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Vista. Revista de Cultura Visual

versão On-line ISSN 2184-1284

Vista  no.7 Braga jun. 2021  Epub 01-Maio-2023

https://doi.org/10.21814/vista.3165 

Articles

Museus a céu aberto: culturas digitais, estética e vida quotidiana

1 Laboratoire d'Études Interdisciplinaires sur le Réel et les Imaginaires Sociaux (LEIRIS), Département de Sociologie, Université Paul-Valéry, Montpellier, França


Resumo:

Numa época em que tudo se torna arte, a arte já não pertence a si mesma, ao ponto de transbordar dos quadros que a enclausuraram durante séculos – museus, galerias, igrejas – com efeitos inéditos não só e não unicamente no campo da estética, mas sobretudo na vida quotidiana. Para compreender esta dinâmica em profundidade, é necessário ter em conta a reprodutibilidade digital da obra de arte, enquanto dinâmica que perturba a relação entre obra e espectador, sujeito e objeto, política e vida quotidiana. A partir da segunda metade do século XVIII, assistimos a uma dinâmica de "estetização do público" paralela ao nascimento da indústria cultural e, portanto, à transformação da cultura em mercadoria. É um processo ambíguo, pois implica a emergência da massa como sujeito central de nossa cultura, mas também sua reificação definitiva. E quanto à estética em tal condição? O presente estudo explora a genologia e a história desse processo por meio da atualização do pensamento de Walter Benjamin em relação às emergências culturais de nosso tempo. Em particular, parece essencial compreender o que acontece com a aura no contexto de uma condição em que o objeto estético, a obra de arte e, de forma mais geral, a área que diz respeito à beleza está disponível, é usada e consumida no quotidiano, tanto a ponto de colocar nossas cidades como "museus a céu aberto".

Palavras-chave: arte; cultura digital; imaginário; vida quotidiana

Abstract:

At a time when everything becomes art, art no longer belongs to itself, to the point of overflowing from the frames that have enclosed it for several centuries – museums, galleries, churches – with unprecedented effects not only in the field of aesthetics, but above all in ordinary life. To understand this in depth, it is necessary to take into account the digital reproducibility of the work of art as a dynamic that upsets the relationship between work and spectator, subject and object, politics and everyday life. From the second half of the 18th century onwards, we saw a dynamic of "aestheticization of the public" parallel to the birth of the cultural industry and, therefore, the transformation of culture into merchandise. It is an ambiguous process, as it implies the emergence of the mass as the central subject of our culture, but also its definitive reification. What about aesthetics in such a condition? This study explores the genology and history of this process by updating Walter Benjamin's thinking in relation to the cultural emergencies of our time. In particular, it seems essential to understand what happens to the aura in the context of a condition in which the aesthetic object, the work of art and, more generally, the area that concerns beauty is available, used and consumed in everyday life, to the point of placing our cities as "open air museums".

Keywords art; digital culture; imaginary; everyday life

Introdução

O pensamento de Benjamin permite-nos esclarecer os pontos sobre os quais foram orientadas ao longo do século XIX as dinâmicas da mediatização da política, em primeiro lugar, e a politização do espetáculo, em segundo lugar. O primeiro mecanismo refere-se ao desaparecimento de uma relação rigidamente piramidal, abstrata e de sentido único, entre o poder político e o público, enquanto que o segundo se refere ao processo pelo qual, a certa altura, tudo o que até ao período anterior se tinha manifestado como espetáculo, divertimento e puro entretenimento, tende a traduzir-se agora na vida quotidiana e a reivindicar uma vontade de poder. Este ensaio baseia-se na interpretação teórica, de acordo com uma abordagem qualitativa, da relação entre a arte e o público desde o século XIX até aos dias de hoje. O período analisado é aquele marcado pelo nascimento da indústria cultural que conduz à dinâmica de estetização do quotidiano e à reprodutibilidade digital da obra de arte.

Segundo Benjamin (2000), "à volta de 1900, a reprodução técnica tinha atingido o nível que lhe permitiu (...) conquistar uma relação autónoma entre os vários processos artísticos" (p. 21). É por isso que entre as formas artísticas começavam a insinuar-se já não a mera produção de objetos ou de performances, mas o próprio facto de traduzir e de replicar potencialmente ao infinito o que já tinha sido produzido por outros. Trata-se de uma alavanca central para os tempos vindouros, uma vez que tornará possível, quando o processo adquirir uma plena maturidade, a reviravolta total, tanto da dimensão do que é artístico, como da figura do seu produtor. É assim que foi criado um fluxo duplo – uma dialógica – segundo o qual a vida mundana se apropria gradualmente, se torna acolhedora, faz suas as centelhas da arte, ao mesmo tempo que esta encarna – no seu papel de produtor das ferramentas da indústria cultural nascente – o papel de distribuidor em primeiro lugar e de criador destas últimas em segundo lugar, para finalmente se tornar no seu próprio objeto, um objeto de consumo ou uma matéria-prima do capitalismo da informação sob a forma de dados úteis para alimentar os algoritmos que cada vez mais regulam as nossas vidas (Cardon, 2015).

Foi necessário esperar pela conclusão de um longo ciclo para que o apresentador das primeiras estações locais se tornasse o DJ que reuniria música dos anos oitenta (Attimonelli, 2008). E, no entanto, é na fase inicial deste percurso que são estabelecidas as premissas tecno-sociais para um resultado deste tipo. O objeto artístico reprodutível é assim engolido nos infernos da vida quotidiana, perde a sua fluorescência e começa a comprometer-se e a confundir-se com as coisas belas de mau gosto, presentes na vida quotidiana e nas suas lojas ricas e negligenciadas. Não é por acaso que se tenha definido o espírito do digital como uma cultura remix (Lessig, 2008). Se nos começos o DJ – tal como o consumidor-produtor sobre o qual Karl Marx (1980), Alvin Toffler (1980) ou Michel De Certeau (1999) escreveram – se limita a selecionar a música dos outros, com o tempo este ato torna-se a fonte de uma verdadeira recriação, ao ponto de atribuir aos protagonistas das consolas um papel de star (Attimonelli, 2008). Se olharmos de perto, são eles que marcam o ritmo do tempo musical do nosso tempo, enquanto dança perpétua – uma alegria trágica.

A reprodutibilidade técnica da obra de arte permite a esta última "ir ao encontro do destinatário (...). A catedral abandona o seu local para ser acolhida no gabinete de um apreciador de arte; o coro que foi apresentado num auditório ou ao ar livre pode ser ouvido num quarto" (Benjamin, 2000, p. 22). À primeira vista, para os observadores menos atentos, esta passagem pode apenas significar uma movimentação do mesmo objeto em contextos novos, para permitir-lhe estender-se para além do seu local de origem. Contudo, a desvalorização do seu hic et nunc leva o objeto artístico a uma corrupção radical da sua "autenticidade" e da sua missão social: já não induz uma contemplação reverencial, já não responde a princípios pedagógicos, já não tem verdadeiramente uma ligação com o sagrado.

A intervenção da técnica como agente de reprodução, de multiplicação e de tradução do objeto original faz com que a Nona Sinfonia de Beethoven possa ser ouvida como um interlúdio entre um anúncio publicitário e um programa radiofónico, modificando assim a natureza atenta, ritualizada e séria da sua receção. Quando, nos anos oitenta, as recordações e os gadgets – desde toalhas a frigideiras – assim como a reprodução dos quadros de Gauguin e Seurat começaram a ser produzidos em massa, depois das experiências da pop art e em pleno desenvolvimento da sociedade de consumo, viu-se claramente que a reprodutibilidade constituía o início de uma mutação irreversível do objeto estético, que gradualmente se tornou um dispositivo de lazer capaz de encantar o quotidiano, dando-lhe uma aura alegre, divertida e espetacular. A vida comum engole avidamente qualquer forma anteriormente inscrita no e útil ao paradigma do belo, para a ceder à satisfação dos seus próprios desejos mais imediatos, fantasmáticos e carnais.

A vida torna-se uma obra de arte

Assim, no ponto de viragem entre o final do século XIX e o início do século XX, assistimos ao início de um longo processo de reapropriação social das formas artísticas, uma vaga que, ao levar as peças artísticas ao público, irá num primeiro tempo embriagá-lo com a arte e revesti-lo de uma forma artística, capilarizando na vida quotidiana a missão que Oscar Wilde (1972) se fixou, a de fazer da vida uma obra de arte. Assim, a profecia de Nietzsche (1997) revela-se:

o homem já não é um artista, tornou-se uma obra de arte: o que está a ser revelado aqui no tremor da embriaguez é, com vista à suprema volúpia e apaziguamento do Uno originário, o poder artístico de toda a natureza. (p. 45)

A dimensão da bios, da existência enquanto tal, é o destino final deste fluxo, a sua realização. Isto só será plenamente concretizado quando as linguagens digitais, as redes sociais e tudo o que diz respeito à estetização da experiência de vida envolverem todos os corpos, entre a web e a rua, de uma nova luz. A sua principal virtude, neste sentido, reside na possibilidade dada ao corpo social de expressar tanto os seus impulsos materiais como corporais, as partes baixas acerca das quais escreve Bakhtine (1998), os seus impulsos fantasmagóricos e a sua poética do estar cá, de habitar o mundo.

As sinergias diárias estabelecidas neste quadro, entre as maravilhas e as sombras, o celeste e o terrestre, o onírico e o sensível, não conduzem simplesmente ao devir-obra do público, mas promovem também o devir-público da arte, bem como uma reversibilidade entre sujeitos e objetos. O devir-público da arte significa a dispersão do belo nas ramificações da vida quotidiana, lá onde a beleza do estar cá e do estar-juntos prevalecem sobre toda a estética canonizada e musealizada. Ao mesmo tempo, isto remete para uma nova e inédita reificação do público, pois ao tornar-se obra aceita ser controlado, manipulado e consumido segundo as mesmas regras que regem o sistema dos objetos. É exatamente isto que acontece na vida digital em rede, no Tinder, Instagram, Pornhub, Tik Tok ou Snapchat, onde efetivamente o sujeito se torna obra, conteúdo primordial da comunicação, ao mesmo tempo que está envolvido em enredos que o tornam uma informação entre os dados, uma mercadoria entre os produtos das vitrines digitais. De certa forma, acontece a cada um o que aconteceu no início do star system, quando as primeiras celebridades foram simultaneamente embriagadas e consumidas pela sua popularidade. Na altura, James Dean e Marylin Monroe pagaram esta dinâmica com as suas vidas. Hoje em dia, o mesmo acontece com a crise de autonomia individual na existência eletrónica, isto é, a "morte" do sujeito em linha, e mesmo por vezes a morte física, por suicídio, de pessoas incapazes de sobreviver à visibilidade das suas histórias privadas.

Trata-se, em muitos aspetos, de uma mudança de paradigma em relação à nossa tradição sociológica e cultural. Mario Perniola (1994), na esteira do pensamento benjaminiano, teve razão de falar do homem como um objeto sentindo e do objeto como uma coisa sentindo, pois, de facto, a compenetração contemporânea entre bìos e technè suaviza as diferenças entre estas ordens, que se encontram doravante entrelaçadas num mesmo mosaico.

Para além do campo artístico: o finish do consumidor

Ao nível pessoal, o advento das novas tecnologias eletrónicas, especialmente as que entram em contacto com os nossos corpos, abre uma brecha no indivíduo ao injetar-lhe várias doses de alteridade tecno-social. Com efeito, trata-se de um convite – de uma iniciação – para perder-se no outro e para encontrar um novo equilíbrio com tudo o que nos rodeia. Trata-se de um estilhaçamento do ser, da sua fuga para um além, da sua invasão pelo além. Em suma, enquanto ser humano, o indivíduo já não é o centro do mundo, nem se encontra no centro do mundo...

O que desaparece é em suma o que pode ser resumido pela noção de "aura"; e pode dizer-se que o que desaparece na era da reprodutibilidade técnica é a "aura" da obra de arte. O processo é sintomático, o seu significado remete para além do campo artístico. (Benjamin, 2000, p. 23)

Nesta passagem está inscrita a interpretação mais eficaz e profética do significado social de um facto, a reprodutibilidade da obra, aparentemente apenas técnica, mas na realidade fundamental no que diz respeito ao futuro das formas estéticas, à sociedade de massas e aos seus sistemas de poder-saber. O desaparecimento da aura da obra de arte significa que o objeto exterior ao corpo social, provindo de um além por assim dizer mágico que transcende o hic et nunc, sofre uma relativização que o esvazia da sua capacidade de seduzir e de enfeitiçar o público. Ao perder a sua autoridade moral, o universo artístico priva o seu referente político, o sistema que o preside, do seu poder simbólico. Embora seja verdade que a democracia moderna se baseia na correspondência entre a lei e os costumes (Durkheim, 2002), que é por sua vez alimentada pela adesão simbólica do corpo social às elites, importa constatar que hoje em dia esta ligação foi interrompida, na precisa medida em que o quotidiano, o que se situava em baixo, já não se reflete nas formas estéticas vindas de cima, mas reflete-se em si mesmo e em todas as suas extensões tecno-societais, das redes digitais à street art, do rap ao funk e à techno, passando pelo cosplay, o jogos de papéis e as street parties.

As tradições legitimadas e consolidadas no decorrer da modernidade, ou seja, as suas organizações, as suas instituições e os seus presbitérios, perdem assim subitamente o dispositivo estético que lhes permitiu cristalizar a diferença entre elas e a rua, colocar-se do outro lado da vedação, isto é, da fronteira que se ilustra, por exemplo, pela distância que, em qualquer museu, separa a obra do público. O espaço sagrado do museu, lá onde os novos peregrinos da sociedade têm de ir para redimir a sua ignorância e contemplar a beleza, é a área de alta densidade simbólica na qual o segredo e o monopólio do poder por parte do Estado e dos seus avatares estão alojados. O bom gosto e o conhecimento elevados a valores supremos, defendidos e distribuídos cientificamente, são as alavancas através das quais o corpo social é organizado com uma finalidade dialética entre a produção do conhecimento e a geração do poder. O museu é o lugar sagrado, uma sacralidade laica, o arquétipo da relação de poder leve e totalizante que regula a relação entre a elite e as massas na era da democracia. No seu interior, a linha de sombra entre a obra e a barreira que o público nunca pode atravessar adquire um valor especial. É a metáfora da imposição da lei e das regras segundo as quais o público e os governantes, os representados e os representantes são obrigados a manter papéis diferentes: o primeiro, o de contemplar com reverência, o segundo o de governar, ao irradiar esplendor e destinos progressivos nas massas. Pela mesma razão, em qualquer museu, é proibido dançar, gritar, comer... Em suma, exprimir a voz do corpo, que deve ser reduzida à ordem da razão.

O objeto artístico deve ser aqui contemplado em silêncio, com admiração ou pelo menos com discrição, sem poder ser tocado ou, basicamente, discutido, uma vez que tudo num museu está organizado de tal forma que o visitante se move num quadro predestinado e vedado a um qualquer significado possível. Este modelo é, se olharmos bem, o oposto daquele que se experimenta através dos jogos linguísticos das plataformas comunicativas horizontais e interativas em rede, onde o espaço do prazer, do jogo e das festas, enquanto beleza, é o resultado da socialidade eletrónica e das afinidades conectivas que a compõem. O desmoronamento da fronteira entre a obra e o público leva, lenta, mas fatal e inelutavelmente, à confusão entre os dois campos. É por essa razão que aquilo de que estamos a falar vai para além do campo artístico.

A técnica da reprodução, tal como poderia ser formulada, subtrai o reproduzido do domínio da tradição. Ao multiplicar a reprodução, coloca uma série quantitativa de eventos no lugar de um único evento. E ao permitir que a produção venha ao encontro da pessoa que dela desfruta na sua situação particular, atualiza o produto. Os dois processos conduzem a uma violenta convulsão que investe o que é transmitido – a uma convulsão da tradição, que é a outra face da atual crise e da atual renovação da humanidade. Estão estreitamente ligados aos movimentos de massas do nosso tempo. (Benjamin, 2000, p. 23)

As massas, o grande remanescente da modernidade – realidade simultaneamente criada e temida pela ordem instituída – são imprudentemente dotadas de um instrumento que lhes dá a possibilidade de implementar as suas próprias "quantidades" desproporcionadas de novas "qualidades", em detrimento dos guardiões do poder. O que é "reproduzido" é separado do produtor e do seu círculo de fiéis intérpretes, mas é também deslocado do palco – o museu e os seus corolários – que o tinham dotado da sua magia e supremacia. A atualização de qualquer produto em questão torna-se assim a antecâmara de uma sensibilidade que é inconciliável com as estratégias dos produtores. Ocorre discretamente num cenário de distração generalizada, lazer ou fantasia. Neste caso, a obra é adaptada e apropriada à vida quotidiana a fim de a estetizar, de a tornar agradável e "bonita". No final, acaba por ser definitivamente desviada quando o habitar poético – a poética do quotidiano – prevalece sobre as instâncias da arte e sobre as formas artísticas. Neste sentido, a pop art, as estéticas urbanas e a indústria cultural são apenas o começo do devir-obra do público e da sua vida quotidiana, acionado pelas stories do Instagram, das selfies e dos snaps. De acordo com Marx (1980), o ato de consumo constitui a fase final da produção, sendo que o finish do consumidor é a forma como a mercadoria ganha vida no quadro da vida quotidiana. É, de certa forma, a sua continuação, a sua recriação, a obra da qual o corpo social é o verdadeiro artista – para usarmos outras palavras. Desta forma, estamos em face do – ou melhor dito, estamos imersos no – finish final e decisivo do consumidor, lá onde ele se torna uma obra. Este resultado final também revela uma fatalidade. Referindo-se à realização de um processo, não só anuncia a morte da arte evocada por Hegel (1944), mas também a do público.

Este tipo de performance, antes do seu desfecho, assume um tom violento quando as "massas" a implementam contra o significado com o qual a obra original foi concebida. A violência destrutiva é assim a face escura do consumismo, e Benjamin (2000) distingue nela, desde o início, as suas qualidades potencialmente subversivas, precisamente lá onde a obra é acolhida no seio tumultuoso de uma vida quotidiana irredutível a toda a ordem que não seja a sua, de acordo com a lei dos irmãos. A subversão da tradição é então o corolário da emergência de práticas enraizadas num passado arcaico e ao mesmo tempo tingido de visões futuristas. É assim que, para Benjamin, o regresso por assim dizer trivial da cultura tem imediatamente a ver com uma destruição geral do que é dado e do que foi sedimentado pelos saberes, pelos poderes e pelas instituições. A qualidade fundamental dos meios de comunicação de massas, que muitas vezes escapou àqueles que os moldaram e elaboraram para fins políticos ou comerciais, é assim apreendida: ela permanece na sua capacidade de entrar em sinergia com o corpo social e de tornar-se o seu ambiente, o seu território, a sua paisagem, mediascape integrando a bodyscape.

A paisagem mediática

O corpo social expande-se num cenário que lhe permite satisfazer uma série de desejos imediatamente associados a uma renovação geral da sua existência, trazendo de novo à discussão as tradições e cânones há muito sedimentados nas nossas sociedades. Os meios de comunicação social desempenham aqui o papel de espaços poderosos de comunhão: atualizam o estar-juntos, corroboram a comunidade e sacrificam tudo aquilo de que esta já não precisa ou quer para estar cá. De uma forma particular, o desafio mais significativo em qualquer altura cabe ao meio de comunicação mais recente, àquele que é capaz de garantir o equilíbrio entre a continuação e a renovação das formas sociais. Na altura em que Benjamin (2000) escreveu, existe um extraordinário vetor das intenções conscientes e inconscientes das massas: "o seu agente mais poderoso é o cinema. O seu significado social, mesmo na sua forma mais positiva, ou mesmo precisamente nesta forma, é impensável sem a sua forma destrutiva, catártica: a liquidação do valor tradicional da herança cultural" (p. 23).

No que diz respeito à nossa investigação, consideramos este ponto como fundamental, embora tenha sido negligenciado por quase todos os intérpretes do pensamento de Benjamin e, em geral, pela maioria dos mediólogos e sociólogos da comunicação. Durand (1996) é a esse respeito uma feliz exceção, uma vez que consegue identificar até que ponto a invasão dos mercados e das mentes por parte da parafernália técnica e das imagens mediáticas atua subrepticiamente em direção a uma produção subterrânea de "efeitos perversos", dirigida contra os próprios produtores das comunicações e dos objetos manipulados pelo corpo social. O autor consegue isto, acima de tudo, ao ter em consideração a dimensão do imaginário, antes e bem mais ainda do que o discurso sobre os instrumentos ou as funções dos média. De facto, neste reino invisível mas sensível, por detrás de cada consumo de massas existe também a destruição, a liquidação do valor tradicional da herança cultural em nome de uma tradição mais antiga e de um presente sem qualquer outra finalidade para aqueles que o habitam que não seja a de estar cá, aqui e agora.

A partir do momento em que começa a manifestar-se uma fricção entre as massas e o universo estético, quando este último deixa de ser um objeto a ser contemplado à distância e com reverência, enquanto que a obra de arte se aproxima da pessoa, as massas inauguram um processo de apropriação do mundo dos objetos e das imagens que as leva a tornarem-se cada vez mais gananciosas, de uma certa forma a engrossarem, segundo um paradigma próximo da obesidade e da obscenidade que encontramos em Baudrillard (2000). Há aqui uma espécie de vontade de poder do corpo social devido à proximidade estabelecida entre a vida quotidiana, as imagens e o sistema dos objetos. Para compreender plenamente esta dinâmica, devemos explorar nas suas raízes e superfícies o

condicionamento social da atual decadência da aura. Baseia-se em duas circunstâncias, ambas relacionadas com a importância cada vez maior das massas na vida atual. E isto é: tornar as coisas, espacialmente e humanamente mais próximas, é para as massas atuais uma exigência muito viva, tanto como a tendência para superar a unidade de todo o elemento, qualquer que seja, por meio da receção da sua reprodução. (Benjamin, 2000, p. 24)

A modernidade, de facto, fundou-se num distanciamento geral em relação às coisas e aos outros, de acordo com uma lógica da separação. Apostando na abstração e no universal, tem orientado os seus projetos para objetivos distantes, válidos para todos e em todo o lado, que exigem o sacrifício do gozo, do presente. Inversamente, a cultura contemporânea que estamos a explorar investe no que é próximo e em estreito contacto com aquilo que é ao mesmo tempo da ordem do sensível e do imaginário. Ao olharmos bem, a reprodutibilidade técnica da obra de arte é um processo fundamental que tem apoiado esta mudança de paradigma, que está em curso desde a segunda metade do século XIX. A autenticidade da obra é o equivalente da unidade e da separação do indivíduo, da sua distância em relação aos outros e ao mundo. A partir do momento em que estes princípios se desmoronam, todas as jaulas identitárias, económicas e políticas do mundo moderno parecem estar em crise (Martins, 2015). Aproximar as coisas significa para o indivíduo, puxá-las a si, incorporá-las e, ao mesmo tempo, traduzir o que é autêntico e único em algo reprodutível e comum. O indivíduo burguês é para o produto estético autêntico e distante o que as massas são para a estetização da existência e para a absorção do que as rodeia. "A unidade da obra de arte identifica-se com a sua integração no contexto da tradição" (Benjamin, 2000, p. 25), enquanto que a sua reprodutibilidade e a sua traição são a medida da distância que existe entre a vida quotidiana e a própria tradição.

Esta redefinição corrói a condição do homem moderno, o seu equilíbrio sensorial, a sua relação com o que está dentro e fora dele, e mesmo o seu ponto de vista. Aquilo que pertence à ordem visual e que é capaz de estabelecer uma diferença-distanciação entre o indivíduo e a sua alteridade, dá lugar ao ressurgimento do carácter táctil da experiência (McLuhan, 1977), quando o tocar – tocar e ser tocado – se torna o eixo portador da vida quotidiana, a marca da socialidade para além e aquém do sexo. As carícias que caracterizam a nossa relação com os tablets e smartphones, os swipes de Tinder, as partilhas e os emojis, neste sentido, são apenas metáforas para uma aproximação generalizada, de ordem enfática, ao outro, por meio de uma interação baseada no sentimento e na emoção, mais do que no ver e na abstração. Benjamin (2000), graças à sua capacidade de compreender os média, as superfícies e as fantasmagorias do seu tempo, foi o primeiro a vislumbrar esta passagem crucial: "todos os dias, a exigência de tomar posse do objeto a uma distância que seja a mais próxima possível na imagem, ou melhor ainda na efígie, na reprodução, torna-se cada vez mais indiscutível" (p. 25).

A imagem é assim investida da delicada missão de reconectar o corpo social com aquilo de que anteriormente estava separado, de permitir fundamentalmente uma apropriação do mundo que é também o início da sua recriação. Ícones, objetos, informações e símbolos são assim engolidos no ventre da vida quotidiana e readaptados ao que é atual e quotidiano. Ao contrário do que se escreve habitualmente sobre a globalização e o papel desempenhado neste processo pelos média, o imaginário é um regime através do qual levamos as coisas do mundo para nós próprios, ativamos um processo de participação no qual o que está próximo está ligado ao que está distante.

Neste quadro, a imagem mediática é de facto um mesocosmo, um dispositivo através do qual nos conjugamos com o que é estrangeiro e misterioso: a natureza, a técnica, o divino. A rígida separação entre o eu e o outro, filha da cultura alfabética que moldou a modernidade ocidental, é então gradualmente abandonada em favor de uma confusão generalizada, de uma interpenetração que nos recorda o holismo, de uma participação que evoca mais a tecnomagia do que a tecnologia (Susca, 2011). Não é por acaso que as palavras-chave das culturas digitais sejam as de "interação", "imersão", "ligação", ou seja, outros tantos indícios que são os testemunhos da comunhão, da confusão e da ordem matricial (Susca, 2016). Por conseguinte, compreendemos melhor porque, embora estejamos cada vez mais dependentes do ambiente técnico, estamos também a aproximar-nos da natureza. O regresso do bio, a deep ecology (Drengson & Inoue, 1995), a ordem vegan (Celka, 2018), a triagem seletiva, as férias verdes, a economia sustentável (Combes, 2010) e a ética do decrescimento (Latouche, 2006) aparecem então como os sintomas de uma nova conjunção entre os seres humanos e o ambiente, que estes consideraram durante muito tempo como um objeto a ser conquistado, ocupado e manipulado como lhes apetecia (Maffesoli, 2017). Pelo contrário, a trama que nos liga ao universo técnico é a mesma que doravante associamos à “terra mãe”. Em ambos os casos, o indivíduo dá um passo para trás em relação ao que o rodeia, mas é um passo de dança. Acaba por depender dela da mesma forma que dependemos da pessoa que lidera a dança. Este é um dos eixos do pós-humanismo que sinaliza a crise do antropocentrismo. Há também aqui um sacrifício do humano, porque a confusão em questão implica perdas para o indivíduo: a renúncia a si próprio e ao eu.

A aura do quotidiano

A função da arte e em particular do momento ritual do seu gozo, tem sido, pelo menos desde o Renascimento, a de traduzir e deslocar os sentimentos e sensações induzidos pela contemplação da obra para os sistemas simbólicos de poder e de saber que a presidem: quer se trate do senhor, do padre ou do mecenas, a questão foi sempre a de aderir a uma ordem superior à vida quotidiana, em nome da beleza, uma ordem cuja superioridade se tornou um vetor, uma fonte e uma garantia. Por conseguinte, esta correspondência estética serviu para legitimar a supremacia moral e política do poder instituído sobre a vida ordinária. A imagem é assim a ligação entre o público, as massas – ou mesmo antes disso, a "populaça" – e o corpo do soberano, que da luz da primeira retira a linfa vital para corroborar o seu estatuto. O êxtase experimentado individualmente diante do objeto único e autêntico, exposto no museu de forma austera e pomposa, faz corpo com a aprovação de uma ordem instituída e com a inscrição no quadro de uma comunidade social imaginada, a que serve de pretexto identitário ao Leviatã (Anderson, 1996).

O rito da admiração de uma obra é a alavanca que confirma e reforça o mito no qual se funda e se renova lentamente a ordem estabelecida. A distinção entre o sagrado e o profano é a matriz arquetípica sobre a qual se orienta também, durante a modernidade, a separação entre o poder instituído e o poder instituinte, entre as formas belas daquele que governa e as formas mais baixas e banais experimentadas no quadro da vida quotidiana. Se as primeiras mantêm uma sacralidade que as torna transcendentes, fundadoras e emblemáticas, o espaço do quotidiano torna-se naturalmente a margem dos que governam, uma ramificação do poder – o espelho do político. O ritual da contemplação inscreve-se então na tradição, ao satisfazer a permanência dos seus guardiões e ao dissipar nos seus corpos as energias agitadas na emoção estética.

O modo original de articulação da obra de arte no contexto da tradição encontrou a sua expressão no culto. As obras de arte mais antigas nasceram (...) ao serviço de um ritual, primeiro mágico, depois religioso. (...) O valor único da obra de arte autêntica encontra o seu fundamento no ritual, no contexto em que teve o seu primeiro valor de uso originário (...) a reprodutibilidade técnica da obra de arte, pela primeira vez na história do mundo, emancipa esta última da sua existência parasitária no contexto do ritual. A obra de arte reproduzida torna-se cada vez mais a reprodução de uma obra de arte predisposta à reprodutibilidade. (Benjamin, 2000, p. 26)

O ritual a partir do qual a obra de arte se origina como expressão e meio é, na realidade, reconfigurado, e não extinguido, pelo processo de reprodutibilidade. Benjamin, quando escreve, tem em mente uma imagem gloriosa, tradicional e transcendental do ritual: pensa nas antigas formas de religião (Obadia, 2012), nas quais o prazer estético e o envolvimento emocional são os pretextos que permitem ao público aderir a um sistema ético e simbólico, ao interpretar o papel de espectador, com ar de fiel. A reprodutibilidade técnica da obra de arte, em contrapartida, inaugura o deslize lento, mas progressivo, da faculdade de orientar o sentido, as comunicações e as imaginações de cima para baixo, do centro para a periferia da vida coletiva, nas suas molduras horizontais, de acordo com gostos, de estilos de vida e de afinidades eletivas e depois conectivas. Ela traduz gradualmente o público em artista e ao mesmo tempo em obra, sujeito de recriação e objeto de contemplação, manipulação e consumo.

Neste contexto, os rituais mudam de forma. A "peregrinação" nas catedrais clássicas da cultura, como Benjamin (2000) gostava de lhe chamar, não desapareceu, mas está a ser transfigurada sob o impulso de arquiteturas emocionais que apostam no espetáculo, na mercadoria e no lazer. Neste sentido, os museus estão a ser reconfigurados em dispositivos deslumbrantes e divertidos através de bares, cafés, espaços multimédia e lojas de lembranças, que estão a tornar-se cada vez mais nos seus verdadeiros marcos. De certa forma, o turista ou visitante já não vai realmente para lá para contemplar a obra única e autêntica, mas para viver um momento de socialidade ou de convívio. Além disso, se no passado os gadgets ou recordações museais eram vestígios utilizados para relembrar ao espectador a experiência artística vivida, hoje em dia são verdadeiros fetiches. Exit through the gift shop, o mockumentary de Banksy (2010) sobre a street art e sobre as misérias da arte contemporânea, tinha precisamente como objetivo destacar a dimensão comercial e efémera deste sector. Com efeito, ao visitar museus, especialmente os da nova geração, não se pode deixar de reparar não só na hiperpresença de gift shops à saída, como também na sua centralidade, muitas vezes mesmo à entrada desses locais.

O souvenir já não é propriamente falando um simples souvenir, mas a própria obra que o turista, o fã e o espectador mais desejam, a obra que o acompanhará a casa e que lhe permitirá estetizar o seu quotidiano, conferindo-lhe uma aura. A aura do quotidiano. Este é o penúltimo passo do processo descrito por Benjamin (2000) enquanto absorção da arte no ventre do público, sendo que o último passo é o devir-obra do público e mesmo o seu devir-souvenir, coisa e gadget, como acontece com os perfis das redes sociais, as fotos do Instagram, os emoji, os stickers, os memes, gifs e qualquer outra reificação eletrónica de indivíduos em linha. Isto ocorre no contexto de novos rituais que certamente nada têm a ver com as filas de espera para aceder ao Louvre ou ao Museu do Vaticano e não respondem aos cânones dos manuais de arte. No entanto, na mania das selfies e na implantação de <3 online, na elaboração de histórias, na montagem de memes, até à encenação de uma intimidade esteticizada no Snapchat, passando pela escolha cuidadosa das fotos de perfil no Facebook, força é constatar o advento e a proliferação de práticas societais simbolicamente densas, causas e efeitos de emoções, cerimónias e comunhões. Já não se dirigem a altares sobresselentes, em nome de verdades universais e abstratas – as grandes narrativas – mas sim à efervescência daquilo que é próximo e quotidiano, tendo a ver com a ordem dos pares: as afinidades conectivas, o estar-juntos sem fim. O quotidiano torna-se assim, para o bem e para o mal, segundo um espírito que evoca a sacralidade selvagem de Bastide (1997), um museu a céu aberto, cuja "revolta é o próprio prazer, e é isto que está também em jogo em cada pensamento” (Bataille, 2010, p. 120).

Podemos, portanto, concluir que, numa época de ampla difusão, a arte desvanece-se na vida quotidiana. A vida comum torna-se assim um objeto e sujeito estético. Este não é mais o quarto de hora da fama previsto por Andy Warhol durante a época de ouro da pop art, mas uma arte que se tona verdadeiramente "arte do público". O desafio futuro é entender o que é: ainda é legítimo falar de arte e sujeitos em tal cenário?

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Recebido: 18 de Janeiro de 2021; Revisado: 17 de Março de 2021; Aceito: 17 de Março de 2021

Tradução: Jean-Martin Rabot

Vincenzo Susca é professor de Sociologia do Imaginário, diretor do Departamento de Sociologia e investigador no Laboratoire d'Études Interdisciplinaires sur le Réel et les Imaginaires Sociaux (LEIRIS), da Universidade Paul-Valéry (Montpellier). McLuhan Fellow da Universidade de Toronto e diretor editorial dos Cahiers Européens de l'Imaginaire, é autor de vários livros, incluindo Joie tragique. Les formes élémentaires de la culture électronique (Milão, 2010, Paris, 2011, Barcelona, 2012), Les affinités connectives (Paris, 2016, Porto Alegre, 2019) e Pornoculture (Paris, 2016, Milão, 2016, Porto Alegre, 2017, Buenos Aires, 2020, com C. Attimonelli). O seu último livro é Un oscuro riflettere. Black Mirror e l’aurora digitale (Milão, 2020, Montréal, 2021, Porto Alegre, 2021, com C. Attimonelli). Email: vincenzo.susca@univ-montp3.fr Morada: Université Paul-Valery, 34 Route de Mende, 34090 Montpellier, France

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