SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.13Administração Trump - Make the World Multipolar Again índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Political Observer - Revista Portuguesa de Ciência Política

versão impressa ISSN 1647-4090versão On-line ISSN 2184-2078

PO-RPCP vol.13  Lisboa jun. 2020  Epub 18-Maio-2021

https://doi.org/10.33167/2184-2078.rpcp2020.13/pp.9-14 

Editorial

Editorial: A Ciência da Política e o Poder

Cristina Montalvão Sarmento1 

1 Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Universidade de Lisboa, Lisboa, Portugal


A Ciência da Política e o Poder

Para o reforço da ciência da política como disciplina académica, contribuíram, certos fenómenos como a proliferação dos sistemas democráticos, dos partidos políticos e a expansão dos órgãos de comunicação social coletiva. Estes factos levaram ao aumento de estudos sobre estas matérias, o que suscitou também uma maior proliferação da ciência da política e dos seus estudiosos, que através da tradição política filosófica do ocidente, prosseguiram as indagações dos clássicos. Este fenómeno culmina com a criação da International Political Science Association (IPSA-AISP), de origem franco-americana, associação do pós-guerra, onde cientistas políticos discutiram as suas posições, o que impulsionou mundialmente a constituição de organizações nacionais de académicos da área.

Deste modo, o desenvolvimento da comunidade epistémica dos cientistas políticos é um fenómeno histórico oriundo da guerra e da política internacional. Portugal fez também o seu caminho, criando a Associação Portuguesa de Ciência Política e obtém a sua maioridade absoluta quando projetou acolher o 26º Congresso Mundial de Ciência Política que se deveria ter realizado em Lisboa no corrente ano de 2020, dedicado ao tema: New Nationalisms in an Open World. Mal imaginávamos que o seu adiamento para o ano de 2021, seria provocado pela atual crise de saúde mundial.

A Revista Portuguesa de Ciência Política nasceu em 2010 no âmbito desta maioridade da comunidade de estudiosos dos fenómenos do poder. Hoje é do senso comum que a ciência política ou análise política é o estudo da política - dos sistemas políticos, das organizações e dos processos políticos. Os cientistas políticos podem estudar instituições ou outras organizações cujas estruturas e processos de ação se aproximam ou constituam um governo, em complexidade e interconexão.

Não obstante esta concetualização comummente aceite, no início, existiu no interior da ciência política, uma discussão acerca do objeto de estudo desta ciência, que, para alguns, se concentrava no Estado e, para outros, no poder. A primeira posição restringe o objeto de estudo da ciência política; enquanto a segunda, o amplia. A posição da maioria dos cientistas políticos é hoje essa visão mais abrangente, de que o objeto de estudo da ciência política, é o poder.

Assim, atualmente, a ciência da política acolhe várias perspetivas que se entrelaçam de modo a constituir um amplo campo de estudos e de investigação. Deste modo, a ciência política investiga acerca da teoria e da prática da política. Descreve e analisa os sistemas políticos e o comportamento político. Abrange diversos campos, como a teoria e a filosofia política, os sistemas políticos, os partidos políticos, as elites políticas, a ideologia, a teoria dos jogos, a economia política, a geopolítica, a geografia política, a análise de políticas públicas, a política comparada, a análise de relações exteriores, política e direito internacional, estudos de administração pública e governo, o processo legislativo, o direito público (como o direito constitucional) e outros que envolvam a atividade das comunidades políticas e naturalmente, as relações internacionais ainda que a mesma venha, como outros subcampos, a ganhar autonomia disciplinar.

Porém, importa também considerar que existem várias formas de abordagem ao objeto de estudo desta ciência que se podem sintetizar maioritariamente em três. Por um lado, pode ser do ponto de vista da política descritiva, ou empírica: nesta linha os investigadores optam por análises empíricas da realidade política. Nesta opção de análise política é de fundamental importância a recolha de dados fiéis à realidade, distinguindo-se, assim, das teorias normativas. Por outro lado, pode colocar o foco na política comparada, fundamental na ciência política, esta abordagem da investigação procura, através de comparações entre diversas realidades sócio históricas, elementos mais gerais da realidade política das sociedades. Também aqui é necessária a mediação do dado empírico com a teoria, mas desta vez, através da comparação, tenta-se chegar a elementos generalizáveis da realidade política e questionar hipóteses ou teorias concebidas a respeito de uma única realidade delimitada. E, finalmente do ponto de vista da teoria política, abordagem em que os investigadores podem partir dos dados empíricos, mas articulam-nos com a teoria política propriamente dita para compreender e explicar a realidade considerando insuficiente a mera descrição da realidade tal como ela se apresenta. Assente, que a ciência da política reflete sempre o estudo sobre o poder, este número foi organizado em torno das diferentes perspetivas que o seu estudo pode implicar.

A primeira parte a que se deu o título de Novos Poderes inclui um conjunto de três artigos que nos chegaram em língua inglesa. Seja, um primeiro, que se debruça sobre a administração Trump, seja a análise sobre as relações entre a China e o Paquistão no âmbito da Belt and Road Initiative ou finalmente, um terceiro que se debruça sobre a situação em Moçambique. Todos representam poderes transfigurados, novos poderes que se afirmam com outros discursos que criam ordens diferenciadas que alteram o mundo político e carecem de análise e problematização.

Na segunda parte, agrupados sob o título de Análises sobre o Poder um primeiro artigo é para nós particularmente importante porquanto interroga as ligações entre a ciência da política e as variações que a democracia tem sofrido que nos tem levado a múltiplas análises de uma “crise” da democracia. Um segundo artigo explora, talvez consequentemente a questão dos equilíbrios institucionais, ensaiando sobre os modelos de decisão que se vão manifestando.

Outros Modelos de Poder constituem a terceira parte da revista. Outras formas de poder não menos importantes impactam a vida do coletivo. Um artigo que nos chega do Peru discute a capacidade da gestão administrativa dos municípios num interessante estudo comparado. E, ainda que de forma histórica e um pouco lateral, uma análise do genocídio do Ruanda a partir das teorias sobre segurança da Escola de Copenhague, introduzem a ligação entre ciência e poder, que são o alvo primordial da ciência da política.

Neste número existiu ainda espaço para as recensões que os nossos jovens estagiários prepararam é assim, que o Diogo Nascimento, o Diogo Moreira e a Ana Rita Dias, nos trazem os recentes livros, respetivamente: The Right Side of the History de Shapiro, A Era dos Muros de T. Marshall e a A Estranha Morte da Europa de D. Murray, todos com a marca da atualidade.

Como sempre afirmamos a RPCP fica devedora de um conjunto de contributos de apoio e neste número é o contributo da Doutoranda Patrícia Tomás que devemos destacar. Finalmente, a nossa capa que, como sempre, se projeta na street art, onde lemos culturalmente parte da leitura política sobre o mundo, é dedicada a um mural com o sugestivo título de “Intensive Care”, cuidado intensivo que o mundo precisa. Assumíamos então, que esta imagem representava uma relação com as preocupações ambientais e de gestão mundial de recursos, mas mal imaginávamos que o intensive care, se viria a demonstrar muito mais complexo face à recente crise de saúde pública pela propagação endémica do novo corona vírus, designado SARS-CoV-2, que a organização mundial de saúde vem a identificar como COVID-19, declarando a situação de pandemia dado a sua progressão mundial. Motivo pelo qual, o próximo número da revista será dedicado ao tema. Fazemos votos de uma boa e útil leitura.

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons