INTRODUÇÃO
A Organização Mundial de Saúde (OMS), refere que o Acidente Vascular Cerebral (AVC) é uma doença clinicamente definida como sendo um comprometimento neurológico focal (ou às vezes global), de ocorrência súbita e duração de mais de 24 horas (ou que causa morte) e com provável origem vascular1. De acordo com a World Stroke Organization, nos últimos 25 anos, o AVC tornou-se na segunda maior causa de morte e incapacidade no mundo2.
Cerca de 50% dos doentes que sobrevivem a um AVC ficam com limitações nas atividades da vida diária, sendo das taxas mais elevadas na União Europeia3.
Esta doença constitui uma ameaça para a saúde e bem-estar da pessoa, não só pela sua elevada incidência, mas também pela elevada taxa de mortalidade e morbilidade4, a qual pode levar a alterações a nível da funcionalidade, tendo impacto não só nas Atividades de Vida Diária (AVD), como na integração social, podendo desta forma comprometer a qualidade de vida.
As limitações provocadas pelo AVC podem dar origem a outras consequências, não só devido à diminuição da mobilidade, como ao consequente agravamento do estado de dependência e aos riscos associados a estas alterações. Neste seguimento, o risco de queda torna-se uma problemática relevante a considerar na pessoa com AVC.
As quedas são a causa subjacente de cerca de 10 a 15% de todos os episódios que ocorrem nos serviços de urgência4. As mesmas têm um pesado impacto económico nas famílias, na comunidade e na sociedade, além de poderem levar a estados de dependência, perda de autonomia, confusão, imobilização e depressão, que conduzem a restrições variadas nas atividades do dia-a-dia. Em Portugal, de acordo com os dados do sistema nacional de notificação de incidentes, 21% do total de incidentes notificados são incidentes relacionados com quedas4.
A Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem (CIPE) apresenta o conceito de cair como um foco de enfermagem e define-o como “descida do corpo de um nível superior para um nível inferior devido a desequilíbrio, desmaio ou incapacidade para sustentar pesos e permanecer na vertical”, que se traduz “pelo evento ou episódio - Queda”5.
Por sua vez a NANDA-International (NANDA-I) define o Diagnóstico de Enfermagem, Risco de quedas, como “suscetibilidade aumentada para quedas que pode causar dano físico e comprometer a saúde” (p.799). Os fatores de risco descritos para o mesmo incluem aqueles ligados ao ambiente, ao estado cognitivo e fisiológico dos pacientes, bem como os de causa medicamentosa6.
Para a prática clínica do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Reabilitação (EEER) à pessoa com AVC, é fundamental uma avaliação do risco de queda, assente na natureza multifatorial deste evento. Sendo desejável a utilização das classificações e linguagens padronizadas, que representem conhecimento atual. Desta forma o enfermeiro com informação relevante para um diagnóstico preciso pode assim intervir de forma adequada, obtendo ganhos positivos na saúde da pessoa com AVC.
A evidência científica é fundamental na sustentabilidade da prática diária do Enfermeiro especialista em Reabilitação4. Para a revisão sistemática da literatura partimos da seguinte questão norteadora: “Quais os fatores de risco de queda na pessoa com Acidente Vascular Cerebral?”. Esta identificação permite ao EEER a identificação precoce e atuação perante os fatores de risco identificados. O enfermeiro, ao cuidar da pessoa com lesão neurológica, desenvolve atividades que promovem a maximização das suas capacidades funcionais, promovendo um melhor desempenho motor, potenciando o rendimento e desenvolvimento pessoal, minimizando desta forma o risco de queda.
O objetivo desta revisão sistemática é identificar os fatores de risco de queda na pessoa com AVC.
MATERIAIS E MÉTODOS
A investigação científica é efetuada com o objetivo de validar o conhecimento já estabelecido e de produzir novos conhecimentos que, direta ou indiretamente, influenciam a prática7.
Esta revisão implica em todo o processo a fiabilidade da informação dos artigos consultados. Nesse sentido foi utilizada uma metodologia de pesquisa rigorosa, tendo o cuidado de efetuar a referenciação de forma adequada, assim como, a integridade no tratamento e apresentação dos dados. As Revisões Sistemáticas da Literatura (RSL) permitem identificar, selecionar e avaliar rigorosamente um conjunto de estudos a fim de extrair a melhor evidência científica, para dar resposta a uma questão de investigação. A sua finalidade consiste em reunir toda a evidência empírica mediante a aplicação de métodos sistemáticos e explícitos, com o intuito de minimizar enviesamentos, permitindo obter resultados mais fiáveis, tirando assim conclusões mais adequadas8.
Procedeu-se a uma revisão sistemática da literatura, por ser um processo criterioso, que permite identificar, avaliar e interpretar todas as pesquisas disponíveis e relevantes, de forma a responder a uma questão que surge num contexto da prática clínica. Os elementos fundamentais de uma revisão sistemática são constituídos por 8 etapas: questão de investigação, definição do problema, objetivos da revisão sistemática; critérios de inclusão e exclusão; estratégia de pesquisa; procedimento de seleção; procedimento de extração dos dados; e procedimento de avaliação da qualidade metodológica dos estudos selecionados9.
A presente RSL, tem como propósito identificar os fatores de risco de queda em pessoas com AVC. Utilizou-se a seguinte questão de pesquisa: Quais os fatores de risco de queda em pessoas com Acidente Vascular Cerebral?
Para formular a questão de pesquisa foram consideradas as recomendações do Joanna Briggs Institute (JBI) através da estratégia PEO (Population = pessoas com AVC, Exposure = Risco de queda, Outcome = fatores relacionados).
Além dos critérios definidos pela questão de pesquisa e pela estratégia PEO foram definidos os seguintes critérios de inclusão para a pesquisa de artigos nas bases de dados: estudos no idioma em português e inglês, disponíveis em texto integral, publicados entre janeiro de 2012 e dezembro de 2017 e estudos com maior nível de evidência científica tais como desenho experimental, quase-experimental, de coorte e/ou quantitativos descritivos. Como critério de exclusão, artigos que associavam risco de queda a outras patologias que não o AVC.
A pesquisa eletrónica decorreu no período de 1 a 31 de outubro de 2017, sendo realizada com recurso à plataforma EBSCO Host®, nas bases de dados CINAHL Complete e MEDLINE Complete, biblioteca virtual da Escola Superior de Saúde Atlântica, B-On e Biblioteca Virtual da Saúde (BVS).
Para a RSL foram utilizadas palavras-chave e descritores que permitiram uma pesquisa objetiva e facilitaram o processo de seleção dos artigos mais adequados para a questão de investigação. Foi realizada a validação dos descritores na plataforma MeSH (Medical Subject Headings) e DeSC (Descritores em Ciências da Saúde), sendo utilizadas as seguintes palavras-chave e descritores:
AVC/Stroke AND queda acidental/ accidental falls AND risk factors/ fatores de risco
A avaliação dos artigos foi efetuada por dois revisores independentes que compararam as suas análises e chegaram a um consenso sobre a qualidade metodológica dos estudos.
Através dos descritores utilizados foram identificados na plataforma BVS e EBSCO 508 artigos. Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão foram selecionados 61 artigos. A seleção dos artigos partiu primeiro pela leitura de título, seguido da leitura do resumo. Após esta seleção foram admitidos 24 artigos. Posteriormente, para a extração de dados foi utilizada uma tabela para exclusão de artigos, face aos critérios da JBI, dependendo do tipo de estudo. Estas tabelas foram aplicadas a cada artigo por dois revisores independentes, tendo sido incluídos 19 artigos na revisão sistemática da literatura por apresentar pelo menos 75% dos critérios. Atendeu-se ao protocolo PRISMA para o processo de identificação, seleção, elegibilidade e inclusão dos estudos. (Figura 1)
Visto o objeto de estudo serem os artigos, considerou-se o princípio do respeito pela propriedade intelectual dos autores dos artigos que constituem a amostra, através da citação completa e rigorosa dos mesmos.
RESULTADOS
Dos 19 artigos incluídos nesta revisão, 7 foram publicados em 201310-16, 4 em 201217-20, 3 em 201521-23, 2 em 201624-25, 2 em 201726-27 e um último em 201428.
Relativamente ao país encontraram-se 10 origens, dos quais se destacam os Estados Unidos da América com 8 estudos, 11-12,14-16,19,25-26, Singapura10,22 e Brasil20,28 com 2 estudos cada. Seguem-se Irlanda21, Bélgica13, Turquia17, Coreia do Sul18, Suécia23 e Tailândia27 com 1 artigo cada.
Os artigos incluídos para análise de dados nesta RSL são estudo primários que utilizam metodologia quantitativa, 8 estudos de coorte 13,15-17,21,26-28 e 11 estudos descritivos 10-12,14,18-20,22-25.
As amostras dos estudos selecionados variaram de 1425 a 1678212 participantes sobreviventes de AVC.
Nesta RSL apenas um estudo foi realizado no âmbito da enfermagem e teve como objetivo identificar o diagnóstico de enfermagem “Risco de Queda em idosos com AVC”20.
Identificaram-se 22 fatores de risco de queda associados ao AVC nesta revisão, os quais foram organizados de acordo com as categorias da NANDA-I (Quadro 1).
Quadro 1 Síntese comparativa dos fatores de risco encontrados na RSL e os que estão classificados na NANDA-I. Lisboa, 2018.
Fatores de Risco | N | NANDA-I |
---|---|---|
Ambientais | ||
Ambiente social agitado26 | 1 | |
Ambiente cheio de objetos26 | 1 | √ |
Fisiológicos | ||
Dificuldades na marcha10,11,14,20,24,25,27 | 7 | √ |
Redução da força em extremidade inferior10,20,25 | 3 | √ |
Mobilidade reduzida11,16,21,28 | 4 | √ |
Populações de risco | ||
Idade ≥ 65 anos14,20,21,22,24 | 5 | √ |
Condições associadas | ||
Agentes farmacológicos (Anti-hipertensores)26-27 | 2 | √ |
Alteração da função cognitiva/sensorial10,16,20 | 3 | √ |
Anemia12 | 1 | √ |
Deficit propriocetivo20 | 1 | √ |
Equilíbrio prejudicado10-11,16,19-20,22,26-27 | 8 | √ |
Uso de dispositivo auxiliar (ex. andarilho, canadianas, cadeira de rodas)13 | 1 | √ |
Visão prejudicada20 | 1 | √ |
Aumento tónus27 | 1 | |
Dificuldade nas transferências10-11 | 2 | |
Declínio das atividades básicas de vida diária10,15,22,27 | 4 | |
Internamento prolongado10-11 | 2 | |
Lesão do hemisfério direito15,18,28 | 3 | |
Lesão hemisfério esquerdo17 | 1 | |
Maior tempo pós-AVC28 | 1 | |
Psicológicos | ||
Medo de cair16,18 | 2 | |
Depressão26,27 | 2 |
Fonte: Dados de pesquisa, 2017
No que respeita à organização dos fatores de risco de queda, a NANDA-I organiza os indicadores em seis categorias. Após a pesquisa e análise dos artigos selecionados foi possível acrescentar mais uma categoria, que foi denominada por fatores psicológicos.
Na categoria de fatores ambientais são nos apresentados 5 indicadores de risco de queda. A presença de um ambiente cheio de objetos (n=1) foi o único encontrado. Contudo no mesmo artigo foi identificado um fator adicional, que um ambiente social calmo (n=1) leva a que a pessoa com AVC se sinta mais segura e saia de casa estando assim sujeita aos perigos ambientais que propiciam as quedas.
A categoria de fatores fisiológicos apresenta 10 fatores de risco na NANDA-I. Destes foram encontrados os seguintes, dificuldades na marcha (n=7), mobilidade reduzida (n=4) e redução da força em extremidade inferior (n=3).
Na categoria que engloba a população de risco são apresentados 5 fatores de risco, tendo sido identificado o fator idade superior ou igual a 65 anos (n=5).
No grupo das condições associadas, a taxonomia apresenta 17 fatores de risco de queda, dos quais foram identificados sete: equilíbrio prejudicado (n=8), alteração da função cognitiva (n=3), ação de agentes farmacológicos (anti hipertensores) (n=2), anemia (n=1), deficit propriocetivo (n=1), visão prejudicada (n=1) e uso de dispositivo auxiliar (n=1). Foram identificados mais sete fatores de risco de queda não presentes na taxonomia NANDA-I: declínio das atividades básicas de vida diária (n=4) e lesão do hemisfério direito (n=3), dificuldade nas transferências (n=2), internamentos prolongados (n=2), aumento do tónus (n=1), lesão do hemisfério esquerdo (n=1) e maior tempo pós AVC (n=1).
Na categoria criada referente aos fatores psicológicos, os estudos apontam para o medo de cair (n=2) e depressão (n=2) como fatores de risco de queda para a pessoa com AVC.
DISCUSSÃO
A discussão dos resultados deve incidir nas implicações da evidência apresentada em relação às decisões para a prática clínica, assim, procurando responder à questão de partida verificamos que os fatores de risco de queda na pessoa com AVC são múltiplos, sendo que os mais identificados são: as dificuldades na marcha, equilíbrio prejudicado, idade ( 65 anos, declínio das atividades básicas de vida diária, mobilidade reduzida, lesões do hemisfério direito, alterações cognitivas e redução da força em extremidades inferiores.
As alterações de equilíbrio decorrentes do AVC evidenciam-se como o maior fator de risco, uma vez que a pessoa tem dificuldade em controlar e repor o equilíbrio no decorrer da marcha através de alterações repentinas de postura e centro de massa10-11,16,19-20,22,26-27, a manutenção do equilíbrio e do controlo postural são necessárias para o desempenho adequado das atividades de vida diária20, daí se pode afirmar que um número significativo de quedas resulta de dificuldades em corrigir alterações posturais na realização de atividades básicas de vida diária.
Pela análise dos artigos verificou-se que alterações a nível das características da marcha tais como passada11, velocidade14, variação/estabilidade24, simetria24,27 ou mesmo alterações na marcha no geral10,20,25 são, indicadores relevantes de risco de queda na pessoa com AVC. Outros fatores como aumento do tónus também podem afetar esta função27.
Apesar das dificuldades de marcha e equilíbrio prejudicado serem indicadores de risco de queda em pessoas com AVC, foi verificado que 6 anos após a doença, indivíduos que apresentavam poucas alterações a nível destes fatores, apresentaram maior número de quedas que indivíduos que apresentavam maior compromisso da marcha e do equilíbrio. Tal deveu-se ao fato de o grupo que apresentou melhor avaliação de marcha e equilíbrio não estar tão desperto para o perigo de queda e o grupo que apresentou melhores resultados desenvolveu medidas para compensar as alterações23. As descobertas sugerem que a monitorização do risco de queda após o AVC é importante, mesmo quando uma avaliação inicial da marcha e do equilíbrio pós AVC é satisfatória23. Por outro lado, refere que quanto mais tempo passa desde o início da doença, maior é o risco de queda na pessoa com AVC28.
O AVC resulta numa diminuição de controlo das extremidades, que limita a capacidade funcional da pessoa e dificulta a realização das atividades de vida diária, o que associado a outros fatores aumenta o risco de queda10,20,25.
Quanto à localização de lesão, estudos demonstram que as lesões do hemisfério direito são mais indicadoras de risco de queda15,18,28. Esta conclusão está associada ao fato de pessoas com AVC do hemisfério direito apresentarem comportamentos mais impulsivos e maiores défices visuo-espaciais que aumentem o risco de queda15, apresentam uma heminegligência espacial que se traduz num défice de atenção e consciência para o lado parético18. Estes défices vão contribuir para uma instabilidade da marcha, potenciando assim o risco de queda28. Estas pessoas tendem a ser impulsivas, desorganizadas, sobrevalorizando as suas capacidades e não aprendem com os erros e com instrução, fatores que os impedem de ser tornar independentes nas AVD’s, dado o risco elevado de queda17.
Outro artigo encontrado refere que pessoas com AVC do hemisfério esquerdo caíam mais (47%) face aos do hemisfério direito (21%)17. Neste artigo pessoas com lesão do hemisfério esquerdo apresentaram um risco de queda quatro vezes superior num período de 6 meses. Os autores associam um maior número de quedas em pessoas com AVC do hemisfério esquerdo por estes apresentarem problemas de comunicação, mas por outro lado apresentam perceção visual e memória intactas. Estas pessoas aprendem assim por demonstração e erro, sendo capazes de sintetizar partes das tarefas, o que lhes permite tornarem-se mais independentes, requerendo assim uma menor supervisão por parte dos profissionais. Este fato permite explicar assim uma maior incidência de quedas em pessoas com AVC do hemisfério esquerdo versus hemisfério direito17.
O défice cognitivo, resultante do AVC, é também considerado um fator de risco de queda. Indivíduos com alterações cognitivas têm uma perceção reduzida das suas incapacidades, levando-os a desempenhar tarefas para além das suas capacidades10, podem provocar défices de atenção que podem dar origem a quedas acidentais no decorrer de AVD16, compromete a marcha, equilíbrio e estabilidade postural20. Observou-se que o défice cognitivo é um forte indicador de risco de queda.
A pessoa com AVC apresenta dificuldade para executar atividades pois pode apresentar uma desorientação espacial, estando a sua capacidade de resposta protetora comprometida que associado a uma alteração da marcha, equilíbrio e estabilidade postural leva à ocorrência de quedas.
A análise dos artigos indica uma alta sensibilidade para instrumentos de avaliação, permitindo identificar fatores de risco de queda, tais como, BBS (Berg Balance Scale)10,22, TUG (Timed Up & Go Test)16,28 e MIF (Medida Independência Funcional)10,15,22,27. O instrumento de avaliação de TUG avalia a capacidade de equilíbrio estático e dinâmico da pessoa, envolvendo manobras funcionais como levantar-se, andar, dar a volta e sentar-se. A escala de Berg é um instrumento de avaliação do equilíbrio estático e dinâmico. Os resultados encontrados revelam que fracos desempenhos nestes testes refletem-se em risco de queda, uma vez que o equilíbrio deficiente está associado a quedas22. Relativamente à MIF, na presente revisão verificou-se que baixos valores de pontuação global22,27 são indicadores de risco de queda. Dentro das diferentes categorias que constituem o instrumento de avaliação, verifica-se que existe maior risco de queda para pessoas com baixas pontuações a nível do controlo vesical e intestinal, transferências, mobilidade, higiene e vestuário10, bem como o uso do sanitário, transferências para a cama, banheira/duche e uso de escadas15. Sendo assim é possível afirmar que estes instrumentos de avaliação são pertinentes para determinar o risco de queda na população em estudo.
A nível do ambiente físico verificou-se que as quedas ocorrem com mais frequência no domicílio. Pela análise dos artigos os locais mais comuns onde ocorrem quedas são na casa de banho10,16,18 e no quarto11, o que vem reforçar o já mencionado anteriormente, que baixos valores de MIF no uso de sanitário e transferências para a cama, banheira/duche15, são indicadores de risco de queda. Apesar destes estudos apontarem estas divisões como locais de queda frequente em pessoas com AVC, não referem se estas se devem a falta de material antiderrapante, falta de barras de apoio na sanita ou banheiras/polibans, presença de tapetes, divisões com muito mobiliário que dificultam a circulação pela divisão. Estes dados seriam fundamentais para a RSL, uma vez que é importante uma avaliação do domicílio pelos profissionais, educação sobre segurança, bem como modificação do ambiente doméstico durante o planeamento de alta, contribuindo para que não corram quedas em casa10. Foi também verificado que em locais com ambientes sociais menos seguros existe um menor número de quedas, tal deve-se ao fato da pessoa com AVC não se sentir tão segura em ir para a rua não correndo assim o risco em cair durante a marcha na rua26.
As incapacidades, de nível motor e sensitivo e visual, características do AVC, levam a pessoa a estar mais vulnerável e a apresentar episódios de queda, que podem resultar em hospitalização, demora no processo de reabilitação, diminuição da participação social ou morte.
Na RSL encontrada sobre esta temática30 os autores encontraram vários fatores de risco para quedas em pessoas com AVC. O equilíbrio e a maior dependência nas atividades de vida diárias são apresentados como os mais frequentes, resultado que vem reforçar os achados obtidos no nosso estudo. Esta RSL aponta outros fatores de risco encontrados na nossa pesquisa, nomeadamente, a dificuldade na marcha, mobilidade reduzida, a diminuição de força nas extremidades, as alterações cognitivas e sensoriais, medo de cair, a depressão e a heminegligência como fator de risco, fator que na presente pesquisa se associou às lesões do hemisfério direito e alterações cognitivas. Ao contrário da presente pesquisa, o estudo refere que não há associação entre o local da lesão do AVC e da idade como risco de queda.
Desta forma, face à literatura encontrada, considerada de qualidade e atual, foi possível identificar algumas semelhanças que reforçam os achados e solidificam os resultados obtidos.
Verifica-se que existem fatores de risco que não estão classificados na NANDA-I, tais como fatores ambientais físicos/sociais26, lesões do hemisfério direito15,18,28, declínio das atividades básicas de vida diária10,15,22,27, internamentos prolongados10,11, dificuldade nas transferências10,11, medo de cair16,18, depressão26,27, aumento do tónus27, AVC do hemisfério esquerdo17 e maior tempo pós AVC28.
Com base nos resultados da RSL e da proposta NANDA-I sobre os fatores de risco de queda da pessoa com AVC, confirma-se a existência multifatorial dos fatores de risco, o que requer intervenções abrangentes.
Desta forma os resultados contribuem para o conhecimento dos enfermeiros, na medida em que os achados podem ser aplicados na prática clínica, permitindo desta forma uma prática baseada na evidência.
Ao Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Reabilitação são atribuídas competências específicas, pois “os cuidados de enfermagem de reabilitação constituem uma área de intervenção especializada que decorre de um corpo de conhecimentos e procedimentos específicos. Tem por foco de atenção a manutenção e promoção do bem-estar e da qualidade de vida, a recuperação da funcionalidade, tanto quanto possível através da promoção do autocuidado, da prevenção de complicações e da maximização das capacidades.” 31. Assim sendo, este profissional deve conhecer os fatores de risco de queda no AVC identificados neste estudo e realizar medidas de prevenção para os mesmos, contudo não limitar o pensamento, a avaliação e a ação com base neles. Esta intervenção especializada permite assim melhorar a funcionalidade da pessoa com AVC através de ações específicas do enfermeiro especialista de reabilitação, maximizando a funcionalidade da pessoa e minimizando fatores de risco.
O fator de risco ambiente pode ser minimizado pelo EEER, caso este assuma a sua função de promover um ambiente seguro, por meio de estratégias de visita ao domicílio e de educação em saúde. Na maioria das vezes a pessoa com AVC não cai por realizar atividades perigosas, mas sim no executar de atividades básicas de vida diária. Identificar os fatores de risco ambientais bem como capacitar a pessoa a desenvolver as atividades em segurança através de técnicas seguras, possibilita uma intervenção por parte deste perito no sentido de eliminar alguns destes fatores e assim evitar eventos de queda.
A utilização de instrumentos de avaliação adequados por parte do EEER por sua vez, facilita a avaliação da funcionalidade da pessoa com AVC, permitindo também identificar a existência de risco de queda.
CONCLUSÃO
A RSL contribuiu para a sistematização do conhecimento e comparação de vários estudos, permitindo desta forma a organização do estado da arte numa determinada problemática.
Os artigos analisados são estudos realizados com instrumentos em contextos diferentes, com dados colhidos em diversos países do mundo, permitindo desta forma um vasto conhecimento da problemática, sendo esta a razão encontrada para a existência de um elevado número de fatores.
Foram encontrados inúmeros estudos acerca de fatores de risco de queda na pessoa com AVC. O fato da maior parte dos artigos encontrados não serem do âmbito de Enfermagem constitui uma limitação ao estudo.
Com base nos resultados da RSL e dando resposta à questão de investigação, foram identificados os seguintes fatores de risco de queda em pessoas com AVC: dificuldades na marcha, equilíbrio prejudicado, idade superior a 65 anos, mobilidade reduzida, declínio das atividades básicas de vida diária, redução da força em extremidade inferior, lesões no hemisfério direito e alterações cognitivas. Confirma-se assim a natureza multifatorial dos fatores de risco, que requer intervenções abrangentes e multidisciplinares. Desta forma, numa pessoa com AVC torna-se necessária uma abordagem multiprofissional e uma avaliação do seu estado geral, dos conhecimentos, capacidades e défices.
Durante o período de pesquisa, encontrou-se apenas um artigo no âmbito de Enfermagem. Assim sendo e dado o número de fatores de risco encontrados, sugere-se que sejam desenvolvidos mais estudos nesta área.