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Political Observer - Revista Portuguesa de Ciência Política

versión impresa ISSN 1647-4090versión On-line ISSN 2184-2078

PO-RPCP vol.17  Lisboa jul. 2022  Epub 28-Sep-2022

https://doi.org/10.33167/2184-2078.rpcp2022.17/pp.17-37 

Artigo Original

Tucídides na Teoria das Relações Internacionais

Thucydides in International Relations Theory

Tomé Ribeiro Gomes1 

1 Centro de Estudos Internacionais, ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, Portugal; tome.ribeiro.gomes@gmail.com


Resumo

Tucídides é apelidado com frequência de pai das Relações Internacionais (RI). Dentro da dis ciplina, trava-se um debate acerca da sua visão analítica, sendo invocado como percursor de diferentes escolas teóricas. Apesar da existência de leituras simplistas que descontextualizam passagens e aceitam a primeira tradução que encontram, mesmo uma interpretação cuidadosa mostrará que a sua História da Guerra do Peloponeso dá espaço para interpretações diferentes à luz das principais teorias das RI. Este artigo faz a revisão do debate em torno de Tucídides na teoria das RI, apresentando as principais barreiras à compreensão de Tucídides, considerando as diferentes tentativas de apropriação da sua obra e respetivas críticas e, por fim, argumen tando que o maior contributo da sua obra para a disciplina está no ecletismo, na ambiguidade e na primazia do concreto sobre o abstrato. A união destas características resulta numa postura teórica semelhante à da raposa no fragmento do poeta grego do séc. VII Arquíloco, que Isaiah Berlin aplicou, com reservas, a Tolstói. A postura tucidideana - eclética, cética e pluralista - pode e deve ser adotada por analistas das RI nos nossos dias.

Palavras-chave: construtivismo; neorrealismo; pluralismo; realismo; Tucídides

Abstract

Thucydides is frequently cited as the father of International Relations(IR). There is debate in the field on how to interpret his thought, with different schools invoking him as their an cestor. Despite some simplistic readings of his work, which consider quotations out of their context and acritically accept the first translation that comes to hand, careful study of The History of the Peloponnesian War will find that the text allows for multiple interpretations in light the main IR schools of thought. This paper reviews the debate around Thucydides in IR theory, considering the main barriers to reading his work and the different attempts at claiming him for a particular theoretical view. Lastly, it argues that the main contribution of Thucydides to IR is in his eclecticism, his embrace of ambiguity, and his preference for the concrete over the abstract. Taken together, these characteristics amount to a theoretical stance similar to that of the fox in the 7th century BC poet Archilochus, which Isaiah Berlin applied to Tolstoy with reservations. The Thucydidean posture - eclectic, sceptical, and pluralist - can and should be adopted by IR analysts today.

Keywords: constructivism; neorealism; pluralism; realism; Thucydides

1. Introdução

As Relações Internacionais (RI) têm uma relação complicada com Tucídides. [1] O autor é “widely acknowledged to be the father of [International Relations]” (Lebow, 2007, p. 245), e a imagem do seu busto na página da Wikipédia dedicada a “Interna tional Relations” é disso testemunho (Wikipedia, 2021). A sua associação mais antiga é com o Realismo: “To most scholars in international politics, to think like a Realist is to think as the philosophical historian Thucydides first thought” (Doyle, 1997, p. 49). Porém, esta identificação foi sendo contestada por diferentes escolas teóricas das RI ao longo das últimas três décadas. Os desafios principais vieram dos realistas estruturais e dos construtivistas, que argumentam ter leituras mais adequadas da História da Guerra do Peloponeso (doravante História).

Recentemente, uma leitura estruturalista conquistou a consciência popular atra vés da expressão “Thucydides’ trap” (armadilha de Tucídides). Cunhada por Graham Allison (2012, 2013, 2019/2017), que a aplicou à rivalidade crescente entre EUA e China, a expressão gerou debate dentro e fora da academia. Allison empregou-a pela primeira vez em 2012, e logo em 2013 a “armadilha” surgia num discurso do Pre sidente da República Popular da China, Xi Jinping (Rachman, 2018). A esta súbita popularidade seguiu-se a crítica de muitos leitores atentos de Tucídides, reabrindo o debate sobre o lugar da sua História nas RI (Gautam, 2018; Kirshner, 2019; Lebow & Tompkins, 2016; Yun, 2021).

Há dois motivos principais para pensarmos sobre o lugar de Tucídides na dis ciplina. Primeiro, a obra de Tucídides tem sido saqueada pelas RI com frequência. Alguns autores invocam episódios, diálogos e reflexões da História como fontes de legitimidade para as suas teses sobre fenómenos internacionais desde as causas da Primeira Guerra Mundial à lógica da Guerra Fria (Novo, 2016, p. 17). Importa por isso testar a correção desses argumentos contra a obra em que se baseiam, tanto para os pôr à prova, como para fazer justiça à obra. Em segundo lugar, Tucídides é importante para as RI por si só, independentemente do uso que a disciplina tem feito da sua obra.

Neste artigo, defendo a utilidade da obra de Tucídides para a teoria das RI. Co meço por esboçar um estado do debate em torno da leitura da História pela disci plina, para depois reconsiderar as lições de Tucídides para os estudantes e analistas da realidade internacional nos dias de hoje. Concentro-me em textos acerca de teoria das RI publicados a partir da década de 80, altura em que a começa a problematizar -se com alguma intensidade a identificação de Tucídides com o realismo clássico. O artigo explora esta literatura ao longo de três secções. A primeira considera os pro blemas da interpretação que se colocam ao ler a História hoje. A segunda apresenta criticamente as tentativas de apropriação de Tucídides por parte de diferentes escolas teóricas das RI, nomeadamente o realismo, nas variantes clássica, neoclássica, e es truturalista, e o construtivismo. A terceira secção explora o contributo da História para a teoria das RI enquanto síntese teórica pós-paradigma. Na Conclusão, defendo que ler Tucídides continua a ser relevante para quem se dedica às RI, não apesar, mas precisamente devido à variedade de interpretações que a sua obra permite.

2. Obstáculos à interpretação de Tucídides à luz das RI

É inevitável que um texto com cerca de 2500 anos coloque problemas de interpreta ção a quem o lê hoje. O desafio é exacerbado pelo objetivo e pelos métodos de Tucí dides. Apesar de afirmar que quer estabelecer a verdade dos factos contra as versões concorrentes que então se ouviam (I.21.1, I.22.1-3), a sua ambição é mais vasta do que isso. A perplexidade central que o leva à escrita é a quebra das relações normais entre comunidades políticas helénicas que levou à Guerra do Peloponeso (431-404 a.C.), na qual participou como general ateniense antes de ser exilado. Diz que esta foi a guerra mais devastadora de sempre, e que esse seu carácter inédito foi para ele evidente desde o início. O aristocrata ateniense dotado de uma acuidade intelectual extraordinária e de um forte sentimento de justiça tem a perceção que algo de muito fundamental falhou, e é isso que motiva a sua investigação e a torna digna de estudo para gerações vindouras (I.23.1-4).

Tucídides procura assim uma conceção que lhe permita dar uma ordem ao caos em que viu mergulhar o mundo helénico (Strauss, 1989). Esta ambição faz dele um praticante da História no sentido que lhe dá José Mattoso (2019): uma tentativa de encontrar uma lógica no passado que sirva de chave para o presente e para o futuro. É este desígnio universalista que dá a Tucídides o direito a almejar a que a sua obra seja um “legado para sempre” (I.22.4). Torna-se assim algo mais que um cronista, como foi notado por Hobbes ao dizer que Tucídides é “the most politic historiographer that ever writ” (Hobbes, 1839-45b, p. viii). Todavia, são raras as passagens em que a opi nião do historiador surge de um modo declarado, e é na própria narrativa que temos de procurar grande parte das teses e dos argumentos de Tucídides.

Excepto quando se pronuncia em nome próprio, avaliando personagens-chave ou especulando sobre as suas motivações, o método narrativo de Tucídides significa que é na sequência dos eventos ou dos discursos que temos de procurar a visão do mundo do autor. À oração fúnebre em que Péricles apresenta uma visão idealizada de Atenas (II.35-46) segue-se a descrição da peste e subsequente rutura das normas sociais atenienses (II.47-54). O que nos diz isto sobre Atenas? E sobre Péricles? Tucí dides tece-lhe grande elogios, quer em nome próprio, que em nome dos seus contem porâneos (I.140.4, II.65). Parece desta forma ilibá-lo dos desaires que a guerra traria a Atenas após a sua morte, e pelas quais muitos o terão responsabilizado. Porém, esta defesa é posta em dúvida se a cruzarmos com uma passagem que surge logo antes da primeira leva de elogios a Péricles. Aí, Tucídides aproveita uma digressão histórica para dizer que Temístocles, proeminente político ateniense da geração anterior à de Péricles, “demonstrou decididamente a força do seu carácter e muito especialmente a esse respeito, mais do que qualquer outro, era digno de admiração” (I.138.3, ênfase minha). Estará Tucídides a menorizar a genialidade de Péricles e a estratégia que ele levou Atenas a adotar?

Além das questões suscitadas pela narrativa, também o método do discurso di reto levanta problemas. São 141 os diálogos e discursos presentes na História (Han son, 1996, p. xv). O próprio autor admite que estes não são transcritos ipsis verbis, e por razões práticas nunca o poderiam ser. Os discursos são reconstituídos a partir da sua memória ou da de testemunhas que entrevistou e estão por isso à mercê da parcialidade destas pessoas ou das suas genuínas falhas de memória. Tucídides vai mais longe, e admite recriar discursos de acordo com o que faz sentido que os prota gonistas tenham dito na ocasião (I.22.1). Neles encontramos visões da humanidade que poderão ou não coincidir com as de Tucídides. Dado que surgem muitas vezes sob a forma de pares contrastantes de peças oratórias, cada uma a defender um curso diferente com base em pressupostos morais e estratégicos opostos, é impossível que os oradores da História sejam todos porta-vozes das opiniões do autor. São por isso duvidosas as teses colam Tucídides a uma particular visão do mundo através das palavras que atribui a terceiros. Quando temos em conta toda a obra, torna-se difícil sustentar algumas ideias comuns, tal como a de que no diálogo de Melos (V.58-111) o autor está a endossar a amoralidade na conduta política. Uma leitura atenta terá em conta toda a obra e não apenas esta ou aquela passagem.

A consciência de que Tucídides apresenta uma visão pessoal dos eventos e tem opiniões sobre eles (Forsdyke, 2017) é essencial para ler bem a História. Tucídides obteve o tempo e a distância necessários à análise por via do seu exílio de 20 anos, que lhe deu acesso aos protagonistas políticos de ambos os lados, tanto de cidades -estado (sing. pólis, pl. poleis) alinhadas com Atenas como com Esparta (V.26.5). Este desprendimento político leva alguns autores a argumentar que o historiador ganhou “a perspective that transcends perspectivism - what Thomas Nagel calls the ‘view from nowhere’” (Polansky, 2015, p. 439). Porém, não devemos esquecer que o castigo aplicado a Tucídides deveu-se ao seu falhanço enquanto general na defesa da Anfí polis, na costa da Trácia, onde a sua família tinha interesses económicos (IV.105.1, IV.106.3). A Schuldfrage, a questão da sua culpa (Schuld) de Tucídides neste revés estratégico é alvo de um longo debate na historiografia. De qualquer forma, é seguro assumir que Tucídides saiu de Atenas com sentimentos fortes em relação ao suce dido. A decisão que o exila é tomada pelo povo de Atenas reunido em assembleia, in fluenciado pela retórica de Cléon. Ora, a assembleia não surge na História como um órgão deliberativo racional ou competente, e Cléon é-nos apresentado como sendo “o mais violento dos cidadãos” (III.36.6). Pensar que Tucídides é emocionalmente neu tro em relação aos acontecimentos da Guerra do Peloponeso é uma postura arriscada (Canfora, 2017).

Welch (2003) chama a nossa atenção para outra dificuldade apresentada pelo texto da História: a tradução. Como sabemos o que Tucídides queria dizer quando a própria tradução do texto para as línguas com que trabalhamos é contenciosa no domínio dos Estudos Clássicos? Como sabemos que o Tucídides que estamos a ler é o mesmo Tucídides que um colega está a ler numa tradução diferente? Classicistas como Mary Beard (2010) notam o facilitismo interpretativo dos autores não instruí dos na língua original. Conclui-se que este é um problema significativo que deve ser tido em conta pelas RI. Os riscos da leitura enviesada podem ser mitigados através da consulta de várias traduções e da deferência em relação aos Estudos Clássicos acerca dos méritos e deméritos de cada uma. Ainda assim, a tradução continuará a ser uma barreira imponente para o leitor moderno, até porque o Grego de Tucídides é especialmente difícil de entender. Na apreciação de Greenwood (2015), o acervo de traduções a partir do original deixa ainda muito a desejar. Em Portugal, a primeira tradução a partir do original chegou apenas em 2013. Impõe-se por isso uma grande dose de humildade ao ler a História.

3. Tucídides e as escolas teóricas das RI

3.1 Realismo clássico

A associação entre Tucídides e realismo é tão forte que, para Michael Doyle, a ques tão da sua influência é quase tautológica: “Was Thucydides, Thucydidean? Is Rea lism, Realist?” (Doyle, 1990, p. 223). O realismo pode ser declinado em três “imagens” (Waltz, 2001). A “primeira imagem” é aquela que identifica a natureza humana como o locus explicativo do comportamento dos Estados na arena internacional. A “se gunda imagem” localiza as causas do comportamento externo dos estados na sua política interna. O próprio Waltz irá colocar Tucídides na “terceira imagem”, aquela que vê a estrutura do sistema internacional como a principal condicionante para o comportamento das unidades, os Estados (Waltz, 2001, p. 160). Tucídides é geral mente associado a Hobbes e a Maquiavel como precursor da “primeira imagem”. Por assumir o compromisso de dar uma versão desapaixonada dos factos (I.22.4), assim como pelas muitas passagens em que descarta explicações supersticiosas de fenóme nos naturais ou desconsidera decisões baseadas em fatores religiosos (II.54, VII.50.4), é tentador ver em Tucídides como antepassado dos analistas racionais que resistem à tentação de falar sobre o que deveria ser, preferindo ocupar-se da “verdade efectiva da coisa”, como lhe chama Maquiavel (2008, p. 185).

Além de Maquiavel, também é comum traçar uma linha de continuidade entre Tucídides e Thomas Hobbes. Há boas razões para isso. A primeira obra publicada por Hobbes, em 1628, é a sua tradução da História da Guerra do Peloponeso. Esta é a pri meira tradução de Tucídides para vernáculo a partir do grego original, o que nos diz algo sobre a importância que Hobbes dava ao ateniense (Steinmetz, 2021). O próprio admite essa influência num prefácio da tradução, assim como na sua “Autobiography in Verse”, de 1680 (Hobbes, 2020, p. 469). Une-os a preocupação com os tópicos da natureza humana e da anarquia, e é possível encontrar em Hobbes várias marcas da leitura da História. A descrição que Tucídides faz da revolução e subsequente guerra civil na Córcia (III.70-85, espec. III.82.2), por exemplo, pode ser vista como inspira dora da conceção hobbesiana do estado de natureza e necessidade da ordem imposta pelo Leviatã (Evrigenis, 2006, pp. 308-209, 314; Steinmetz, 2021, p. 91).

No entanto, podemos também encontrar no episódio da Córcia uma diferença fundamental entre Tucídides e Hobbes. Como nota Ahrensdorf (2000), se em Hobbes é o medo da morte violenta e o desejo de segurança que torna o Estado necessário para superar a anarquia, já em Tucídides é a esperança de atingir a glória que explica a propensão para a violência e para a conquista do poder (IV.108.4). Infelizmente, Tucídides não vislumbra nenhuma solução formal e permanente para os efeitos des trutivos da ambição humana, o que contraste com a fé de Hobbes num Estado prote tor (Johnson, 1993, p. 226). Para que a ambição pessoal não dilacere a comunidade, é necessário que haja uma liderança política cautelosa, moderada e eficaz (Ahrensdorf, 2000, pp. 587-592). No entanto, segundo Lebow (2007a), não é a anarquia que está na origem dos excessos dos decisores políticos, mas sim a falência da nomos, das leis não escritas que fundamentam o sistema de cidades-estado gregas (Lebow, 2007a, p. 172).

No cerne deste debate está a noção de agência humana que encontramos em Tucí dides. A sua inserção no realismo clássico de “primeira imagem”, em que surge como antecessor de Niebhur e de Morgenthau, depende de um suposto pessimismo fun damental e de uma crença na racionalidade do ator internacional. Podemos encon trar esse pessimismo na visão cíclica que Tucídides tem da História (Johnson, 1993, pp. 225-226). Mas o pressuposto da racionalidade levanta maiores dúvidas. São mais abundantes na História os exemplos de políticos irresponsáveis do que de estadistas competentes. A justiça e a moderação são as qualidades que Tucídides procura num líder, mas o que encontramos repetidamente no seu texto são exemplos de como a ambição dos protagonistas políticos leva as comunidades à beira do precipício (Ah rensdorf, 1997; Korab-Karpowicz, 2006; Orwin, 1986; Rahe, 1995). Orwin atribui por isso a qualidade de “humanidade” a Tucídides. Embora muitas das personagens da sua História sejam de alguma forma realistas, Tucídides denota uma forte preocu pação com a justiça e com a piedade (Orwin, 1994, pp. 8-11).

3.2 Realismo neoclássico

O campo do realismo neoclássico também encontra argumentos em Tucídides. Garst (1989, 2000) encontra-os na grande importância que o autor dá ao carácter e à orga nização interna dos Estados como variáveis explicativas da sua política externa. Os desenvolvimentos políticos dentro das Estados e as suas consequências na sua polí tica externa são evidenciados pela abundância de discursos deliberativos que opõem fações políticas internas ao longo da História. A luta entre oligarcas e populares, sem pre à espreita na maioria das poleis, inclina-as ora para a coligação ateniense, ora para a espartana (III.82), tornando a componente ideológica em algo essencial para explicar a origem e o curso da Guerra do Peloponeso (Garst, 2000).

Além do conflito interno provocado pela luta de classes nas poleis, há ainda traços de personalidade comunitários que parecem fixos e imutáveis e que são preponde rantes quer na decisão de fazer a guerra, quer na forma de a conduzir. Insiste neste aspeto em vários passos, especialmente quando coloca na boca de personagens ou quando ele próprio menciona o contraste entre a audácia ateniense e a hesitação es partana (I.69, I.118, VIII.96). Aliás, não fosse essa hesitação e é possível que o poder ateniense não se tivesse expandido ao ponto de se tornar tão ameaçador para Esparta e para os seus aliados. É possível argumentar que Esparta cede a sua hegemonia a Atenas após a guerra com os Persas devido às suas circunstâncias políticas domés ticas que tornavam impossível a opção pelo poder naval à semelhança do que fez Atenas (Garst, 2000, pp. 75-76; Rahe, 2015, p. xiv).

Os autores que relevam a política interna e o carácter coletivo dos estados em Tucídides, como Novo (2016) e Bagby (1994), fazem-no para realçar que a cultura e o tipo de regime influenciam o comportamento dos atores do sistema internacional e que a única forma de compreender a História é levar em conta as assimetrias entre uma Atenas naval, democrática e aberta ao exterior, e de uma Esparta terrestre, mo nárquica e conservadora. Dos diferentes caracteres resultam diferentes formas de ad ministrar os respetivos sistemas de alianças. A variância nos processos políticos das cidades-estado e a diferença nas decisões que daí resulta também levam Doyle (1990) a concluir que Tucídides não pode ser visto como um estruturalista. Em Tucídides, comunidades políticas diferentes reagem de forma diferente às mesmas mudanças no sistema de poder inter-estados.

3.3 Realismo estrutural

Apesar de referências a Tucídides em Kenneth Waltz (2001, p. 159; 1979, p. 127), é Ro bert Gilpin quem faz a defesa mais sustentada de Tucídides como realista estrutural (Gilpin, 1981, 1984, 1988). Tal como Tucídides previu que aconteceria no seu prefá cio (I.22.4), Gilpin diz que a História é tão relevante para o séc. V. a.C. como para a realidade internacional contemporânea (Gilpin, 1981, p. 7). Uma das dimensões que para isso contribui é a importância que Tucídides dá aos fatores económicos, que Gilpin acusa os realistas clássicos de terem menosprezado. Em reação, os “novos rea listas” voltaram “às raízes” representadas pela História, obra que “can be read as an examination of the impact of a profound commercial revolution on a relatively static international system.” (Gilpin, 1984, p. 293).

Gilpin resume a lição da História da seguinte forma: “The essential idea embod ied in Thucydides’ theory of hegemonic war is that fundamental changes in the inter national system are the basic determinants of such wars. (…) The outcome of such a war is a new international structure” (Gilpin, 1988, p. 592). Esta ideia encontra esteira numa das mais famosas frases de Tucídides: “O pretexto mais próximo da verdade e que não tem sido visível no que se tem dito é que o avanço a que os Atenienses tinham chegado lhes conferia muito poder, o que causou medo aos Lacedemónios e os obrigou a declarar a guerra” (I.23.6). Tucídides parece apontar aqui para uma dinâmica de fundo que seria a disparidade nos ritmos de crescimento de poder entre cidades-estado. Estaria assim a antecipar a “law of uneven growth” que sintetiza o estruturalismo gilpiniano e que o aproximaria da teoria da transição de poder de Organski (Gilpin, 1981, pp. 94, 158), ou dos longos ciclos de Modelski e Thompson (Modelski, 1987, pp. 1, 53, 58-59).

Recentemente, a visão da Guerra do Peloponeso como uma guerra de transição hegemónica ganhou o nome de “armadilha de Tucídides”. A expressão foi cunhada por Graham Allison, que atribui a Tucídides a ideia de que as guerras de transição de poder tendem a ser violentas devido ao medo de declínio sentido pelo hegemon em face do aumento de poder do challenger. Allison aplica o conceito à relação EUA -China, que diz estarem embrenhados nas redes de uma armadilha de Tucídides (Allison, 2019/2017). Esta tese tem gerado fortes críticas. Gautam (2018), sublinha que o conceito de “armadilha” é imposto a Tucídides, cujo realismo, como vimos, não é consensual e baseia-se numa leitura simplista da matriz analítica do autor. Tam bém Kirshner (2019) dedica várias linhas à desconstrução do argumento de Allison, apontando pelo caminho uma variedade de casos onde Allison comete erros factuais e interpretativos acerca da História. Vários dos quais estão presentes na sua interpre tação da frase acerca das origens da guerra (I.23.6).

No entanto, Tucídides é explícito quanto ao mecanismo que transforma o “au mento de poder de Atenas” em guerra. Esse mecanismo é o “medo de Esparta” - e esse medo, diz-nos Kirshner (2019), não tem em Tucídides uma explicação relacio nada apenas com as alterações sistémicas em curso. Pelo contrário, envolve o carác ter e regime dos estados e os seus respetivos processos deliberativos, que por sua vez são protagonizados por atores que instrumentalizam a emoção “medo” para obter vantagem política. Aqui, “o medo de Esparta” não é visto como uma inevitabilidade decorrente da distribuição de poder, embora seja inevitável que esse medo, uma vez instalado e transposto para a ação, leve as partes à guerra.

Contra as leituras gilpiniana (Gilpin, 1981, 1984, 1988) e waltziana (Monten, 2006, Waltz, 2001) de Tucídides, Garst (1989) reage dizendo que “[Thucydides] pro vides a far richer understanding of hegemony in the international arena than that of neorealism” (Garst, 1989, p. 22). O conceito de poder em Tucídides não é concreto, discreto e mensurável, mas sim difuso, dependendo de fatores como as instituições sociais da pólis e as convenções que a constrangem nas relações de “controlo psico lógico” que mantém com as suas semelhantes. Também Bagby (1994) defende que não encontramos realismo ou neorrealismo em Tucídides, já que a História enfatiza fatores como o carácter nacional, a influência das dimensões morais e intelectuais de líderes políticos, a importância da retórica na decisão política e a moralidade ou imoralidade de determinada conduta.

Andrew Novo (2016) critica ainda os estruturalistas por assumirem a bipolari dade do sistema helénico do século V a.C. Contrapõe que este sistema era antes ca racterizado pela multipolaridade, com espaço para atores que, longe de serem mar ginais, podiam condicionar fortemente a política dos dois grandes poderes centrais na História. Para Novo (2016), a narrativa de Tucídides chega mesmo a contrariar a causalidade explicitada pelo próprio: o verdadeiro instigador da guerra foi Corinto, ao condicionar a política externa da aliada Esparta no sentido de iniciar hostilidades (I.68-71). Já o medo que precipitou o conflito não foi o de Esparta, mas sim o medo de Atenas de perder a sua hegemonia naval e comercial para o poder naval de Corinto, ameaça essa que Esparta, cuja base de poder era terrestre, não representaria num futuro próximo (I.140-145).

A bipolaridade do sistema político da Guerra do Peloponeso pode ser questionada por outra via. Yun (2021) nota que Tucídides omite o enorme poderio da Pérsia, e que por isso a Guerra do Peloponeso não terá surgido no seio de um sistema bipolar. Porém, a Pérsia é mencionada na medida em que tem movimentações observáveis pelo historiador. Exemplo disso é quando ele regista a interceção por Atenas de um enviado persa com destino a Esparta (IV.50.1-3). Se a Pérsia esperava para ver o resul tado da rivalidade Atenas-Esparta, é natural que não apareça com frequência numa narrativa preocupada sobretudo com o que é visível. Como nota Canfora (2017, pp. 4-5), o sentido da visão é central em Tucídides. No início da terceira década da Guerra, os anos finais tratados na História, a Pérsia já se mostra presente, chegando a descrever-se uma estratégia persa que consistiria em esperar que Atenas e Esparta se fragilizassem mutuamente antes voltar a interferir na Hélade (VIII.46). Gilpin reconhece a existência da Pérsia enquanto grande potência, mas apenas numa “tela mais ampla”, ou num “sistema muito maior” que o “sub-sistema” de Estados gregos considerado por Tucídides (Gilpin, 1981, p. 38). Apenas se aceitarmos esta delimita ção do sistema internacional podemos considerar o conflito entre Atenas e Esparta como uma “guerra hegemónica”.

A História motiva ainda o debate entre neorrealismo defensivo, na senda de Waltz (1979), e ofensivo, na de Mearsheimer (2014). Por um lado, o motivo “medo” pode levar à moderação; por outro, os motivos “honra” e “interesse” inspiram à aquisi ção contínua de poder (Korab-Karpowicz, 2006, p. 235). É a famosa tríade de le gítimas motivações (medo, honra e interesse) formulada pelas enviados atenienses que justificam a sua hegemonia perante uma audiência espartana (I.72-98, espec. I.76). No entanto, Tucídides introduz complexidade nesta explicação. Vê em Atenas uma tentação imperialista, mas o elo que liga essa tentação ao deflagrar da guerra está na incapacidade espartana de traçar uma linha vermelha aos abusos atenienses até ser demasiado tarde e deixar que se instale o medo perante o poderio ateniense. Olhando para a conduta de Esparta, é difícil considerar Tucídides um realista ofen sivo e olhando para a de Atenas, é difícil ver nele um realista defensivo. Como ve remos abaixo, é possível ver toda a História como uma tragédia que mostra como a hubris ateniense levou à sua nemesis.

3.4 Construtivismo

No diálogo de Melos (V.58-111), os enviados atenienses explicam aos mélios que a neutralidade não é para eles uma opção e que as consequências da rebelião serão severas, não por qualquer consideração de justiça, mas simplesmente porque Atenas tem o poder de os subjugar. Este episódio é tomado pelo principal defensor da leitura construtivista da História, Richard Ned Lebow, como uma instância clara em que Tucídides, a propósito de uma pequena ilha estrategicamente insignificante, apro veita para revelar a erosão da legitimidade de Atenas no plano do sistema internacio nal (Lebow, 2001). O diálogo expõe a falência da linguagem comum que assegurava a hegemonia de Atenas. Não era nos seus navios, mas sim numa ideia de justiça em que se baseava a legitimidade ateniense para recolher tributo de uma vasta rede de aliados. Os autores realçam a distinção fulcral entre hegemonia e arkhé. A hegemonia pressupõe que os outros atores reconheçam uma certa honra ao hegemon que o legi tima a definir a ordem internacional em seu benefício. Arkhé, pelo contrário, designa o domínio, a força ou o poder material que permite a uma potência agir à revelia dos outros atores (Lebow & Kelly, 2001, p. 595). Lida desta forma, a História é sobre como os atenienses provocaram a erosão da legitimidade que haviam adquirido ao defen der a Hélade contra os persas. No final, Atenas ficou apenas com o seu poder militar, e este revelou-se insuficiente para manter o seu estatuto internacional.

A linguagem da justiça, que no início da guerra ainda encontramos em Péricles (Lebow & Kelly, 2001, p. 596) é um dos elementos fulcrais dessa hegemonia. O difí cil equilíbrio entre justiça e interesse vai sendo posto em causa pelos sucessores de Péricles, sedentos de vitórias externas para sedimentar o seu estatuto político domés tico (II.65.10-13). Quando chegamos ao diálogo de Melos, no 16.º ano do conflito, assistimos à falência total da retórica ateniense, resultando na chacina dos mélios. É a derradeira prova de que Atenas é um império (arkhé), tão cruel como teria sido o domínio persa. Nesta visão construtivista, a degenerescência da linguagem é simul taneamente efeito e causa da erosão da legitimidade (hegemonia) de Atenas (Lebow & Kelly, 2001, p. 602).

Em causa está a atitude de Tucídides relativamente à agência humana. Para os neorrealistas, o autor endossa a visão de que a dinâmica do sistema internacional é preponderante sobre a ação de qualquer uma das suas unidades. Lebow (2001) e Bagby (1994), pelo contrário, afirmam que a possibilidade de auto-determinação das sociedades é um tema central na História. A importância que dá à retórica em mo mentos cruciais de deliberação afasta Tucídides do realismo pessimista. Para Bagby (1994, p. 153), “Thucydides teaches us that even though internal passions and exter nal forces may exert much force, humans are in control of themselves and morally aware.” Ao elevar Péricles e Hermócrates a estadistas-modelo, Tucídides sublinha a importância de líderes que dominam a arte da retórica, mas conhecem o valor da moderação e da cautela no exercício da política externa (Lebow, 2001).

A leitura da História a partir de um ângulo construtivista parece mais próxima do texto que a das restantes escolas devido à integração de múltiplas causas e foco no processo de decisão. No entanto, convém não esquecer que muitas vezes esses processos de decisão são apresentados por Tucídides como suscetíveis sobretudo de serem influenciados por considerações estratégicas. Mesmo os espartanos, cujo ca rácter nacional os leva a um notório conservadorismo de política externa, acabam por ser persuadidos pelos coríntios a tomar a iniciativa contra Atenas (I.119-125). Afi nal, diz-nos Tucídides, é a ação espartana, motivada pelo medo que o crescimento do poder de Atenas venha a ameaçar a sua independência, que dá o oxigénio ao fogo que consome todo o sistema de poleis helénicas (I.23.4-6). Assim, Esparta age contra a sua inclinação natural e tradicional postura estratégica porque se vê obrigada a intervir.

4. Tucídides como autor pós-paradigma

Como vimos, não é possível circunscrever Tucídides a qualquer variante do realismo. No entanto, da leitura da História fica a ideia de há algo de realista na sua análise. É isso que leva Michael Doyle (1990) a defender que Tucídides representa uma forma compósita de realismo, que não se limita a qualquer uma das três imagens analíticas de Waltz (2001). Doyle (1997, pp. 49-92) dá o nome de “realismo complexo” a esta pos tura analítica. Na mesma linha encontra-se David A. Welch, para quem a lição de Tu cídides nega o realismo clássico ao recusar tomar o Estado como unidade de análise e mostrar a cada passo como as escolhas individuais moldam o futuro. (Welch, 2003).

Luís Lobo-Fernandes (2018) invoca o realismo complexo para dirimir o conflito entre os realismos clássico de Morgenthau e estruturalista de Waltz: “O «realismo complexo» de Tucídides… poderia, assim, reemergir como aferidor último das dife rentes pulsações no seio do realismo, estabelecendo novas pontes teóricas e contri buindo para uma maior acuidade e rigor no exercício analítico e de diagnóstico das dinâmicas internacionais contemporâneas” (Lobo-Fernandes, 2018, p. 114). Tucídi des pode ser invocado como exemplo de como é possível fazer a ponte entre realismo clássico e estrutural, evitando cair em leituras simplistas das causas dos fenómenos internacionais.

Uma destas pontes é a que Tucídides constrói ao tratar a tensão entre a justiça e necessidade. Para alguns autores (Bedford & Workman, 2001; Brands & Edel, 2019; Hanson, 2005; Lebow, 2003), a História deve ser lida como uma tragédia, em que a ação se desenrola numa série de passos que levam os protagonistas a caminhar para o desfecho trágico devido aos seus vícios intrínsecos: “It is rendered as artfully as any tragedy of the stage, filled with speeches, memorable leading actors, and a poetic composition that emphasizes the role of deliberate choices made by individuals in determining Athens’ rise and fall” (Brands & Edel, 2019, p. 19). Esta interpretação coloca a existência de agência sob uma nova luz: será o destino a tramar o herói, ou é ele responsável pelo desfecho trágico? Mas de acordo com ela, Tucídides não será certamente um realista racional, uma vez que não acredita que a comunidade polí tica se comporte racionalmente (Bedford & Workman, 2001).

A preocupação de Tucídides, enfatizada por Orwin (1986, 1994), em mostrar as consequências adversas para a polis do abandono da moderação e da justiça, levam Ahrensdorf (1997) a afirmar que Tucídides oferece uma crítica aos realistas baseada num realismo ainda mais profundo, que reconhece que a crueldade excessiva gera uma reação dentro e fora da comunidade política, culminando na sua autodestrui ção. Mas esse caminho não é inevitável. Estadistas ponderados como Diodoto de Atenas e Hermócrates de Siracusa são modelos de realismo tucidideano, uma vez que reconhecem os riscos de humilhar e de ofender, preferindo uma conduta res peitadora dos limites da justiça. Como escreve Forde (2000, p. 173), “a Thucydidean statesman… would certainly be guided more by the insights of Diodotus than of Per icles”. Assim, a irracionalidade que toma conta de Atenas é a principal culpada pela sua queda. A moral da História é que “[a] realist nation must never believe that it is morally superior in any way to any other nation” (Ahrensdorf, 1997, p. 252). Tucídides é “mais realista que os realistas” por mostrar que uma política externa baseada ape nas no calculismo e na aquisição de poder tem toda a probabilidade de falhar devido à reação interna e externa que encontrará (Ahrensdorf, 1997, p. 262; Rahe, 1995).

No entanto, a oposição entre força e legitimidade é um aspeto de Tucídides que faz com que teóricos construtivistas o reclamem como colega, como vimos acima. Também a importância que é dada à palavra nas grandes deliberações de política externa da História parecem apontar para o facto de a realidade ser em grande parte uma construção social. Uma das vantagens do método dos discursos emparelhados é que o autor mostra o raciocínio por trás de cada um dos cursos de ação possíveis. Após uma destas parelhas de discursos, o leitor sente que a decisão pode pender para qualquer um dos lados. Mostrar as alternativas em jogo em cada momento crítico tem assim o efeito de conferir agência ao decisor. Por vezes, a deliberação de um decisor coletivo é tomada por uma margem muito reduzida, realçando a preponderância do ato deliberativo. No debate de Mitilene, por exemplo, a assembleia ateniense reverte por uma curta margem de votos a decisão que tomara no dia anterior (III.36-50).

É então possível que estes aspetos coloquem Tucídides de fora da tradição realista como ela se desenvolveu no contexto das RI modernas. Esse debate dependerá de uma discussão acerca das fronteiras de cada escola. Mais proveitoso para nós será constatar que Tucídides não se encaixa precisamente em nenhuma delas, e ao mesmo tempo contém traços de ambas. É o que defende John Zumbrunnen, que vê em Tucí dides uma postura pós-paradigma (ou, se quisermos respeitar a cronologia, pré-pa radigma). Esta postura faz dele um teórico eclético preocupado com a solução de um puzzle, não com a formulação ou adesão a uma ou a outra teoria explicativa total. Por ser pós-paradigmático (ou pré-paradigmático), Tucídides realiza uma síntese teórica que fará dele um “realista construtivista” ou “construtivista realista” (Zumbrunnen, 2015, p 309). Zumbrunnen recupera o elogio de W. R. Connor ao Tucídides pós-mo derno, um Tucídides “taciturno” que sabe “manter a distância” (Zumbrunnen, 2015, p. 310). Este poderá ser o verdadeiro valor que retiramos de Tucídides quando o tra zemos para o debate teórico das RI. É uma ideia que encontra suporte na leitura que Nietzsche faz de Tucídides como sofista, preocupado em dar ao leitor todos os lados de um argumento. É “o antídoto para o platonismo”, porque localiza a justiça no mundo, sujeita ao natural conflito entre humanos, e não fora dele (Polansky, 2015, pp. 440-441).

A diversidade de perspetivas e apresentação agonística das mundivisões que en contramos na História levam-nos a encarar Tucídides como uma raposa, e não como um ouriço, na formulação de Isaiah Berlin que tem origem num fragmento do poeta Arquíloco. Para Berlin, “there exists a great chasm between those, on one side, who relate everything to a single central vision, one system… and on the other side, those who pursue many ends, often unrelated and even contradictory, connected, if at all, only in some de facto way” (Berlin, 2000/1953, p. 436). Os primeiros são os ouriços, os segundos as raposas. Como já Hobbes reconhecera, Tucídides não é um mero cro nista e não se limita à descrição. Procura retirar dos acontecimentos uma resposta, algo de fundamental que explique os eventos extraordinários que relata. Como vi mos, muitos autores veem Tucídides preocupado acima de tudo com a moralidade das ações dos estadistas do seu tempo. Sob essa luz, é possível ver Tucídides não como uma raposa, mas antes como um ouriço de Arquíloco.

A perplexidade que orienta a análise de Tucídides é a de perceber como foi possí vel que a comunidade helénica se tenha embrenhado numa longa guerra cuja escala sem precedente e cuja “enorme complexidade” resultou em “desastres que assolaram a Grécia como nenhuns outros em período de igual duração” (I.23.3). No entanto, a resposta que Tucídides dá não se apresenta como unívoca, mesmo que Tucídides o preferisse, mas sim multifacetada. É tentador ver Tucídides como uma espécie de Tolstói de Isaiah Berlin: “by nature a fox, but [he] believed in being a hedgehog” (Ber lin, 2000/1953, p. 438). Como Tolstói, Tucídides busca uma chave para um mundo que o deixa perplexo, mas é constitucionalmente incapaz de simplificar e de resumir a realidade a uma só abstração devido ao seu extraordinário talento para entender o concreto e relacionar diversas experiências e fatores. Partilha com Tolstói duas pai xões contraditórias: por um lado, “desire to penetrate to first causes, to understand how and why things happen as they do and not otherwise”, e, por outro lado, “na incurable love of the concrete, the empirical, the verifiable” (Berlin, 2000, p. 443). Talvez por isso Tucídides comece por nos identificar apenas um factor apenas para o início daquela guerra, mas ao longo dos oito livros seguintes nos revele uma comple xidade que invalida a elegância da sua resposta inicial.

É assim que Tucídides mostra os perigos da esperança infundada (Bedford & Workman, 2001), ou da esperança fundada em mera sorte (Schillinger, 2021), mas também as consequências do racionalismo excessivo (Rahe, 1995; Ahrensdorf, 1997). É certo que grande parte da literatura revista neste artigo vê em Tucídides um teórico disposto a reduzir a variedade que encontra a uma verdade subjacente e fundamen tal; ou seja, um ouriço. É notável, por exemplo, que a tríade de motivações humanas que surge no discurso dos atenienses em Esparta (I.72-98) - medo, interesse, e honra - não mereça muita atenção na literatura das RI, talvez perdida no meio da discus são entre neorrealistas e construtivistas. Lebow (2006) sugere mesmo a construção a partir da tríade de uma teoria geral das RI. À semelhança do que faz Platão para a cidade na República, nesta teoria é reproduzida a nível internacional a mesma ordem psíquica que se encontra a nível individual. No entanto, estas motivações não esgo tam os elementos fundamentais do comportamento das cidades-estado durante a Guerra do Peloponeso. Como bem nota Orwin (1986, 1994), a justiça também conta.

A tríade de motivações e a preocupação com a justiça relevam um ponto relativa mente descurado em Tucídides: a navegação da fronteira entre as dimensões interna e externa nas deliberações dos estados. Os construtivistas poderão analisar a des treza de Tucídides ao relevar a linguagem política (verbal e não verbal) e os caracte res de personagens individuais no decurso da guerra e nas tentativas de paz. Mas os diálogos deliberativos da História raramente se ficam pelos princípios e pelas emo ções. Pelo contrário, os atores individuais que Tucídides põe em cena dedicam partes substanciais dos seus discursos à racionalização da posição geográfica e militar dos seus estados. Estas secções serão, decerto, lidas com muito interesse por realistas de todas as estirpes. Também os construtivistas encontrarão precedentes relevantes na forma como Tucídides mostra a manipulação e criação de perceções de poder e de ameaça através de atos retóricos nos discursos e debates, assim como no testemunho do poder da linguagem enquanto alicerce da ética vigente que é o seu relato da guerra civil na Córcira (III.82).

A exploração simultânea e congruente destes aspetos na História aponta assim para algo que pode constituir-se como um contributo valioso para as RI: a transcen dência de fronteiras teóricas que se explicam mais pela história e pela sociologia da disciplina do que pela sua incompatibilidade conceptual. Esta é a porta que Doyle (1990) deixa aberta para o debate intra-realismo, mas que é estendida ao debate in ter-escolas por Zumbrunnen (2015). Em suma, a forma como Tucídides relaciona os vários níveis de análise de modo a compatibilizar uma leitura realista (das três imagens de Waltz [2001]) com uma leitura construtivista que enfatiza a linguagem, os valores, as normas e as convenções poderá conter uma lição importante a todos os que utilizam as RI para compreender o mundo. O pensamento de Tucídides sobre a realidade internacional é simultaneamente sofisticado e parcimonioso, atento ao de talhe e disposto à redução ao essencial. Apesar da sua complexidade, o leitor fica com a sensação de que compreende as causas e as dinâmicas de comportamentos indivi duais e coletivos, que entende algo sobre o que se passou. O edifício teórico que sus tenta este esforço analítico do autor está, como vimos, camuflado por uma utilização confiante dos métodos da narrativa e do discurso direto, ainda que semi-ficcionado.

Neste Tucídides-raposa não há a cientificidade que alguns autores das RI procu ram nele. O realista estrutural Gilpin afirma sem equívoco que Tucídides merece o título de “the first scientific student of international relations” (Gilpin, 1984, p. 291). Visão semelhante está implícita noutros autores (Monten, 2006; Waltz, 1979, p. 127; 2001, p. 159). A postura tucidideana esboçada aqui poderá parecer para os neorrealis tas sinónimo de regressão teórica. Pelo menos nos métodos, é evidente que o analista tucidideano conta que ferramentas que Tucídides não tinha. Já não precisa, por exem plo, de recorrer a discursos semi-inventados. Com informação abundante ao seu dis por, as RI podem agora analisar documentos nacionais definidores de política externa e de pronunciamentos oficiais em busca dos motivos para determinado comporta mento internacional. Além disso, as RI receberam e integraram métodos de outras disciplinas, como a história, a geografia, a estratégia, a teoria dos jogos, a semiótica, entre outras. Numa perspetiva multidisciplinar e focada em problemas, as RI podem empregar estes métodos em conjugações diferentes de acordo com o objeto de estudo.

No entanto, mantém-se a constatação de que a disciplina não encontrou funda mentos teóricos novos que lhe permitissem atingir uma cientificidade que também não estava ao alcance de Tucídides, mesmo que ele a isso almejasse. Em reposta a essa objeção só se pode contrapor que também nenhuma das teorias universalistas con seguiu escapar à parcialidade. Numa espécie de teorema da incompletude de Gödel para as ciências sociais, o que constatamos é que qualquer teoria que se declare axio mática terá de limitar severamente o escopo do que pretende explicar. Daí resulta a ausência de ciclos kuhnianos nas RI. Tal como nas outras ciências sociais, não há nas RI revoluções científicas, e não se rejeitam paradigmas antigos para trabalhar com novos. Por isso, nas RI não podemos dar como irrelevantes os pressupostos teóricos ou os métodos dos autores clássicos (Holsti, 1989, p. 257). Não há lugar para o “progresso científico” no sentido que lhe dá Kuhn (2012/1962). Só podemos avaliar a qualidade de um trabalho de RI pelos méritos da sua eficácia teórica, metodológica e empírica, e não pelos de supostos alicerces filosóficos estabelecidos a priori (Mon teiro & Ruby, 2009, p. 42).

5. Conclusão

Se seguirmos a definição de Mark Twain de livro clássico como “algo que toda a gente quer ter lido e ninguém quer ler”, a História de Tucídides pode competir pelo título de clássico dos clássicos. Este estatuto é um convite ao abuso por diferentes discipli nas. Miguel Monjardino, que estrutura o seminário de “Geopolítica e Geoestratégia” na Universidade Católica Portuguesa em torno de Tucídides, lamenta a popularidade das leituras simplistas de Tucídides (Monjardino, 2021a, 2021b). A latitude de signi ficados em Tucídides permite que o autor seja frequentemente tratado pela literatura de RI como uma arma para arremessar contra os adversários dentro da disciplina das RI, refutando o uso deste ou daquele episódio da História para credibilizar um determinado ponto de vista teórico. Vários autores pedem uma leitura “mais cuida dosa” pelos teóricos das RI, ao invés de um abandono da História a outras disciplinas (Ahrensdorf, 1997; Bedford & Workman, 2001; Lebow, 2007; Orwin, 2015). Grande parte da literatura desmonta certas leituras de Tucídides, mas não deixa por isso de ressalvar que a sua obra mantém algum grau de aplicabilidade geral para a aná lise das relações inter-estatais contemporâneas (Bagby, 1994; Garst, 1989; Kirshner, 2019; Lebow, 2001; Novo, 2016; Welch, 2003).

Ainda assim, é legítima uma abordagem “presentista” à História, em que a lemos com as preocupações dos nossos dias em mente, desde que essa “modernização” de Tucídides seja empreendida com humildade interpretativa e consciência histórica. Ainda que Tucídides não se encaixe totalmente em nenhuma escola, há ferramentas de trabalho de RI que nos podem ajudar a compreendê-lo, assim como ele a elas. Conceitos como sistema internacional, anarquia, hierarquia, polaridade, dissuasão, compulsão, balancing, bandwagoning, buck-passing ou dilema de segurança podem ser aplicados a episódios da História para iluminar o seu significado, sem que seja necessário decidirmos se Tucídides está a oferecer uma lição acerca de política in ternacional ou não, e muito menos se essa lição se enquadra num qualquer tipo de realismo ou outra teoria das RI. A “armadilha” pode não estar nas páginas da His tória, mas a dinâmica de rivalidade entre grandes poderes, baseada em perceções mútuas e pautada por decisões difíceis, estará certamente. Se o sistema internacional da Guerra do Peloponeso for multipolar, ler Tucídides torna-se ainda mais pertinente hoje em dia.

Poderá ser ainda mais útil para as RI adotar uma abordagem diferente, que explore a capacidade de Tucídides de nos fazer entender a realidade internacional. Afinal, a simplicidade natural com que transmite ao leitor ideias tão complexas é invejável e nem sempre conseguida pelas RI contemporâneas. Em vez de trazermos Tucídides para o nosso tempo, podemos nós ir ao seu encontro, nos termos da própria obra. Para apreciar a riqueza do seu contributo é necessário “recover our distance from Thucydides” (Welch, 2003, p. 317). Não será difícil: o “taciturno” Tucídides impôs essa distância entre si e o leitor através de uma narrativa cronológica e parca em co mentário, em que ele próprio raramente surge enquanto autor. Segundo Leo Strauss o leitor ganha entendimento (understanding) através da História porque ela “imita” a ambiguidade do discurso e das ações, e consequentemente a tensão entre justiça e necessidade: “Thucydides imitates the enigmatic character of reality” (Strauss, 1989, p. 93). Soma-se a distância natural trazida pela passagem do tempo, que é fruto da longevidade impressionante do texto. A utilidade da distância entre o leitor e o livro é adivinhada pelo próprio Tucídides, que vê a sua obra como um “legado para sempre” (I.22.4).

A “domesticação” de Tucídides pelas RI foi apressada e não serve nem a sua obra nem as RI. As sentenças sumárias sobre Tucídides por parte de teóricos da disci plina, que por vezes não são acompanhadas de qualquer fundamentação, contribuí ram para a receção do autor como um mero antecipador desta ou daquela corrente de pensamento. O valor de Tucídides está em grande medida na sua estranheza. É ela que permite ao leitor proveniente das RI ver o seu objeto de estudo com outros olhos. Afinal, uma das razões principais para ler os clássicos é ganhar uma nova perspetiva. Nas palavras de Alan Jacobs, “you can’t understand the place and time you’re in by immersion; the opposite’s true. You have to step out and away and back and forward, and you have to do it regularly” (Jacobs, 2020, p. 23). Para o analista de política inter nacional, Tucídides é o clássico por excelência.

Concluímos (i) que Tucídides é um teórico das RI, ressalvando-se que a sua “teo ria” está mais próxima do sentido original do termo, que remete para a “observação”, através da qual tenta compreender e comunicar algo sobre a ordem subjacente ao caos das relações entre cidades-estado; (ii) que a sua visão não se insere nem antecipa claramente nenhuma das grandes teorias que dominam as RI desde o seu apareci mento formal, já que são possíveis e verosímeis tanto leituras realistas de diversas variantes como leituras construtivistas da sua obra; (iii) e que o seu contributo para a compreensão do fenómeno internacional e para a disciplina das RI reside precisa mente na abrangência da sua visão e na harmonização de diferentes e complemen tares níveis de análise. Conseguimos imaginar Tucídides a aceitar a formulação das três imagens da realidade internacional sugerida por Waltz (2001). Mas não conse guimos imaginar Tucídides a satisfazer-se com a seleção de uma só imagem para utilizar como lente analítica. A visão de Tucídides é caleidoscópica. A sua natureza é a da raposa.

Se a História estimula o debate entre as diferentes correntes das RI que vimos neste artigo, podemos concluir que a obra traz valor para a disciplina e que esse valor se deve precisamente à sua ambiguidade e abrangência. Como tal, Tucídides legou -nos um recurso inestimável para a educação de analistas e de alunos de RI. À pri meira vista, pode parecer um luxo estudar um autor do séc. V a.C. Mas o leitor atento ao contexto histórico da obra, ciente dos seus problemas interpretativos, e despojado de uma agenda teórica rígida, estará a ganhar acesso a um texto sofisticado que inte gra elementos analíticos díspares com consistência e equilíbrio, partindo do “como” para chegar ao “porquê” e assim mostrando como a investigação histórica pode dar frutos teóricos. Sobretudo, importa ler Tucídides, ao invés de o “ter lido”.

Agradecimentos

O autor agradece à Fundação para a Ciência e Tecnologia o financiamento através de Bolsa de Doutoramento.

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1 As referências à História da Guerra do Peloponeso de Tucídides são compostas neste artigo pelo número do Livro em numeração romana, seguido, em numeração árabe, do número do parágrafo e, quando necessá rio, número da frase (ex.: I.138.3). Para as citações em língua portuguesa utilizo Tucídides (2013). Foram ainda consultadas as traduções identificadas na Bibliografia.

Sobre o autor TOMÉ RIBEIRO GOMES é doutorando em História, Estudos de Segurança e Defesa no Centro de Estudos Internacionais do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa, com financiamento através de Bolsa de Doutoramento pela Fundação para a Ciência e Tecnologia. Licenciou-se em Ciência Política e Relações Internacionais pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa em 2014. Obteve o grau de mestre em Governance, Lead ership and Democracy Studies pelo Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa em 2016. A sua principal área de investigação é o papel estratégico dos Açores no contexto geopolítico do Atlântico Norte desde o fim da Guerra Fria. [ORCID ID: https://orcid.org/0000-0003-3787-8661]

About the author TOMÉ RIBEIRO GOMES is a PhD student in the History, Security Studies and Defense pro gramme at ISCTE -University Institute of Lisbon, financed by a PhD Research Studentship from Fundação para a Ciência e Tecnologia. He obtained his BA in Political Science and International Relations from the Faculdade de Ciências Sociais e Humanas of Nova Univer sity of Lisbon in 2014, and his MA from the Instituto de Estudos Políticos of the Catholic University of Portugal in 2016. His main research area is the strategic role of the Azores in the geopolitical North Atlantic since the end of the Cold War. [ORCID ID: https://orcid.org/0000-0003-3787-8661]

Recebido: 15 de Fevereiro de 2022; Aceito: 07 de Julho de 2022

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