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Revista Portuguesa de Enfermagem de Reabilitação

Print version ISSN 2184-965XOn-line version ISSN 2184-3023

RPER vol.3  supl.1 Silvalde Oct. 2020  Epub Oct 27, 2020

https://doi.org/10.33194/rper.2020.v3.s1.7.5781 

Artigos

Exercício físico no doente renal crónico de estádio 5 submetido a hemodiálise: Estudo de caso

Ejercicio físico en el paciente con enfermedad renal crónica etapa 5 sometido a hemodiálisis: estudio caso

Physical exercise in patient with stage 5 chronic kidney disease undergoing hemodialysis: Case study

1- Universidade de Évora

2- Comprehensive Health Research Centre (CHRC)


RESUMO

Objetivo:

conceber uma proposta de cuidados de enfermagem dirigida à intolerância à atividade, num indivíduo com Doença Renal Crónica de estádio 5 a cumprir programa de hemodiálise.

Métodos:

estudo descritivo do tipo estudo de caso, referente a indivíduo do sexo masculino, de 76 anos, em programa de hemodiálise. Foi utilizado o Modelo das Atividades de Vida de Roper, Logan e Tierney para a colheita de dados e taxonomia NANDA-I, NIC e NOC para suporte do plano de cuidados.

Resultados:

na avaliação inicial foram levantados 6 diagnósticos autónomos de enfermagem, dos quais se destacou um como prioritário: Intolerância à atividade (00092) e intervenções que promovam a atividade física e exercício físico.

Conclusão:

a intervenção da enfermagem tem um papel fundamental para a avaliação e intervenção no âmbito da atividade física e exercício físico em pessoas submetidas a hemodiálise, podendo diminuir a intolerância à atividade e subsequentemente melhorar a sua qualidade de vida.

Descritores: Insuficiência renal crónica; Hemodiálise; Exercício físico; Qualidade de vida

RESUMEN

Objetivo:

diseñar una propuesta de cuidado de enfermería dirigida a la intolerancia a la actividad, a un paciente con enfermedad renal crónica etapa 5 sometida a un programa de hemodiálisis.

Métodos:

estudio descriptivo del caso práctico, refiriéndose a un hombre de 76 años, en un programa de hemodiálisis. Fue utilizado el modelo de actividades vitales de Roper, Logan y Tierney para recopilar datos. Fue también utilizada taxonomía NANDA-I, NIC y NOC para apoyar el plan de atención.

Resultados:

en la evaluación inicial, se plantearon 6 diagnósticos autónomos de enfermería, de los cuales uno se destacó como una prioridad: intolerancia a la actividad (00092) e intervenciones que promueven la actividad y el ejercicio físico.

Conclusión:

la intervención de enfermería desempeña un papel fundamental para la evaluación e intervención en el campo de la actividad y el ejercicio físico en personas sometidas a hemodiálisis, lo que puede reducir la intolerancia a la actividad y posteriormente mejorar su calidad de vida.

Descriptores: Insuficiencia renal crónica; Hemodiálisis; Ejercicio físico; Calidad de vida

ABSTRACT

Objective:

to design a proposal for nursing care aimed at activity intolerance, in an individual with Stage 5 Chronic Kidney Disease undergoing hemodialysis.

Methods:

a case study and descriptive study, referring to a 76-year-old male undergoing hemodialysis. The Roper, Logan and Tierney Life Activities Model was used for data collection and NANDA-I, NIC and NOC taxonomy to support the care plan.

Results:

in the initial assessment, 6 autonomous nursing diagnoses were raised, of which one was highlighted as a priority: Activity intolerance (00092) and interventions that promote physical activity and physical exercise.

Conclusion:

nursing intervention has a fundamental role for the assessment and intervention in the scope of physical activity and physical exercise in people undergoing hemodialysis, which can reduce intolerance to activity and subsequently improve their quality of life.

Descriptors: Renal Insufficiency; Chronic; Hemodialysis; Physical exercise; Quality of life

INTRODUÇÃO

A Doença Renal Crónica (DRC) afeta mais de 10% da população mundial, sendo que milhões de indivíduos morrem todos os anos vítimas da sua incidência. O ser detetada na sua fase inicial, é um fator de grande importância, pois aumenta a esperança de vida com base nas opções terapêuticas que podem ser oferecidas1.

A DRC é caracterizada pela existência de alterações na estrutura ou função renal, presentes no mínimo por 3 meses. Diversos estudos definem-na pela taxa de filtração glomerular (TFG) inferior a 60 ml/min/1,73m2 e/ou uma presença de albumina-creatinina na urina superior ou igual a 30mg/g. Associado a este cenário, os principais fatores de risco incluem a existência de hipertensão e diabetes sendo também fatores importantes 2.

A DRC engloba 5 estádios, referentes ao nível de afeção renal baseado na TFG. O estágio 1 e 2 em que a TFG é inferior ou igual a 60ml/min/1,73m2 e/ou presença de albumina-creatinina na urina superior ou igual a 30mg/g; o estágio 3 em que a TFG se situa entre 30-59ml/min/1,73m2; o estágio 4 em que a TFG se situa entre 15-29ml/min/1,73m2 e o estágio 5 em que a TFG é inferior a 15ml/min/1,73m2 (3.

Como opções de substituição da função renal existe a hemodiálise, a diálise peritoneal e o transplante renal. A hemodiálise, é realizada através de uma máquina de diálise e um dialisador (filtro). O processo consiste em bombear através de um circuito extracorporal, o sangue, passando este pelo dialisador. Normalmente cada sessão de hemodiálise é realizada 3 vezes por semana com a duração de 4 horas por tratamento4.

Dos indivíduos com DRC, a maior parte são sedentários, limitando a sua atividade física em cerca de 60 a 70% do esperado para a sua condição. Sabe-se que indivíduos a cumprir programas de hemodiálise estão submetidos a um catabolismo acrescido, o que conduz a uma deterioração do sistema músculo-esquelético, podendo levar a ocorrência de fraturas (p.e. as fraturas do colo do fémur são 3 a 4 vezes mais frequentes em indivíduos submetidos a hemodiálise). A fadiga é considerada um dos principais sintomas na pessoa a cumprir hemodiálise, resultando da síndrome de neuropatia, anemia, dificuldade na mobilidade e mal-estar5.

Os indivíduos a cumprir este tipo de tratamento apresentam também problemas nutricionais, contribuindo para o agravamento da perda de massa muscular, fraqueza e caquexia. A prevalência de sarcopenia foi de 55% e está associada à perda de massa muscular e fraqueza muscular. Todos estes problemas estão associados a maus resultados clínicos 6.

Estas ocorrências, traduzem-se na diminuição da autonomia e independência, com consequências na vida pessoal e profissional, devido à debilidade muscular acentuada e menor tolerância à atividade física5.

Sabe-se assim, que nos indivíduos a cumprir hemodiálise, o exercício físico reduz a atrofia muscular, melhora a capacidade aeróbia e consequentemente a tolerância ao esforço. Desta forma existem benefícios como a melhora a nível da pressão arterial, prevenção e melhora no controlo da diabetes, melhora dos níveis lipídicos no sangue, melhora da aptidão física, melhora da saúde mental (menos ansiedade e stress), prevenção do desequilíbrio e das quedas, melhora da composição corporal (menos massa gorda e mais massa muscular) e melhora da eficácia dialítica.

Ainda, alguns estudos têm concluído que indivíduos em hemodiálise que praticam exercício tendem a viver mais anos e com uma melhor qualidade de vida 7. Face ao exposto, este estudo de caso tem por objetivo conceber uma proposta de cuidados de enfermagem dirigia à intolerância à atividade, num indivíduo com Doença Renal Crónica de estádio 5 a cumprir programa de hemodiálise.

MÉTODO

Trata-se de um estudo descritivo do tipo estudo de caso8 que consiste numa abordagem metodológica de investigação que possibilita explicar a dinâmica da DRC, com capacidade para produzir evidência. Foram seguidas as orientações da CAse REport (CARE)9 e o fluxograma para o relato do caso clínico10.

A colheita de dados foi realizada através de anamnese e consulta de diário clínico. Todas as análises e procedimentos foram realizados com base nas diretrizes da ética para a investigação em enfermagem, preservando os princípios da beneficência e da não maleficência, fidelidade, justiça, veracidade, garantindo-se a confidencialidade, preservando a autonomia e autodeterminação com base no consentimento informado e o anonimato do indivíduo em estudo11. Foram seguidas as diretrizes da Declaração de Helsínquia e da Convenção de Oviedo.

A avaliação do indivíduo foi baseada no Modelo das Atividade de Vida Diárias12. Depois de uma recolha de dados clínicos acerca do indivíduo e seu contexto, elaborou-se um plano de cuidados autónomo de enfermagem de acordo com as necessidades identificadas. Os diagnósticos autónomos de enfermagem foram enunciados de acordo à taxionomia North American Nursing Diagnosis Association - International (NANDA-I)13; as intervenções de enfermagem foram suportadas pela Nursing Intervention Classification (NIC)14; e os resultados foram suportados e avaliados segundo indicadores Nursing Outcome Classification (NOC)15.

O presente estudo de caso aborda um indivíduo do sexo masculino, de 76 anos, em programa de hemodiálise seguido numa clínica de Diálise, que sofre de DRC de estádio 5 devido a nefrite crónica com envolvimento túbulo-intersticial, diagnosticada em 2015. Tem como antecedentes pessoais apendicectomia aos 7 anos, prótese total da anca direita por coxartrose em 2015, ex-fumador desde os 60 anos, peritonite (por diálise peritoneal) em 2015, transplante renal na fossa ilíaca esquerda em 2017 que sofreu necrose por isquemia poucos dias depois, leak peritoneo-testicular em 2018. Devido a isto, iniciou hemodiálise por cateter venoso central (CVC) em 2018 que mais tarde, no mesmo ano, foi diagnosticado com Staphylococcus aureus no orifício de inserção. Por não haver melhoria da infeção, foi retirado o CVC e criada fístula arteriovenosa latero-terminal no terço médio do antebraço esquerdo (no mesmo ano). As suas comorbilidades associadas são alteração ventilatória brônquica e bronquiolar obstrutiva moderada com insuflação pulmonar, dislipidemia mista, hipertensão arterial, osteoporose, rabdomiólise com toxicidade a fibratos, hiperuricemia, claudicação bilateral e hiperparatiroidismo secundário. Apresenta-se de seguida, o fluxograma de acordo com a CARE guidelines10 para melhor compreensão do caso e a avaliação segundo o modelo teórico (quadro 1). Este estudo de caso surge no âmbito de um ensino clínico, tendo sido feito um plano de cuidados, com o programa detalhado (tabela 2) e implementado durante uma semana. Não foi feita avaliação por interrupção do ensino clínico devido ao estado de emergência provocado pela pandemia COVID 19.

Fluxograma: 

Quadro 1 avaliação das atividades de vida diária12: 

Manutenção de ambiente seguro: Orientado na pessoa, espaço e tempo. Sente cansaço a esforços moderados (p.e. subir escadas). Alteração da sensibilidade nos membros inferiores por alterações do fluxo circulatório. Risco de infeção por procedimentos invasivos.
Comunicação: Discurso coerente e otimista. Comunica dor física e emocional avaliada na escala numérica com a pontuação 5 e 3 respetivamente. Apresenta sinais de depressão ligeira segundo a escala da depressão geriátrica.
Respiração: Eupneica, torácica e simétrica. Tensão arterial entre 102-50mmHg e 140-80mmHg. Doença pulmonar obstrutiva crónica sem necessitar de terapêutica medicamentosa. Compromisso do fluxo circulatório às periferias dos membros inferiores.
Alimentação: Apresenta dislipidemia mista. Prótese dentária total. IMC=24,1Kg/m2
Eliminação: DRC estádio 5. Cumpre tratamento de hemodiálise. Elimina pequenas quantidades de água pela uretra.
Higiene pessoal e vestuário: Realiza de forma independente higiene pessoal completa.
Controlo da temperatura corporal: Apirético durante contacto. Independente para controlar a sua temperatura.
Mobilidade: Cansaço a esforços. Sem auxiliares de marcha. Mantém equilíbrio.
Trabalho e lazer: Já não vai com tanta frequência à sua quinta. Gosta de ver televisão e ler o jornal. Gosta de ir à missa aos domingos. Já não está com tanta frequência com os seus amigos.
Expressão da sexualidade: Viúvo. Vive com companheira. Apresenta-se cuidado de acordo com o género.
Sono: Dorme 6 a 7h noturnas e descansa. Gabapentina para controlar dor dos membros inferiores.
Morte: Comunica sentimentos e emoções de forma independente e quando escutado face à sua mulher que já faleceu. Não manifesta medo de morrer.

RESULTADOS

Quadro 2 diagnósticos, intervenções e resultados em enfermagem 

Diagnóstico de enfermagem (NANDA-I): Intolerância à atividade (00092) que se caracteriza por existência de desconforto ao esforço, dispneia ao esforço, fraqueza generalizada. Relaciona-se com o desequilíbrio entre a oferta e a demanda de oxigénio. Está também associada à condição respiratória e ao problema circulatório13.
Resultados (NOC)15 Participação em programa de exercício físico (1633) Tolerância à atividade (0005)
Legenda da escala:
1 (nunca demonstrado)
2 (raramente demonstrado)
3 (algumas vezes demonstrado)
4 (frequentemente demonstrado) 5 (consistentemente demonstrado)
Avaliação inicial Legenda da escala:
1 (gravemente comprometido) 2 (muito comprometido)
3 (moderadamente comprometido) 4 (levemente comprometido)
5 (não comprometido)
Avaliação inicial
Indicadores (NOC)15 Planeia exercício com o profissional de saúde antes de iniciá-lo 1 Saturação de oxigénio durante atividade Não avaliado
Identifica dificuldades ao programa 4 Frequência cardíaca durante atividade Não avaliado
Estabelece objetivos realistas a curto prazo 1 Facilidade de respirar durante atividade 3
Estabelece objetivos realistas a longo prazo 1 Pressão sanguínea sistólica durante atividade Não avaliado
Participa em exercícios regularmente 2 Pressão sanguínea diastólica durante atividade Não avaliado
Pratica exercícios corretamente 1 Cor da pele 4
Utiliza estratégias para vencer dificuldades 2 Tolerância à subida de escadas 3
Monitoriza frequência cardíaca 2 Força na porção superior do corpo 3
Monitoriza frequência respiratória 2 Força na porção inferior do corpo 3
Monitoriza fadiga, dor, cansaço (Escala de Borg) 1 Capacidade de falar durante atividade física 3
Adere ao programa de exercício 1
Intervenções (NIC)14 - Promoção do exercício (0200): explorar as experiências anteriores com exercício; determinar a motivação individual para começar o programa de exercício; explorar as barreiras ao exercício; encorajar a verbalização dos sentimentos sobre o exercício ou a necessidade de se exercitar; estimular o indivíduo a começar o exercício; auxiliar o indivíduo a desenvolver um programa de exercício adequado para atender às suas necessidades; auxiliar o indivíduo a estabelecer objetivos a curto e longo prazo; informar o indivíduo sobre os benefícios à saúde e os efeitos fisiológicos do exercício; orientar o indivíduo quanto aos exercícios adequados; orientar o indivíduo
quanto a técnicas de respiração apropriadas para aumentar absorção de oxigénio; monitorizar a resposta do indivíduo ao exercício.
- Promoção do exercício: treino para fortalecimento (0201): fazer uma avaliação de saúde do exercício para identificar os riscos de exercitar-se; especificar o tipo e a duração da atividade, do aquecimento e do relaxamento; demonstrar alinhamento corporal (postura) adequado e a forma de levantar os pesos para exercitar cada grupo muscular importante; auxiliar sobre movimentos e realizá-los sem pesos até que a forma correta seja aprendida; orientar a reconhecer sinais/sintomas de tolerância/intolerância ao exercício durante e após as sessões (p.e. vertigens, falta de ar, dor muscular, esquelética ou articular, palpitações); reavaliar os níveis de capacidade muscular mensalmente.
- Controlo de energia (0180): monitorizar o indivíduo quanto a evidência de excesso de fadiga emocional e física; monitorizar a resposta cardiorrespiratória à atividade (p.e. taquicardia, outras arritmias, dispneia, diaforese, palidez, pressões hemodinâmicas, frequência respiratória); encorajar exercícios aeróbicos conforme o tolerado; auxiliar o indivíduo a entender os princípios de conservação de energia (p. ex. necessidade de restrição de atividades ou de repouso); ensinar técnicas de organização de atividades e de controle de tempo para evitar
a fadiga; promover repouso no leito/limitação de atividade (p. ex., aumentar o número de períodos de repouso), levando em conta a hora de descanso escolhida pelo paciente; encorajar a alternância entre períodos de repouso e de atividade.

Comentário: Uma vez que o período previsto de contacto foi mais curto que o inicialmente pensado, não houve oportunidade de colocar em prática um programa de exercícios nem de fazer a sua avaliação. Apenas houve um incentivo inicial à atividade física, que passou predominantemente pela escuta, informação e incentivo. Pela avaliação inicial, conclui-se que o indivíduo em estudo apresentava-se relutante face à atividade física, pois identificava vário obstáculos à sua realização. O indivíduo referia que apesar de manter alguns passeios curtos fora de casa, já não tinha atividades com a frequência como antes, nomeadamente, ir ter com os amigos ou realizar caminhadas.

DISCUSSÃO

O senhor selecionado para o caso enquadra-se no perfil das pessoas com DRC, tendo como antecedentes, hipertensão, dislipidemia e doença vascular2.

Estudos recentes referem que associado à DRC, 24% tem hipertensão arterial e 22,7% tem dislipidemia. Referente ao IMC, encaixa-se ainda nos 16,3 % (com IMC abaixo de 25Kg/m2)16.

A hemodiálise, embora contribua para a expectativa de vida dos indivíduos com DRC, interfere de maneira negativa na sua qualidade de vida, pois favorece o sedentarismo e o declínio funcional17.

A evidência científica recente, demonstra que a atividade física em indivíduos hemodialisados apresenta benefícios, tanto para a eficácia do tratamento como para a qualidade de vida dos doentes renais crónicos5,7.

A perda de tecido muscular nos indivíduos em hemodiálise afeta os músculos da caixa torácica que tem como consequência a redução dos volumes e capacidades pulmonares, contribuindo para uma menor oxigenação dos tecidos corporais. O treino muscular inspiratório pode ser combinado com exercícios aeróbios ou resistidos, culminando assim numa melhoria da aptidão física destes indivíduos17.

Para a realização de exercícios aeróbios, existe por exemplo, o ergómetro. Este é um equipamento de uso intradialítico que pode ser utilizado para o caso em estudo nas duas primeiras horas de diálise (período mais seguro, pois no segundo pode haver descompensação cardíaca). A realização deste tipo de exercício durante a hemodiálise melhora a capacidade funcional, proporcionando benefícios cardiorrespiratórios, como a melhoria do volume máximo de oxigénio. Este exercício, praticado regularmente em cada sessão, promove a modificação da capacidade aeróbia e o descondicionamento físico, o que possui um impacto positivo na qualidade de vida18.

Intradiálise pode também recorrer-se à realização de exercícios de resistência, utilizando o peso dos membros inferiores e o movimento da bola elástica para os membros superiores. Praticado regularmente este exercício melhora a força máxima de preensão, o ritmo diário e o nível de atividade física. Para além do anteriormente descrito, este tipo de exercício de resistência reduz as reações micro inflamatórias, mesmo que não haja aumento da massa muscular, em indivíduos com sarcopenia19.

Em pessoas idosas o exercício tem de ser ajustado. O programa de exercício físico concebido por Junqué Jiménez e colaboradores20, foi implementado nas duas primeiras horas da sessão de hemodiálise, com duração aproximada de 45 a 50 minutos e durante duas sessões semanais.

Durante a sessão de hemodiálise, após um breve período de aquecimento, a capacidade anaeróbica, força, coordenação e flexibilidade em diferentes grupos musculares das extremidades sem acesso vascular funcional foram trabalhadas usando faixas elásticas de resistência, bolas medicinais, bolas de contração, pesos no tornozelo com peso adicional, halteres e vários pesos. Para trabalhar a capacidade aeróbica, foram utilizados ergómetros de ciclo elétrico colocados aos pés da pessoa. A intensidade (40-50-60 rpm) e a duração (3-6-9-12-15 min) dos ciclos ergómetros foram progressivamente adaptadas20.

Durante os tratamentos, o exercício promove a saída do soluto (ureia) das células e a entrada na circulação sanguínea, fazendo com que o gradiente de concentração do soluto entre os meios seja reduzido, o desequilíbrio é também reduzido, e assim é potenciada a eficácia dialítica19. Além disso, o exercício realizado no pós-operatório sob supervisão do enfermeiro, pode melhorar a maturação da fístula arteriovenosa21.

O Modelo das Atividades de Vida Diárias12 enquadra a atividade física e o exercício físico enquanto focos e intervenções em enfermagem22. O modelo referido, apresenta 12 atividades de vida, onde está contemplada a atividade mobilidade que refere a atividade física e exercício físico. Estas doze atividades de vida são enquadradas e analisadas com base em cinco componentes essenciais: atividades de vida, duração de vida, grau de dependência/independência, fatores que influenciam as atividades de vida e individualidade no viver. Neste estudo de caso foram identificados os fatores que influenciam a atividade física, tendo em consideração o clico de vida, o continuum independência-dependência de modo a planear intervenções sensíveis aos cuidados de enfermagem.

Este senhor apresentava alguns sinais de depressão, esta situação enquadra-se nos resultados de um estudo em que se verificou que em 37.2% das pessoas com DRC apresentavam sintomas depressivos23. Num outro estudo constatou-se que os sintomas depressivos estavam associados negativamente com o bem-estar subjetivo, felicidade subjetiva e sentido de humor, contido estavam associados positivamente com o stresse/ansiedade24. Numa revisão sistemática sobre os benefícios do exercício físico em pessoas com depressão verificou-se que teve como efeitos benéficos a diminuição dos sintomas depressivos, melhorando ainda a forma física, função cognitiva e o bem-estar25. Neste sentido, a prática do exercício físico pode ser uma intervenção com benefícios para este senhor, uma vez que apresentava sintomas depressivos.

Implicações para a prática de enfermagem e políticas de saúde

Os programas de exercício físico no domicílio26 e intradialítico19,20 podem ser benéficos para todas as pessoas DRC, independentemente do estágio da doença ou da modalidade de tratamento que recebem26. Um programa de exercício intradialítico adaptado pode melhorar a força muscular, a capacidade funcional e a qualidade de vida em pessoas idosas submetidas a hemodiálise20.

Tanto os programas implementados no intradialítico como no domicílio têm benefícios no aumento no nível de atividade física27.

Os programas de exercícios físicos realizados no domicílio têm sido bem avaliados pelas pessoas com DRC, sendo que a maioria afirmou ter melhorado e consideram apropriado que seja o enfermeiro a implementar e a liderar o programa26. Contudo, é necessário ter em atenção alguns fatores relacionados com os profissionais de saúde e com os doentes, sendo necessário incentivá-los e motivá-los, de modo a melhorar a adesão aos programas de exercício27.

Limitações

Atendendo a que o plano de cuidados foi suspenso devido à estado de emergência em consequência do COVID-19, não foi possível dar seguimento aos exercícios programados com a pessoa e consequentemente a avaliação da sua efetividade neste caso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A análise inicial ao indivíduo, permitiu destacar determinados focos de atuação. Destacou-se o diagnóstico “Intolerância à atividade (00092)” pois os seus resultados positivos contribuiriam para a minimização de outros focos de atenção, como por exemplo sinais depressivos, eficácia dos tratamentos dialíticos (equilíbrio eletrolítico) e perfusão periférica.

O modelo teórico utilizado simplificou a recolha de dados e a elaboração de diagnósticos autónomos de enfermagem, o que permitiu uma maior compreensão do caso em estudo. Também a utilização das ligações NANDA-I, NIC e NOC, auxiliou e muito a elaboração do plano de cuidados, dando indicações precisas dos indicadores a avaliar.

O período de contacto, mais curto que o inicialmente previsto, condicionou a incrementação e avaliação das intervenções mencionadas. Ainda assim, tentou-se realizar pesquisa nas mais diversas bases de dados, que as suportasse, indicando os seus benefícios.

A elaboração deste estudo de caso, permitiu atingir os objetivos inicialmente propostos, sendo que para isso foi necessária uma compreensão aprofundada da situação do indivíduo e uma pesquisa que permitisse dar suporte às intervenções planeadas.

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Recebido: 27 de Maio de 2020; Aceito: 17 de Outubro de 2020

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