maiores litigantes consumeristas se perfilam em segmentos bem determinados e que estão majoritariamente representados na plataforma extrajudicial.

Mais recentemente, o governo Federal tornou a plataforma obrigatória para a resolução de lides que envolvam os órgãos e entidades da administração direta e indireta19. Por sua vez, o Conselho Nacional de Justiça firmou acordo de cooperação técnica com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, objetivando incrementar o uso de métodos autocompositivos on-line para conflitos de consumo, abrangendo a integração da plataforma Consumidor.gov ao Processo Judicial Eletrônico (PJe) (BRASIL, 2019).

Os números são promissores, tanto em número de queixas apresentadas, quanto no percentual de respostas e nos índices de satisfação. Trata-se de canal público, a princípio isento de influências dos fornecedores ali demandados, o custo de sua utilização é baixíssimo, praticamente zero (considerando a disponibilidade de acesso à internet pelo consumidor) e o prazo de resposta, bastante razoável.

No entanto, paralelamente a esse crescimento, as lides de consumo apresentadas em juízo não refrearam. A distribuição processual continua elevada e, feito recorte mais específico, a proporção de ações consumeristas representa significativa parcela das demandas20.

A questão que se coloca, portanto, é que, a despeito de as plataformas extrajudiciais (e, em particular, o “Consumidor.gov.br”) serem de acesso fácil e ágil e demonstrarem resultados satisfatórios, elas ainda não ocasionaram diminuição na distribuição de demandas em juízo. O que nos leva a indagar se não seriam necessários incentivos adicionais para que os consumidores busquem as plataformas extrajudiciais como primeira opção para resolverem suas querelas.

Katsh e Rule sustentam que sistemas de ODR, como qualquer outra tecnologia que se pretenda bem-sucedida, devem observar um triângulo cujos lados representam a conveniência, perícia (expertise) e confiança (Katsh, Rule, 2016, p. 331). Permitindo a comunicação assíncrona e não presencial, longe dos fóruns, tribunais e instalações administrativas dos Procons, o “Consumidor.gov” fornece economia de dinheiro21 e tempo, logo, atende à conveniência.

No entanto, o sistema do “Consumidor.gov.br” ainda não incorpora nenhuma aplicação que possa ser relacionada a ideia de “quarta parte” e que proporcione ganhos qualitativos aos envolvidos. O sistema oferece ambiente de negociação on-line, sem qualquer tipo de assistência mais sofisticada (ELESBON, 2022, p. 182-183).

O “Consumidor.gov.br” opera como sistema de reputação, ranqueando os fornecedores, conforme a sua disposição em oferecer soluções céleres na plataforma22. Em tese, os dados disponíveis permitiriam ao usuário consumidor antecipar as chances de êxito e o tempo a ser despendido, mas isso depende exclusivamente de seu discernimento e de outros fatores externos (Costa, Francisco, 2020). Não há, portanto, ênfase no lado da “expertise” do triângulo de Katsh e Rule.

Sob o aspecto da confiança, o avanço da plataforma sugere que se encontra no caminho para conquistá-la. Crítica que se faz pertinente, no entanto, diz respeito à metodologia empregada para divulgação dos resultados positivos, que pode gerar viés favorável à percepção de resolutividade. Afinal, se o consumidor deixa de avaliar o resultado em determinada janela de tempo, automaticamente a questão é considerada resolvida, presumindo, portanto, resultado positivo (Figueiredo, 2020).

Quanto à desjudicialização, ainda não há dados que permitam conectar a saída da plataforma e o ajuizamento ulterior de demandas, de modo que não se pode descartar a possibilidade de que, mesmo registrada a questão como resolvida, por “default”, os consumidores tenham posteriormente se socorrido de demanda judicial.

Modelagem futura da plataforma “Consumidor.gov” talvez devesse cogitar da participação mais ativa, ainda que opcional, dos advogados23. Em primeiro lugar, porque isso permitiria mensurar a conduta desse importante ator nas vias extrajudiciais24. Confirmando ou rechaçando a visão de que a advocacia estaria em oposição à autocomposição25. Em segundo lugar, porque asseguraria maior proteção ao consumidor26, de modo a atenuar as assimetrias informativas que existem na relação de negociação direta com o fornecedor, litigante habitual (ELESBON, 2022, p. 183)27.

Conclui-se, portanto, que o serviço está em trajetória de expansão, mas que essa pode ser auxiliada por estratégias públicas de incentivo, particularmente no campo da desjudicialização. De igual modo, são possíveis aperfeiçoamentos na própria plataforma, a fim de que se alcance a plenitude da proteção aos interesses do consumidor.

4 VIESES E NUDGES

Vasconcelos e Carnaúba (2020), abordando o sistema multiportas sob a ótica da análise econômica do direito, sustentam que, ao se apresentarem ao particular diversas portas alternativas aptas em tese a solucionar o seu conflito, dele seria exigida a escolha sobre qual delas utilizar. Pressupondo tratar-se de sujeito racional, a opção recairia na de menor preço ou, mais precisamente, com os “menores custos de transação incorridos para a resolução da disputa”.

Thaler e Sunstein (2019), no entanto, salientam que o ser humano real não opera como hipotético “homo economicus”, estando sujeito a todo tipo de heurísticas, vieses e, por conseguinte, a influências sutis sobre o seu comportamento28. Tabak e Amaral (2018, p. 474-477) esclarecem:

O termo “viés” pode ser entendido como qualquer dinâmica cognitiva que leva os indivíduos a processarem as informações de uma maneira que sistematicamente tenha o potencial de frustrar o alcance de seus objetivos. (...) Para tomar uma decisão racional, maximizando os retornos possíveis, o indivíduo deve considerar uma grande quantidade de informações e relacioná-las sistematicamente, utilizando a racionalidade humana, que possui limitações. Por isso, é bastante comum o uso de atalhos mentais, chamados heurística, para se chegar a decisões de qualidade, de forma mais prática e com melhor custo-benefício. (...) Em determinadas circunstâncias, no entanto, o emprego da heurística pode produzir armadilhas, como levar um indivíduo a aceitar como verdadeira uma proposição simplesmente por ser de mais fácil compreensão.

Dentre os vieses mais significativos, podem-se elencar o viés de confirmação, de disponibilidade, de ancoragem e de enquadramento. Também são relevantes para o escopo deste trabalho os vieses de manutenção do status quo, de retrospectiva, de excesso de confiança e de desconto hiperbólico (TABAK, AMARAL, 2018, p. 477-482)

Essas propensões podem ser exploradas por arquitetos de escolhas29 no âmbito de políticas públicas, visando, por exemplo, a influenciar a maior inclinação dos consumidores à escolha de canais menos onerosos e mais adequados à proteção de seus interesses. Para tanto, “nudges” podem ser adotados (ELESBON, 2022, p. 69-70).

Sunstein (2014, p. 1) define os “nudges” como abordagens que orientam as pessoas a direções particulares, mas que também lhes permitem seguir seus próprios caminhos, preservando, assim, sua liberdade de escolha30. São exemplos de “nudges” mencionados pelo autor: GPS; aplicativo que informa a quantidade de calorias consumidas; mensagem de texto avisando do iminente vencimento de uma conta; inclusão automática em planos de aposentadoria; configurações padrão em computadores e celulares; advertências em embalagens de cigarros e informações nutricionais nas de alimentos.

O interesse crescente nos “nudges”, segundo Sunstein (2014, p. 2), provém do fato de que eles preservam a liberdade e em geral envolvem custos baixos (ou nenhum custo), e mesmo assim podem apresentar resultados imediatos, altamente efetivos e, em certos casos, com impacto maior do que os meios coercitivos.

Sunstein (2014, p. 3-6, passim) relaciona dez categorias de nudges, por ele consideradas as mais importantes para o escopo de políticas públicas: as regras-padrão (e escolhas ativas), a simplificação, o uso de normas sociais, o aumento de facilidade e conveniência, a transparência, as advertências (visuais ou de outra natureza)31, as estratégias de comprometimento prévio, os lembretes, a indagação sobre intenções futuras (objetivos de implementação) e a informação sobre a natureza e consequências de escolhas passadas (feedback).

Pesquisa realizada pela FGV, sobre a confiança no Poder Judiciário, concluiu que dentre as matérias que mais provavelmente levariam o cidadão a demandar em juízo estavam as questões relativas a bens de consumo de elevado valor. O Relatório ICJ Brasil 2021 sublinha, de um lado, a má avaliação do Judiciário no tocante à morosidade, custo e dificuldade de acesso. Mas de outro, denota a alta disposição para resolver conflitos na Justiça (Ramos, 2021).

Disso advém a relevância dos “nudges” para o campo ora debatido, das ODRs e, particularmente, do uso ampliado do “Consumidor.gov.br” como alternativa à judicialização das questões consumeristas. Nas palavras de Tabak e Amaral (2018, p. 484):

(...) o governo poderia, sem adotar qualquer ação coercitiva, auxiliar as pessoas a tomarem a melhor decisão social, com base em um desenho de políticas que efetivamente ajudem os indivíduos a seguirem o melhor caminho dentre as potenciais opções.

O que pode e deve ser realizado de modo transparente e livre de manipulações32.

5 DESENHO DE NUDGES VISANDO O INCENTIVO À AUTOCOMPOSIÇÃO

Alguns dos vieses anteriormente mencionados podem ser neutralizados ou redirecionados por “nudges”, para deles extrair resultados mais positivos no sentido aqui proposto (Elesbon, 2022, p. 71).

Os vieses de excesso de confiança33 e de otimismo34 explicam em parte a tendência à judicialização mesmo em situações em que os benefícios potencialmente alcançáveis são objetivamente menores dos que os esperados na autocomposição (Ibidem).

A recordação de experiências recentes, sejam elas próprias ou resultado da divulgação na mídia sobre casos judicializados, também influi na tomada de decisão, por força do viés de disponibilidade35.

Ambos os vieses podem ser mitigados por “nudges” que envolvam informações claras e adequadas sobre os riscos e benefícios reais envolvidos na escolha sobre a modalidade adequada de resolução do conflito. Expor, por exemplo, de forma clara e objetiva os prazos e os resultados obtidos em cada modalidade de resolução (ELESBON, 2022, p. 72). Destarte, “(...) a avaliação das perspectivas concretas de sucesso pode reduzir dramaticamente o viés de otimismo que normalmente caracteriza os postulantes” (CUEVA, 2021).

Também é oportunidade para fazer operar o poder das “influências sociais”, as normas não declaradas e inconscientes que resultam do comportamento coletivo36. Há a tendência poderosa de se conformar ao padrão social e certas condutas destoantes emergem, por vezes, do desconhecimento ou da percepção equivocada sobre as tendências de comportamento do grupo37 (a chamada “ignorância pluralística”)38:

As influências sociais se agrupam em duas categorias básicas. A primeira envolve informações. Se muitas pessoas fazem ou pensam algo, suas ações e pensamentos transmitem informações sobre o que seria mais conveniente fazer ou pensar. A segunda envolve pressão social. Se você se importa com o que outros pensam a seu respeito (talvez por acreditar, equivocadamente, que eles estejam prestando atenção ao que você faz - (...)), talvez acabe seguindo a multidão para evitar sua ira ou cair nas graças dela. (...) A ideia geral é clara. Se os arquitetos de escolhas querem mudar comportamentos com nudges, podem apenas informar às pessoas o que as outras estão fazendo. Às vezes as práticas alheias são surpreendentes e, por isso, afetam profundamente outras pessoas. (Thaler, Sunstein, 2019, p. 957 e 1181)

Em adendo, é possível trabalhar a aversão à perda39 e a tendência ao desconto hiperbólico40, para suscitar melhor disposição ao acordo no momento presente, em detrimento da suposição de ganho maior (e objetivamente improvável), no futuro. Eventualmente, utilizando ferramentas de inteligência artificial e de jurimetria para alinhar o conhecimento das partes quanto aos riscos e potencialidades da adjudicação.

Em juízo, seria de grande valia que o “Consumidor.gov.br” fosse estipulado como opção padrão. Conforme Thaler e Sunstein:

“(...) muitas pessoas aceitam a opção que exige o menor esforço - seja ela qual for -, ou o caminho de menor resistência. Lembre-se do que foi dito sobre a inércia, o viés do status quo e a heurística do “ah, tanto faz”. Todas essas forças nos levam a crer que, se há uma opção-padrão - uma opção que prevalecerá caso nenhuma outra seja escolhida -, podemos esperar que um grande número de pessoas acabará por mantê-la, mesmo que não seja boa. E como também já enfatizamos, essas tendências à falta de ação são reforçadas quando, de forma implícita ou até explícita, se sugere que a opção-padrão representa a ação normal ou mesmo a ação recomendada”. (Thaler, Sunstein, 2019, p. 1537)

A oferta de uma opção padrão explora a tendência à manutenção do status quo41. O seu uso inteligente pode trazer resultados positivos, direcionando o consumidor para a alternativa que lhe assegure melhores chances de atendimento de seu interesse e que, simultaneamente, proporcione o resultado desejado em termos de desjudicialização.

No caso da integração do PJe (processo judicial eletrônico) e do “Consumidor.gov.br”, implantada pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT, 2019), observa-se que o desenho do sistema não observou essa premissa. De fato, a pergunta inicial apresentada pelo sistema é se o autor deseja utilizar a plataforma extrajudicial. Pressupondo que a maioria esteja assistida por advogado, dificilmente essa escolha será adotada depois que o patrono já iniciou o cadastro da demanda em juízo. Melhor seria o direcionamento automático para a plataforma, se constatada a pertinência de assunto e parte no polo passivo, como opção padrão, possibilitando ao usuário a intervenção ativa para retornar ao PJe (ELESBON, 2022, p. 74-75).

Definir o “Consumidor.gov.br” como opção padrão para os consumidores que acessem o processo eletrônico não seria subterfúgio para afastar demandas, mas desenho compatível com o modelo de complexidade e custo progressivos, que por muitos tem sido defendido. Nada impediria, por exemplo, que o usuário dispensasse a alternativa inicial e passasse à etapa seguinte, ciente, no entanto, das perspectivas de tempo e dos ônus correspondentes (por exemplo, da necessidade de participar de uma audiência) (Ibidem).

Por sinal, esse foi o desenho escolhido pelo Tribunal de Justiça da Bahia, ao modelar o sistema de “negociação virtual” no Projudi, para os Juizados Especiais (TJBA, 2020). Embora não use o “Consumidor.gov.br”, a premissa é a mesma. A diferença está em que o fluxo de negociação é desencadeado automaticamente. É a opção padrão que atua como nudge (ELESBON, 2022, p. 75).

A simplificação é igualmente fundamental para o design de soluções que envolvam as ODRs. Da experiência com o eBay, Rule sintetiza: os usuários desejam que o processo de ODR seja rápido, simples, justo para todos os participantes e de fácil entendimento (RULE, 2017, p. 368)! É imperioso, portanto, evitar complexidades desnecessárias42.

No caso do “Consumidor.gov.br”, é necessário o cadastro do usuário para acesso à plataforma, com uso de conta “.gov”43. Ora, em se tratando de espaço virtual, de ODR, pode-se presumir com razoável grau de convicção que o usuário que a acesse diretamente seja possuidor, no mínimo, de um smartphone (lembrando que a maior parte dos acessos, no Brasil, segundo pesquisa recente, se dá por essa via, não por computadores) (VALENTE, 2020). Talvez fosse o caso de permitir o acesso com o uso de perfil do Google, da Apple Store, Facebook ou outro serviço amplamente disseminado, desde que proporcionada segurança na identificação. Ao menos, para minimizar a necessidade de introduzir dados pessoais de uso repetitivo.

A visibilidade merece igual atenção. Diversos tribunais subscreveram a adesão ao acordo de cooperação firmado entre o CNJ e a Senacon e passaram a divulgar o “Consumidor.gov.br” em suas páginas institucionais. No entanto, nem sempre há o destaque necessário e o percurso para o usuário externo localizar o “banner” que informa a existência da plataforma é tortuoso. Simplificar essas etapas, inclusive a linguagem utilizada, e conferir o maior destaque possível é a base do design centrado no usuário do serviço.

A maioria dos consumidores não litiga de modo habitual. Pesquisas revelam, ao contrário, certa aversão a estar em juízo44. Logo, não há conhecimento prévio sobre como comportar-se perante o litígio45. Esse tipo de situação é propícia aos nudges:

O que vimos até aqui sugere que talvez as pessoas precisem de um nudge acima de tudo para tomar decisões que têm efeitos posteriores; para aquelas decisões difíceis, incomuns e com pouco feedback e para aquelas em que nem sempre a escolha feita e a experiência vivida são dúbias. (Thaler, Sustein, 2019, p. 1389)

Thaler e Sunstein propõem o uso de “nudges” para substituir o feedback em processos de longo prazo46. Por exemplo: ao acessar o balcão do Juizado Especial Cível ou a página do Tribunal de Justiça, visando propor demanda consumerista, ser informado de que existe o canal extrajudicial, de que milhões de pessoas o tem utilizado e de que os resultados são mais rápidos do que os esperados em juízo (Elesbon, 2022, p. 74).

Vale dizer que o “Consumidor.gov.br” não constitui canal extrajudicial exclusivo. Ele se soma a tantos outros, públicos e privados, endógenos aos fornecedores47 ou exógenos a eles. Observe-se que, segundo pesquisas, os S.A.C.s das próprias empresas ainda são o canal preferencial para o diálogo entre consumidores e fornecedores. O painel do “Consumidor.gov.br” consigna que oitenta por cento dos que ali ingressaram já tentaram solucionar o problema por pelo menos uma vez antes de acessarem a plataforma48.

Os próprios fornecedores poderiam, por exemplo, divulgar a existência da plataforma nas faturas de cobrança, nos aplicativos e extratos. Nos SACs, durante os comezinhos intervalos de espera, nada impediria que o “Consumidor.gov.br” fosse mencionado. E, de modo escalonado, ao fim dos atendimentos pelos canais próprios, já poderiam ali indicar a plataforma como alternativa para os usuários insatisfeitos49. Inclusive com opção do encaminhamento do link para o consumidor ou de compartilhamento dos dados com a plataforma, se solicitado (evitando que o consumidor precise fazer novo cadastro para acessar o “Consumidor.gov.br”)50.

Esse desenho pode considerar, ainda, o efeito de pré-ativação (priming). Indagar ao usuário, antes de entrar no sistema, sobre a intenção de obter solução amigável na plataforma extrajudicial pode influenciar a sua própria disposição posterior nesse sentido51.

O “Consumidor.gov.br” já incorpora o conceito de “nudge” informacional, na medida em que opera como sistema de reputação. Entretanto, o simples fato de tornar mais visível essa informação preexistente, e hoje restrita ao próprio site, pode amplificar os seus efeitos. Seria o caso de noticiar esse ranking periodicamente, na mídia e em outros canais de grande penetração52. Essa divulgação viria ao encontro do que preceitua a Resolução 125/2010, do Conselho Nacional de Justiça53.

Esses são exemplos de “nudges” que poderiam operar dentro dos sistemas, nos portais dos tribunais, nos serviços de atendimento ao consumidor, dentre outros canais, e se voltam precipuamente ao consumidor. Mas há outras abordagens a considerar, no plano mais geral, ligado aos aspectos jurídicos, materiais e processuais, que cercam os litígios consumeristas (ELESBON, 2022, p. 76).

Um dos incentivos que tem ganhado força nos debates acadêmicos, que repercute em algumas decisões judiciais e que está sendo discutido no Congresso Nacional54 diz respeito ao interesse processual. Sem que tentativa de resolução pré-processual seja demonstrada, estaria descaracterizada essa condição da ação (GAJARDONI, 2020, p. 99-114; PARO, MARQUES, DUARTE, 2020, p. 275-323).

Não se cuida propriamente de “nudge”, uma vez que assume caráter peremptório, limitando efetivamente a liberdade de escolha dos interessados. Além disso, o filtro de interesse processual atua em somente um dos vértices do litígio, nos autores, pressupondo, portanto, que a redução das demandas esteja associada à ideia de prevenção de ações frívolas ou de conteúdo banal, quiçá aventureiro e fraudulento. Essa alternativa desconsidera o fato de que muitas demandas são fundadas e oriundas de lesões repetitivas cometidas por fornecedores cujas práticas abusivas não tem sofrido repreensão adequada. Logo, apenas refrearia ou retardaria ações oriundas dos consumidores em contextos nos quais os fornecedores, em tese, estariam dispostos a solucionar os impasses vivenciados pelos primeiros (ELESBON, 2022, p. 77).

Outros incentivos, porém, talvez fossem mais eficazes para atuar bilateralmente, na vontade tanto de fornecedores quanto de consumidores. A exemplo da correlação entre o comportamento extrajudicial das partes e o dano moral extra rem55.

Em essência, o que aqui se propõe é examinar, a par dos danos ocasionados in re ipsa, se a conduta das partes demonstra, de um lado, a boa-fé do consumidor em buscar a solução do problema vivenciado em lugar de ganho financeiro e, de outro, a disposição efetiva do fornecedor em solucionar e compensar o consumidor pelos revezes provocados56, com atitude respeitosa e cooperativa (ELESBON, 2022, p. 81).

A tentativa de resolução pré-processual seria indicadora desses atributos positivos, de modo que o consumidor que procura o Judiciário diretamente, em circunstâncias nas quais o histórico do fornecedor demonstra cooperação, poderia ter denegado o dano extrapatrimonial. E o fornecedor que, instado na via extrajudicial, deixa de atuar cooperativamente, ao reverso seria condenado ao pagamento desse importe, pelo desperdício do tempo do consumidor e pelo menosprezo à sua dignidade. Ambas as partes teriam incentivos e sanções para sua falta de colaboração (Idem, p. 82)57.

Vale dizer que esse fator de estímulo poderia operar até mesmo em situações nas quais o dano é caracterizado in re ipsa. Nesse caso, não na identificação do an debeatur, mas do quantum debeatur, graduando-se a compensação conforme as atitudes cooperativas ou conflitivas dos envolvidos. O fato de que o dano moral é quase onipresente nas ações de consumo sugere a viabilidade dessa abordagem (Ibidem)58.

Os caminhos são múltiplos e as experiências pretéritas trazem otimismo. Todavia, em que pese ser possível traçar lineamentos e estratégias mais gerais, Sunstein adverte sobre a necessidade de que os “nudges” sejam adequadamente projetados e testados, baseando-se em dados empíricos, não apenas em intuições e evidências anedóticas59.

A eficiência dos “nudges” e sua aderência aos objetivos traçados (no caso, o incentivo não coercivo às vias extrajudiciais sem vulneração à tutela do consumidor) depende do seu desenho e de sua experimentação e avaliação rigorosas60. O que, a rigor, também se estende ao próprio design da plataforma de resolução de disputas, que virá a incorporá-los (ELESBON, 2022, p. 84).

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Há grande potencial para o emprego de ODRs como alternativas à judicialização, com o intuito de conter o avanço dos processos consumeristas. A política judiciária nacional de resolução adequada de conflitos aponta nesse sentido, conectando-se com o macrodesafio do Poder Judiciário de ampliar os meios autocompositivos e a prevenção de demandas.

O “Consumidor.gov.br” tem conquistado espaço como plataforma pública de negociação on-line entre consumidores e fornecedores. Além de proporcionar a interlocução em ambiente neutro, permite a coleta e mensuração dos resultados alcançados, fornecendo dados estruturados sobre tempo de resposta, resolutividade e satisfação expressa pelos usuários e funcionando como sistema de reputação.

Porém, os números positivos do “Consumidor.gov.br” e das demais plataformas de ODR em operação no país ainda não tem produzido reflexos na diminuição do ingresso de demandas consumeristas. O que sugere a existência de espaços amplos para aperfeiçoamento das próprias plataformas e para a sua divulgação.

Guardadas as devidas cautelas éticas, nada impede, antes recomenda, a adoção de desenhos que orientem e estimulem a adesão a esses canais, tanto por fornecedores, quanto por consumidores, funcionando como “nudges” comportamentais.

Como é da essência dos nudges, deve ser respeitada a liberdade decisória dos envolvidos e asseguradas a transparência e a imparcialidade. Isso implica guarnecer o consumidor de conhecimento sobre os meios de resolução de conflitos disponíveis e sobre as implicações jurídicas do conflito, a fim de mitigar as assimetrias preexistentes.

Oferecer porta ágil, descomplicada, barata e acessível é meta digna de promoção. Afinal, a legislação consumerista já propugna, desde a edição de seu diploma fundamental, a oferta de vias alternativas de solução de conflitos (CDC, art. 4º, V). Existe, em realidade, déficit histórico a compensar. Essa abertura, no entanto, deve ocorrer no sentido de maximizar o acesso do consumidor à tutela de seus direitos e não de refreá-lo, quando presente a violação.

A desjudicialização é propósito nobre, mas a tutela do vulnerável precisa ser preservada, ainda que sua promoção ocorra dentro do espectro mais amplo de modalidades de acesso à ordem jurídica, em conjunto com as plataformas extrajudiciais.

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1 Doutor em Direito pela Universidade de Coimbra - Portugal. Juiz Federal. E-mail: cesarbochenek @gmail.com.

2 Mestre em Direito e Poder Judiciário pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados - ENFAM. Juiz de Direito. E-mail: saelesbon@gmail.com.

3 Pontos de alavancagem, na definição de Meadows (1999, p. 1), são locais, dentro de um sistema complexo, nos quais uma mudança pequena pode acarretar mudanças significativas. “Folks who do systems analysis have a great belief in ‘leverage points’. These are places within a complex system (a corporation, an economy, a living body, a city, an ecosystem) where a small shift in one thing can produce big changes in everything”.

4 Estima-se que as ações consumeristas representam 10% do acervo processual no Brasil, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça e SENACON (Brasil, 2019, p. 2).

5 Alternative Dispute Resolution, em inglês.

6 Como relatam Katsh e Rule (2016, p. 329): “ODR originally emerged in the mid-1990s as a response to disputes arising from the expansion of eCommerce. During that time the web was extending into commercial uses, becoming an active, creative, growing, and, at times, lucrative space. Such an environment, with significant numbers of transactions and interactions (where relationships are easily formed and easily broken) seemed likely to generate disputes. At the same time, it was also clear that disagreements emerging from online activities could not be resolved through traditional offline channels. With parties likely to be at a distance from each other and incapable of meeting face-to-face, these new disputes could only be resolved online. This meant that new tools and resources that exploited the capabilities of digital communication and information processing by computers had to be developed”.

7 Katsh e Rule (2016, p. 329-330) anotam esse liame embrionário e a inevitável transição para um fenômeno autônomo: “Early experiments in resolving disputes online were often labeled ‘Online ADR’ or ‘E-ADR.’ In the first significant ODR pilot project, with eBay in the late 1990s, an experienced human mediator used email to interact with the disputants using the same strategies with which he engaged disputants offline (e.g., assisted storytelling and joint problem solving). This was a reasonable mindset at the time and consistent with a theme that was often found in other contexts, namely that ‘(w)hen a new online technology is created for any process, the initial impulse is to create online mirror images of the 'live' or offline process’.”

8 Ela abrange, também, pequenas técnicas e ferramentas derivadas da tecnologia da informação, como uma simples videoconferência ou uma intimação por Whatsapp. E ela pode abranger um conjunto de técnicas inéditas, destinadas à resolução de um conflito determinado e específico, e que podem se assemelhar pouco ou quase nada com a dinâmica de um procedimento de mediação ou conciliação tradicional” (Vasconcelos, Carnaúba, 2020).

9 A confidencialidade, como princípio da mediação e conciliação, é definida pelo art. 166, §1º, do Código de Processo Civil Brasileiro e art. 1º, I, do Anexo III, da Resolução 125/2010, do Conselho Nacional de Justiça. Ela impede que as informações obtidas no procedimento sejam utilizados para fins diversos dos autorizados pelos participantes.

10 As ODR has grown in use, the ADR model in which a human mediator alone manages the flow of information between the parties has gradually been supplanted by a model in which technology is looked at as a ‘Fourth Party’, something that can be of value in both online and offline disputes. The Fourth Party may, in less complex disputes (such as many eCommerce disputes), replace the human third party by helping the parties identify common interests and mutually acceptable outcomes. Templates and structured forms can be employed that allow users to choose from various options and, by comparing the choices made by the parties, can highlight potential areas of agreement. More commonly, the Fourth Party assists, enhances, or complements the mediator or Arbitrator” (Katsh, Rule, 2016, p. 331).

11 Seriam três as principais mudanças que as ODRs proporcionam no modo de solucionar conflitos, segundo Nunes e Malone: a passagem de um local físico para o espaço virtual; de uma intervenção humana, para decisões algorítimicas e da confidencialidade para o tratamento dos dados coletados visando prevenção de conflitos (Nunes, Malone, 2021, p. 127).

12 O sistema, que opera em etapas, envolve o programa “Compra Garantida”, negociação direta via chat ou a mediação do conflito por um terceiro. Ao fim, se o problema permanece, sugere-se o acesso ao “Consumidor.gov”. Estima-se que a resolução atinja 98,9% dos casos, embora os números envolvidos não tenham disso divulgados (Freitas, 2019).

13 Pereira e Schinemann (2020) descrevem as distinções e vantagens das ODRs sobre os métodos tradicionais de composição de litígios: “Entre esses vetores que diferenciam o ODR de mecanismos autocompositivos tradicionais é possível mencionar a facilidade e instantaneidade no acesso ao meio de solução de conflito; o baixo custo, tanto para o usuário quanto para o mantenedor da plataforma; a feição amigável ao usuário, em contrariedade à usual concepção hostil que a população no geral possui quanto às instalações de órgãos públicos; a rapidez e comodidade no atendimento; a possibilidade de utilização de tecnologia para triagem e imediata alocação da situação jurídica em discussão; e, enfim, uma série de facilidades e comodidades que os serviços em rede oferecem”.

14 This lesson affirmed feedback we had heard previously indicating that buyers preferred to lose their case quickly rather than have the resolution process go on for an extended period of time” (Katsh, Rule, 2016, p. 334-335).

15 Some ODR approaches may resemble face-to-face ADR processes and ADR practitioners may employ ODR tools to supplement face-to-face meetings, but the goal of ODR is not simply to digitize inefficient offline processes. Technology changes the nature of the interaction between the parties and introduces new possibilities for helping them achieve resolution. We may learn from offline approaches in designing ODR systems, but the larger challenge is to take advantage of what we can do with technology that we could not do before. As a result, as the full potential of ODR is realized over time, future applications are likely to diverge more and more from how disputes were handled in the past”. (Katsh, Rule, 2016, p. 330).

16 Em uma escala de 1 a 5, o grau médio de satisfação com o atendimento foi de 3,34 (2018), 3,28 (2019), 3,03 (2020) e 2,93 (2021). Esses índices variam entre os segmentos, sendo os mais reclamados, historicamente, as operadoras de telecomunicações; os bancos, financeiras e administradoras de cartão; comércio eletrônico; bancos de dados e cadastros de consumidores; e transporte aéreo.

19 Por via do Decreto 8.573/2015, com alterações do Decreto 10.197/2020.

20 Conforme dados do painel justiça em números, os assuntos de direito do consumidor foram os mais demandados nos juizados especiais estaduais desde 2014. Somente em 2017 estiveram na segunda colocação. Em 2019 foram distribuídos 6.548.235 processos tendo como assunto, nas tabelas processuais unificadas, um tema desse ramo. Em 2020, esse número caiu para 5.586.938 processos, possivelmente em razão da pandemia e das consequentes restrições de acesso a juízo. Mesmo assim, o volume ainda permaneceu maior do que o de 2018, quando o total foi de 4.308.097, o que denota inexistir uma tendência de arrefecimento. Nas varas cíveis comuns, o quadro não é diferente. O painel Justiça em Números revela uma proporção não desprezível de ações iniciadas por consumidores, o que se dessume pelos assuntos preponderantemente cadastrados. Em 2020, foram 1.957.048 casos novos com assuntos da ramificação direito do consumidor. Em 2019, 1.377.352! (https://paineis.cnj.jus.br/QvAJAXZfc/opendoc.htm?document=qvw_l%2FPainelCNJ.qvw&host=QVS%40neodimio03&anonymous=true&sheet=shResumoDespFT )

21 Na perspectiva dos fornecedores, de igual forma: “Companies seem to be interested in participating in Consumidor.gov, firstly because there is no cost to solve the conflict and because they know that the complaint might be addressed by courts. As Hörnle said, to achieve adherence to negotiation it is important to have adjudication as an ultimate resource, and for companies, the possibility of taking care of the problem with no court costs is much better” (Suriani, 2020).

22 Nesse sentido, Suriani: “The creation of a public database with solved/not solved information and the satisfaction rank can further enhance good practices. Companies need to protect their reputation and, therefore, want to show to the market that they care about their clients, making an effort to gain good rates on the platform” (Suriani, 2020).

23 E há notícias de que a OAB teria avançado junto à SENACON em tal sentido: < https://www.conjur.com.br/2020-fev-02/advocacia-atuar-reclamacoes-site-consumidorgov?fbclid=IwAR3BilF-QK4RdZb1uEFC2KNxk8zHhlPzJyOVzY_diAU1N3yIrYIr5vBlJzc >. Em sentido contrário, há sempre o risco de captura da plataforma: < https://www.oconsumerista.com.br/2020/02/advogados-consumidor-empresas-debandada/ >.

24 Perante a justiça comum estadual, a regra é a representação por advogado. E os dados de distribuição nos Juizados Especiais revelam que mesmo nas situações em que a atuação desse profissional é facultativa, na prática, a sua presença é dominante, em especial nas ações de consumo contra os grandes fornecedores. Sobre o ponto: Conselho Nacional de Justiça (2015, p. 42).

25 Estimular a autocomposição e evitar demandas fraudulentas e aventureiras é dever de todo advogado, consoante o art. 2º, incs. VI e VII, do Código de Ética e Disciplina da OAB e, mais recentemente, a regra universal do art. 3º, §3º, do Código de Processo Civil. Uma possibilidade que se abre nesse caso, seria ranquear os próprios advogados que se habilitassem na plataforma e concordassem com tal classificação, demonstrando, por exemplo, quais são aqueles que obtém melhores resultados conciliatórios. Uma proposta ainda imatura e que necessitaria de reflexão, mas, quiçá, importante para alavancar a cultura de conciliação e valorizar os profissionais que abraçam esse conceito.

26 O que está em consonância com o art. 6º, VI, da Resolução 125/2010, do Conselho Nacional de Justiça.

27 A possibilidade de captura dos sistemas de ODR pelos “jogadores habituais” não passou despercebida por Rule, a partir da experiência com o eBay: “We also learned that, just like in offline dispute systems design, it’s very important to pay attention to power differentials. Because sellers are repeat players (and because they have more resources), they have a systematic advantage over buyers, and it is important to design systems that com- pensate for that asymmetry. Part of tackling this challenge is thinking hard about how your system may be gamed by users trying to find shortcuts or advantages, and finding ways to address each identified vulnerability” (Rule, 2017, p. 368).

28 Se você ler livros teóricos de economia, vai descobrir que o Homo economicus pode pensar como Albert Einstein, ter tanta memória quanto um supercomputador e ter tanta força de vontade quanto Mahatma Gandhi. Mas as pessoas que conhecemos não são assim. (...) Pessoas reais têm dificuldade de fazer divisões complexas sem calculadora, às vezes esquecem o aniversário do parceiro e ficam de ressaca no Ano-Novo. Esses não são Homo economicus; são Homo sapiens”. (Thaler, Sunstein, 2019, p. 156-157)

29 Arquitetos da decisão são aqueles agentes que têm a responsabilidade de organizar o contexto no qual as pessoas tomarão decisões. São arquitetos da decisão o médico ao indicar um tratamento a seu paciente; Os pais, ao explicarem ao filho adolescente as opções de cursos de nível superior disponíveis; o dono de uma lanchonete, ao decidir a ordem de disposição dos alimentos; bem como o formulador de política previdenciária, ao apresentar as opções de planos de aposentadoria aos servidores públicos, para citar alguns exemplos”. (Tabak e Amaral, 2018, p. 486)

30 Esse nudge, na nossa concepção, é um estímulo, um empurrãozinho, um cutucão; é qualquer aspecto da arquitetura de escolhas capaz de mudar o comportamento das pessoas de forma previsível sem vetar qualquer opção e sem nenhuma mudança significativa em seus incentivos econômicos. Para ser considerada um nudge, a intervenção deve ser barata e fácil de evitar. Um nudge não é uma ordem. Colocar as frutas em posição bem visível é um exemplo de nudge. Simplesmente proibir a junk food, não”. (Thaler, Sunstein, 2019, p. 141)

31 Sunstein (2014, p. 5) realça as advertências como nudges: “(...) attention is a scarce resource, and warnings are attentive to that fact. One virtue of warnings is that they can counteract the natural human tendency toward unrealistic optimism and simultaneously increase the likelihood that people will pay attention to the long-term”.

32 Sunstein (2014, p. 2) adverte ser imperioso que a adoção de nudges governamentais seja transparente e sujeita a escrutínio público: “Any official nudging should be transparent and open rather than hidden and covert. Indeed, transparency should be built into the basic practice. (...) A principal advantage of nudges, as opposed to mandates and bans, is that they avoid coercion. Even so, they should never take the form of manipulation or trickery. The public should be able to review and scrutinize nudges no less than government actions of any other kind”.

33 Tal viés ocorre quando o indivíduo superestima suas habilidades e capacidades; quando a intuição errônea da completude de seu conhecimento o leva a achar que entende fenômenos complexos em uma profundidade muito maior do que realmente entende. É o caso da pessoa que olha a ponta do iceberg e acredita conseguir descrever com a total precisão seu tamanho e formato, fenômeno chamado pela literatura de ilusão da ‘profundidade explicatória’”. (Tabak e Amaral, 2018, p. 482)

34 Thaler e Sunstein (2019, p. 602) explicam: “O otimismo irreal é uma característica generalizada da vida humana; ele define a maioria das pessoas na maioria das categorias sociais. Quando as pessoas superestimam sua imunidade individual contra danos, pode ser que deixem de tomar medidas sensatas de prevenção. Se estiverem correndo riscos por causa do otimismo irreal, podem se beneficiar de um nudge. Na verdade, já falamos sobre uma possibilidade de dar esse nudge: se são lembradas de um evento ruim, as pessoas podem diminuir o nível de otimismo”.

35 Conforme Thaler e Sunstein (2019, p. 461-469, passim): “(...) a maioria das pessoas usa a heurística da disponibilidade. Elas avaliam o risco de algo acontecer de acordo com a facilidade com que conseguem pensar na questão. (...) A acessibilidade e a visibilidade estão muito relacionadas à heurística da disponibilidade, e o papel delas é igualmente importante. (...) superestimamos a probabilidade de mortes mais gravadas na memória e fáceis de imaginar (como um tornado), enquanto outras formas mais discretas (uma crise de asma, por exemplo) recebem estimativas baixas, mesmo que sejam muito mais frequentes (é vinte vezes mais provável que você morra de ataque de asma do que vítima de um tornado). Acontecimentos recentes também têm impacto maior no nosso comportamento e nos nossos medos, em comparação com os antigos. O Sistema Automático tem plena consciência (talvez até demais) dos riscos associados aos exemplos mais disponíveis, por isso não sente necessidade de recorrer a estatísticas entediantes”.

36 Sobre o uso de normas sociais, que consiste em enfatizar o que a maioria das pessoas faz, Sunstein (2014, p. 4) sublinha: “One of the most effective nudges is to inform people that most others are engaged in certain behavior. Such information is often most powerful when it is as local and specific as possible (...) It is true that sometimes most or many people are engaging in undesirable behavior. In such cases, it can be helpful to highlight not what most people actually do, but instead what most people think people should do (as in, “90 percent of people in Ireland believe that people should pay their taxes on time”)”.

37 Há precedentes de sucesso: “(...) grande parte dos estudantes acredita que o consumo excessivo de bebida alcoólica é muito mais generalizado do que de fato é. (...) Essas percepções equivocadas são, em parte, fruto da heurística da disponibilidade. É fácil se lembrar de incidentes relacionados ao consumo excessivo de bebida alcoólica, e isso cria uma visão deformada da realidade. Os estudantes universitários são influenciados por suas crenças sobre o que outros universitários estão fazendo, por isso é inevitável que o consumo de bebida aumente quando os estudantes têm uma percepção exagerada de quanto os outros bebem. (...) O estado americano de Montana, por exemplo, adotou uma campanha educacional maciça salientando que a grande maioria de seus moradores não bebe”. (Thaler, Sunstein, 2019, p. 1221-1228)

38 Um problema importante aqui é o da “ignorância pluralística” — o desconhecimento de todos, ou de grande parte do grupo, sobre o que as outras pessoas pensam. Somos capazes de adotar uma prática ou seguir uma tradição não porque gostamos, ou mesmo porque a consideramos defensável, mas basicamente porque achamos que a maioria das pessoas aprova. É por esse motivo que muitas práticas sociais continuam existindo, só que um leve choque, ou nudge, pode colocá-las por terra”. (Thaler, Sunstein, 2019, p. 1038)

39 Thaler e Sunstein (2019, p. 606/623): “As pessoas odeiam perder (e seus Sistemas Automáticos são bem emotivos quanto a isso). Em termos gerais, a tristeza de perder algo é duas vezes maior que a felicidade de ganhar a mesma coisa. (...) as pessoas têm “aversão à perda” (...) a aversão à perda opera como uma espécie de nudge cognitivo, nos impulsionando a evitar mudanças mesmo quando são do nosso interesse”.

40 A sociedade utiliza recompensas para adiamento do usufruto de um benefício no presente para um melhor aproveitamento do recurso no futuro, o que permite dizer que o desconto hiperbólico representa a taxa de desconto aplicada pela sociedade para comparar os benefícios de maneira intertemporal. (...) Em geral, os indivíduos apresentam um considerável grau de impaciência, que os leva a tomarem decisões com resultados de curto prazo menores comparativamente a alternativas que lhes renderiam um ganho maior a ser recebido no longo prazo”. (Tabak e Amaral, 2018, p. 480)

41 Afirmam Thaler e Sunstein (2019, p. 640): “Uma das causas do viés do status quo é a falta de atenção. Muitas pessoas adotam o que chamamos de heurística do ‘ah, tanto faz’ “. No mesmo sentido, Tabak e Amaral (2018, p. 483): “O viés do status quo pode ser observado nas situações em que o indivíduo não tem familiaridade com o assunto ou está demasiadamente confuso para escolher dentre as opções apresentadas. Assim, com o intuito de fugir dos riscos ou pelo medo de se mover para uma opção que traga piores resultados, é grande a probabilidade de se escolher a resposta padrão (default)”.

42 If the goal is to encourage certain behavior, reducing various barriers (including the time that it takes to understand what to do) is often helpful. Resistance to change is often a product not of disagreement or of skepticism, but of perceived difficulty - or of ambiguity” (Sunstein, 2014, p. 5).

43 Seguindo as diretrizes do Decreto 9.756/2019, da Presidência da República.

44 Suriani (2020) aponta pesquisa de Oliveira e Wada, que parece corroborar com essa ilação: “In 2012 Oliveira and Wada made a survey with consumers between 25 and 40 years old belonging to Brazilian middle class. They found out that when consumers identify a violation of a right, they usually try to solve the issue directly with the company. If it doesn’t work, they do nothing or look for help at PROCON, and most of them don’t go to the courts. Exception is made to telecommunication companies. For the interviewers, its notorious the inefficacy of their customer services, and because of this, customers prefer to go directly to PROCON or to the courts, bypassing the company”.

45 Com fundamento em pesquisa desenvolvida por Rebecca L. Sandefur, Costa e Francisco (2020) ponderam que, nos Estados Unidos da América, “constatou-se que parcela significativa da população (...) não reconhece como jurídicos problemas que enfrentam, identificando-os como fatalidades, azares, coisas da vida e até mesmo a vontade de Deus, e quando reconhecem, frequentemente não procuram advogados ou o sistema de justiça, o que foi por ela conceituado como uma ‘lacuna’ no acesso à justiça. Embora a pesquisa tenha sido conduzida na realidade dos Estados Unidos da América, é possível extrapolar seus achados como indicativos de que também em nosso país, diante da desigualdade e estágio de desenvolvimento social, se verifique situação semelhante”.

46 Além disso: “Nem a prática levará à perfeição se as pessoas não tiverem boas oportunidades para aprender. E é mais provável que se aprenda recebendo um feedback claro e imediato após cada tentativa”. (Thaler e Sunstein, p. 1359) “(...) em geral recebemos feedback apenas das opções que escolhemos, mas não das que rejeitamos. A não ser que você desvie do seu caminho original para fazer experimentos, é possível que nunca conheça as alternativas às opções familiares”. (Thaler, Sunstein, 2019, p. 1365)

47 Daniel Becker e Bruno Feigelson (2020) citam como exemplo brasileiro de ODR endógeno o criado pelo Mercado Livre.

48 No ano de 2021, 82,12%. Em toda a história da plataforma, 80,56%, conforme o painel estatístico, acessado em 08/01/2022: <https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMWVjZDg0NzItYjcyYy00MDE5LWFhNmYtNzg0Zjg2ZWMxZDdiIiwidCI6ImViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9 >.

49 Como anteriormente mencionado, ao cabo de todas as etapas internas de ODR, o MercadoLivre estimula os disputantes a procurarem pelo “Consumidor.gov”, em linha com o que foi aqui proposto (Freitas, 2019).

50 O simples fato de serem expostos à existência de alternativas pode operar como um nudge sobre os consumidores, por força dos vieses cognitivos que operam em natural detrimento dessa opção: “What you see is all there is (“WYSIATI”) é o viés pelo qual se desconsidera, olimpicamente, a existência de coisas que escapam à primeira percepção. O brocardo o que não está nos autos, não está no mundo serve de analogia nesse caso (o que não está disponível à atenção, em regra, não está sendo processado no plano consciente); ou seja, a atenção interfere, também, em percepção, intuições e avaliações”. (Marden e Wykrota, 2018, p. 57). Mostrar que a opção existe e, quando possível, já torna-la a opção padrão formam um conjunto poderoso de nudges.

51 Conforme Thaler e Sunstein (2019, p. 1256-1257): “Pesquisas apontam que influências sutis podem aumentar a facilidade com que determinada informação chega à mente.(...) Às vezes, uma simples alusão a uma ideia ou conceito põe em marcha uma associação que pode estimular uma ação. Esses “primes” ocorrem em contextos sociais, e seus efeitos podem ser surpreendentemente poderosos”. Nesse mesmo caminho, Marden e Wykrota (2018, p. 57): “Há, também, o priming ou viés associativo, bem sintetizado no brocardo “a primeira impressão é a que fica”. É o que explica — por exemplo, porque a ordem na qual um candidato apresenta suas qualidades ou seus defeitos pode influir na escolha por uma vaga de emprego ou mesmo na avaliação preliminar da confiabilidade de uma pessoa”.

52 Meadows (1999, p. 13) apresenta um caso exemplar de nudge informacional: “A more recent example is the Toxic Release Inventory, the U.S. government’s requirement, instituted in 1986, that every factory releasing hazardous air pollutants report those emissions publicly every year. Suddenly every community could find out precisely what was coming out of the smoke- stacks in town. There was no law against those emissions, no fines, no determination of “safe” levels, just information. But by 1990, emissions dropped 40 percent. They have continued to go down since, not so much because of citizen outrage as because of corporate shame. One chemical company that found itself on the Top Ten Polluters list reduced its emissions by 90 percent, just to ‘get off that list.’”

53 Que preconiza, dentre outras medidas, o acompanhamento estatístico das iniciativas de autocomposição das empresas, permitindo a visualização desses resultados e a concessão de “selos de qualidade” (art. 6º, VII).

54 A exemplo do Projeto de Lei 533/2019, da Câmara dos Deputados. Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2191394>.

55 Na lição de Cavalieri Filho (2008, p. 268-270, passim): “(...) dano circa rem é aquele que é inerente ao vício do produto ou do serviço, que está diretamente ligado a ele, não podendo dele desgarrar-se. (…) o dano extra rem é aquele que apenas indiretamente está ligado ao vício do produto ou do serviço, porque, na realidade, decorre de causa superveniente, relativamente independente, e que por si só produz o resultado. A rigor, não é o vício do produto ou do serviço que causa o dano extra rem - dano material ou moral - , mas a conduta do fornecedor, posterior ao vício, por não dar ao caso a atenção e solução devidas. O dano moral, o desgosto íntimo, está dissociado do defeito, a ele jungido apenas pela origem. Na realidade, repita-se, decorre de causa superveniente (o não-atendimento pronto e eficiente ao consumidor; a demora injustificável na reparação do vício). Tem caráter autonômo”.

56 A ponderação do comportamento pré-processual das partes na quantificação de danos morais remete às condenações por perda do tempo útil e desvio produtivo do consumidor, propugnadas originalmente por Marcos Dessaune, para quem: “(…) ao precisar enfrentar tais problemas de consumo potencial ou efetivamente lesivos, o consumidor sofre necessariamente um dano extrapatrimonial que tem efeitos individuais e potencial repercussão coletiva, que, sendo um dano certo, imediato e injusto, é indenizável in re ipsa. Na perspectiva da melhor doutrina atual, a lesão antijurídica ao tempo que dá suporte à vida, enquanto atributo da personalidade humana, caracteriza o dano moral, ao passo que a lesão antijurídica às atividades existenciais da pessoa consumidora configura o dano existencial” (Dessaune, 2019, p. 25).

57 É esse o pensamento de Becker e Feigelson (2020): “A resolução extrajudicial de conflitos como pré-requisito de acesso ao Poder Judiciário, embora reputada como vilã por parte da doutrina ortodoxa, na verdade, cria um ônus para a parte ré no caso de procedência da ação. Dito de outra forma, a eventual negativa de composição pode significar o aumento do rigor das condenações, criando, por força da economia comportamental, incentivos para que partes em conflito resolvam-se de forma autônoma, eficiente, rápida e justa”.

58 A eficácia na prevenção de demandas frívolas, oportunistas, é provável, já que esse é o maior fator de ganho financeiro em ações que, de outro modo, geralmente tem valor econômico muito módico. E, em contrapartida, também o fornecedor beligerante pode sentir-se motivado a negociar, para prevenir essa condenação ulterior O projeto de Lei 533/2020 contém dispositivo que poderá, se interpretado nessa linha, proporcionar esse resultado: “ Art. 491(...) § 3º Na definição da extensão da obrigação, o juiz levará em consideração a efetiva resistência do réu em satisfazer a pretensão do autor, inclusive, no caso de direitos patrimoniais disponíveis, se o autor, por qualquer meio, buscou a conciliação antes de iniciar o processo judicial.”

59 The most effective nudges tend to draw on the most valuable work in behavioral science (including behavioral economics), and hence reflect a realistic understanding of how people will respond to government initiatives. But some policies, including some nudges, seem promising in the abstract, but turn out to fail in practice. Empirical tests, including randomized controlled trials, are indispensable”. (Sunstein, 2014, p. 3)

60 “(...) se o contexto decisório for mal arquitetado, o nudge pode apresentar efeitos insignificantes, reação inversa ao esperado ou até ameaçar o alcance de outras metas pretendidas. (...) um nudge pode falhar por diversos motivos, dentre os quais a informação estar confusa ou difícil de processar; o nudge ter efeito somente no curto prazo; o arquiteto da decisão desconhecer as reais motivações dos agentes; ou devido a incentivos que produzem efeitos adversos ou comportamento compensatório. Além disso, podem falhar, também, quando existe forte preferência por uma opção diferente daquela que é padrão (default), o que pode ocorrer com base em normas, constrangimentos sociais ou em uma avaliação de maior impacto financeiro em seu bem-estar. Assim a preferência distinta da opção proposta pelo nudge se torna a referência base de medição do potencial de perdas”. (Tabak, Amaral, 2018, 486-487)

Recebido: 30 de Setembro de 2022; Aceito: 24 de Janeiro de 2023

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